Buscar

ARTIGO DIR FAMÍLIA

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 14 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 14 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 14 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

DUPLA PATERNIDADE NO REGISTRO CIVIL BRASILEIRO E SEUS EFEITOS
Milene Borges Cardoso
Acadêmica em Direito pela Faculdade do Noroeste de Minas - FINOM
RESUMO: 
O trabalho buscou demonstrar a evolução da entidade familiar e analisar os benefícios e efeitos jurídicos decorrentes da multiparentalidade, em especial a dupla paternidade, para tanto, foi utilizado pesquisas bibliográficas e jurisprudenciais, objetivando assim abordar a possibilidade de tal reconhecimento, priorizando, garantir o melhor interesse da criança ou do adolescente, no qual convivem, simultaneamente com vínculos de maternidade/paternidade biológicos e afetivos. 
ABSTRACT:
The work sought to demonstrate the evolution of family entities and to analyze the benefits and legal effects of multiparenting, especially dual paternity, for this purpose, it was used for bibliographic and jurisprudential research, aiming at addressing a possibility of such recognition, prioritizing, guaranteeing or better interest of the child or adolescent, without coexistence, simultaneously with bonds of maternity / biological paternity and affective.
Paracatu
2020
INTRODUÇÃO 
O Direito de Família, do mesmo modo que os demais, não ficou imune às transformações da sociedade. Dentro de tal conceito, o presente artigo buscou abordar a filiação e seus critérios de definição, sejam registral, biológico ou afetivo. Assim, o afeto se torna base do núcleo familiar e o laço consanguíneo, com isso, desenvolve-se o conceito de paternidade socioafetiva. Logo, o reconhecimento da paternidade socioafetiva não exclui o vínculo biológico de forma automática, sendo possível que filho tenha relações de igual afeto e consideração por ambos os pais, sem nenhum tipo de hierarquia sobre as paternidades. Partindo da premissa que a convivência com múltiplos parentes é uma realidade na vida de muitas crianças e adolescentes. O reconhecimento da pluralidade de vínculos gera grande repercussão jurídica ainda pouco estudadas, porém carregam valores fundamentais o qual instigou uma análise mais aprofundada. 
EVOLUÇÃO NO CONCEITO DE FAMÍLIA E DE FILIAÇÃO
De acordo com as necessidades socias o conceito de família foi modificado adaptando-se a sociedade atual, juntamente com o avanço cultural dos povos. Essas variações conceituais e, sobretudo legais, são necessárias, não podendo o direito civil ficar estático diante da necessidade de se adequar ao contexto social (DINIZ, 2014). 
A inovação apresentada pelos doutrinadores atualiza o conceito de família, bem como o de filiação, portanto a família é instrumento de proteção e promoção social, em constante desenvolvimento no qual busca na legislação um amparo, porém a evolução é constante e de forma rápida e assim o nosso ordenamento acaba ficando retrógrado. 
Ao longo do tempo o conceito de família sofreu várias alterações, no passado o modelo de família que predominava era o paternalista, no qual, o poder da família era destinado ao pai, assim a mulher e os filhos não eram detentores de direitos. 
No que diz a respeito de filiação tratado pelo Código Civil de 1916, era expressa a desigualdade dos filhos havidos dentro do casamento e os fora do casamento conhecidos como filhos bastardos. Washington Monteiro e Regina Beatriz Tavares da Silva classificam a filiação da seguinte maneira:
Filhos legítimos eram os nascidos de casal unido pelos laços do casamento. Quando os filhos não procedessem de casamento entre os genitores, se diziam ilegítimos. Os filhos ilegítimos se classificavam em naturais e espúrios. Eram havidos como naturais quando nascidos de homem e de mulher entre os quais não existisse impedimento matrimonial; espúrios, quando nascidos de homem e mulher impedidos de se casarem na época da concepção.
A Constituição de 1988 atualizou a ideia de que a família somente se constituía pelo casamento, conforme o artigo 226 CF, admitindo a sociedade familiar também sendo derivada da união estável e da família monoparental a qual originar-se de ascendente e descendente. Sendo rol meramente exemplificativo, a Constituição não se limita aos modelos expressamente previsto, dessa forma, admite-se novos conceitos que surge juntamente com a evolução da sociedade. Como afirma Maria Berenice Dias (2015, p.32), “Instaurou a igualdade entre o homem e mulher e esgarçou o conceito de família, passando a proteger de forma igualitária todos os seus membros”. Assim o conceito partindo da premissa de igualdade ganha maior amplitude e redimensiona as relações entre pais e filhos. 
