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Criança é vista como um cidadão com direitos e deveres?

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3.1 As infâncias no mundo contemporâneo 
Muitas são as infâncias vividas diariamente pelas 
crianças existentes em nosso Brasil – de acordo 
com o Censo 2010 do Instituto Brasileiro de 
Geografia e Estatística, a população infantil de 
zero a 14 anos era de 46 milhões (IBGE, 2010). 
Há as infâncias passadas em subúrbios de classe 
alta, em que as crianças têm acesso a um leque 
oportunidades; aquelas vividas em favelas e 
cercadas por miséria; a infância da classe média, 
com seus muros altos e, muitas vezes, cerceadas 
pelo medo. 
São vidas e vivências diferentes que se 
entrelaçam e formam as infâncias brasileiras, 
sendo que muitas delas se chocam na escola, 
cabendo ao professor saber lidar com essas 
crianças de forma a estabelecer uma práxis que o 
permita escutar e levar em consideração todas 
essas experiências diversas e traduzi-las em 
troca, ajuda e sensibilidade. 
3.1.1 Entre a riqueza e a pobreza 
Que o Brasil é um país de desigualdades, já 
sabemos; o Instituto Brasileiro de Geografia e 
Estatística (IBGE) lançou um estudo em 2016, 
que chegou aos seguintes dados: 10% da 
população brasileira detêm 43,4% da renda do 
país, enquanto 90% da população dividem, 
injustamente, o restante da fatia. 
Mapa estatístico feito pela Pesquisa Nacional por 
Amostra de Domicílios Contínua 2016, com a 
desigualdade social do Brasil. Fonte: IBGE, 2017a. 
Desta forma, pode-se afirmar que são várias as 
realidades dos brasileiros e, consequentemente, 
das crianças brasileiras. Se entendermos que as 
crianças são seres sociais, marcadas e 
constituídas pela sociedade em que vivem, essas 
maneiras diversas de viver, a partir da realidade 
econômico-social de cada família, influenciam 
diretamente nas formas de viver a infância. 
Pensemos nas crianças que vivem entre os 10% 
que detêm a maior fatia da riqueza do país. Em 
um primeiro momento, chega-se à conclusão de 
que essas crianças vivem a melhor vida que o 
dinheiro pode comprar, porém, há pesquisas que 
indicam que há muitas minúcias no que se refere 
aos modos de viver dessas crianças. Por exemplo, 
na tese de doutorado em Antropologia Social, 
Saraiva (2014) estudou as crianças ricas de 
Fortaleza e constatou que a infância desse 
público é marcada por uma parcela que vive 
reclusa a lugares fechados – como shoppings, 
suas próprias casas e escolas – e uma parte com 
medo de lugares públicos. Além disso, são muitas 
vezes impedidas por seus familiares a brincarem 
e interagirem com outras crianças fora de suas 
casas “segundo suas mães devido, 
principalmente, às más influências” (SARAIVA, 
2014, p. 123). 
Se buscarmos estudos da infância ao longo da 
história, no Brasil, constata-se que há registros 
de crianças pobres, vivendo em condições de 
miséria, deixadas à margem da sociedade e da 
vida digna, o que revela a infância desvalida no 
Brasil e como esse modo de viver a infância 
ultrapassou os séculos, permanecendo e se 
agravando nos dias atuais. 
O mapa a seguir ilustra a alta porcentagem de 
indivíduos em situação de pobreza no país: 
 
Mapa da pobreza no Brasil e a alta porcentagem de 
pessoas em situação de pobreza. 
Fonte: IBGE, 2017b. 
Como exemplos de pesquisas que ilustram essas 
infâncias brasileiras, temos os estudos de Assis 
et al. (2007), que trazem uma pesquisa com 
crianças pobres e suas infâncias no Nordeste, 
constatando que essas crianças têm altas taxas 
de mortalidade e doenças devido à falta de 
políticas públicas de saúde e desigualdade social 
da região. 
Da mesma maneira, o estudo bibliográfico de 
Veiga (2017) teve como foco o “entendimento da 
condição de pobreza como desqualificação moral 
e a estigmatização da criança pobre” (VEIGA, 
2017, p. 1), trazendo dados de que a criança de 
baixa classe social é vista como outsider, ou seja, 
como alguém que sempre está à margem da 
sociedade, e as instituições sociais, como a 
escola, ao contrário de fazer o papel de minimizar 
essas diferenças, favorece esse estigma de 
criança pobre como ser inferior. 
