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Conceitos-chave conhecimento, representação, verdade, sujeito, objeto, realismo, idealismo, empirismo, racionalismo, apriorismo, dogmatismo, ceticismo, criticismo O conhecimento Encerrando esta unidade sobre o ser humano e sua relação com o mundo, focalizaremos agora esse aspecto tão caracteristicamente humano – o conhecimento – que concentrou a atenção de boa parte do debate filosófico por muitos séculos. Você conhecerá uma série de reflexões e distinções sobre esse tema que depois o ajudarão a enveredar pela história da filosofia. Como o indivíduo da imagem ao lado se relaciona com o mundo ou com o conhecimento? O que é conhecer para ele (ou para o artista)? E para você? Homem do conhecimento (1857) – Janusz Kapusta. Questões filosóficas O que é conhecimento? De onde se origina fundamental- mente o conhecimento? Como é a relação do sujeito com o objeto do conhecimento? O que podemos conhecer? Im a g E s .c o m /c o r b Is /f o t o a r E n a Capítulo 10 191Cap’tulo 10 O conhecimento FILOVU-191-201-U2-C10.indd 191 4/6/16 5:35 PM GnOsiOlOGia A investigação sobre o conhecer muito engano e ilusão naquilo que uma pessoa pen- sa conhecer, como apontaram Descartes e sócrates (conforme vimos nos capítulos 2 e 3, respectiva- mente), entre outros. Portanto, é preciso ir bem mais “fundo” nesse assunto e tentar entender mais profundamente o processo de conhecer. foi o que fizeram diversos filósofos, em sua busca incessante por compreender a si mesmos e o mundo à sua volta. nesse intento, chegaram à conclusão de que era necessário investigar primeiro a própria faculdade de conhecer do ser humano, antes de confiar plenamente na percepção e na compreensão que alcançavam das coisas. Questões básicas Desde a antiguidade grega, grande parte dos pensadores voltou-se para o problema do conhe- cimento e das questões básicas que o envolvem, dando origem a diversas gnosiologias ou teorias do conhecimento. nesse sentido, podemos dizer que existem tan- tas teorias do conhecimento quantos foram os filó- sofos que se preocuparam com o problema, pois é impossível constatar total coincidência de concep- ções mesmo entre filósofos que habitualmente são classificados em uma mesma escola ou corrente. apesar dessa diversidade, podemos dizer que as questões que concentraram a atenção desses teóricos foram principalmente as seguintes: • relação sujeito-objeto – como é a atividade do sujeito do conhecimento em relação ao objeto conhecido; • fontes primeiras – qual é a origem ou o ponto de partida do conhecimento; • processo – como os dados se transformam em ideias, em juízos etc.; • possibilidades – o que podemos conhecer de forma verdadeira. cada teoria do conhecimento constitui, portanto, uma reflexão filosófica que procura investigar as origens ou os fundamentos, as possibilidades, a extensão e o valor do conhecimento. apesar de constituir uma reflexão antiga, foi so- mente a partir da Idade moderna que a gnosiologia passou a ser tratada como uma das disciplinas centrais da filosofia. nesse processo de valorização, colaboraram de forma decisiva, além de Descartes, os filósofos John Locke e Immanuel Kant, conforme veremos adiante. garoto examina cuidadosamente uma dioneia, planta insetívora. a partir da ação que executa, em que estará baseado o conhecimento que pode construir dessa planta? b r It a In o n V IE w /g E t t y Im a g E s Gnosiologia é o campo de estudos filosóficos que se dedica à questão do conhecimento. Essa área também é conhecida como teoria do conheci- mento, epistemologia ou crítica do conhecimento. mas o que é conhecimento? o que queremos dizer quando falamos em conhecimento? a palavra conhecimento pode ter diferentes acepções, conforme o contexto. anteriormente, fizemos a distinção entre conhecimento em um sentido geral (lato sensu) e em um sentido estrito (stricto sensu), que é o conhecimento fundamentado e, por isso, supostamente verdadeiro (se necessário, reveja esse trecho do capítulo 4). agora, precisamos refinar um pouco mais nossa definição, tendo em vista a investigação deste ca- pítulo. assim, vamos partir da concepção básica e comum de que conhecimento é a apresentação verídica ou adequada de algo (o objeto) ao pensa- mento (o sujeito), mesmo que de forma parcial. se, por exemplo, alguém diz “navio” e aparece em minha mente algo que corresponde ao objeto navio, eu tenho um conhecimento, mesmo que vago. mas, se dizem “navio” e me vem ao espírito