Portanto, “a família, como vimos, é fenômeno fundado em dados biológicos, psicológicos e sociológicos regulados pelo direito” (Venosa, 2005, p.25). Vale ressaltar a grande conquista jurídica alcançada na jurisprudência e na doutrina, abordando o parentesco natural ou consanguíneo, por afinidade e civil. Todavia, existe uma omissão do Código Civil em tratar apenas do parentesco natural ou consanguíneo e o civil, porém, é importante enfatizar que a afetividade é indescritível na relação entre pais e filhos. 
Sendo que o conhecimento da paternidade biológica não pode ser considerado de maneira isolada além de não ser decisivo para o conhecimento da paternidade, pois em razão do elo afetivo os termos “pai” e “genitor” são termos distintos, sendo pai aquele que detém a filiação , enquanto genitor é aquele que fornece o material genético. 
Nesse seguimento, Ana Carolina Brochado Teixeira e Gustavo Pereira Leite Ribeiro dispõe: 
As referidas figuras (pai e genitor) não podem ser confundidas pela ordem normativa, dada a distância que as separa no estágio atual da biotecnologia de reprodução humana e da configuração de paternidade.
Portanto, o acolhimento e o afeto começam a ser notados para a formação de família assim começa a aderir o conceito de família socioafetiva, deixando de ser apenas por laços consanguíneos, ou seja, a formação de família apenas em relação a genética. 
MULTIPARENTALIDADE
De maneira geral, o ordenamento jurídico e a doutrina procuram acompanhar as evoluções vividas pela sociedade de maneira ágil, desta forma é possível notar a evolução da legislação no reconhecimento da união estável, casamento homoafetivo e o divórcio. Pois bem, o aumento da multiparentalidade é evidente, contribuindo com este aumento está a família recomposta, a qual é formada por integrantes que em momento anterior era parte de outra família. Visto que os pais genitores mesmo que presentes na vida dos filhos compartilham o papel de pai e mãe com os padrastos e madrastas, uma vez que são papeis similares. Em virtude disso, o ordenamento jurídico busca estar apto para regular a multiparentalidade, a fim de proporcionar segurança jurídica para os evolvidos, especialmente aos menores, perante a condição de pessoa em desenvolvimento, a fim de evitar traumas futuros, principalmente em conflitos judiciais. 
Embora a multiparentalidade exista independente da regularização, em razão de que o vínculo afetivo é desenvolvido no cotidiano, assim a afeição é gerada com atividades familiares criadas no dia-a-dia. Assim existem três tipos de paternidade, a biológica, registral e a paternidade socioafetiva. A paternidade biológica é o vínculo consanguíneo estabelecido em linha reta e aquele que colaborou para sua concepção seja por relação carnal entre os genitores, ou de inseminação artificial homologa ou heteróloga. Já a paternidade registral é constituída a partir do registo de nascimento, mesmo que não há de fato a verdade da paternidade biológica traz a presunção que seja verídica. A paternidade socioafetiva é a qual existe um vínculo afetivo e assim acaba gerando uma relação entre pais e filhos, mesmo que não haja vínculo sanguíneo ou por adoção. Em uma decisão judicial da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado Rio Grande do Sul, o Desembargador Rui Portanova conceituou a paternidade socioafetiva da seguinte maneira:
Paternidade socioafetiva é a relação que, procedendo da realidade social, se desenvolve entre aquele que apresenta um estado de filho perante quem socialmentepossui um estado de pai. A relação social se dá quando uma pessoa de fato cria, educa e acompanha o desenvolvimento de outro indivíduo a ponto de configurar verdadeiro estado de pai e filho. Ou seja, é aquela relação de afeto que ao longo do tempo vai criando raízes a ponto de – apesar da verdade biológica – criar uma verdade social. (Tjrs. Apelação cível, processo nº 70010973402. Oitava Câmara Cível. Relator Desembargador Rui Portanova, julgado em: 04 ago.2005).
