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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ ESCOLA DE DIREITO CURSO DE DIREITO ANA CAROLINA BAUMGARTNER FERREIRA A APOSENTADORIA ESPECIAL E A FIXAÇÃO DE REQUISITO ETÁRIO: ANÁLISE DOS FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS LONDRINA 2020 ANA CAROLINA BAUMGARTNER FERREIRA A APOSENTADORIA ESPECIAL E A FIXAÇÃO DE REQUISITO ETÁRIO: ANÁLISE DOS FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS Artigo de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de bacharel em Direito. Orientador: Prof. Me. Paul Jürgen Kelter. LONDRINA 2020 ANA CAROLINA BAUMGARTNER FERREIRA A APOSENTADORIA ESPECIAL E A FIXAÇÃO DE REQUISITO ETÁRIO: ANÁLISE DOS FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de bacharel em Direito. BANCA EXAMINADORA _____________________________________ Professora Mestra Fernanda Raquel Thomaz de Araújo Pontifícia Universidade Católica do Paraná _____________________________________ Professor Mestre Paul Jürgen Kelter Pontifícia Universidade Católica do Paraná _____________________________________ Professora Mestra Raquel Cristina Silva das Neves Pontifícia Universidade Católica do Paraná Londrina, 25 de outubro de 2020. A APOSENTADORIA ESPECIAL E A FIXAÇÃO DE REQUISITO ETÁRIO: ANÁLISE DOS FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS THE SPECIAL RETIREMENT AND AGE REQUIREMENT SETTING: ANALYSIS OF CONSTITUCIONAL FOUNDATIONS Autor: Ana Carolina Baumgartner Ferreira1 Orientador: Prof. Me. Paul Jürgen Kelter2 RESUMO A Aposentadoria Especial consiste em uma espécie de benefício previdenciário conferido ao trabalhador que exerce suas atividades sujeitadas a condições especiais. O presente estudo busca analisar as principais mudanças da reforma da previdência no que concerne à aposentadoria especial e esgrimir o descumprimento dos princípios basilares da Constituição Federal, tais como o princípio da dignidade da pessoa humana e o principio do não retrocesso, entre outros, que configuram inconstitucional tal mudança e concomitantemente, o vislumbre da fixação de idade mínima como lesivo ao direito adquirido assegurado por lei. O problema a ser enfrentado se foca na ideia de que os danos concernentes à saúde e integridade dos trabalhadores que laboram em atividades insalubres ou perigosas não se encontram subordinada a uma faixa etária, mas ao tempo que ficam expostos aos agentes tidos como nocivos, pois o objetivo central da aposentadoria especial consiste na prevenção ou condução preventiva de lesões adversas, que não podem ser restauradas ou revertidas. O método de abordagem será dedutivo, de técnica argumentativa, com finalidade básica. Para resolução do problema será utilizada pesquisa qualitativa; já para elaboração do presente trabalho será utilizada pesquisa bibliográfica e documental composta principalmente de livros e artigos científicos, análise da legislação atual e levantamento jurisprudencial e doutrinário. O novo requisito culminaria, aparentemente, na descaraterização da aposentadoria especial com natureza preventiva, no que tange a proteção e preservação da saúde e integridade física e psíquica do laborado, sendo este o problema a ser pautado. Palavras-chave: Aposentadoria Especial. Fixação de Idade Mínima. Inconstitucionalidade. _______________ 1 Graduando do Curso de Direito do Curso da Pontifícia Universidade Católica do Paraná 2Advogado, mestre em Ciências Jurídicas pelo Centro de Ensino Superior de Maringá, professor de direito previdenciário, ética profissional e direito processual civil da PUC-PR. Professor dos cursos de pós-graduação em Direito da PUC-PR, IDCC, UNIVEL, Faculdade Integrado, UNIFIL, UNIPAR e EMATRA. ABSTRACT The Special Retirement consists of a security benefit conferred to workers who execute their activities in particular conditions. This study analyzes the most significant changes in the special retirement after the social security reform and examines the non fulfillment of basic principles found in the Federal Constitution, as the principle of dignity of the human person and the non-retrogression which configure unconstitutionally such change, and concomitantly foresees the glimpse of minimum age fixed as a harmful act to the constitutional rights ensured by law. The matter discussed focuses on the idea that the damages concerned to the health and integrity of workers who labor at hazardous activities are not related to their age range but the frequency they are exposed to toxic agents since the main objective of special pension consists in the prevention of adverse injuries that cannot be restored or reverted. The approach method will be deductive, based on argumentative technique with basic finality. Qualitative research will be used for problem-solving and the work will be elaborated by bibliographic and documental research of books, scientific articles, current legislation analyses, jurisprudence, and doctrinaire survey. This current requirement would culminate in the mischaracterization of the special pension preventive nature, regarding the protection and preservation of laborer’s physical and mental health, addressing the total attention to this problem. Key-words: Special Pension. Minimum Age Fixed. Unconstitutionality 4 1 INTRODUÇÃO A aposentadoria especial consiste em um benefício