Outro exemplo é o estudo realizado por Moraes 
(2000) revela o tratamento oferecido às crianças 
pobres no transcorrer histórico do Brasil, e o 
quanto esse passado se revela na vida presente e 
na “usurpação dos direitos fundamentais da 
criança na contemporaneidade no país.” 
(MORAES, 2000, p. 93). 
A partir desses exemplos, pode-se concluir que a 
criança pobre é maioria no país, e sua infância, 
na maioria das vezes, é tomada por dificuldades 
que vão além da falta de estrutura ou da falta de 
bens materiais; é uma infância privada de 
direitos básicos, apesar de muitos destes direitos 
serem reconhecidos por lei. 
3.1.2 O papel da escola com as infâncias 
A escola deve ser um lugar que acolha as 
diferenças, ou seja, as crianças deveriam se 
sentir seguras e protegidas na escola, e suas 
diferenças enaltecidas. Desta forma, faz-se 
necessária uma educação que leve em 
consideração essas diversidades, propondo 
momentos de aprendizagem em que se respeitem 
as vivências e os conhecimentos trazidos pelas 
crianças, bem como as características 
individuais, a partir da igualdade de direitos que 
privilegie a todos, sem distinção de raça, sexo ou 
classe social. 
Mas a escola está preparada para trabalhar com 
as distintas realidades? Há profissionais 
capacitados e políticas voltadas à manutenção e 
ampliação da escola pública que permita à 
instituição seguir o caminho de igualdade e 
atendimento de qualidade para todas as 
crianças? 
As políticas públicas relacionadas a gastos com 
educação não revelam boas notícias para o país. 
Em outubro de 2016, o Governo Federal lançou – 
e a Câmara dos Deputados aprovou – a Proposta 
de Emenda à Constituição (PEC) 241 (BRASIL, 
2016), que congelou por duas décadas os 
investimentos em educação, sendo que o próprio 
Instituto Brasileiro de Pesquisa Econômica 
Aplicada (IPEA), órgão do Governo Federal, 
lançou pesquisas sobre o impacto positivo dos 
investimentos em educação para o 
desenvolvimento socioeconômico do país. 
Destarte, estamos vivendo momentos de 
sucateamento da educação, no qual a pauta do 
Governo está no desmantelamento do direito 
universal à educação pública de qualidade ao 
invés de investirem em políticas que avancem 
nas discussões da universalidade da educação 
como direito de todos. 
Viver plenamente a infância, em uma sociedade 
na qual os direitos não são garantidos a todos, é 
tarefa difícil. A escola, inserida nesse contexto, 
deveria contribuir para assegurar, a todos os 
envolvidos, o direito de ser criança e viver a 
infância. No entanto, a falta de investimentos em 
educação acaba não permitindo que a instituição 
faça valer seu papel. 
Essa diminuição de investimento do dinheiro 
público em educação abre as portas para a 
privatização dentro da escola, com o interesse de 
trazer dinheiro da iniciativa privada para cobrir 
os déficits da escola pública. A partir disso, cria-
se uma atmosfera de obediência ao capital, sendo 
a instituição, muitas vezes, obrigada a se adaptar 
à lógica do mercado: 
Pesquisas apontam um incentivo à 
privatização da educação pública no país, 
com a finalidade de promover a lógica de 
mercado dentro das escolas, ou seja, tratar 
a educação com a lógica de uma empresa, 
na qual o lucro de sobressai em detrimento 
da construção de conhecimento. 
Diante desse processo de privatização 
situada na lógica do sistema capitalista, 
produz-se um dos efeitos para a Educação 
pública que é justamente a transformação 
da Educação em mercadoria. 
Transformação em um objeto ou coisa que 
tem um valor e pode ser comercializada na 
sociabilidade capitalista [...]. (SANTOS, 
2017, p. 259-260). 
Desta forma, a escola está à mercê de políticas 
que favorecem sua passagem da esfera pública 
para a privada através de acordos e 
financiamentos que ferem a constitucionalidade 
da educação para todos, sendo queuma 
educação direcionada à lógica do mercado é mais 
atrativa para os detentores dos meios de 
produção. 
