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Claudio de Musacchio Ensaios Interdisciplinaridades e Pesquisas Científicas em Sala de Aula Ensino para além da Escola A educação que se quer para o século XXI Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) ISBN: 978-85-7592-229-3 Editora Alcance - Rua Bororó, 5 - CEP 91.900-540 - Vila Assunção Porto Alegre/RS - Fone/Fax: (51) 3307 0221 / 3307 0233 www.editoraalcance.com.br - atendimentoalcance@gmail.com Contatos MSN: editoraalcance@hotmail.com - Skype: editora.alcance M985e Musacchio, Claudio de. Ensaios : interdisciplinaridades e pesquisas científi cas em sala de aula / Clau- dio de Musacchio ; [ilutrado por] Rubens Renato Abreu. – Porto Alegre : Alcance, 2012. 254p. ; 16 x 23 cm 1. Educação. 2. Ensino. 3. Interdisciplinaridade. 4. Pesquisa científi ca. I. Título. CDU: 37.01 CDD: 370.1 © by Cláudio de Musacchio Direitos autorais reservados Revisão: do autor Editoração eletrônica e capa: Rafael Porto e Priscila Garcia Arquivo digitado e corrigido pelo autor, com revisão fi nal do mesmo, autorizando a impressão da obra Editor: Rossyr Berny Contato com o autor: musacchio@portaleadbrasil.com.br Para conhecer mais autores da Alcance acesse: www.youtube.com e procure por Editora Alcance Bibliotecária: Simone da Rocha Bittencourt – 10/1171 A interdisciplinaridade consiste em trabalho de equipe, colaborativo, e este, parece ser o grande desafio de nossos tempos. Não aprendemos a trabalhar de forma integrada, privilegiando o pen- samento coletivo. Temos que evoluir no método. As disciplinas que estão fragmenta- das num modelo hiper-especialista de estudar os fenômenos naturais; o do- cente também é fragmentado em seus “cercadinhos” epistemológicos. Temos que evoluir na capacitação e habilidade das praxiologias docentes para posturas interdisciplinares e transdisciplinares. Cláudio de Musacchio Ensaios Interdisciplinaridades e Pesquisas Científicas em Sala de Aula Ensino para além da Escola A educação que se quer para o século XXI Apresentação Os Ensaios consistem de uma coletânea de artigos escritos para sensibilizar gestores de escolas e professores de todas as áreas de conhecimento para as questões da Interdisciplinaridade como metodologia a ser adotada na escola e os construtos epistemológicos que evidenciem uma postura voltada a comprovação científica dos fenômenos estudados e observados. Apesar de surgir na década de 60, incentivada pela nova ordem que se estabelecia, aproximando o conhecimento com as necessidades do trabalho, e da primazia pela especialização, patrocinada pelos avanços tecnológicos e industriais, a interdisciplinaridade, timidamente, foi pouco a pouco, sendo inserida em contextos universitários, ligando os conhecimentos específicos de graduação. No ensino superior, a interdisciplinaridade promoveu, em alguns casos, o nascimento de novas ciências, de tal ordem e força que as análises dos contornos das disciplinadas em discussão não conseguiram retornar aos seus pontos epistemológicos e pedagógicos de origem, originando em novas disciplinas. Isto ocorreu com as disciplinas de biologia e química, surgindo à bioquímica, biologia e mecânica, surgindo à biomecânica, só para citar algumas. Não significa que a interdisciplinaridade promova necessariamente saberes plurais, a ponto de gerar novas subdivisões curriculares. As concepções construídas dos saberes específicos podem gerar discussões nos contornos das ciências, gerando perguntas e respostas que não podem ser respondidas pelas ciências em separado, originando assim, o nascimento de novas epistemologias e pedagogias. Quando isso ocorre, uma nova disciplina surge no cenário dos saberes. Mas isso nem sempre ocorre, na maioria das vezes, a interdisciplinaridade ora aborda uma ciência, ora aborda outra ciência, e as discussões recebem contribuições de ambos os lados científicos, de muito enriquecimento e construção para todos os participantes. Entretanto, na contramão do conhecimento disciplinar, especializado, fragmentado, direcionado a uma restrita direção, a interdisciplinaridade nos propõe a retomada do conhecimento, observando o cenário das disciplinas através dos contornos que as dividem, unindo-as na discussão e na reflexão e reconsiderando o viés epistemológico e pedagógico dos saberes distintos. O epistemológico enquanto atividade de investigação de uma disciplina, e o pedagógico enquanto atividade de ensino de uma área da ciência. 7Cláudio de Musacchio Sendo assim, a ação interdisciplinar que se busca não é simplesmente a contribuição especializada de cada área de conhecimento, mas a compreensão de uma proposta que busca superar o olhar multi e pluridisciplinar, sugerindo o estabelecimento de múltiplas compreensões dos fenômenos observados, através do que é inter e transdisciplinar, conseguindo-se realizar uma análise multidimensional dos objetos estudados, estabelecendo-se os fundamentos de totalidade do conhecimento. A visão além do alcance disciplinar das ciências. Os ensaios desta obra possuem este propósito e este viés, que é o de levar aos professores do ensino básico, fundamental e médio, a possibilidade de se instalar a interdisciplinaridade através da criação de oficinas extraclasses, onde as crianças dos três ensinos possam exercitar momentos interdisciplinares, desenvolver pesquisas científicas em sala de aula, e envolver-se coordenadamente no sentido de trabalharem em equipe com as várias disciplinas. Divididas em núcleos, os ensaios sugerem alguns temas para serem trabalhados, ao mesmo tempo em que oportuniza ações que podem ser desenvolvidas à luz da ciência científica, baseada nos experimentos, utilizando- se de objetos do cotidiano para entender os fenômenos observáveis. Ao mesmo tempo em que discute as intenções da interdisciplinaridade, construindo seu entendimento e embasamento teórico-filosófico, também capacita e habilita os professores para a implantação de momentos interdisciplinares, privilegiando metodologias de embate e discussões, ao invés de exposições passivas dos conteúdos. Ao contrário do que muita gente imagina, a interdisciplinaridade é exercida quando dois ou mais professores, presentes em sala de aula, discutem temas comuns, sempre com a intervenção dos alunos para questionamentos ocasionais, ricas e imprescindíveis. Um professor, dominando várias ciências, não promove a interdisciplinaridade, mas contribui, fundamentalmente, para que ele entenda como interagir com outros professores presencialmente. O grande desafio, portanto, daqui para frente, é oportunizar os professores, uma aprendizagem que inclua a interdisciplinaridade, que se pratique a interdisciplinaridade em seus cursos de formação docente. E para os professores experientes, que já exercem a docência, e quiserem incluir esta metodologia em sua praxiologia, devem se inserir nessas discussões, promovendo em sala de aula a discussão de seus temas curriculares, envolvendo dois ou mais professores, e permitindo que os atores: professores e alunos, participem desse processo de construção de conhecimento, transformando o ambiente escolar num grande laboratório de saberes, que se ajudam mutuamente. 8 Ensaios - Interdisciplinaridades e Pesquisa Científica em Sala de Aula Aos gestores de escolas, o desafio da interdisciplinaridade, consiste em oportunizar ações como oficinas, eventos culturais, seminários, palestras, workshops, feiras, congressos e aulas especiais, efetuando pesquisas científicas e discutindo temas e fenômenos com a opinião de diferentes disciplinas. O papel dos gestores vai além das questões burocráticas, abrange também gestão de processos de planejamento e implementação do PPP (projeto político pedagógico) e das propostas curriculares. Também recaí sobre o gestor da escola a melhoria e inovação da qualidade escolar. Sendo o gestor um catalisador, deve prever as possíveis soluções, e incentivador de transformações, inspirando os professores que estimulem, orientem e criemnovos paradigmas e metodologias na relação ensino-aprendizagem. Compreender as ações propostas neste livro é nosso principal objetivo e as proposições aqui colocadas de maneira alguma encerram o assunto, pelo contrário, sugerem que estas ideias e sugestões sejam o início de um trabalho e metodologia que deve ser, dia após dia, investigada, aprimorada, consultada e publicada nos veículos específicos, para que mais professores conheçam suas implicações, dificuldades e sucessos das experiências vivenciadas na escola. Se numa perspectiva, a escola, através das suas oficinas, pode oportunizar e praticar a interdisciplinaridade, através de atividades práticas e científicas, numa abordagem mais profunda, já em sala de aula, e tendo os professores compreendidos à intencionalidade da ação interdisciplinar dos encontros, os temas podem aproximar as disciplinas, descobrindo novos vieses sobre as ciências. A multiplicidade de formações e capacitações que cada professor traz consigo, suas habilidades e qualidades, atitudes e aprendizagens técnico- científicas, didático-pedagógicas, propiciam uma diversidade de perspectivas em suas praxiologias docentes, que permitem momentos de muita ludicidade, aprendizagem e construção de conhecimento. Além dos aspectos positivos da união e do encontro dos saberes em sala de aula, a riqueza das experiências dos professores e suas