No mesmo sentido Maria Berenice Dias diz: 
A filiação socioafetiva corresponde à verdade aparente e decorre do direito de filiação. A necessidade de manter a estabilidade da família, que cumpre a sua função social, faz com que se atribua um papel secundário à verdade biológica. Revela a constância social da relação entre pais e filhos, caracterizando uma paternidade que existe não pelo simples fato biológico ou por força de presunção legal, mas em decorrência de uma convivência afetiva. (DIAS, 2010, p.364).
Assim o ideal seria a junção de tais conceitos em uma única pessoa para exercer a função paterna, porém não acontece em todos os casos. Ainda assim, não é coerente que exista apenas a paternidade biológica para estabelecer a figura paterna, sendo que ela deve ser relacionada com a verdadeira afetividade e ser complementada com a verdade registral. Contudo não deve acontecer que prevaleça um modelo de paternidade sobre o outro, pois devem coexistir para complementar e não ser excludente, dessa maneira, o ordenamento jurídico necessita ser maleável para impedir os conflitos jurídicos. 
Em casos de reconhecimento de paternidade socioafetiva como parentesco civil não restringe a biológica, porém em casos concretos como existe a distinção de formação de famílias, fazendo com que o instituto para essa aplicação se adeque a realidade vivida da criança, resguardando o interesse do filho. Explica Farias (2015, p.591): 
[...] Isso não significa, todavia, que o critério suplantaria, cegamente, o
biológico. É certo – e isso não se pode colocar em dúvida – que somente no
caso concreto, considerada as mais diferentes circunstâncias e elementos
de prova, é que será possível definir um determinado critério para estabelecer o vínculo paterno-filial. Em determinados casos, pode ser o biológico (imagine-se que um homem que engravidou uma mulher, com quem manteve um brevíssimo relacionamento, sequer voltando a travar um contato com ela ou com o rebento nascido – nesse caso, a solução passará pelo critério biológico). Noutros, o afetivo pode sobrepujar (basta pensar no exemplo conhecido da “adoção à brasileira”, quando um homem cria, cuida, educa, concede amor e carinho a um filho que registrou sabendo não ser decorrente de seu material genético e, posteriormente, tenta negar o vínculo que se estabeleceu – aqui tem relevo o critério afetivo).
Vale reconhecer em casos concretos mesmo que a paternidade socioafetiva predomine sobre a paternidade biológica é necessário a proteção do vínculo consanguíneo, no qual é de suma importância por se tratar das origens da pessoa humana, ainda assim cada caso deverá ser observado pelo magistrado, para assim sobressair o melhor interesse do filho. O reconhecimento produz todos os efeitos da relação de pai e filho, sendo todos os direitos e deveres paterno-filial legais referente a matéria. 
POSICIONAMENTO DOUTRINÁRIO E JURISPRUDENCIAL 
É determinante a evolução em vários aspectos da família, uma grande mudança foi a igualdade sobre as responsabilidades de homens e mulheres, a maternidade não prevalece sobre a paternidade sem a jerarquização da figura paterna na família. É explícito a criação da divisão da paternidade na tentativa de separação de funções, provindo a paternidade socioafetiva e a biológica. Como apresenta Mendes (2017, p.31): 
A doutrina de direito de família tem levantado a bandeira no campo da paternidade para valorar um determinado tipo de comportamento paterno como a melhor forma de paternidade, qual seja, a paternidade afetiva. “Na família atual, o afeto é a razão de sua própria existência, o elemento responsável e indispensável para a sua formação, visibilidade, continuidade. Realização de si mesmo através do outro, nesse espaço reina o companheirismo e a camaradagem, em uma busca, dentro dela, a sua própria 
realização, seu próprio bem-estar e felicidade.
A família afetiva originar-se a partir da relação conjugal entre homem e mulher, ligando-se diretamente ao fato do filho ser registrado em nome do pai não biológico, no qual a legislação brasileira não faz distinção entre os filhos de verdade biológica ou aos adotivos, tendo estes os mesmos direitos que os filhos legítimos, sendo inaceitável qualquer distinção filial depois de constar em registro civil (MENDES, 2017).