E a educação violada que permeia muitas escolas 
acaba reproduzindo a lógica excludente da 
sociedade, e, mais uma vez, muitas crianças não 
têm seus direitos básicos atendidos. 
A escola é uma instituição com a possibilidade de 
levar em conta a criança sendo criança, em seu 
contexto de infância, tendo como pressuposto a 
compreensão de seu papel enquanto agente 
social na sociedade da qual faz parte, bem como 
o protagonismo infantil nas relações que se 
estabelecem nas interações. 
3.2 Infância como um direito da criança 
A criança, como ser social, também é cidadão 
com direitos e deveres. Viver a infância é direito, 
porém, a análise está em como essas crianças 
vivem suas diferentes infâncias dentro de suas 
particularidades sociais. 
Além disso, deve-se ter em conta que os direitos 
constitucionais e legais das crianças são 
universais, ou seja, são para as crianças ricas e 
pobres, negras, brancas ou amarelas, meninos e 
meninas de todas as classes sociais que 
permeiam todas as localidades desse grande país. 
A visibilidade dessas crianças deve ser real e na 
concretude de suas particularidades, assim como 
seus direitos devem ser garantidos, 
possibilitando que todas as crianças possam 
viver sua infância. 
3.2.1 Análise dos direitos da criança 
Quando tratamos sobre o direito das crianças no 
Brasil, se estabelece que os principais 
documentos no que tangem aos seus direitos e 
deveres são a Constituição do Brasil de 1988, o 
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 
1990 e, no âmbito mais específico da educação, a 
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 
(LDB), promulgada em 1996. 
Esses três documentos permeiam as práticas 
sociais na instância dos direitos no que se refere 
às crianças e adolescentes, são eles que ditam à 
sociedade quais as determinações em relação às 
crianças no que se refere à educação, bem-estar, 
saúde, mas também em como lidar com a criança 
marginalizada, indefesa, que sofre maus tratos. 
Enfim, esses documentos se completam e se 
entrelaçam, na tentativa, ao menos no campo das 
ideias, de permitir à criança viver a infância no 
seu tempo e de forma plena. 
Devemos iniciar a discussão a partir da lei 
magna do país, a Constituição. Em seu artigo 5º, 
o documento traz a seguinte afirmação: 
Art. 5º – Todos são iguais perante a lei, sem 
distinção de qualquer natureza, garantindo-
se aos brasileiros e aos estrangeiros 
residentes no País a inviolabilidade do 
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à 
segurança e à propriedade [...] (BRASIL, 
1988, p. 2). 
Infelizmente, nem todas as pessoas têm esses 
direitos efetivamente garantidos, já tratamos 
sobre os casos de pobreza no país nos tópicos 
supracitados, o que exprime a não garantia de 
direitos em detrimento ao que dita a referida lei. 
Continuando, em seu artigo 227, a Constituição 
trata sobre os direitos das crianças que devem 
ser assegurados por diversas instâncias sociais: 
[...] É dever da família, da sociedade e do 
Estado assegurar à criança, ao adolescente 
e ao jovem, com absoluta prioridade, o 
direito à vida, à saúde, à alimentação, à 
educação, ao lazer, à profissionalização, à 
cultura, à dignidade, ao respeito, à 
liberdade e à convivência familiar e 
comunitária, além de colocá-los a salvo de 
toda forma de negligência, discriminação, 
exploração, violência, crueldade e opressão. 
(BRASIL, 1988, p. 103). 
Considerando que a criança é ser social, ao 
deixar de garantir direitos básicos às famílias, 
consequentemente se estará deixando de atender 
os direitos das crianças que vivem nessas 
famílias. Dessa forma, ao congelar o investimento 
com saúde e educação por 20 anos a partir da 
homologação da PEC 241 (BRASIL, 2016), por 
exemplo, o poder público deixa claro que não está 
levando em consideração os direitos mínimos dos 
cidadãos, sejam crianças, jovens, adultos ou 
idosos, consequentemente, seus direitos 
constitucionais não estão sendo respeitados. 
No que se refere ao ECA (BRASIL, 1990), trata-se 
de um documento que avançou muito as 
discussões sobre os direitos da criança, 
estabelecendo normas rígidas e punição para 
quem violar, maltratar ou negar à criança e ao 
adolescente quaisquer direitos que lhe cabem em 
lei. 