algo que não corresponde ao objeto navio (por exemplo, um pato), eu não tenho um conheci- mento, isto é, o objeto navio não se apresenta em minha mente de forma verídica (como ele é de verdade) ou adequada. Isso parece simples, mas não é bem assim. Exis- tem graus distintos de conhecimento e também há 192 Unidade 2 N—s e o mundo FILOVU-191-201-U2-C10.indd 192 4/6/16 5:35 PM Representacionismo a definição de conhecimento dada anterior- mente (apresentação verídica ou adequada de algo ao pensamento) corresponde à interpretação pre- dominante no pensamento moderno, que entende o conhecimento como representação. Isso quer dizer que conhecer seria represen- tar o que é exterior à mente. seria obter uma “imagem” ou “reprodução” do mundo externo, projetada na consciência. conhecer um pássaro, por exemplo, consistiria em formar uma represen- tação, uma “imagem adequada” desse pássaro em nossa mente. nesse entendimento, a mente constitui uma espécie de “espelho da natureza” – metáfora su- gerida pelo filósofo estado-unidense richard rorty (1931-2007), um crítico da interpretação represen- tacionista do conhecimento. assim, para conhecer as coisas como elas realmente são bastaria “polir” metodicamente esse “espelho” (a mente e seus processos), como tentaram fazer a filosofia e a ciência moderna. A condição humana (1935) – rené magritte. na interpretação tradicional – que pertence também ao senso comum–, o conhecimento perfeito é aquele em que a representação é idêntica à realidade, como a imagem de um espelho. c o LE ç ã o P a r tI c u La r Relação sujeito-objeto Portanto, de acordo com a visão tradicional e re- presentacionista do conhecimento, há basicamente dois polos no processo de conhecer: • o sujeito conhecedor (nossa consciência, nossa mente); e • o objeto conhecido (a realidade, o mundo, os inú- meros fenômenos). Dependendo do papel que uma teoria do conhe- cimento atribui a cada um desses polos, podemos classificá-la como realista ou idealista. Vejamos cada uma dessas possibilidades. Realismo De acordo com as teorias realistas do conheci- mento, as percepções que temos dos objetos são reais, ou seja, correspondem de fato às caracterís- ticas presentes nesses objetos, na realidade. Por exemplo: as formas e cores que o sujeito percebe no pássaro são cores e formas que o pássaro real- mente possui em si. observe que a concepção do senso comum é basicamente realista. assim, no realismo mais ingênuo (ou menos crítico), o conhecimento ocorre por uma apreensão imediata das características dos objetos, isto é, os objetos mostram-se ao sujeito que os percebe como realmente são, determinando o conhecimento que então se estabelece. Há, no entanto, outras formas mais críticas de realismo, que problematizam a relação sujeito -objeto, porém mantêm a ideia básica de que o objeto é determinante no processo de conhecimento. Observação Diversos pensadores contemporâneos ques- tionaram o representacionismo, bem como as visões gnosiológicas que polarizam sujei- to-objeto. Esse questionamento deu origem a outras correntes de interpretações sobre o processo de conhecer, como o pragmatismo (que veremos adiante) e a fenomenologia (que estudaremos no capítulo 17). 1. Interprete a pintura de magritte. É possível relacioná-la com a concepção do conheci- mento como representação? Em sua opinião, as representações podem ser idênticas à rea- lidade? Justifique.COnexões 193Capítulo 10 O conhecimento FILOVU-191-201-U2-C10.indd 193 4/6/16 5:35 PM Idealismo Já nas teorias idealistas do conhecimento, é o sujeito que predomina em relação ao objeto, isto é, a percepção da realidade é produzida pelas nossas ideias, pela nossa consciência. Em outras palavras, os objetos seriam “construídos” de acordo com a capacidade de percepção do sujeito. como consequência dessa interpretação, o que existe realmente é a representação que o sujeito faz do objeto. Por exemplo: as formas e cores que o su- jeito percebe no pássaro nada mais são que ideias ou representações desses atributos; não entra em questão se elas realmente existem no pássaro. também no idealismo há posições mais ou menos radicais em relação à afirmação do su- jeito como elemento determinante na relação de conhecimento. 1. Para que os filósofos investigam o processo do conhecimento? 2. analise a relação entre conhecimento e represen- tação, de acordo com a tese representacionista. 3. Quais são os polos tradicionalmente identificados no processo do conhecimento? Explique cada um deles e sua relação. 