histórias de vida e o interesse dos alunos por temáticas transversais, propiciam momento de incrível troca, colaboração e interação. O primeiro passo para um professor interdisciplinar é aceitar-se eterno aprendiz, entender que é parte de um projeto maior, parte de uma ciência integradora que luta para compreender-se em sua totalidade. Depois, promover a interdisciplinaridade criando projetos com outros professores para explicar os fenômenos estudados nas duas ou mais disciplinas envolvidas no projeto escolhido. Em seguida, experimentar a interação com os alunos, promovendo 9Cláudio de Musacchio o debate sobre o assunto escolhido, abordando ora uma disciplina, ora outra, e ainda, no contorno das duas disciplinas, onde os temas se misturam e se convergem. E, finalmente, ver com os próprios olhos, os resultados das interações, das colaborações, das perguntas realizadas pelos alunos e das respostas dos professores. As estratégias de ensino e aprendizagem que se experimentam em tais metodologias são transformadoras, revolucionárias, e desconcertam os atuais dogmas institucionalizados da educação, promovendo impactos profundos entre o pensamento e a ação, entre a teoria e a prática, é um novo paradigma, é uma nova capacitação e habilidade ao se produzir ciência, de refletir sobre os objetivos da educação que se deseja para o século XXI que se inicia e sobre a forma como as sociedades contemporâneas se organizarão para compreender essas mudanças. Espero que a leitura desses ensaios permita a reflexão sobre suas praxiologias e sua didática. Independente das amarras legislativas e institucionais das escolas, professores e alunos, devem superar as dificuldades e promover os a interdisciplinaridade e incentivar os projetos de pesquisas que levem a experiências cientificas em sala de aula. 10 Ensaios - Interdisciplinaridades e Pesquisa Científica em Sala de Aula Primeiro eu quero agradecer a todas as pessoas que de uma maneira ou de outra contribuíram para permitir a impressão desta obra. É sempre uma caminhada apaixonante até chegar a sua publicação. E outra caminhada, é o da divulgação, dos contatos, da participação dos congressos e feiras para levar esta ideia a todo lugar. Quero agradecer imensamente a todos os profissionais que trabalharam na orientação e na produção deste livro. Aos colaboradores e professores que nos auxiliam, nos incentivam, e nos colocam o tempo todo em contato com o nosso senso crítico para que possamos adornar com beleza plástica, os ensinamentos para uma vida repleta de novas aventuras aonde as letras e as palavras como notas musicais, vão pouco a pouco entoando a música do saber. Quero agradecer imensamente ao Professor e amigo Zaro que além de meu orientador no doutorado, é um grande amigo e parceiro nesta caminhada. Ao professor e amigo Fernando Schnaid, que juntamente com o professor Zaro, oportunizaram o projeto de pesquisa intitulado Paidéia, que busca incentivar o ensino experimental nos ensino básico, fundamental e médio. Quero agradecer especialmente a minha esposa Maria de Los Angeles, a quem muitas vezes, negligenciei uma atenção maior e cuidados, aos meus sogros Carmem e Victório, que torcem pelo meu sucesso, aos amigos que conhecem meu trabalho e vêem minha preocupação diária com a qualidade do nosso ensino e da nossa aprendizagem. E finalmente, agradecer a vida que levei até aqui, todas as conexões, contribuições, colaborações, cooperações, interações, sabores, dissabores, encontros e desencontros, aprendendo com as pessoas que elevam a nossa estima e reconhecendo àquelas que precisamos evitar, e muitos momentos de recomeço da vida atribulada, mas sempre na constante dose diária de aprendizagem que não se cansa de me surpreender e me fazer feliz. Agradecimentos 11Cláudio de Musacchio Prefácio A proposta dessa obra se constitui em conhecer algumas questões relacionadas às práticas pedagógicas interdisciplinares, e como essas práticas se estabelecem numa dimensão institucional privilegiada essencialmente pelo regime curricular e disciplinar. Também procura discutir em que contexto didático elas podem acontecer, como elas se configuram na praxiologia docente, como é possível ouvir duas ou mais disciplinas em sala de aula auxiliando o processo de ensino-aprendizagem, e os primeiros passos que podem ser dados, sem se constituir em profundas mudanças institucionais ou econômico- financeiras, embora estas abordagens devam ser consideradas num segundo momento. A introdução de oficinas como forma de se atingir os objetivos propostos foi à maneira encontrada para mostrar aos alunos e professores como atuar em ambientes interdisciplinares, mesmo levando-se em consideração que as oficinas são, por natureza, interdisciplinares. Os ensaios foram criados para sensibilizar professores e alunos do Projeto Paidéia. Este projeto é uma iniciativa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul em parceria com o Colégio Israelita Brasileiro, que servirá de laboratório de neuroeducação, para experimentações nas pesquisas que se pretende desenvolver e a implantação de metodologias e ações interdisciplinares. Aproveitaram-se as oficinas já existentes no Colégio para introduzir os conceitos e metodologias abordadas acima. As oficinas foram agrupadas por núcleos distintos: núcleo de ciência e tecnologia, núcleo educacional de empreendedores, núcleo de cultura e erudição, núcleo de produção musical. Das oficinas existentes escolhemos doze, cujos temas pudessem ser mais bem trabalhados os conceitos interdisciplinares e as questões de experimentação científica em sala de aula. Em cada uma das oficinas, escolhemos dois momentos interdisciplinares, envolvendo dois ou mais professores: uma atividade no início da oficina e outra no final das aulas. Alunos e professores deverão construir um projeto de pesquisa envolvendo a interdisciplinaridade e a experimentação científica em sala de aula. No final todos darão seus depoimentos sobre a metodologia aplicada, resultados dos experimentos apurados e a construção de um artigo científico a ser publicado em periódicos respectivos aos assuntos construídos. 13Cláudio de Musacchio Neste livro foi descrito um ensaio para cada oficina, dissertando sobre o tema proposto em cada uma delas, as epistemologias e pedagogias próprias, os conceitos devidamente esclarecidos, a questão da aplicação da interdisciplinaridade relativa ao tema estudado e a metodologia referente à experiência científica em sala de aula. A análise dos resultados será publicada no segundo semestre de 2012, juntamente comos pareceres dos alunos, professores, gestão e pais. Queremos que toda a escola participe do projeto Paidéia que buscará na essência discutir metodologias e práticas pedagógicas que contemplem um ensino para além da escola e uma educação para toda a vida. Estes resultados serão publicados no segundo volume de ensaios, com os respectivos resultados das pesquisas científicas realizados em sala de aula, os aspectos da interdisciplinaridade e a análise do projeto geral. O importante ressaltar no final do projeto é como os professores se sentiram diante das experiências de interdisciplinaridade?, como foram as trocas docentes diante dos alunos?, como os alunos se sentiram recebendo enfoques e epistemologias diferentes sobre os temas estudados?, e as experiências científicas em sala de aula, trouxeram mais luz aos entendimentos? Estas e outras questões terão respostas no final das oficinas e dos projetos de pesquisa escolhidos. Também serão publicados os dados sobre as oficinas escolhidas para o segundo semestre, bem como os projetos de pesquisas para cada uma delas, gerando artigos no formato ensaios. Todos os artigos científicos gerados das pesquisas científicas em sala de aula e dos momentos interdisciplinares serão publicados no periódico intitulado Revista Paidéia, pela Editora Alcance, de publicação semestral, prevista para agosto e janeiro. Os trabalhos também serão publicados em feiras e congressos nacionais e internacionais mostrando aos demais grupos de estudos destas metodologias à experiência vivenciada. 14 Ensaios - Interdisciplinaridades e Pesquisa Científica em Sala de Aula Sumário Apresentação .........................................................................................7 Agradecimentos ..................................................................................11 Prefácio ...............................................................................................13 Ensaios ................................................................................................17 Interdisciplinaridade: Discurso ou Praxiologia Docente ................... 23 A Interdisciplinaridade na Contemporaneidade: novos paradigmas para a praxiologia docente ................................... 