Em seu artigo 5º, o estatuto estabelece: 
“Nenhuma criança ou adolescente será objeto de 
qualquer forma de negligência, discriminação, 
exploração, violência, crueldade e opressão, 
punido na forma da lei qualquer atentado, por 
ação ou omissão, aos seus direitos 
fundamentais” (ECA, 1990, p. 10). Esse discurso, 
que atende à legalidade, mas não à realidade, é 
promessa de campanhas de inúmeros 
candidatos, levando a sociedade a crer em um vir 
a ser de direitos, ou seja, está exigido na lei, mas 
não ocorre com todas as crianças na realidade, 
podendo vir a ocorrer – ou não. 
De acordo com o ECA, criança é o indivíduo 
menor de 12 anos de idade, sendo assim, em 
seus artigos 60 a 69, trata da profissionalização e 
proteção do trabalho: “[...] é proibido qualquer 
trabalho ao menor de quatorze anos, salvo na 
condição de aprendiz.” (BRASIL, 1990, s. p.). Em 
pesquisa feita pelo IBGE, em 2016, 998 mil 
crianças entre 5 e 13 anos de idade estavam em 
situação de trabalho infantil (IBGE, 2017c). 
Esse dado nos leva a pensar sobre as diferentes 
infâncias que existem nos mais diversos cantos 
do Brasil: de um lado, a infância vivida em sua 
plenitude por uma parcela das crianças que 
nascem com possibilidades de uma vida digna, 
com os direitos à educação, saúde e moradia 
garantidos, não por força da lei, mas pelos 
recursos financeiros de suas famílias; de outro, 
tantas infâncias desvalidas e desprovidas de 
pertencimento e direito, vividas por crianças 
trabalhadoras, analfabetas, negligenciadas e 
marginalizadas, os outsiders de que tratam Elias 
e Scotson (2000, p. 1), delegados à categoria de 
seres inferiores, sem direitos, mas com deveres; 
sem infância, mas ainda crianças. 
Quanto à Lei de Diretrizes e Bases da Educação 
Nacional, a conhecida Lei 9.394/1996 (BRASIL, 
1996), igualmente foi um avanço no que se refere 
à legislação, mais especificamente à educação 
infantil e de todos os indivíduos da sociedade. 
Iniciaremos a discussão a partir de seu artigo 5º, 
que trata do acesso à educação: 
O acesso à educação básica obrigatória é 
direito público subjetivo, podendo qualquer 
cidadão, grupo de cidadãos, associação 
comunitária, organização sindical, entidade 
de classe ou outra legalmente constituída e, 
ainda, o Ministério Público, acionar o poder 
público para exigi-lo. (BRASIL, 1996, s. p.). 
De acordo com pesquisa feita 2016 pelo IBGE, 
em 2016, cerca de 99,2% das crianças e 
adolescentes frequentavam a escola, o que é uma 
margem muito boa, porém, a taxa de 
analfabetismo foi de 7,2%; sendo assim, em 
algum momento, falha-se no ensino, já que a 
pesquisa nos faz ter certeza de que há 
analfabetos frequentando a escola (IBGE, 2017d). 
O que chama a atenção nessa pesquisa é que as 
taxas de escolaridade oscilam entre os Estados, 
sendo que em alguns as taxas são boas, e em 
outros são muito ruins, o que deixa claro que o 
direito chega para alguns, e não para outros. 
Cabe mencionar que a região Nordeste, uma das 
mais pobres do país, é a região com maiores 
taxas de analfabetismo e baixa escolarização de 
pessoas das mais variadas idades (IBGE, 2017d). 
Observe que a ideia não é minimizar a existência 
das leis, uma vez que muitas crianças e jovens 
hoje estão na escola – ou protegidos da violência 
–, por exemplo, devido ao amparo legal. Contudo, 
deve-se atentar para o fato de que as leis não são 
para todos, sendo o Brasil um país notoriamente 
soterrado pelas desigualdades (IBGE, 2017e). 
Desta forma, sempre é necessário analisar 
criticamente os aspectosdas leis para não 
cairmos no senso comum e na ingenuidade, 
acreditando que, por haver leis, estamos todos 
protegidos. 