4. confronte o idealismo com o realismo. 1. Realismo versus idealismo Qual doutrina faz mais sentido para você: a realista ou a idealista? reflita sobre essa questão considerando sua maneira de se relacionar e compreender o mundo e qual epistemologia traz implícita. Depois reúna-se com colegas e procure argumentar defendendo sua posição. análIse e entendImentO COnveRsa fIlOsófICa FOntes primeiras Razão ou sensação? Vejamos agora outra questão básica enfrentada pela gnosiologia: qual é a fonte, o ponto de partida dos conhecimentos? De onde se originam as ideias, os conceitos, as representações? De acordo com as respostas dadas a esse pro- blema, destacam-se basicamente duas correntes filosóficas: o racionalismo e o empirismo. mas existe também uma terceira posição, o apriorismo kantiano, que conjuga de alguma maneira essas duas correntes. Vejamos cada uma. Racionalismo a palavra racionalismo deriva do latim ratio, que significa “razão”, e é empregada em diversos sentidos. no contexto das teorias do conhecimento, racionalismo designa a doutrina que atribui exclu- siva confiança à razão humana como instrumento capaz de conhecer a verdade. como advertia um dos principais filósofos racionalistas, René Des- cartes (1596-1650), não devemos nos deixar persuadir senão pela evidência de nossa razão (conforme vimos no capítulo 2). Essa preferência se deve principalmente à compreensão, pelos racionalistas, de que a ex- periência sensorial é uma fonte permanente de erros e confusões sobre a complexa realidade do mundo. assim, para eles, somente a razão huma- na, trabalhando de acordo com os princípios lógicos, pode atingir o conhecimento verdadeiro, capaz de ser universalmente aceito. Para o racionalismo, os princípios lógicos fundamentais seriam inatos, isto é, já estariam na mente do ser humano desde o nascimento. Daí a razão ser concebida como a fonte básica do conhecimento. empirismo a palavra empirismo tem sua origem no grego empeiria, que significa “experiência”. as teorias empiristas defendem a tese de que todas as nossas ideias são provenientes da experiência e, em última instância, de nossas percepções sensoriais (visão, audição, tato, paladar, olfato). Portanto, para defensores do empirismo, não existem as ideias inatas. como afirmava um dos principais teóricos dessa corrente, o filósofo inglês John Locke (1632-1704), nada vem à mente sem ter passado antes pelos sentidos. Isso quer dizer que ao nascermos nossa mente é como um papel em branco (ou tábula rasa, 194 Unidade 2 N—s e o mundo FILOVU-191-201-U2-C10.indd 194 4/6/16 5:35 PM expressão usada pelo pensador), desprovida de qualquer ideia. (Estudaremos o pensamento de Locke com mais detalhes no capítulo 15.) De onde provém, então, o vasto conjunto de ideias que existe na mente humana? o filósofo responde: da experiência. a experiência, segundo Locke, fundamenta o conhecimento por meio de duas operações: • sensação – que leva para a mente as várias e distintas percepções das coisas, sendo, por isso, bastante dependente dos sentidos; • reflexão – que consiste nas operações inter- nas da nossa mente, pelas quais se desen- volvem as ideias primeiras fornecidas pelos sentidos. Afirmo que estas duas, a saber, as coisas materiais externas, como objeto da sensação, e as operações de nossas próprias mentes, como objeto da reflexão, são, a meu ver, os únicos dados originais dos quais as ideias derivam. (Locke, Ensaio acerca do entendimento humano, p. 160.) alegoria dos cinco sentidos. Para o empirista, todo conhecimento está baseado na experiência sensorial. Depende, portanto, em última análise, de um ou mais de nossos sentidos. Im a g E s .c o m /c o r b Is /f o to a r E n a apriorismo kantiano nem todos os filósofos aderiram ao racionalismo ou ao empirismo. alguns buscaram um meio-termo para essas visões tão opostas. É o caso do apriorismo kantiano, formulado pelo filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804). Catedral de Rouen de manhã cedo. nessas pinturas da catedral de rouen (1892-1894), claude monet retrata não a catedral (a coisa em si, no dizer de Kant), mas a catedral tal como é apreendida pelo pintor com as variações de luz de um dia (o fenômeno). Catedral de Rouen ao meio-dia. Catedral de Rouen à luz do sol. m u s É E D 'o r s ay , P a r Is , f r a n ç a P u s H K In m u s E u m , m o s c o u , r ú ss Ia c La r K a r t In s tI tu tE , w IL LI a m s to w n , E u a 195Cap’tulo 10 O conhecimento FILOVU-191-201-U2-C10.indd 