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1 Professora Débora Feres INTRODUÇÃO AO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES Sumário: 1. Conceito e âmbito do direito das obrigações. 2. Importância do direito das obrigações. 3. Características principais do direito das obrigações. 4. Relações com as outras ramificações do direito civil. 5. Direitos obrigacionais ou pessoais e direitos reais. 5.1. Principais distinções. 5.2. Figuras híbridas. 5.2.1. Espécies. 5.2.2. Obrigações propter rem. 5.2.2.1. Conceito. 5.2.2.2. Natureza jurídica. 5.2.3. Ônus reais. 5.2.4. Obrigações com eficácia real. 6. Evolução da teoria das obrigações. 7. Posição do direito das obrigações no Código Civil NOTAS INTRODUTORIAS E CONCEITOS Álvaro Villaça Azevedo, investigando um conceito contemporâneo de obrigação, ensina que “obrigação é a relação jurídica transitória, de natureza econômica, pela qual o devedor fica vinculado ao credor, devendo cumprir determinada prestação positiva ou negativa, cujo inadimplemento enseja a este executar o patrimônio daquele para a satisfação de seu interesse” (AZEVEDO, Álvaro Villaça. Teoria..., 2000, p. 31). Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho conceituam a obrigação, em sentido amplo, como a “relação jurídica pessoal por meio da qual uma parte (devedora) fica obrigada a cumprir, 2 Professora Débora Feres espontânea ou coativamente, uma prestação patrimonial em proveito da outra (credor)” (GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo Novo curso..., 2003, p. 17). Na versão clássica, para Washington de Barros Monteiro a obrigação pode ser conceituada como “a relação jurídica, de caráter transitório, estabelecida entre devedor e credor e cujo objeto consiste numa prestação pessoal econômica, positiva ou negativa, devida pelo primeiro ao segundo, garantindo-lhe o adimplemento através de seu patrimônio” (MONTEIRO, Washington de Barros. Curso..., 1979, p. 8). Elementos subjetivos da obrigação SÃO ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DA OBRIGAÇÃO a) elementos subjetivos: o credor (sujeito ativo) e o devedor (sujeito passivo); b) elemento objetivo imediato: a prestação; c) elemento imaterial, virtual ou espiritual: o vínculo existente entre as partes. 3 Professora Débora Feres Sujeito ativo e sujeito passivo SINALAGMA $ Embora seja frequente, na linguagem jurídica, dar o nome de crédito ao lado ativo da relação e reservar o termo obrigação para designar apenas o seu lado passivo, a obrigação abrange a relação globalmente considerada, incluindo tanto o lado ativo (o direito à prestação) como o lado passivo (o dever de prestar correlativo) Elemento objetivo ou material da obrigação O objeto imediato da obrigação, perceptível de plano, é a prestação, que pode ser positiva ou negativa. Sendo a obrigação positiva, ela terá como conteúdo o dever de entregar coisa certa ou incerta (obrigação de dar) ou o dever de cumprir determinada tarefa (obrigação de fazer). Sendo a obrigação negativa, o conteúdo é uma abstenção (obrigação de não fazer). CREDOR DEVEDOR 4 Professora Débora Feres Na definição de Antunes Varela, jurista português: “A prestação consiste, em regra, numa actividade ou numa acção do devedor (entregar uma coisa, realizar uma obra, patrocinar alguém numa causa, transportar alguns móveis, transmitir um crédito, dar certo número de lições, etc.). Mas também pode consistir numa abstenção, permissão ou omissão (obrigação de não abrir estabelecimentos de certo ramo do comércio na mesma rua ou na mesma localidade; obrigação de não usar a coisa recebida em depósito; obrigação de não fazer escavações que provoquem o desmoronamento do prédio vizinho). As quatro características fundamentais da obrigação retiradas da análise dos seus elementos, apontadas pelo Professor Catedrático da Universidade de Lisboa Menezes Leitão (MENEZES LEITÃO, Luis Manuel Telles de. Direito..., 2006, v. I, p. 91-101): 1) A patrimonialidade – pois a obrigação deve ser avaliável em dinheiro ou em valor (conteúdo econômico). 2) A mediação ou colaboração devida – uma vez “que o credor não pode exercer directa e imediatamente o seu direito, necessitando da colaboração do devedor para obter a satisfação do seu interesse” (MENEZES LEITÃO, Luis Manuel Telles de. Direito..., 2006, p. 94). 3) A relatividade – eis que a relação jurídica é estabelecida e gera efeitos entre os seus participantes. 