3.3 Metodologia de pesquisa 
Melhorar a práxis educativa significa, além da 
busca pela garantia de uma educação infantil de 
qualidade do ponto de vista do conhecimento, 
também procurar compreender as crianças das 
mais diversas formas. 
A pesquisa com crianças é uma maneira eficaz de 
entender o processo educativo e esses educandos 
per se, permitindo também ao professor melhorar 
seu desempenho profissional. 
Desta forma, ser professor-pesquisador é 
exigência primeira na busca por melhorar a 
práxis e, consequentemente, a educação das 
crianças, assim como compreender os 
pressupostos da pesquisa qualitativa, para que 
se garanta a melhor forma de pesquisar as 
crianças e dar voz a elas. 
3.3.1 Professor-pesquisador 
É de conhecimento geral que o pesquisador é 
aquele que produz conhecimento, enquanto que 
ao professor cabe o ofício de ensinar. No dia a dia 
da escola, porém, essas duas características 
podem se relacionar, fazendo com que o professor 
seja também um pesquisador que busque refletir 
sobre sua prática, bem como sobre os contextos 
que envolvem os processos de ensinar e 
aprender. A esse respeito, veja o que diz Paulo 
Freire, um dos maiores pensadores e 
pesquisadores da educação no Brasil: 
Não há ensino sem pesquisa e pesquisa 
sem ensino. Esses que-fazeres se 
encontram um no corpo do outro. Enquanto 
ensino, continuo buscando, reprocurando. 
Ensino porque busco, porque indaguei, 
porque indago e me indago. Pesquiso para 
constatar, constatando, intervenho, 
intervindo, educo e me educo. Pesquiso 
para conhecer e o que ainda não conheço e 
comunicar ou anunciar a novidade 
(FREIRE, 1996, p. 16). 
Na perspectiva deste autor, o dia a dia da escola 
pode ser objeto de estudo e reflexão a partir de 
práticas, e dos sujeitos envolvidos em diferentes 
contextos, baseadas em pesquisa. Nesse intuito, 
podem ser realizadas sobre o cotidiano 
vivenciado, as práticas pedagógicas, o papel dos 
sujeitos envolvidos, entre outros tantos temas 
(FREIRE, 1996). 
Ouvir e observar as crianças em suas 
minudências também pode ser um pretexto para 
refletir sobre seus movimentos e aprendizagens, 
dentro e fora da escola, bem como levar em 
consideração o protagonismo das crianças na 
produção de seus conhecimentos e culturas 
infantis. 
Nesse sentido, observe o caso a seguir. 
Escola pública, horário de intervalo. A 
professora está caminhando por entre as 
crianças enquanto essas lancham, conversam, 
ou simplesmente esperam o sinal de fim de 
intervalo tocar. Nesse ambiente, a professora 
ouve vários sons. Dentre os diversos ruídos, 
destaca-se um choro baixo, com um soluçar 
tímido. Ao se aproximar, a professora se 
depara com três meninas em roda: uma 
chorosa, enquanto as outras duas –com olhar 
de tristeza –, escutam os lamentos da amiga. 
Perplexa, a professora ouve a menina contar 
sobre as diversas vezes que apanhou do pai, 
sobre a violência quase diária em sua casa e 
como ela e a mãe sofrem com o alcoolismo do 
seu pai. 
Sem saber muito bem o que fazer naquele 
instante, além de acolher a menina, a 
professora decide não intervir, mas leva 
consigo o que escutou. Mais tarde, em sua 
casa, reflete sobre o relato daquela criança e 
decide que, no dia seguinte, conversará com os 
professores sobre possibilidades e atitudes que 
a escola deve tomar ante os casos de violência 
doméstica. Com essa conversa, verá de que 
maneira cada um pode ajudar na busca de agir 
de forma adequada tanto com aquela menina 
quanto com outras tantas crianças que sofrem 
abuso. 
 
Ouvir, observar e sentir as crianças na escola, 
bem como suas atitudes e expressão de vivências 
fora do contexto escolar, além de ser um 
compromisso que o professor tem com as 
crianças, podem se apresentar como evidências 
que se tornem objeto de questionamento e 
pesquisa. 
Um dos propósitos do professor que pesquisa 
pode ser melhorar o seu desempenho nos 
processos de ensinar e aprender, além de 
também conhecer seus alunos e refletir sobre 
suas vivências e conhecimento. 