É habitual que novas famílias se formem a partir de união estável ou matrimonial entre pessoas, que já tem filhos, assim o homem acaba criando e educando filhos alheios como se fossem seus, em regra desfeita a sociedade conjugal, uma vez que assumida a paternidade socioafetiva, havendo o reconhecimento voluntário civil não poderá negar a paternidade e anular o registro, exceto em casos de vicio de consentimento. Devendo para tanto, como nas expressões latinas tractatus e reputatio, na posse do estado de filho, ser tratado e havido socialmente com tal (SILVA, 2012).
Há situações em que o filho pode requerer o anulamento do reconhecimento da paternidade socioafetiva a fim de buscar o reconhecimento da paternidade biológica, nessas situações é analisado o interesse do envolvido a fim de que se tenha uma decisão na qual deverá ou não prevalecer a paternidade socioafetiva sobre a paternidade biológica. 
 Com o Código Civil reconhecendo o parentesco de outra origem, além do parentesco consanguíneo, incluiu o conceito socioafetivo, assim gerou espaço para outros tipos de paternidades que a sociedade vem apresentando com as novas formações de família. Para o reconhecimento da filiação pluriparental, basta estabelecer o vínculo de filiação com mais de um pai. Coexistindo vínculos afetivos e biológicos ou apenas afetivos é mais que direito e sim uma obrigação constitucional reconhecê-los, não há outra forma de respeitar os direitos dos envolvidos preservando sobre tudo, à dignidade e à afetividade. 
No Distrito Federal a Juíza Ana Maria Gonçalves Louzada destacou não caber ao Direito ou ao Judiciário impor limites:
O direito deve espelhar e proteger a vida da pessoa na sua inteireza. Se no caso concreto ela possuir duas mães, dois pais, ou seja lá a composição que sua família tenha, não cabe ao Direito e tampouco ao Judiciário impor limites a esta entidade familiar. Hannah Arendt já dizia que a pluralidade é a condição da ação humana porque somos todos iguais, isto é, humanos, de um modo tal que ninguém jamais é igual a qualquer outro que viveu, vive ou viverá. Ou seja, somos únicos! Engessar arranjos familiares tendo como fundamento o dogma da unicidade de paternidade e maternidade, é apenas fazer uma leitura linear da vida. É preciso que nossos horizontes sejam alargados, que nossa visão seja aprofundada, e que nossos braços sejam fontes de acolhimento. (TJDF, Comarca de Sobradinho. Proc. 2013.06.1.001874-5, Juíza Ana Maria Gonçalves Louzada, j. 06/06/ 2014).
Os posicionamentos que garantiu espaço para a multiparentalidade quanto a garantia dos direitos das famílias vem se consolidando. Assim conclui Maria Berenice Dias e Marta Cauduro Oppermann (2015, p.8): 
 Diante do reconhecimento das uniões homoafetivas como entidades familiares, da garantia de acesso ao casamento15 e do uso das técnicas de reprodução assistida,16 uma nova realidade se impôs, não havendo como negar respeito a estes projetos multiparentais, de quem planejou e realizou o sonho de ter filhos. Necessariamente, mais de duas pessoas.
Assim há um posicionamento no qual busca o melhor interesse do filho: 
PATERNIDADE CUMULADA COM ANULAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. PROVA PERICIAL (EXAME DE DNA) PATERNIDADE BIOLÓGICA DO DEMANDADO COMPROVADA. SENTENÇA RECONHECEU A DUPLA PARENTALIDADEE DETERMINOU A RETIFICAÇÃO DO REGISTRO CIVIL
PARA CONSTAR O NOME DO PAI BIOLÓGICO COM A MANUTENÇÃO DO
PAI SOCIOAFETIVO. INCONFORMISMO DO RÉU. ALEGAÇÃO DE VÍNCULO AFETIVO COM O PAI REGISTRAL. AMPARO MATERIAL. DESNECESSIDADE DO RECONHECIMENTO CONSANGUÍNEO. AFASTAMENTO DO ESTADO DE FILIAÇÃO. ESTUDO SOCIAL E LAUDO
PSICOLÓGICO. AFETIVIDADE COM O PAI REGISTRAL MESMO APÓS A
SEPARAÇÃO DA GENITORA. MANIFESTAÇÃO EXPRESSA DE QUE VAI
CONTINUAR A RECONHECER A CRIANÇA COMO FILHA. DUPLA PATERNIDADE MANTIDA. VÍNCULO SOCIOAFETIVO QUE NÃO EXCLUI O BIOLÓGICO. POSSIBILIDADE DE COEXISTÊNCIA DE AMBOS. PREVALÊNCIA INTERESSE DA CRIANÇA. TESE FIRMADA EM REPERCUSSÃO GERAL. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. A paternidade responsável, enunciada expressamente no art. 226, § 7º, da constituição, na perspectiva da dignidade humana e da busca pela felicidade,