39 Interdisciplinaridade: avanços e desafios ............................................57 NÚCLEO CIÊNCIA & TECNOLOGIA .............................................73 Educando com a Astronomia ..............................................................73 O uso da fotografia nos projetos pedagógicos da escola .....................87 Noções de eletrônica Básica na escola ................................................99 NÚCLEO EDUCACIONAL DE EMPREENDEDORES ................111 Educação Empreendedora nas Escolas .............................................112 Noções de educação ambiental e alimentar ......................................127 Projetos de Educação Ambiental ......................................................147 NÚCLEO CULTURA E ERUDIÇÃO ..............................................163 Mídias na Educação: histórias em quadrinhos ..................................164 Mídias na Educação: contador de histórias .......................................179 Mídias na Educação: ênfase em áudios e vídeos ..............................191 Produzindo brinquedos pedagógicos ................................................215 NÚCLEO PRODUÇÃO MUSICAL ................................................235 Educação e Produção Musical ..........................................................236 15Cláudio de Musacchio Ensaios A série Ensaios sobre a Interdisciplinaridade e pesquisa científica em sala de aula é o primeiro movimento nesta intrincada multiplicidade de aspectos e abordagens educacionais que se almeja para o século XXI. O atual regime educacional regido pela égide do sistema disciplinar, contempla um espectro de pouca ou quase nenhuma interação entre as diferentes áreas do saber. E para tentar diminuir ou trabalhar com as distâncias existentes é que se busca nestas duas metodologias a busca por uma educação escolar mais hegemonicamente linear, tentando compreender as dicotomias promovidas pela separação e especialização do conhecimento ao longo da História. Nesta primeira abordagem em ambiente escolar, fruto da parceria entre a Universidade Federal do Rio Grande do Sul e o Colégio Israelita Brasileiro, ambos de Porto Alegre - RS, e através do Programa de doutoramento Informática na Educação, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, na linha de pesquisa intitulada Paradigmas para a Pesquisa no Ensino Científico e Tecnológico, com a coordenação dos professores Drs. Milton Antonio Zaro e Fernando Schnaid e do doutorando Cláudio de Musacchio, pretende-se transcrever na forma de ensaios, os diferentes aspectos das possibilidades de implantação da interdisciplinaridade e do uso de pesquisas científicas em sala de aula como metodologia, para se atingir um ensino-aprendizagem que faça maior sentido, tanto para a praxiologia docente, quanto para o aluno. A escolha das experimentações científicas ficaram a cargo dos próprios professores e coordenadores das oficinas escolhidas. A experimentação científica compreende o próprio evento da experimentação e professores convidados de outras áreas de conhecimento para fazerem o embate em sala de aula com os alunos na demonstração efetiva da interdsiciplinaridade. Não se trata, portanto, de demonstrar o que cada disciplina pode contribuir com os projetos de pesquisas escolhidos, mas de colocar os professores numa situação de confrontação colaborativa das distintas 17Cláudio de Musacchio ciências e epistemologias, demonstrando que é possível e necessária a troca, osdiferentes enfoques, e, principalmente, as contribuições vindas das áreas de contorno entre as ciências. E o mais importante de toda a implantação de novas metodologias e paradigmas na escola é a participação ativa da gestão institucional da escola, dos seus diretores, das mantenedoras, sem a qual, qualquer vontade de mudança, fica reduzida ao nível da discussão e reflexão. Também é importante salientar que as Novas Diretrizes e Bases da Educação permite tais implementações e cita nos Parâmetros Curriculares Nacionais, em diferentes temas transversais, o uso intensificado da interdisciplinaridade como meta para corrigir as distorções oriundas da educação e do ensino fragmentado. Nesta primeira abordagem, as aplicações da interdisciplinaridade e das pesquisas científicas serão realizadas numa série de oficinas já existentes na escola e posteriormente aplicações nas salas de aula do currículo normal. Para o procedimento inicial foram escolhidas doze oficinas espalhadas por quatro núcleos distintos: núcleo de ciência e & tecnologia, núcleo educacional de empreendedores, núcleo de cultura e erudição e núcleo de produção musical. O Colégio possui hoje mais de 60 oficinas funcionando regularmente. Para o segundo semestre serão escolhidas outras doze oficinas para serem trabalhadas e assim por diante. Dentro das oficinas escolhidas, algumas atividades foram transformadas em pesquisas científicas a serem realizadas durante o transcurso do primeiro semestre de 2012. Cada experiência científica terá um projeto de pesquisa, texto técnico e produção através de um artigo científico que será publicado num periódico e posteriormente em revistas científicas especializadas, conforme as áreas de conhecimento. Para cada oficina foi criado um artigo do tipo ensaio, para promover as primeiras discussões a respeito da metodologia de interdisciplinaridade a ser inserida na oficina e questões sobre a experimentação científica em sala de aula. Os ensaios escolhidos por núcleo de oficinas são: 18 Ensaios - Interdisciplinaridades e Pesquisa Científica em Sala de Aula Núcleo de Ciência e Tecnologia Astronomia I e II 6ª, 7ª e 8ª série Ensaio de Astronomia Fotografia 8ª série e 1ª série Ensaio de Fotografia EletrônicaBásica 8ª série e 1ª série Ensaio de Eletrônica Básica Núcleo Educacional de Empreendedores Empreendedorismo 2ª ano Ensaio Aprendendo a Empreender Produção de Horta 1ª ano Ensaio Educação Ambiental e Alimentar Patrulha Ecológica - Ensaio Projetos de educação ambiental Núcleo de Cultura e Erudição Histórias em Quadrinhos 8ª e 1ª séries Ensaio Mídias Alternativas Contadores de Histórias 7ª série Ensaio Contadores de Estórias Áudios e Vídeos 6ª série Ensaio Mídias na Educação Brinquedos Pedagógicos 1ª e 2ª séries Ensaio Produção de Brinquedos Núcleo de Produção Musical Educação e Produção Musical Todas as séries Ensaio - Educação e Produção Musical 19Cláudio de Musacchio A questão da aplicação da interdisciplinaridade como metodologia na escola ainda, passa nos dias de hoje, por uma nuvem de mistério quanto as suas reais possibilidades e resultados efetivos. Dependendo mais da postura dos professores e da gestão da escola em implantar novas metodologias que contemplem soluções que possam melhorar a formação dos indivíduos para a vida, para o mercado de trabalho e para a cidadania. Alguns centros de estudos já estão utilizando a interdisciplinaridade em seu fazer diário. Os eventos científicos e as produções científicas em sala de aula têm parcialmente enveredado para atividades que contemplem ações interdisciplinares que apesar de não estarem no ementário dos currículos, já experimentam o embate entre diferentes áreas do conhecimento na busca de respostas às suas indagações aos projetos de pesquisas. As oficinas se configuram num ambiente bastante propício para a prática da interdisciplinaridade por serem consideradas atividades livres. E podem introduzir os professores nesta modalidade dando-lhes a experiência necessária para levar este conhecimento e experiência para sala de aula. Os alunos se inscrevem expontaneamente e participam ativamente de todos os desafios e atividades propostase, que agora, podem aprender também as metodologias interdisciplinares com dois ou mais professores e projetos de pesquisas envolvendo experiências científicas. Nesta configuração, o Projeto Paidéia pretende implantar na escola o uso efetivo da interdisciplinaridade como metodologia para integrar as disciplinas, os professores e os currículos, tornando a produção de conhecimentos menos complexa, a aprendizagem mais significativa e o ensino menos fragmentado. Para isso, será implantado nas oficinas o forte conceito da interdisciplinaridade e da metodologia alternativa de experimentação científica, envolvendo mais de uma disciplina para demonstrar os conceitos, os conteúdos, promover discussões, visões diferentes, e discursos que se locupletem. Aos alunos será dado papel importante nesta movimentação, já que eles são os protagonistas do projeto de pesquisa. São eles que irão participar de todas as etapas e atividades para compreender não só os conteúdos abordados do tema da oficina, mas também da metodologia empregada, mostrando que o modelo interdisciplinar de educação busca a inter-relação com todas as áreas do saber, fortalece a interação necessária entre objetos e sujeitos promovendo maior ação e construção do conhecimento. Concomitante ao movimento do Projeto Paidéia se pretende também avaliar o papel do docente nesta transformação educacional onde os conceitos 20 Ensaios - Interdisciplinaridades e Pesquisa Científica em Sala de Aula epistemológicos e pedagógicos estarão sendo direcionados para a conexão necessária que deve existir entre as ciências, possibilitando que todos os atores envolvidos entendam as transformações que se estabelecem nos novos paradigmas para um ensino muito além da escola e uma educação para toda a vida. Ferramenta EAD auxiliando o Projeto Paidéia O Projeto Paidéia contará com o apoio didático-pedagógico de uma ferramenta EAD fornecida pelo PORTAL EAD BRASIL. Os professores receberão uma página na Internet onde poderão administrar e controlar as participações nas oficinas. A ferramenta possui os seguintes recursos: 1. Conteúdo programático (contendo textos e figuras) 2. Arquivos adicionais (Word, Excel, PowerPoint, PDF, e outros) 3. Mídias de Áudios e Vídeos 4. Fóruns de Debates 5. Glossário de Termos Técnicos (criados pelos próprios alunos) 6. Chats (momentos síncronos) 7. Mensagens entre Alunos 8. Exemplos auxiliando os Textos 9. Exercícios (banco de questões) 10. Testes (banco de questões) A ferramenta possui gestão para controle e administração do aprendizado e do registro de todas as atividades propostas. A ferramenta será utilizada para que os alunos possam gerar as informações necessárias ao projeto na modalidade à distância, bastando para isso acessar a Internet pelo computador. A interatividade e colaboração existente na ferramenta EAD será amplamente utilizada através de atividades nos chats e mensagens entre alunos, e nas construções coletivas dos recursos de fóruns e do glossário, construídos pelos próprios alunos. A ferramenta poderá ser utilizada em sala de aula como livro-texto, banco de exercícios e testes, link para pesquisa e trabalhos extraclasse, atividades para discussão entre os alunos. As experiências científicas realizadas em sala de aula serão disponibilizadas para as demais escolas que comporão o Projeto Paidéia. As transmissões poderão ser ao vivo, ou on demand, e a listagem das experiências gravadas ficarão a disposição dos alunos e professores no site do PORTAL EAD BRASIL. 