Para tanto, o professor deve ter concepções de 
criança e infância que levem em conta diferentes 
contextos, e escolher um método de pesquisa que 
seja adequado àquilo que pretende. 
3.3.2 Pesquisa qualitativa 
Os métodos de pesquisa mais conhecidos nas 
ciências humanas são as metodologias chamadas 
de pesquisas qualitativas, pelas quais se realiza a 
coleta de dados a partir da observação e escuta 
dos sujeitos. “A abordagem qualitativa parte do 
princípio de que a realidade só existe a partir do 
ponto de vista da pessoa. Ou seja, o que é real é 
a interpretação que se faz de um fenômeno, não o 
fenômeno em si.” (MALHEIROS, 2011, p. 188). 
Assim, os dados coletados são analisados a partir 
de pressupostos teóricos, e não apenas 
apresentados como mero resultado. 
Dessa forma, interagir, escutar e observar 
atentamente os indivíduos é a melhor maneira de 
garantir precisão na coleta de dados da pesquisa. 
De acordo com Bogdan e Biklen (1991, p. 11-12), 
as características de uma investigação qualitativa 
seriam: 
[...] (I) ter o ambiente natural como sua fonte 
direta de dados e o pesquisador como seu 
principal instrumento; (II) coletar dados 
predominantemente descritivos; (III) ter 
maior atenção ao processo que com o 
produto; (IV) o processo de análise tende a 
ser indutivo, sendo que ‘os pesquisadores 
não se preocupam em buscar evidências 
que comprovem hipóteses definidas antes 
do início dos estudos. 
Dessa maneira, se comprovam os pressupostos 
da pesquisa de cunho qualitativo, a escuta e 
observação atenta do sujeito, bem como formas 
de registro que evidenciem um compromisso com 
a fidelidade dos dados, garantindo ética e 
coerência nas evidências. 
Assim, é de extrema importância dar a devida 
atenção ao caderno de campo ou a outra forma 
de registro utilizada, sendo estes instrumentos 
indispensáveis para a pesquisa. 
Os dados coletados são 
predominantemente descritivos. O material 
obtido nessas pesquisas é rico em 
descrições de pessoas, situações, 
acontecimentos; inclui transcrições de 
entrevistas e de depoimentos, fotografias, 
desenhos e extratos de vários tipos de 
documentos. (LUDKE; ANDRÉ, 1986, p. 12-
13). 
Diante disso, o pesquisador deve ter uma 
amplitude de material retirado do campo para 
haver várias possibilidades de análise, seja na 
forma de diários de campo, entrevistas, registro 
fotográfico, filmagens, no intuito de garantir uma 
quantidade de dados que o permita, de forma 
segura, entender a realidade e os indivíduos 
estudados. 
Graue e Walsh (2003) tratam da importância de 
se observar atentamente as pequenas coisas 
diárias, quando falam sobre pesquisar as 
crianças em contexto, propondo que: 
[…] os investigadores pensem nas crianças 
como vivendo em contextos específicos, com 
experiências específicas e em situações da 
vida real. Sugerimos que os investigadores 
gastem menos tempo a tentar desenvolver 
grandes teorias e mais tempo a aprender a 
retratar toda a riqueza das crianças nos 
inúmeros contextos em que elas se movem. 
(GRAUE; WALSH, 2003, p. 22). 
Os autores chamam a atenção para o fato de que 
há maior relevância de pesquisa na observação 
das crianças a partir delas mesmas, permitindo a 
elas demonstrarem como vivem e como entendem 
sua realidade. 
Nesse sentido, as crianças não devem ser 
classificadas a partir de teorias, as quais devem 
servir como referência para o trabalho e forma de 
contextualização. Ou seja, a partir dos dados 
coletados, as teorias são meios para refletir sobre 
– e com – esses dados, priorizando a narrativa da 
criança em seu contexto. 
Observe a figura a seguir, que ilustra o 
dinamismo no processo de pesquisa. 
A análise de dados perpassa as observações, queperpassa as anotações, no processo dinâmico que 
busca entender a realidade do sujeito pesquisado. 