4) A autonomia – pela existência de uma disciplina própria dentro do Direito Civil, qual seja o Direito das Obrigações. Elemento imaterial, virtual ou espiritual da obrigação 5 Professora Débora Feres O elemento em questão é o vínculo jurídico existente na relação obrigacional, ou seja, é o elo que sujeita o devedor à determinada prestação – positiva ou negativa –, em favor do credor, constituindo o liame legal que une as partes envolvidas. A doutrina das obrigações prende-se ao direito civil em geral: a. Pela teoria da capacidade do sujeito ativo e passivo delas; b. Pela teoria da propriedade e seus diversos modos de aquisição que elas pressupõem; c. Pelos direitos sucessórios que as transmitem O fato jurídico, como causa ou fonte da obrigação, é, todavia, elemento exterior à relação obrigacional. Não se confunde o contrato, o acordo negocial celebrado pelas partes, com a relação contratual dele emergente. A garantia, por sua vez, pertence mais ao foro processual da ação creditória. De sorte que os elementos que realmente integram a relação obrigacional são os três já mencionados: a) os sujeitos; b) o objeto; c) o vínculo ou conteúdo da relação O art. 391 do CC/2002, quando analisado em conjunto com os arts. 389 e 390, consagra a responsabilidade civil contratual ou negocial, presente nos casos em que uma obrigação assumida por uma das partes não é cumprida. O art. 389 deve ser aplicado para os casos de obrigação positiva (dar e fazer), enquanto o art. 390 para aqueles envolvendo obrigação negativa (não fazer). 6 Professora Débora Feres Direitos obrigacionais ou pessoais e direitos reais quanto ao objeto • porque exigem o cumprimento de determinada prestação, ao passo que estes incidem sobre uma coisa quanto ao sujeito • porque o sujeito passivo é determinado ou determinável, enquanto nos direitos reais é indeterminado (são todas as pessoas do universo, que devem abster-se de molestar o titular). quanto à duração • porque são transitórios e se extinguem pelo cumprimento ou por outros meios, enquanto os direitos reais são perpétuos, não se extinguindo pelo não uso, mas somente nos casos expressos em lei (desapropriação, usucapião em favor de terceiro etc.) quanto à formação • pois podem resultar da vontade das partes, sendo ilimitado o número de contratos inominados (numerus apertus), ao passo que os direitos reais só podem ser criados pela lei, sendo seu número limitado e regulado por esta (numerus clausus) quanto ao exercício • porque exigem uma figura intermediária, que é o devedor, enquanto os direitos reais são exercidos diretamente sobre a coisa, sem necessidade da existência de um sujeito passivo quanto à ação • que é dirigida somente contra quem figura na relação jurídica como sujeito passivo (ação pessoal), ao passo que a ação real pode ser exercida contra quem quer que detenha a coisa 7 Professora Débora Feres Concepção moderna das fontes das obrigações Pode-se, assim, resumidamente dizer que a obrigação resulta da vontade do Estado, por intermédio da lei, ou da vontade humana, por meio do contrato, da declaração unilateral da vontade ou do ato ilícito. No primeiro caso, a lei atua como fonte imediata, direta, da obrigação; nos demais, como fonte mediata ou indireta. OBRIGAÇÃO E RESPONSABILIDADE A responsabilidade é, assim, a consequênciajurídica patrimonial do descumprimento da relação obrigacional. Pode-se, pois, afirmar que a relação obrigacional tem por fim precípuo a prestação devida e, secundariamente, a sujeição do patrimônio do devedor que não a satisfaz. ARNOLDO WALD, depois de dizer que o dever de prestar surge do débito e que a ação judicial sobre o patrimônio surge da responsabilidade ou garantia, lembra que a distinção entre obrigação e responsabilidade foi feita por BRINZ, na Alemanha, que discriminou, na relação obrigacional, dois momentos distintos: o do débito (Schuld), consistindo na obrigação de realizar a prestação e dependente de ação ou omissão do devedor, e o da responsabilidade (Haftung), na qual se faculta ao credor atacar e executar o patrimônio do devedor a fim de obter o pagamento devido ou indenização pelos prejuízos causados em virtude do inadimplemento da obrigação originária na forma previamente estabelecida. Ex: O fiador é responsável por dívida do locatário. TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL A DOUTRINA SUSTENTA QUE NÃ SE DEVE CONSIDERAR RESOLVIDA A OBRIGAÇÃO QUANDO A ATIVIDADE DO DEVEDOR, EMBORA NÃO HAJA SIDO PERFEITA, APROXIMOU-SE CONSIDERAVELMENTE DO RESULTADO ESPERADO! ENUNCIADO 361 DA IV JORNADA DE DIREITO CIVIL . EMBORA QUE O STJ RECOMENDE CAUTELA NA APLICAÇÃO DESSA TEORIA REsp 1581505/SC .