21Cláudio de Musacchio Professores e alunos terão acesso à página através de senhas de identifi cação. Todos os formulários do projeto estarão disponíveis na página e deverão ser preenchidos em determinados momentos. Toda a literatura (livros, artigos, relatórios, textos técnicos e artigos produzidos pelos alunos estarão disponíveis na página conforme as ofi cinas trabalhadas. O acesso à página poderá ser conseguido através dos endereços: COLÉGIO ISRAELITA BRASILEIRO PORTO ALEGRE-RS http://www.colegioisraelita.com.br Programa de Pós Graduação em Informática na Educação www.pgie.ufrgs.br PORTAL EAD BRASIL Educação Corporativa http://www.portaleadbrasil.com.br/ Universidade Federal do Rio Grande do Sul www.ufrgs.br Centro Interdisciplinar de Novas Tecnologias na Educação www.cinted.ufrgs.br 22 Ensaios - Interdisciplinaridades e Pesquisa Científica em Sala de Aula Interdisciplinaridade: Discurso ou Praxiologia Docente Resumo O presente ensaio objetiva discutir os conceitos da interdisciplinaridade e sua complexidade e seus aspectos enquanto discurso e praxiologia docente. Em sua primeira análise percorre a trajetória da noção de disciplinaridade, segundo referencial epistemológico, cartesiano, e suas estruturas paradigmáticas em sua concepção unidisciplinar. Percorrendo em seguida pelas epistemologias hibridas e mestiças das novas ciências, e por último uma consideração a cerca dos projetos metodológicos e pedagógicos da docência segundo seus dois principais atores: docente e aluno. Finalmente, apresenta uma síntese da evolução necessária das ciências incluindo em seus construtos epistemológicos à existência de proposições que se configuram como interdisciplinaridade e transdisciplinaridade e como arcabouço de novos paradigmas que se desenham nos cenários educacionais e histórico-sociais. Palavras-chave Interdisciplinaridade, transdisciplinaridade, teoria da complexidade, praxiologias docentes, novas ciências, novas docências. Interdisciplinarity: Speech Teacher or Praxiology Abstract This paper discusses the concepts of interdisciplinarity and its complexity and its aspects as a discourse and praxiology teacher. In its first analysis examines the trajectory of the concept of disciplinarity, the second epistemological framework, Cartesian, and its paradigmatic structures in their design unidisciplinary. Traveling by then crossbred and hybrid epistemologies of the new sciences, and finally a considerationof some methodological and pedagogical projects of teaching according to its two main actors: teachers and students. Finally, we present a synthesis of the necessary evolution of the sciences in their epistemological constructs including the existence 23Cláudio de Musacchio of propositions that constitute the interdisciplinary and transdisciplinary framework and how new paradigms are emerging in educational settings and history-social. Key words Interdisciplinarity, transdisciplinarity, complexity theory, praxiologias teachers, new science, new docências. Resumen Este artículo discute los conceptos de interdisciplinariedad y de su complejidad y sus aspectos como un discurso y el maestro praxiología. En su primer análisis se examina la trayectoria del concepto de interdisciplinariedad, el marco epistemológico en segundo lugar, cartesiano, y sus estructuras paradigmáticas en su diseño unidisciplinario. Viajar en epistemologías continuación mestizos e híbridos de las nuevas ciencias, y, finalmente, la consideración de algunos proyectos metodológicos y pedagógicos de la enseñanza de acuerdo con sus dos actores principales: profesores y estudiantes. Finalmente, presentamos una síntesis de la evolución necesaria de las ciencias en sus constructos epistemológicos, incluyendo la existencia de proposiciones que constituyen el marco interdisciplinar y transdisciplinar, y cómo los nuevos paradigmas están emergiendo en los centros educativos y sociales-la historia. Palavras clave La interdisciplinariedad, transdisciplinariedad, la teoría de la complejidad, los maestros praxiologias, nueva ciencia, docências nuevos. Introdução “A capacitação e o desenvolvimento das habilidades para a docência que se espera na educação contemporânea, se constitui necessariamente em pra- xiologias docentes que contemplem a interdisciplinaridade, a transdisciplinari- dade e a atitude de eternos aprendizes.“ 24 Ensaios - Interdisciplinaridades e Pesquisa Científica em Sala de Aula Circundam nos meios acadêmicos, pesquisas e trabalhos de teóricos e educadores, articulações e discussões sobre as tendências epistemológicas e metodológicas como alternância a uma educação que se faz necessária para o século XXI. Nestas possíveis aplicações, embora ainda não se tenha uma métrica padrão estabelecida, a questão da interdisciplinaridade, bem como da transdisciplinaridade, tem promovido debates e questionamentos se estes paradigmas seriam considerados novos paradigmas ou possíveis retomadas às categorias epistemológicas existentes desde o início dos séculos a.C., quando Platão, Sócrates e seus discípulos detinham os conhecimentos abrangentes sobre as ciências, muito antes de o modelo cartesiano ser implantado nos meios educacionais. Se o uso de tais metodologias ou epistemologias numa perspectiva teórica da complexidade sugere um movimento convergente para que se faça uma revisão sistemática das propostas de produção do conhecimento como alternativas ao paradigma dominante, dicotomizado, cartesiano, hiperespecializado, também sugere que estas discussões saiam do conforto do discurso pragmático e se embale no dorso altivo da praxiologia docente, para então se começar a vislumbrar matizes dessa educação que se vislumbra para o século XXI. Soethe (2003) Muitos pensadores, discutindo a teoria da complexidade, movendo-se em direção a interdisciplinar visão contemporânea da interpretação dos fenômenos observáveis, têm promovido um movimento científico que privilegia, senão o nascimento de novos paradigmas, pelo menos, a retomada de velhos ideais não lineares de se fazer ciência. Entre os teóricos, Edgar Morin (pensamento complexo e os sete saberes necessários à educação do futuro), Edward Norton Lorenz(1917-2008) (efeito borboleta), Ilya Prigogine (1917-2003) (teoria das estruturas dissipativas), Karl Ludwig Von Bertalanffy (1901-1972) (teoria geral dos sistemas), unanimemente acreditavam que o todo seria maior que a soma das partes, isto é, que uma visão interdisciplinar de se fazer ciência levaria o Homem a reconhecer qualidades, que não são vistas na composição da visão disciplinar e unilateral de cada ciência. Estes pensamentos vêm articulando sistematicamente alternativas para superação das possíveis debilidades do pensamento reducionista disciplinar atuante no ementário educacional contemporâneo, numa clara e verdadeira especialização excessiva, tornando o ensino, segundo Japiassu (1976), uma patologia do saber. Leal (1996) Lorenz (1993). 