O pesquisador que busca compreender a criança 
em suas interações deve caracterizar a escolha do 
campo, contextualizar as teorias a partir da 
subjetividade dos sujeitos pesquisados e recolher 
uma grande quantidade de dados. Dessa forma, 
assegura-se a escuta dos indivíduos 
participantes, compreendendo a realidade a 
partir dela mesma e dos envolvidos, assim como 
entender o contexto situacional desses sujeitos, 
na tentativa de propor coisas novas e na garantia 
de uma pesquisa que privilegie o processo de 
construção do saber e a melhora na práxis do 
professor. 
3.4 Pesquisa com as infâncias e a educação 
São várias as maneiras de fazer pesquisa com as 
crianças na escola ou fora dela, assim como são 
muitos os parâmetros de escolha no fazer 
empírico, sendo que o professor-pesquisador deve 
ter conhecimento da metodologia de pesquisa que 
será mais adequada, dependendo de seus 
objetivos e de seu público. 
Cada metodologia empregada carrega consigo 
uma perspectiva daquilo que se quer investigar, 
sendo que o mais importante é que o pesquisador 
tenha uma sólida pergunta de pesquisa, bem 
como um objetivo claro do caminho que quer 
perseguir e daquilo que busca compreender. 
As formas de fazer pesquisa descritas neste 
tópico são algumas das mais usadas na área de 
ciências humanas – dentre tantas outras ainda 
existentes –, portanto, cabe ao pesquisador 
escolher a que lhe pareça mais oportuna e que 
melhor responda às suas indagações. 
 
 
 
3.4.1 As diversas formas de pesquisa – 
pressupostos teórico-metodológicos 
Quando tratamos de pesquisa qualitativa, 
contamos com diversos pressupostos teóricos e 
metodológicos que a caracterizam. Dessa forma, 
antes de começar uma pesquisa, devem-se levar 
em conta as intenções e quais os sujeitos da 
referida pesquisa. A partir destes, é definido o 
problema de pesquisa, bem como a metodologia 
adequada. 
A pesquisa envolve várias etapas. 
Primeiramente, o pesquisador deve levantar seu 
problema de pesquisa, ou seja, especificar o 
assunto que ele deseja abordar. Posteriormente, 
faz-se a pergunta da pesquisa, o que consiste na 
indagação que o pesquisador precisa responder 
para abordar o problema. A partir disso, 
levantam-se hipóteses baseadas nas perguntas e 
indagações do pesquisador na tentativa de traçar 
caminhos para responder a pergunta principal. 
Ao iniciar a pesquisa, após o processo de 
levantamento de hipóteses, deve-se fazer uma 
investigação teórica sobre o tema e, dependendo 
dos procedimentos metodológicos da pesquisa, ir 
a campo fazer o experimento, o que significa, em 
ciências humanas, observar os indivíduos em seu 
contexto levantando dados que, após analisados, 
serão o resultado de sua pesquisa e estes 
resultados levarão a uma conclusão que deve 
responder à sua pergunta inicial. 
Esse levantamento de dados deve ser feito de 
acordo com uma metodologia específica, baseada, 
principalmente, naquilo que se quer saber sobre 
os sujeitos investigados. Neste momento, o 
pesquisador deve escolher qual metodologia 
melhor se emprega à sua pergunta. 
As principais metodologias de pesquisa 
qualitativa feitas na escola são a pesquisa 
etnográfica, a pesquisa-ação e o estudo de caso, 
conhecidas por suas abordagens que priorizam o 
estudo da realidade a partir do entendimento do 
indivíduo estudado. 
A etnografia, segundo Fetterman (1989, p. 11) 
seria “[...] a arte e a ciência de descrever uma 
cultura ou grupo [...]”, não como simples 
descrição dos fatos, mas compreendendo os 
significados que os sujeitos participantes 
atribuem aos eventos. Dessa forma, em uma 
pesquisa com abordagem etnográfica, o 
pressuposto é dar voz às crianças e observá-las a 
partir daquilo que elas fazem e vivenciam 
diariamente. Essa etnografia pode ser do tipo 
participante; a diferença é que nesta o 
pesquisador não age apenas como aquele que 
observa, escuta e anota, mas interage com os 
indivíduos pesquisados. 
O termo participante remete à controvertida 
presença de um pesquisador num campo de 
investigação formado pela vida cotidiana de 
indivíduos, grupos, comunidades ou 
instituições próximos ou distantes. Esta 
presença do pesquisador no campo 
encontra sua complementação no convite ou 
convocação do outro – indivíduo, grupo, 
comunidade ou instituição – para participar 
da investigação como informante, 
colaborador ou interlocutor (SCHMIDT, 
2008, p. 394). 