impõe o acolhimento, no espectro legal, tanto dos vínculos de filiação construídos pela relação afetiva entre os envolvidos, quanto daqueles originados da ascendência biológica, sem que seja necessário decidir entre
um ou outro vínculo quando o melhor interesse do descendente for o reconhecimento jurídico de ambos. (STF, RE n. 898.060/SP. Rel. Min. Luiz Fux, j. 21.9.2016) (TJ-SC- AC: 030267493201582240037 Joaçaba 0302674- 9.2015.8.24.0037. Relator: Saul Steil. Data de Julgamento: 17/04/2018, Terceira Câmara de Direito Civil
Contudo, o afeto é um fator indispensável para os tribunais nas decisões, diante dos os requisitos cabe ao juiz verificar a existência do mesmo, em cada caso e sendo reconhecida, deve sempre prevalecer o melhor interesse da criança. Isto é caso a paternidade afetiva seja mais favorável a criança sendo a mais adequada para garantir seus direitos devera prevalecer sobre a biológica. 
EFEITOS JURÍDICOS DA DUPLA PATERNIDADE 
No dia 21 de setembro de 2016 o Supremo Tribunal Federal (STF) permitiu que uma criança obtivesse em seu Registro Civil o nome de dois pais, sem nenhuma hierarquia, o pai afetivo e biológico. Dessa maneira, o ministro relator Luiz Fux com seu posicionamento de Recuso Extraordinário encerrou os conflitos existentes entre a biologia e o afeto, afirmando que: “A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com todas as consequências patrimoniais e extrapatrimoniais” (Recurso Extraordinário 898.060 São Paulo Relator: MIN. LUIZ FUX, 2016).
A partir inclusão no ordenamento jurídico do conceito de multiparentalidade, que corresponde ao reconhecimento de direitos e deveres, daquela pessoa que cria, educa e ama como filho sem que tenha vínculo biológico, ainda assim sem desconsiderar os pais biológicos, que resultou no direito do reconhecimento da filiação socioafetivo, sem a exclusão da biológica. Assim iniciou a possibilidade de o filho ter no seu Registro Civil declarado o nome do pai/mãe biológicos e também pai/mãe socioafetivo. Assim o RE 898.060, serviu de base para outras decisões envolvendo a dupla paternidade: 
DIREITO DE FAMÍLIA. PROCESSUAL CIVIL. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. DUPLA PATERNIDADE. RECONHECIMENTO DE UM SEGUNDO VÍNCULO SOCIOAFETIVO. CONDIÇÕES DA AÇÃO. VERIFICAÇÃO. TEORIA DA ASSERÇÃO. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. QUESTÕES QUE SE CONFUNDEM COM O MÉRITO. PATERNIDADE ANTERIOR QUE SOBRESSAI BIOLÓGICA, SOCIOAFETIVA E REGISTRAL. ESTADO DE FILIAÇÃO ESTABILIZADO. POSSE DO ESTADO DE FILHO EM RELAÇÃO AO PAI REGISTRAL. CONFIGURAÇÃO. REGISTRO CIVIL. IMUTABILIDADE. DECLARAÇÃO DE PATERNIDADE SOCIOAFETIVA DE PESSOA FALECIDA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA INTENÇÃO DO PADRASTO DE ASSUMIR JURIDICAMENTE A FILIAÇÃO QUANDO EM VIDA. EXISTÊNCIA DE MERA RELAÇÃO AFETUOSA ENTRE PADRASTO E ENTEADA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DE TRATAMENTO IGUALITÁRIO ENTRE IRMÃOS. ARTIGO 227, § 6º, DA CF. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. 1. A convivência familiar e a afetividade constroem e consolidam o estado de filiação, independentemente da superveniência de outros fatores tais como a revelação da origem biológica do filho, a morte do pai ou ainda o surgimento de um padrasto. 2. Tendo sido regularmente constituída a relação de filiação da autora com seu pai biológico, afetivo e registral, com todos os seus inerentes elementos, não há que se falar em relação futura a modificar esse estado de 34 coisa que restou configurado. 3. Sendo a relação paterno-flilial irretratável ou irrevogável, não se mostra possível que uma natural e harmoniosa relação entre enteada e padrasto altere o que sobejou perfeitamente constituído no tempo, notadamente, para sobrevir nos assentamentos civis da postulante um segundo pai, mais de cinquenta anos depois de configurada a paternidade originária, tendo esta sido estabelecida com laços biológicos e socioafetivos. 