25Cláudio de Musacchio No cenário nacional, desde a década de 70, se discute as interdisciplinaridades e transdisciplinaridades no contexto do surgimento das novas ciências e nas mudanças de paradigmas educacionais. Alguns expoentes como os trabalhos de Ivani Fazenda (2006), PUC-SP, Hilton Japiassu, PUC- RJ, e em Portugal, Olga Pombo, University of Lisbon, deixam bem claro que a discussão está apenas começando, embora alguns frutos já estejam sendo colhidos. Longe ainda de um fractal utilização sistematizada nos meios acadêmicos por metodologias que privilegiem a descentração e a característica relativa do ensino transdisciplinar, cresce nos desejos docentes, a consciência de uma praxiologia baseada na construção de modelos, de fórmulas e soluções que sugerem o uso intensivo do arsenal multifacetado e diversificado das ciências e sua comunhão epistemológica. Nicolescu (2001) Mais e mais cientistas, pesquisadores, professores universitários e docentes dos ensinos básico, fundamental e médio, buscam o estudo dos fenômenos, misturando conceitos, epistemologias, hibridização e mestiçagem de métodos e teorias, ultrapassando as fronteiras dicotômicas disciplinares, para considerar contextos mais totalizantes e globalizantes, num movimento de desinsularização das disciplinas. Mesmo que muitas vezes ocorram incoerências científicas, ambigüidades nos pareceres, é uma prática que se avoluma e se aprofunda dentro de perspectivas epistemológicas transdisciplinares e interdisciplinares e de possíveis práticas pedagógicas capazes de responder aos anseios das hipóteses e questões de pesquisa. Jantsch (1995) Mas o que é discurso e o que é praxiologia docente na implantação de cultura inter ou transdisciplinar nos meios educacionais? Pensamento científico disciplinar O conceito do que é disciplinar é tão antigo quanto cartesiano, e implicava necessariamente em fragmentar a realidade em segmentos onde a ciência pudesse se tornar objeto de observação científica cada vez mais fragmentada e conseqüentemente o objeto de conhecimento erigido por leis e teorias epistemológicas cada vez mais reduzidas. E este conhecimento racional, sob o ponto de vista da análise e da síntese, segundo Locke (1988), numa simplificação reducionista, conceberia o conhecimento como uma especialização, caminhando contra a ideia da visão totalizadora das ciências. 26 Ensaios - Interdisciplinaridades e Pesquisa Científica em Sala de Aula Desta maneira, a estratégia utilizada pela metodologia baseada fundamentalmente na experiência foi o desenvolvimento paulatino e crescente da noção de especialização, privilegiando a “perfuração vertical” e epistemológica em detrimento da abertura das análises e sínteses mais abrangentes e totalizadoras nos estudos dos fenômenos observáveis. Na contramão do movimento de criação cada vez mais delimitado das ciências, os grandes cientistas, tanto na fase renascentista (Da Vinci), quanto no período iluminista do enciclopedismo (movimento filosófico-cultural que buscava catalogar o conhecimento humano), onde se permitiam formações tão adversas quanto contraditórias como filosofia, física, química, matemática, astronomia, biólogos, artistas plásticos, e até literatos, serviam como exemplo de como os saberes podiam ser vistos como parte de uma totalidade mais ampliada da produção do conhecimento. Silva (2001) Historicamente, a super valorização, no campo científico, de produção em subdivisõesda ciência em partições disciplinares, tomou força e velocidade no período mecanicista da história que começou a privilegiar a aprendizagem técnica em detrimento da observação de um fragmento do objeto, tornando o sujeito científico cada vez mais especialista. Muito antes disso, no início dos séculos d.C. na Roma Antiga, a relação entre mestre (magister) e seus discípulos (discipuli), se encaminhava para estabelecer os princípios de uma filosofia de aprendizagem em função de determinar escolas como classificação epistemológica. Sendo assim, os seguidores dos grandes mestres optavam por uma escola filosófica, contida numa ação de aprender, instruir e ensinar, segundo os preceitos de uma corrente epistemológica que evoluiu, distanciando-se uma das outras. No século XIV, com o surgimento das primeiras universidades, sob forte contexto escolástico (religioso), instituíram-se o conceito de disciplina, designada como matéria, que mais tarde se chamaria de ciência. O avanço científico, portanto das ciências foi o modelo epistemológico reducionista cartesiano que passou a tratar ciência como uma corrente específica do pensamento e a observação dos fenômenos reduzidos a um objeto simples. Este reducionismo atravessou toda a fase industrial e cada vez mais, diminuindo cientificamente o foco do objeto de estudo. Colaboraram mais ainda as sucessivas descobertas científicas nos campos das tecnologias e metodologias para um novo paradigma que se instalaria por todo o ocidente – disciplinaridade. Quanto mais especialista for o estudo ou o estudioso, mais credibilidade teria seu trabalho científico. Minayo (1992) 27Cláudio de Musacchio Sua institucionalização transcorreu sem nenhum trauma paradigmático, até que as proposições de tais especializações começaram a não mais dar conta do objeto observado, necessitando reconhecer que para determinados casos seriam necessárias a prognóstica colaboração de duas ou mais ciências a serviço da análise e da síntese, inda mais se considerar que tudo que está no mundo social-histórico é indissolúvel e entrelaçado com o simbólico. (Castoriadis, 2000) Tudo começou a ser esclarecido, quanto certo, que ciências advindas do hibridismo e da mestiçagem começassem a provocar mudanças em seus enunciados epistemológicos fundamentais, recorrendo aos fundamentos da abordagem analítica. Nesta perspectiva, produzir conhecimento não era mais possível tendo em vista que a fragmentação exposta, cartesiana, disciplinar, não permitiria a composição ou montagem de seus construtos epistemológicos. (Morin, 2003) Epistemologias híbridas e mestiças Ocorre que, as estratégias utilizadas nos experimentos científicos para análise segundo suas epistemologias não respondiam mais as múltiplas determinações exigidas pelas ciências, necessitando, portanto, de uma alternativa que fosse menos monotemática. É necessário, portanto, avançar e “abrir” as ciências em diálogo, entrelaçando suas epistemologias, seus repertórios de técnicas e procedimentos, que sozinhos não mais dão conta das observações. Cada vez mais se ouve falar em trabalhos de pesquisa interdisciplinar entre pesquisadores com contornos bastante diferenciados e que conseguem dialogar e encontrar aderências no plano científico, o que é bom por um lado, entretanto, por outro, os trabalhos começam a destroçar possibilidade de permanência das disciplinas em seu plano físico, por se tornarem esvaziadas, necessitando obrigatoriamente de uma ampla discussão epistemológica, para reposicionamento das disciplinas menos especializadas e mais abrangentes. Não se trata de unificar ciências, é preciso rever construtos, epistemologias, tratados. Como exemplo pode-se citar as novas disciplinas das ciências que surgem da técnica com a metodologia, da tecnologia com as biociências, e das matemáticas aplicadas às outras ciências como construto de formulações e resoluções matemáticas na busca da demonstração clássica dos enunciados científicos formais. Trata-se de reconhecer em si mesmo e nos outros não só os saberes teóricos, mas os práticos, existenciais. (Sommerman, 2006) 28 Ensaios - Interdisciplinaridades e Pesquisa Científica em Sala de Aula Já estamos a mais de duas décadas, desenvolvendo no campo científico mudanças de configuração na construção de modelos, teorias, fórmulas e conceitos que avançam para as outras necessidades de hibridização e mestiçagem. Segundo Capra (1999), tudo tem uma ligação ecológica ou científica, e não se pode visualizar com olhar clínico de uma só ciência. Como se não bastassem às aplicações das novas nascentes de ciências nos problemas antigos, surgem novos objetos científicos, sociais, de comportamento, que exigem das ciências pareceres igualmente científicos. Como as novas ciências ainda não possuem maturidade para estes estudos, uma discussão sem precedentes estão pulverizando nossas universidades e institutos de pesquisa. Um clássico exemplo dessas discussões é a questão do uso das tecnologias na relação ensino-aprendizagem. Não importa mais estudar os efeitos da tecnologia nesta relação e sim como podemos resolver os problemas práticos da nossa civilização tais como: educação para todos, acesso indiscriminado as tecnologias, preços reduzidos dos equipamentos e programas de computador, mercado de trabalho e acesso irrestrito aos saberes. Novas ciências, novas docências No cenário entre as mutações das várias ciências ocorrendo em nosso tempo, a preocupação que parece unânime em todos os contextos é, sem dúvida alguma, a questão do domínio dos métodos e das práticas educacionais para utilização das novas ciências que emergem na sociedade e nos meios acadêmicos mais precisamente. As universidades para dar conta dessa relação ensino-aprendizagem submetem os docentes aos constantes cursos de educação continuada, pois que sempre haverá uma nova ideia, técnica ou metodologia para ser apreendida pela docência, em qualquer nível e série analisada. Ocorre que, estando à universidade longe do mercado e, portanto, do objeto de observação, o docente não encontra com facilidade o meio experimental de que necessita para desenvolver seus estudos de pesquisa e recorre, portanto ao conhecimento que os alunos trazem desse mercado. Nas ciências advindas do mercado, necessariamente, elas são supostamente atendidas por profissionais professores deste mesmo mercado. Tais mercados como administração, economia, contabilidade, gestão do conhecimento, ciências da informação, informática, e tantas outras, buscam diminuir o distanciamento existente entre a universidade e o mercado de corporações e 29Cláudio de Musacchio empresas. Os insucessos somados a esse distanciamento são uma das causas prováveis de tanto nascimento de universidades corporativas que encontram nesta possibilidade, diminuir este distanciamento e resolver de vez com a questão da capacitação e formação de seus indivíduos pela via formal, sob o ponto de vista acadêmico. Lück (2000) Noutras ciências, ditas puras como: física, biologia, química, engenharias, educação, sociologia, psicologia, e tantas