Outra abordagem muito utilizada em pesquisas 
com crianças é a pesquisa-ação, entendida como 
aquela em que se planejam intervenções no 
campo, ou seja, a partir das investigações feitas 
por meio de observações e interações entre os 
sujeitos, o pesquisador propõe intervenções a fim 
de resolver problemas e apresentar soluções para 
algo de necessidade do grupo ou do pesquisador. 
Mais especificamente, a pesquisa-ação pode ser 
entendida como: 
[...] um tipo de pesquisa social com base 
empírica que é concebida e realizada em 
estreita associação com uma ação ou com a 
resolução de um problema coletivo e no qual 
os pesquisadores e os participantes 
representativos da situação ou do problema 
estão envolvidos de modo cooperativo ou 
participativo (THIOLLENT, 2000, p. 14). 
Dessa forma, para que haja uma pesquisa-ação é 
necessário que aconteça uma pesquisa atenta no 
local ou situação escolhidos, através de 
discussões com os indivíduos participantes para 
que, juntos, se estabeleçam os possíveis 
problemas e suas soluções e, finalmente, as 
ações dos envolvidos visando à melhora ou 
solução do problema. 
Porém, se a pesquisa é feita com crianças muito 
pequenas que ainda não falam, deve-se entender 
que os professores são os sujeitos responsáveis 
pelas discussões que virão a acontecer na escola, 
sendo que neste caso, cabe um cuidado maior 
com as observações iniciais e um olhar atento às 
crianças, pois se deve compreendê-las em seus 
contextos, seja a partir de filmagens ou fotos, 
seja por meio de anotações no caderno de campo, 
garantindo-se que, posteriormente, se 
considerem essas informações ao fazer a análise 
dos dados. 
O estudo de caso é outra metodologia de 
abordagem qualitativa que pode ser utilizada na 
pesquisa com crianças ou para coleta de dados 
na escola. Como o próprio nome já diz, ela se 
caracteriza pelo estudo de um caso específico, 
seja de um indivíduo, seja de múltiplos 
indivíduos ou instituições (VENTURA, 2007). O 
importante é que se tenha em mente uma 
pergunta a ser respondida a partir de uma 
especificidade. Dessa maneira, o estudo de caso 
“visa à investigação de um caso específico, bem 
delimitado, contextualizado em tempo e lugar 
para que se possa realizar uma busca 
circunstanciada de informações.” (VENTURA, 
2007, p. 384). 
Estas são algumas das possibilidades de 
pesquisas de cunho qualitativo, ou seja, que 
visam um estudo mais abrangente da realidade a 
partir da interpretação dos indivíduos que nela 
vivem. É muito importante que o professor e/ou 
pesquisador fundamente suas investigações em 
uma metodologia que o ajude a levantar dados 
concretos e objetivos da realidade, bem como dos 
sujeitos investigados, para que se garanta 
veracidade e exatidão no estudo realizado, 
inclusive, se for o caso, com a possibilidade de 
que existam mudanças significativas a partir da 
pesquisa. 
Síntese 
 
Concluímos o estudo relativo aos direitos das crianças 
na sociedade. A partir do entendimento das principais 
leis que regem os direitos das crianças no Brasil, você 
já sabe que é também compromisso da escola fazer 
valer esses direitos no dia a dia das crianças. Além 
disso, com base no que estudou sobre as questões 
teórico-metodológicas de pesquisa utilizadas para a 
compreensão da criança e da infância, está apto a 
considerar a pesquisa com as infâncias e a educação 
como um pressupostoque deve fazer parte do fazer 
pedagógico dos professores. 
Neste capítulo, você teve a oportunidade de: 
 
• entender que a escola tem um papel 
importante na busca pela compreensão das 
infâncias no país; 
• conhecer as principais leis brasileiras de 
proteção às crianças e aos adolescentes; 
• identificar a responsabilidade do professor em 
analisar criticamente a abrangência das leis 
que prometem proteção e assistência às 
crianças; 
• entender o que são pesquisas qualitativas e 
sua relevância para a práxis do professor; 
• conhecer os principais tipos de pesquisa 
utilizados na área de ciências humanas para 
entender a infância.

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