4. O fato do falecido padrasto ter tratado a autora com afeição, dando-lhe o esperado carinho durante o casamento que manteve com a sua genitora, e mesmo após a morte desta, não repercute diretamente no reconhecimento da paternidade socioafetiva, especialmente, quando não restar claramente comprovada a intenção do padrasto em assumir juridicamente a paternidade da enteada, em vida. 5. Do contrário, qualquer indivíduo que vier a se relacionar com mulher que já tenha filhos e os trate de forma harmoniosa e afetuosa, tal como se espera, estará correndo sério risco de tornar-se pai, mesmo que não seja essa a sua intenção, o que não é minimamente razoável e inverte a lógica do instituto, sobretudo quando existe um genitor que assumiu a paternidade com todos os seus inerentes requisitos, mesmo que tenha falecido no início da adolescência da filha, como na espécie. 6. Nesse contexto, entendo que a relação parental regularmente estabelecida entre a autora e seu pai registral, biológico e socioafetivo deve se perpetuar sem qualquer interferência superveniente, asseverando-se ainda que resta demonstrado nos autos que ela tão somente estabeleceu uma relação natural e harmoniosa com o seu padrasto, o que por si só não indica que este, quando vivo, teria apresentado a intenção de assumir juridicamente a paternidade dela, requerida somente após a morte daquele, circunstância que também informa a inexistência de paternidade socioafetiva na hipótese. 7. Logo, considerando que autora já tivera um pai biológico, com o qual guardara relação de afeto, de modo a restar satisfatoriamente estabelecida e estabilizada a relação paterno-filial entre eles, a pretensão autoral de ver reconhecida a existência de uma dupla paternidade entre seu pai originário e seu padrasto não se justifica. 8. De qualquer sorte, pelas provas produzidas no feito, a pretensão também não é procedente porque não sobressaiu suficientemente demonstrada a intenção do de cujus de assumir juridicamente a aduzida paternidade socioafetiva em face da autora quando ainda era vivo, evidenciando-se, ao menos no que diz respeito ao padrasto, que ele nutria apenas um esperado afeto e carinho pela enteada, num mero relacionamento familiar harmonioso. 9. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. (TJ-DF - APC: 20150111157545, Relator: ALFEU MACHADO, Data de Julgamento: 16/03/2016, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE: 06/04/2016. Pág.: 210). 
Na decisão apresentada, foi reconhecido o vínculo afetivo do padrasto e do filho da genitora mesmo após o termino do relacionamento. Ainda que a criança tinha pai biológico o afeto pelo padrasto só aumentou com o passar dos anos e mesmo com a separação não foi possível que tal vínculo fosse desfeito, assim, no registro do filho foi concedido a dupla paternidade, sendo a biológica e afetiva. 
Encerrado todo processo de reconhecimento da dupla paternidade, os reflexos começam a ser explorados. Para Zeno Veloso (2016, p.468) “estabelecida a filiação socioafetiva ocorrem todos os efeitos do parentesco natural: pessoais ou patrimoniais (sucessórios inclusive)”. 
Conforme o art. 1º da Lei de Registros Públicos (lei 6.015/73), esta modalidade registral garante a autenticidade, a segurança e eficáciados atos jurídicos, devendo, portanto, refletir a verdade real. Além disso, o art. 10, inciso II, do Código Civil atual, prevê a exigência de averbação em registro público dos atos judiciais ou extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a filiação. Ainda que a lei não prever a hipótese de multiparentalidade no registro de nascimento, não representa nenhum impedimento ao exercício da mesma, baseando-se em princípios constitucionais hierarquicamente superiores. Assim a declaração de multiparentalidade reconhecida em ação judicial é conforme o art. 97 da referida Lei de Registros Públicos: “a averbação será feita pelo oficial do cartório e que constar o assento à vista da carta de sentença, de mandado ou de petição acompanhada de certidão ou documento legal e autêntico, com audiência do Ministério Público”.