195 4/6/16 5:35 PM Kant afirmava que todo conhecimento começa com a experiência, mas que a experiência sozinha não nos dá o conhecimento. ou seja, é preciso um trabalho do sujeito para organizar os dados da ex- periência. assim, o filósofo buscou saber como é o sujeito a priori, isto é, antes de qualquer expe- riência. concluiu que o ser humano possui certas faculdades ou estruturas (as quais ele denomina formas da sensibilidade e do entendimento) que não apenas possibilitam a experiência, mas tam- bém determinam o conhecimento. Para Kant, portanto, a experiência fornece a matéria do conhecimento (os seres do mundo), enquanto a razão organiza essa matéria de acordo com suas formas próprias, as estruturas existentes a priori no pensamento – daí o nome apriorismo. Isso significa que o sujeito acaba sendo o centro do processo de conhecer, e não o objeto, motivo pelo qual essa doutrina é também conhecida como idealismo transcendental. (Estu- daremos o pensamento de Kant com mais detalhes no capítulo 15.) 5. ao nascermos, nossa mente é como um papel em branco. Explique essa afirmação, quem a formulou e a que corrente pertence. 6. somente devemos deixar-nos persuadir pela evidência de nossa razão. comente essa frase. 7. De que maneira Kant resolve o impasse criado por racionalistas e empiristas? 2. Razão ou experiência “Penso, logo existo.” Esse conhecimento a que chegou Descartes está fundado na razão ou na experiência? reúna-se com colegas para debater esse tema. análIse e entendImentO COnveRsa fIlOsófICa pOssibilidades O que podemos conhecer? Vejamos por último uma das mais importantes questões da gnosiologia: somos capazes de co- nhecer a verdade? É possível ao sujeito apreender o objeto? afinal, quais são as possibilidades do conhecimento humano? as respostas dadas a essas questões levaram ao surgimento de duas correntes básicas e antagô- nicas na história da filosofia. uma é o ceticismo, que diagnostica a impossibilidade de conhecermos a verdade. a outra é o dogmatismo, que defende a possibilidade de conhecermos a verdade. Conceito de verdade mas o que queremos dizer por verdade? Que verdade é essa da qual tratam tantos pensadores? a palavra verdade tem o sentido básico de uma correspondência entre o que se pensaou se diz e a realidade que se quer conhecer ou expressar. É o mesmo que conhecimento verdadeiro. no entanto, quando os diversos filósofos que tratam da temática do conhecimento falam em “conhecer a verdade”, estão se referindo não só a esse sentido básico, mas também – e princi- palmente – à ideia de conhecer como o objeto é em sua essência, ou seja, sua realidade intrín- seca. trata-se de conhecer o ser, a realidade essen- cial e metafísica das coisas (conforme estudamos no capítulo 6). se, por exemplo, um pássaro parece azul para algumas pessoas e verde-azulado para outras, qual será a cor verdadeira desse pássaro? será possível conhecer a verdade? Vejamos algumas das respostas dadas a essa pergunta. Destacaremos, além das correntes do ceticismo e do dogmatismo, uma terceira posição, o criticismo, que tenta superar o impasse criado por essas posições antagônicas. dogmatismo uma doutrina é dogmática quando, como dis- semos, defende a possibilidade de atingirmos a verdade. Essa interpretação pode seguir duas variantes: • dogmatismo ingênuo – tendência que confia plenamente nas possibilidades do nosso conhe- cimento (predominante no senso comum). não 196 Unidade 2 N—s e o mundo FILOVU-191-201-U2-C10.indd 196 4/6/16 5:35 PM vê problema na relação sujeito conhecedor e objeto conhecido. crê que, sem grandes dificul- dades, percebemos o mundo tal qual ele é; • dogmatismo crítico – tendência que defende nossa capacidade de conhecer a verdade me- diante um esforço conjugado de nossos sentidos e de nossa inteligência. assim, confia que, por meio de um trabalho metódico, racional e cien- tífico, o ser humano torna-se capaz de conhecer a realidade do mundo. Ceticismo uma doutrina é cética quando duvida da possi- bilidade de conhecermos a verdade ou nega essa possibilidade. Essa interpretação também pode seguir duas vertentes básicas, uma absoluta e outra relativa. Vejamos cada uma delas. Ceticismo absoluto muitos consideram o filósofo grego Górgias (c. 485-380 a.c.) o pai do ceticismo absoluto. Ele defendia as seguintes ideias: o ser não existe; se existisse, não poderíamos conhecê-lo; e, se pudés- semos conhecê-lo, não poderíamos comunicá-lo aos outros. outros estudiosos apontam o filósofo