outras, são por excelência campos do saber que pouco ou quase nada interagem com o mercado, podendo desenvolver seus estudos em laboratórios próprios ou em parcerias com institutos de assuntos correlatos. As áreas mais afetadas pelas mudanças de paradigmas são aquelas que, unidas numa só, buscam refazer seus construtos epistemológicos. As ciências ditas novas, como a biomecânica, eletro-eletrônica, neurociências, psicolingüística, e tantas outras, possuem em suas novas formulações conceitos e categorias epistemológicas próprias e que se articulam entre as ciências das quais se originaram dando novos saberes e exigindo dos professores novas posturas para exercício da docência. Novos conhecimentos demandam novas formações na docência e na programação dos ementários, levando os professores a novas preparações exigidas pelo novo pensamento que compartilha dos campos de saberesdas disciplinas originárias. E como tudo está interligado, munido de interatividade, a essência da autopoiese preconizada por Maturana, (2001), demonstra por analogia que somos essencialmente seres sociais e que aprendemos naturalmente uns com os outros, e que se pode alterar a todo o momento não só o conhecimento disciplinado, mas as metodologias pelas quais se produz e constrói este conhecimento. Portanto, novas ciências exigem novas ontologias da realidade. Também nas escolas de ensino básico, fundamental e médio, os professores passam pelas mesmas alterações nos programas e ementários das Secretarias de Ensino. Pressionados pelos programas nacionais advindos da perspectiva enunciada nas novas diretrizes e bases para educação, onde a interdisciplinaridade é vista como um avanço necessário para uma nova compreensão do mundo, os gestores de escolas públicas e privadas se sentem pressionados pelo corpo docente e pelos alunos, a realizarem mudanças drásticas na composição dos saberes para se adequarem a uma nova realidade. Também pressionados pelo alunato que chega à escola com uma avançada tecnologia de informação e comunicação, necessitando compreender os avanços tecnológicos e tentando encontrar razões de inserção desta tecnologia, para que o aluno encontre o sentido de querer aprender 30 Ensaios - Interdisciplinaridades e Pesquisa Científica em Sala de Aula (sensemaking), este professor sente dificuldades inerentes a sua docência, posto que não fora preparado para tais realidades, e se vê, de repente, com duas verdades distintas, alterando seu universo docente: interdisciplinaridade e pesquisa científica em sala de aula. Quanto mais experiências no âmbito educacional, privilegiado pelas circunstâncias tecnológicas que são expostas diariamente, melhor será para o aluno, posto que a vivência às ocorrências fenomenológicas científicas ocorridas no espaço educacional permitirá responder inúmeros questionamentos, que de outra maneira, teórica, não seriam possíveis, ou levariam tempo demais. Certo disso, o docente, ao oportunizar tais ambientes de experimentação também se vê em situações novas, onde precisará de integração de distintos campos disciplinares, para responder as necessidades de pesquisa. Desta forma, os docentes, devem se colocar a disposição, na forma interdisciplinar, de oferecer seus conhecimentos e campos epistemológicos a serviço das explicações exigidas pelas ciências envolvidas. Surge neste contexto ambiental escolar o desejo de toda a comunidade de professores, profundas reformulações que os habilitem a recomporem seus redutos epistemológicos, em detrimento de uma nova ordem, que privilegie uma aprendizagem mais autêntica, expoente, significativa (Ausubel, 2003), rico em questionamentos, baseada na pesquisa feita pelo aluno, que já tem o domínio da tecnologia e que precisa encontrar uma utilização mais eficaz para os propósitos educacionais. Os gestores de escolas e universidades possuem o desafio da mobilização de suas equipes para vivenciar as mudanças que precisam ocorrer, frente à prevalência, no âmbito escolar, de superações reducionistas que fragmentam a realidade e engessam as ciências. Mas para lidar com essas contradições, é preciso o apoio do olhar da complexidade sobre a escola, posto que a gestão precise lidar com níveis de imprevisibilidade e incertezas, mas que encontra no seu corpo docente o apoio e a estrutura adequada para a transição ou transposição das práticas pedagógicas vigentes para metodologias dialógicas em que alunos e professores encontrem em si mesmos as produções e construções do conhecimento de ambos, e que em suas novas abordagens vislumbrem a competência como cenário possível para as mudanças paradigmáticas possíveis. (Perrenoud, 2000) Mas como os professores e pais vêem, hoje em dia, esta nova vertente do ensino-aprendizagem que privilegia o estudo dos fenômenos observáveis, baseado mais na experimentação do que na argumentação teórica ou dialética? 31Cláudio de Musacchio Esta é uma questão que ainda não sabemos quais são suas implicações mais a frente. O que se pode afirmar, contudo, é que alguns sintomas de melhoria começam a se vislumbrar, quando se analisam os resultados dos alunos que tiveram estes enunciados na educação. Escolas que já implantaram este modelo educacional se vangloriam dos resultados dos seus alunos nas entradas das universidades, com índices bastante representativos de aprovação. Certo ou errado, quanto à metodologia ou objetivos, é que a quebra dos paradigmas advindos da necessidade de se ver o mundo com olhos mais totalizantes e menos especialistas, impulsionadas pelas próprias necessidades oriundas das ciências, que migrando para situações menos especialistas e cartesianas, juntam-se às alternativas de campos disciplinares que se somam para construírem um novo saber ou visão mais sistêmica da observação e produção de conhecimento. Segundo Morin (2003), os níveis de complexidade das sociedades contemporâneas necessitam de estudos inter-poli-transdisciplinares para resultar em análises satisfatórias de tais complexidades. Geração Y, X, Z, e a aprendizagem Paralelamente aos paradigmas dos docentes a serem superados quanto a sua formação, por estarem vivenciado transições e mudanças praxiológicas, também os alunos enfrentam seus receios quanto à enorme variedade de possibilidades e inter-relações que são vivenciadas desde cedo. Estes medos diante das tecnologias, não estão ligados ao uso que eles fazem da mesma, visto que são naturalmente digitais, e apelidados de “nativos digitais”, ou geração X, Y, e mais recentemente Z. Senge (1994) Os nascidos na década de 80 e 90 possuem características de uma época de grandes transformações sociais, políticas, econômicas e científicas, principalmente, àquelas ligadas às tecnologias. São extremamente exigentes, cresceram numa sociedade de disputa, de carreira, de certo egoísmo frenético, são pacifistas, por natureza, embora seus passatempos prediletos sejam os jogos de guerra, são consumistas de tecnologias, cuidam de suas carreiras desde cedo, estudam com mais naturalidade e continuam estudando mesmo após a universidade. Possuem forte conceito de educação continuada. Para eles a educação à distância não é um mistério a ser desvendado, mas uma metodologia que precisa ser menos evasiva, mais criativa e menos ortodoxa. Nós que estamos passando pela transição é que costumamos a complicar seus 32 Ensaios - Interdisciplinaridades e Pesquisa Científica em Sala de Aula mecanismos e entendimentos. E se existe algo de novo que possa surgir “é através das crianças que o novo virá, são eles que trarão as respostas que não encontramos”, (D’Ambrósio, 1998). Entendem facilmente a interdisciplinaridade pelas próprias posturas que praticaram diante das correlações de ciências, das vivências em comunidades sociais, das experiências com amizades virtuais. As experiências científicas em sala de aula são vistas como interessantes, educativas, e producentes. Mas os modelos de avaliação que cobram esta construção de conhecimento ainda são retrógrados, antiquados e poucos traduzem os níveis de aprendizagem que os alunos obtiveram. Encontrar razões que levem os alunos a se interessarem pela pesquisa científica e pela aprendizagem significativa é o grande desafio docente de nossa era. Não se trata de metodologias, técnicas ou práticas pedagógicas e sim de posturas docentes diante da praticidade do saber e da praxiologia tão necessária ao aprendizado. Os alunos vêem de uma cultura onde tudo é explicado na forma de regras de um jogo eletrônico bem definido, ou de armadilhas que eles precisam conhecer para vencer tais inimigos virtuais. Como as ciências se protegem diante de seus construtos epistemológicos e buscam fortalecer seus pareceres para continuarem a existir, também os alunos precisam de uma regra distinta, de senso prático, do que, do como, e pra que, aprender, a ciência precisafazer sentido, ou não será apreendida. Os alunos da atualidade são naturalmente polivalentes, assumem várias tarefas ao mesmo tempo, são dialéticos naturais, espontâneos, ao mesmo tempo em que lêem um livro, ouvem música, falam no celular, conversam nas comunidades virtuais, fazem pesquisa pra escola, a TV ligada, isso dá a eles a sensação de que não estão sozinhos. “Deve ser por isso que os alunos acham a escola um lugar chato porque as tarefas são realizadas uma de cada vez e, assim, ficam contando os segundos para terminar o tempo de aula”. Se há necessidade de rever a ciência do ensinar, a tecnologia está mostrando outro viés possível para a aprendizagem. Há quem diga que a revolução educacional já começou, e ela iniciou-se pelos próprios alunos, que em silêncio, estão alterando o atual modelo educacional, quer sejam pelos resultados nas avaliações, pelas informações que trocam nas redes e comunidades, pela evasão muito alta nos ensinos presenciais e virtuais, pelo acesso indiscriminado às informações sem orientação, e a contestação natural de insatisfação demonstrada através das ações de indisciplinas e carências de ética e comportamento. 