DO ESTABELECIMENTO DO VÍNCULO PARENTESCO 
Após o reconhecimento da paternidade socioafetiva, acarreta efeitos principalmente no que se refere as relações de parentesco. Isso ocorre porque os parentes em linha reta e colateral iram se comunicar. Conforme o artigo 1.593 CC/02 “o parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”, assim deixando nítido que da relação socioafetiva é possível que prolongue a linha de parentesco aos envolvidos nessa situação. Assim não restam dúvidas que a estrutura familiar socioafetiva é apta a desenvolver os mesmos efeitos dos vínculos biológicos. 
OBRIGAÇÃO ALIMENTAR
No entendimento de Farias e Rosenvald (2014, p.698) “a obrigação familiar é, sem dúvida, expressão da solidariedade social e familiar (enraizada em sentimentos humanitários) constitucionalmente impostas como diretriz da nossa ordem jurídica”. Nesse sentido, Flávio Tartuce (2016, p.518) alega: “(...) os alimentos devem compreender as necessidades vitais da pessoa, cujo objetivo é a manutenção da sua dignidade: a alimentação, a saúde, a moradia, o vestuário, o lazer, a educação, entre outros”. O dever/direito de prestar alimentos está expresso no art. 1.696 CC e também tem aparo na Constituição Federal art. 229. 
Deste modo compreende-se que o dever de prestação de alimentos deve ser reciproco entre pais e filhos devidamente na proporção de necessidade apresentada. Assim não seria compreensível que fosse diferente ao tratar das relações multiparentais. Neste contexto, Schimitt e Augusto (2013) diz: 
Na tripla filiação multiparental o menor necessitado poderá requerer alimentos de qualquer um dos pais, atendendo o princípio do melhor interesse da criança, presente no Estatuto da Criança e do Adolescente. Resta claro que a possibilidade de uma tripla filiação teria muito mais condições de contribuir para o adequado desenvolvimento do menor. Nos casos onde os magistrados decidissem por reconhecer a tripla filiação, sempre haverá a prévia relação familiar de fato, restando apenas reconhecer uma regulamentação de direito. (SCHIMITT; AUGUSTO apud SANTOS, 2014).
Além disso o art. 1.707 do Código Civil diz: “Pode o credor não exercer, porem lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora”, assim os alimentos são impenhoráveis, ou seja, o menor poderá exercer seu direito quanto aos alimentos, porém nunca renunciá-lo . A legislação brasileira e a jurisprudência não colocam impedimentos quanto a prestação de alimentos por mais de um pai ao filho, e vice-versa. Uma vez que o intuito da prestação de alimentos é atender as necessidades básicas, e não de enriquecimento. 
Há divergências doutrinária em considerar que o filho que recebe simultaneamente amparo dos pais, afetivo e biológico, pois isso poderá acarretar o dever de amparo a todos eles na velhice, ainda que gere encargos para o filho. 
GUARDA 
Quanto a decisão da guarda, os pais ou juiz, devem sempre procurar atender o melhor interesse da criança ou adolescente, analisando o mais capacitado para oferecer um ambiente de vida saudável para o filho, e ainda considerando os anseios do filho sempre que sua idade e maturidade possibilitar. Assim não há que se falar em preferência ou hierarquia entre os vínculos para decisão da guarda, pois aplica-se o melhor interesse da criança e adolescente, utilizando assim critérios como afinidade, a afetividade e o menor ambiente de desenvolvimento. 
DIREITO SUCESSÓRIO 
A filiação garante o direito a herança, abrangendo descentes e ascendentes, assim a relação multiparental deve se dar para todos os fins e efeitos, sendo vedada a discriminação entre os filhos. Em 2012 o Instituto Brasileiro de Direito de Família, publicou uma matéria que analisava uma decisão proferida pelo desembargador Jorge Luiz da Costa Beber, no TJSC. Fato é que a autora da referida ação, perdeu a mãe ainda quando criança, foi criada, educada e amada pelos patrões de sua mãe, sem nenhuma distinção em relação aos outros filhos biológicos assim formou-se um vínculo afetivo. Entretanto quando a mãe afetiva veio a falecer a autora da ação foi excluída do processo sucessório, ingressando com a ação em busca de ter os direitos respeitados. Assim o desembarcador reconheceu o vínculo afetivo e entendeu que a retirada do direito sucessório da filha afetiva seria discriminação diante dos filhos biológicos, o qual implicaria inconstitucionalidade.