grego Pirro (365-275 a.c.) como o fundador do ceticis- mo absoluto. Por isso, chama-se muitas vezes o ceticismo de pirronismo. Pirro afirmava ser im- possível ao ser humano conhecer a verdade devido a duas fontes principais de erro: • os sentidos – o filósofo dizia que nossos conheci- mentos são provenientes dos sentidos (visão, au- dição, olfato, tato, paladar), mas estes não são dig- nos de confiança, pois podem nos induzir ao erro; • a razão – Pirro explicava que as diferentes e con- traditórias opiniões manifestadas pelas pessoas sobre os mesmos assuntos revelam os limites de nossa inteligência, razão pela qual jamais alcan- çaremos a certeza de qualquer coisa. o ceticismo absoluto despertou muita oposição. seus críticos consideram-no uma doutrina radical, estéril e contraditória. radical porque nega total- mente a possibilidade de conhecer. Estéril porque não leva a nada. contraditória porque, ao dizer que nada é verdadeiro, acaba afirmando que pelo menos existe algo de verdadeiro, isto é, o conhecimento de que nada é verdadeiro. O violinista verde (1923-1924) – marc chagall. a relatividade da experiência sensorial: como explicam diversos estudiosos, a percepção das cores não é apenas um fenômeno físico e neurológico, que varia entre as pessoas e entre as espécies, mas também cultural. g u g g E n H E Im m u s E u m , n E w y o r K , E u a Isto não é uma maçã (1964) – rené magritte. Procurando expressar o problema filosófico da relação do conhecimento com a realidade, o pintor belga compôs este quadro, que faz parte da série conhecida como “a traição das imagens”. c o L E ç ã o P a r tI c u L a r 197Cap’tulo 10 O conhecimento FILOVU-191-201-U2-C10.indd 197 4/6/16 5:35 PM Ceticismo relativo como o próprio nome diz, o ceticismo relativo consiste em negar apenas parcialmente nossa ca- pacidade de conhecer a verdade. ou seja, apresen- ta uma posição moderada em relação às possibili- dades de conhecimento se comparado ao ceticis- mo absoluto. Entre as doutrinas que manifestam um ceticismo relativo, destacamos as seguintes: • o subjetivismo – doutrina que considera o co- nhecimento uma relação puramente subjetiva e pessoal entre o sujeito e a realidade percebida. o conhecimento limita-se às ideias e representa- ções elaboradas pelo sujeito pensante, sendo im- possível alcançar a objetividade. o subjetivismo nasce com o pensamento do grego Protágoras, sofista do século V a.c., que dizia que “o homem é a medida de todas as coisas”, ou seja, a verdade é uma construção humana, ela não está nas coisas; • o relativismo – doutrina que considera não exis- tirem verdades absolutas, mas apenas verdades relativas a certo tempo, a determinado espaço social, enfim, a um contexto histórico; • o probabilismo – doutrina que propõe que nosso conhecimento é incapaz de atingir a certeza plena; tudo o que podemos alcançar é uma verdade pro- vável. Essa probabilidade pode ser digna de maior ou menor credibilidade, mas nunca chegará ao nível da certeza completa, da verdade absoluta; • o pragmatismo – doutrina que concebe os huma- nos como seres práticos, ativos, não apenas como seres pensantes. Por isso, para nós, verdadeiro é aquilo que é útil, eficaz, que dá certo, que serve aos interesses das pessoas em sua vida prática. ou seja, o que chamamos de verdade é mais a correspondência do pensamento com o objetivo a ser atingido do que a correspondência do pen- samento com o objeto propriamente dito. assim, para richard rorty, um expoente dessa corrente, […] interpretar alguma coisa, conhecer alguma coisa, penetrar em sua essência, e assim por diante, tudo isso são apenas diversas formas de descrever um processo para fazê-la funcionar. (A trajetória do pragmatista. Em eco, Interpretação e superinterpretação, p. 110.) fu n D a ç ã o g a La /s a LV a D o r D a LI , f Ig u E r a s , E s Pa n H a Galátea das esferas (1952) – salvador Dalí, óleo sobre tela. com sua crítica da razão, Kant realizou uma “revolução copernicana” na filosofia, pois propôs que os objetos são regulados pelas formas a priori de nosso conhecimento, e não o contrário, como sempre se supôs. Isso quer dizer que o que conhecemos é a “realidade para nós”, não a “realidade em si”. nós a construímos a partir de nossas próprias estruturas de sensibilidade e entendimento, como as várias esferas do quadro de Dalí compõem uma “galáxia”, um mundo com forma de rosto feminino (de gala Éluard Dalí). 198 Unidade 2 N—s e o mundo FILOVU-191-201-U2-C10.indd 198 4/6/16 5:35 PM