33Cláudio de Musacchio O maior desafio à docência é trazer o aluno para querer aprender, depois é buscar um método ou mídia a que ele se adapte, goste, contemple e participe. E por fim, que o aluno aprenda a dizer o que aprendeu e da maneira mais científica possível, o que achou do aprendizado que teve e o que pretende fazer com ele. Se o aluno puder vivenciar estas três dimensões do saber, o docente terá realizado sua função de facilitador da aprendizagem, mas se falhar em uma ou duas ou nas três, então os seus paradigmas precisam ser revistos, modificados, reavaliados. Não se pode esperar que ocorra aprendizagem sem que haja a conivência do próprio aluno em querer aprender, sem que lhe seja perguntado o que ele espera aprender, para quê, por que, e como. Conclusões não conclusivas De todas as idiossincrasias de nosso tempo, também chamada de a era do conhecimento, que possam ocorrer diante dos conflitos cognitivos, das construções das estruturas intelectuais, da habilidade de lidar com a complexidade e os objetos complexos, a mais controvertida delas é sem dúvida alguma, a resolução acadêmica de julgar que os guetos epistemológicos possam dar conta de uma multiplicidade de análises e sínteses, de hipóteses cujas problemáticas necessitam de expoentes em várias ciências. Se o momento é de unir esforços nas habilidades e capacidades de ações transformadoras e de colocar sujeitos diante de objetos em observação capazes de ver além da visão especializada do tecnicismo e pragmatismo das disciplinas e das dispersões dos saberes, também é o momento de propor soluções novamente iluministas e renascentistas, unindo não só as ciências, mas os olhares amplificados, renovados, humanísticos, que o movimento enciclopedista volte e pinte as ciências com matizes de todas as epistemologias, metodologias e práticas pedagógicas que se locupletem. Se o que se busca é um novo aluno, também se quer um novo docente, se a sociedade precisa de um novo cientista, também deseja pesquisas que nos levem a compreender os ecossistemas, as economias de mercado para matar a fome de todos os habitantes da Terra, que as inteligências possam se unir para erradicar as doenças fabricadas pelo homem a fim de vender curas, e que os povos, de diferentes ideologias, idiomas e religiões se unam para entender as crenças e a ciência, como lados de uma mesma costura planetária. Se o Homem foi capaz de criar um mundo virtual, cibernético, que mudou as velocidades da informação e da comunicação, que permitiu alterar o 34 Ensaios - Interdisciplinaridades e Pesquisa Científica em Sala de Aula ciclo de conhecimento de 50 anos para 5, revolucionou as relações comerciais, permitiu o acesso irrestrito a informação e ao saber, transformando o irreal em possível, então também pode revolucionar o jeito de fazer ciência, de ensinar e de aprender. Se as novas ciências que nascem todos os dias, mudarem a face da pesquisa e levar o Homem para o entendimento maior dos objetos complexos, dos avanços promovidos pelo uso da interdisciplinaridade e da transdisciplinaridade como processo e estratégia de ação e não como dicotomias unidisciplinares, possibilitando uma rede de intrincados campos científicos, alterando o modo de produção e construção do conhecimento, então se estará avançando para uma sociedade menos materialista-histórica. Porque assim como uma só ciência não explica a menor partícula do universo, também uma só ciência não explica os intrincados segredos escondidos do universo. E como as mudanças e alterações nos construtos epistemológicos e pedagógicos são lentas e graduais, é necessário discutir muito a situação atual, na observação da decadência, obsolescência e declínio de um modelo cartesiano que não serve aos propósitos das sociedades contemporâneas. As próprias ciências se levantam contra o atual sistema e se unem para responder ou adaptarem-se as exigências do mercado, da sociedade e do universo científico das novas descobertas. O grande avanço das metodologias e práticas pedagógicas para o uso de experiências científicas em sala de aula está no cerne das discussões da interdisciplinaridade e transdisciplinaridade enquanto abordagem sistêmica, não mais como discurso, posto que já se conheça suas implicações, mas como praxiologia urgente para continuar avançando, a velocidades cada vez maiores no entendimento das ciências e das sociedades, exigindo dos pesquisadores um tratamento mais sintético, totalizante, holista e globalizante. 35Cláudio de Musacchio Referências Bibliográficas AUSUBEL, David Paul. (2003). Aquisição e retenção de conhecimentos: uma perspectiva cognitiva. Lisboa: Plátano Edições Técnicas. Tradução de The acquisition and retention of knowledge: a cognitive view. (2000). Kluwer Academic Publishers. 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A interdisciplinaridade vista pela teoria da complexidade contribui para considerações de projetos epistemológicos e pedagógicos que alterem substancialmente os paradigmas tradicionais referentes à formação, conteúdo, estudos, avaliação e o uso efetivo da interdisciplinaridade nos modus operandis nos ensinos básico, fundamental e médio. Finaliza propondo quatro paradigmas às transições dos atuais paradigmas da educação tradicional para o uso intensivo da interdisciplinaridade na relação ensino-aprendizagem. Palavras-chave Interdisciplinaridade, transdisciplinaridade, teoria da complexidade, praxiologia docente, novos paradigmas para o ensino. Interdisciplinary today: new paradigms for praxiology teaching Abstract This paper discusses the introduction of new paradigms in teaching-learning relationship, including issues of new formulations in teacher training, both in regard to his speech, as in his praxiology. The interdisciplinary view of the complexity theory contributes to considerations of epistemological and pedagogical projects that substantially change the traditional paradigms concerning the formation, content, research, evaluation and effective use of interdisciplinarity in the modus operandis in primary, elementary and high school. It ends by proposing four paradigms for transitions from the current paradigms of traditional education for the intensive use of interdisciplinarity in the teaching-learning. 39Cláudio de Musacchio Key words Interdisciplinarity, transdisciplinarity, complexity theory, praxiology teaching, new paradigms for teaching. Resumen Este artículo discute la introducción de nuevos paradigmas en la relación enseñanza-aprendizaje, incluidas las cuestiones de las nuevas formulaciones en la formación del profesorado, tanto en lo que respecta a su discurso, como en su praxiología. La visión interdisciplinaria de la teoría de la complejidad contribuye a la consideración de proyectos epistemológicos y pedagógicos que implican cambios sustanciales en los paradigmas tradicionales relativas a la formación, el uso de contenido, investigación, evaluación y eficaz de la interdisciplinariedad en el modus operandis en la escuela primaria, primaria y secundaria. Al final propone cuatro paradigmas para las transiciones de los paradigmas actuales de la educación tradicional para el uso intensivo de la interdisciplinariedad en la enseñanza-aprendizaje. Palavras clave La interdisciplinariedad, transdisciplinariedad, la teoría de la complejidad, la enseñanza praxiología, nuevos paradigmas para la enseñanza. Introdução “Mudanças educacionais de caráter es- truturais sempre ocorrem nos dois sen- tidos: ensino e aprendizagem, obrigato- riamente. Enquanto alunos passam por profundas mudanças paradigmáticas, tec- nológicas e ensinamentos que façam sen- tido para eles, contextualizado; os docen- tes buscam novas praxiologias, capaz de dar conta dessas novas práticas didáticas e pedagógicas. Ambos saem das suas zo- nas de conforto e se estabelecem em novos construtos epistemológicos.” 