 Assim relatou:
A prova dos autos é exuberante. No baile de debutantes, a filha socioafetiva foi apresentada como filha do casal. Quando ela se casou, eles foram contados como pai e mãe. Ela tinha os irmãos biológicos como irmãos. Quando nasceu o filho da filha afetiva, ele foi tido como neto recebendo, inclusive, um imóvel dos avôs afetivos. Trata-se de uma relação afetiva superior ao simples cumprimento de uma guarda. (FILHA..., 2012)
No entanto, verificada a existência da multiparentalidade o efeito sucessório é direito de todos os filhos, afetivos e biológicos sem qualquer discriminação e deve ser analisado baseando-se nos princípios constitucionais, principalmente o da dignidade da pessoa humana, e a vedação de discriminação entre os filhos. Em razão disso, não há impedimentos que se aplique ao filho que não é detentor do vínculo biológico. 
CONCLUSÃO 
A família é uma entidade mais antiga da humanidade, e com a evolução da sociedade, sua estrutura e seu conceito foi se modificando e se adaptando aos novos tempos. Conforme elucidado, a doutrina e jurisprudência e a própria legislação, reconhece a mutação na entidade familiar, bem como as famílias plurais. Assim os filhos que era discriminados na Constituição Federal de 1916, passam a ter amparo na Constituição Federal de 1988, tendo a proteção jurídica, a qual vedou a discriminação entre eles. Embora não há na legislação nenhuma regra a qual expresse em que momento o sujeito pode ser considerado pai, mãe ou filho, assim é notável a importância dos critérios jurídicos, biológicos e afetivos. Tal evolução ocorre juntamente quando o afeto entre pais, madrastas, padrastos e filhos, começam a surgir e assim vem o desejo de que o afeto seja reconhecido legalmente. Assim o símbolo histórico para a denominação de pai/mãe socioafetivo foi a criação da Lei nº 11.924/2009, conhecida como lei Clodovil Hernandes, onde se permitia que padrastos e madrastas fossem considerados pais/mães no próprio registro de nascimento da criança, caso fosse sua vontade. Vale lembrar que isso funcionou através da dupla paternidade/maternidade registral, ou seja, Recurso Extraordinário 898.060, decidindo assim que caso haja o vínculo de afeto, não há impedimentos em ter dois pais/mães em seu registro civil de nascimento. Assim o reconhecimento da dupla filiação não impossibilita a existência de outras, da mesma maneira que não se exclui vínculos já existentes. A possibilidade de coexistir duas paternidades no registo de nascimento representa grande avanço para a sociedade e a legislação, porém de acordo que a evolução humana há necessidade que ao nosso ordenamento jurídico seja flexível, visando o bem esta para as crianças. 
REFERÊNCIAS
MONTEIRO, Washington de Barros; SILVA, ReginaBeatriz Tavares da. Curso de Direito Civil: Famílias. 
São Paulo: Saraiva, 2011. MONTEIRO, Washington de Barros; SILVA, Regina Beatriz Tavares da. Curso de Direito Civil: Famílias. São Paulo: Saraiva, 2011.
TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado; RIBEIRO, Gustavo Pereira Leite. Manual de Direito das Famílias e das Sucessões. Belo Horizonte: Del Rey Mandamentos, 2008. 
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, 1988. Disponivel em: . Acesso em: 20 abril 2020.
RODRIGUES, SILVIO. Direito Civil: Direito das sucessões. 26º edição. rev. e atual. por eno eloso; de acordo com o novo Código Civil ( ei n. 10.406, de 10-1-2002). ed. São Paulo: Saraiva, v. volume 7, 2003.
STF. RECURSO EXTRAORDINÁRIO: RE 898.060. Relator: Ministro Luiz Fux. DJ: 24/08/2017. Portal STF, 2017. Disponivel em: . Acesso em: 20 abril 2020.
TARTUCE, FLÁVIO. Manual de Direito Civil. 7ª Edição. ed. São Paulo: Editora Método, v. Volume único, 2017.

Continue navegando