40 Ensaios - Interdisciplinaridades e Pesquisa Científica em Sala de Aula Embora o conceito e a aplicabilidade da interdisciplinaridade tenham surgido no século XX, como resultado de um esforço de tentar unir as ciências na compreensão dos objetos e das observações dos fenômenos, e ter assim outras visões e pareceres, é de longa data a vontade humana de unificar os saberes e remontar o quebra-cabeça da fragmentação do conhecimento deixado pelo modelo tradicional, de ensino fragmentado e cartesiano. Após o apogeu da fragmentação potencializada na era mecanicista e industrial, por necessidade de especializar os trabalhadores para atividades muito pontuais, as indústrias provocaram demandas que culminaram no nascimento de cursos técnicos e de graduação com alto grau de especialização. Locke (1988) Da mesma forma que o nascimento da ciência moderna a partir do século XVII, tenha introduzido significativos avanços no campo dos saberes também oportunizaram o início do silêncio entre os saberes, devido às metodologias científicas, propostas pelas epistemologias racionalistas e empiristas, que privilegiaram a experiência científica, em detrimento da lógica do entendimento global. Entretanto o movimento só tomou corpo e velocidade com a introdução das tecnologias do século XIX. As profundas revoluções desenvolveram novas necessidades que culminaram em hiper- especializações, oriundas do volume e da complexidade dos conhecimentos produzidos pela sofisticação das tecnologias e do aparelhamento nas áreas produtivas da sociedade. Morin (2003) Ao mesmo tempo em que a ciência caminha para fatias cada vez menores, tornando-se especialista nos estudos e pesquisas, as práticas pedagógicas, tem se encaminhado para o oposto, tentando juntar, para construir uma visão melhorada do todo, do completo, do macro. A ciência cada vez mais especializada busca seu aprofundamento, provocando bifurcações nas disciplinas, e como um microscópio diminui sua visão geral, para uma visão mais concentrada, fechando o foco para um único e cada vez menor objeto de análise. Enquanto algumas áreas do saber não conseguem resolver sozinhos os seus resultados de pesquisa, e necessitam das contribuições de outras áreas para encontrar as respostas.Como exemplo, pode-se citar a psicologia e a sociologia que se juntam para estudar os fenômenos que são, ao mesmo tempo, de natureza individual e social, aparecendo, portanto novos aspectos, no contorno das duas áreas, permitindo novas dimensões como as análises psicossociais. Soethe (2003) 41Cláudio de Musacchio Ocorre que na contramão destas especializações, certas pesquisas não podem ser realizadas, posto que precisem da junção de saber para compreender fenômenos naturais e até mesmo sobrenaturais. Surge, portanto, a interdisciplinaridade como proposta de agregar certas disciplinas e assim criar condições ideais de análise e pesquisa. É o caso das engenharias com a química, física, mecânica, criando assim à biomecânica, biofísica, bioquímica. Os estudos da bioengenharia têm propiciado pesquisas que seriam impossíveis, se as ciências não estivessem se unido para este propósito. Mas se isso ocorre na área das ciências e da pesquisa, também ocorre nas metodologias, pedagogias e práticas educacionais que agora se voltam para outros caminhos diferentes da especialização das disciplinas e tentam criar novos construtos capazes de oportunizar aprendizagens que possam dar maior significação às compreensões. A aplicação desta metodologia está revolucionando o ensino, pois está colocando áreas do saber que até então eram incompreensíveis juntas, mas que começam a fazer sentido e dar respostas aos problemas de pesquisa. Por enquanto, apenas como projetos de estudo e pesquisa, algumas aplicações de junção estão aparecendo nas escolas de ensino básico, fundamental e médio. O Fundamento do paradigma da Interdisciplinaridade O paradigma da professora para o ensino básico ser a única intermediação entre o aluno e o saber está com os dias contados. Pois cada vez mais, professores, gestores e instituições, discutem alternativas de se introduzir no ementário das séries iniciais, professores de diferentes áreas do saber, para explicar às crianças, os fenômenos da natureza. Aparece deste modo, a figura do professor de história, de geografia, de matemática, de ciências, de música, de atividades físicas, auxiliando os professores das séries iniciais com contribuições nas pesquisas e nos trabalhos sugeridos. Com esta demonstração, as crianças são despertadas pela curiosidade de saber como as ciências juntas podem tecer uma visão diferenciada daquela que as ciências teriam em cenários separados. Pode parecer um paradoxo promover vários encontros com professores disciplinares, mas ocorre que os discursos epistemológicos são realizados nos contornos das ciências, buscando-se demonstrar para as crianças, desde o início de sua educação, que é possível integrá-las as demais ciências oportunizando realmente a interdisciplinaridade e posteriormente, a transdisciplinaridade. Sommermann (2006) 42 Ensaios - Interdisciplinaridades e Pesquisa Científica em Sala de Aula Promover a interdisciplinaridade é fazer a interdisciplinaridade e não discutir a interdisciplinaridade. As disciplinas são fundamentais para todos os níveis de educação, desde as séries iniciais até os últimos anos do ensino superior. Mas para compreender as indagações que surgem ao longo desse caminho de aprendizados em que possamos juntar a matemática com a geografia e explicar os fenômenos naturais através da visão matemática do mundo, ou vice-versa, explicar as fórmulas matemáticas mostrando através da geografia o porquê da sua existência e formulação. É isso que falta no ensino, compreensão de diferentes visões que o modelo cartesiano separou. A interdisciplinaridade está ligada a ciência para buscar explicar a totalidade das interpretações e não a objetividade das especializações. Não se pode analisar, por exemplo, o ser humano, sob um único aspecto, e tirar daí conclusões sobre sua natureza e subjetividade. As diferentes dimensões biológicas, psicológicas, religiosas e tantas outras, somam para se fazer um quadro mais completo desta análise. Assim também são os fenômenos estudados. Devem ter a explicação de várias ciências se quisermos um quadro mais completo de várias compreensões e definições. Desta forma, as ciências precisam se unir para explicar o real, a forma, a cor, sabor, cheiro, função, diferentes usos, etc. Não é fácil romper os paradigmas que existem na educação, tanto no aspecto do ensinar quanto no aprender. Sair do isolamento que as disciplinas foram submetidas, e colocá-las uma diante das outras para que se reconheçam parte da verdade que buscam, não é tarefa fácil. Mais difícil ainda é romper o pensamento constitutivo com que os professores foram ensinados e aprenderam como ensinar. Realizar estas costuras tão necessárias para se poderem abraçar as ideias coletivas para o entendimento dos diferentes ângulos das análises será preciso “revolver a terra”, “replantar as sementes” e (re) educar a educação. São muitos os desafios, a história não separou só as ciências, as culturas, mas também a maneira de se ensinar e aprender. A reforma deve ser pensada sob todos os ângulos. A interdisciplinaridade se quiser ser implantada também terá que ser utilizada no modelo construtor de novas práticas pedagógicas. Não basta novos paradigmas para a educação, é necessário reinventar a caneta que irá escrevê-las. Se a interdisciplinaridade é uma metodologia revolucionária, também deve ser as ferramentas que devemos utilizar para aprender este novo modelo e conceito. Não se pode aprender a ser interdisciplinar com os mesmos instrumentos que aprendemos a ser especialistas. A reforma no ensino e na aprendizagem deve começar pelas próprias metodologias que adotamos na formação dos professores. Minayo (1992) 43Cláudio de Musacchio Mas tem-se que ter uma preocupação constante com os movimentos interdisciplinares. A razão é que as disciplinas não estão sendo analisadas no sentido de existirem ou não. A sua existência é fundamental, precisamos da análise de profundidade de cada uma delas. O que se quer é construir uma convivência harmoniosa entre o pensar especialista das observações e o pensar generalista das convergências. Onde uma completaria a outra. Se algumas vezes falta a análise conjectural das observações, muitas vezes falta a visão do especialista. Na visão das teorias científicas, todos os ângulos de observação são contribuições. Precisou separar as ciências para o mundo progredir, agora é preciso juntá-las para o mundo evoluir. Mas o que se busca é a educação em cruz: verticalizar para uma especialização necessária, científica, dos objetos observados, mas também horizontalizar para uma generalização que permita observações nos contornos e interseções das ciências onde as observações possam ser respondidas e as hipóteses reconhecidas. O fundamento da interdisciplinaridade consiste substancialmente na aplicação da investigação e do olhar científico sobre esta linha divisória entre as ciências, em que as próprias ciências, em separado, não podem evoluir, posto que precisem da união, da opinião, da investigação, e da pesquisa- ação. Muitas ciências nasceram desse olhar híbrido e necessário. A sociedade evoluiu, está mais complexa, o próprio pensamento se tornou mais complexo, e se precisa dar conta dessa complexidade, bastando que a educação com sua plasticidade (no sentido neurocientífico) se locomovam para diferentes pontos de observação e reconstruam epistemologias híbridas ou mestiças que respondam aos questionamentos e hipóteses dos atuais projetos de pesquisa. Mudança de paradigmas para a Praxiologia Interdisciplinar Se mudanças são necessárias e possíveis, algumas metodologias podem ser alteradas, modificadas ou até mesmo criadas, para que surjam novos construtos no fazer docente que contemplem contextos interdisciplinares. Mas para isso é necessário revolver os atuais paradigmas do ensino e da aprendizagem. Nesta nova praxiologia docente que se pretende para o século XXI, podem-se eleger, inicialmente, quatro paradigmas que devem ser