previdenciário. É uma das modalidades de aposentadoria por tempo de contribuição, contudo, o tempo é reduzido em detrimento aos demais. Isto porque, a finalidade primordial desta modalidade de aposentaria é garantir ao beneficiário do Regime Geral da Previdência Social uma compensação em razão do desgaste derivado do tempo de labor, que fora realizado em condições prejudiciais à sua integridade física ou psíquica, com potencial dano à saúde. Em 2019, foi promulgada a Emenda Constitucional 103, que alterou os requisitos para concessão da aposentadoria especial. Antes a promulgação da EC, o laborado tinha o direito de receber a aposentadoria especial caso preenchesse o requisito temporal de contribuição referente ao trabalho realizado. Após a Emenda, com a Reforma da Previdência, um novo requisito foi adicionado ao rol que regulamenta a concessão do benefício previdenciário: o requisito etário. Este requisito consiste na ideia de que o trabalhador, além de ter que preencher o requisito temporal de exposição ao ambiente nocivo, precisa atingir um segundo requisito, etário, sem o qual não poderá ser beneficiário da aposentadoria especial. Desta forma o trabalhador que labora exposto a agentes físicos, químicos e biológicos sendo nocivos à saúde, deverá cumprir tanto o requisito de contribuição quanto a idade mínima e tempo de exposição aos agentes prejudiciais. O problema a ser exposto encontra respaldo quando se verifica que a inclusão do requisito etário não considera o tempo que o agente já passou exposto a agentes físicos, químicos e biológicos nocivos à sua saúde. Os danos concernentes à saúde e integridade dos trabalhadores que laboram em atividades insalubres ou perigosas não se encontram subordinados a uma faixa etária, mas ao tempo que passam expostos aos agentes tidos como nocivos, pois o objetivo central da aposentadoria especial consiste na prevenção ou condução preventiva de lesões adversas, que não podem ser restauradas ou revertidas. A presente pesquisa tem como objetivo principal verificar a constitucionalidade da previsão que exige idade mínima para obtenção da aposentadoria especial, independente do tempo ao qual otrabalhador está exposto ao ambiente nocivo. 5 A reforma da aposentadoria especial recém imposta, aparentemente, fere a Constituição, pois pode levar a sofrimento os segurados que desempenham atividades insalubres ou perigosas, o que justifica a necessidade e utilidade do presente estudo. Para atingir a finalidade imposta, o método utilizado é o dedutivo, de técnica argumentativa, com finalidade básica. Para resolução do problema fora utilizada pesquisa qualitativa, tendo sido necessária uma pesquisa preliminar bibliográfica e documental composta principalmente de livros e artigos científicos, análise da legislação atual e levantamento jurisprudencial e doutrinário. 2 QUESTÕES FUNDAMENTAIS SOBRE APOSENTADORIA ESPECIAL O trabalho humano sempre se fez presente, contudo, primordialmente, sequer havia a noção de direito do trabalho, visto que nas sociedades antigas o tema era abordado por leis de servidão, regulando a relação entre o trabalhador e seu senhorio, onde o trabalhador era reduzido ao estado de coisa. 2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA E CONSTITUCIONAL Durante toda história, o homem e a mulher sempre cuidaram em garantir o seu próprio sustento e de sua família, entretanto, diante cenário de pobreza e enfermidade, o cidadão, por si só, não logra êxito, sendo este dependente do Estado. Os primeiros indicios da aposentadoria especial foram vistos na história por meio da advento da Lei Eloy Chaves, em 1923, que estabeleceu a proteção aos ferroviários, no qual, mais tarde abarcaram os marítimos e portuários, além dos trabalhadores dos serviços radiográficos e telegráficos, uma vez que se tinha o conhecimento de que estas profissões se encontravam vinculada a atividades árduas3. Esta modalidade de aposentadoria com caráter especial é um benefício previdenciário de prestação continuada, que surgiu com a Lei nº 3.807, de 28 de _______________ 3 AMADO, Frederico. Curso de Direito e Processo Previdenciário. Editora Jusprovm. 6ª ed. 2015. p. 88. 6 agosto de 1960. Na origem, sua avaliação juntava as opiniões trabalhistas de insalubridade, periculosidade e penosidade, sendo admitido, em suma, duas suposições de concessão, à pela categoria profissional e pela submissão a agentes nocivos4. A redação originária determinava que o segurado que contasse com, no mínimo, cinquenta anos de idade, quinze anos de contribuição e que tivesse trabalhado durante 15, 20 ou 25 anos em atividade laboral cujo exercício fora considerado insalubre, perigoso ou penoso5. Em 23 de maio de 1968, a Lei nº 5.440-A, suprimiu a exigência de idade, além disso, em 8 de junho de 1973 se teve a redução da carência para 5 anos por intermédio da Lei nº 5.8906. Posteriormente, em 24 de julho de 1991, a Lei nº 8.213, ao tratar da aposentadoria especial, retomou a carência em 15 anos e acabou por determinar a concessão do benefício ao segurado que se encontrasse abarcado pelo exercício de atividade que viesse a prejudicar sua saúde ou integridade física. A edição da Lei nº 9.032, de 28 de abril de 1995, acabou por modificar a Lei nº 8.213/91, trouxe uma relevante mudança no tocante aos conceitos da aposentadoria especial. O enquadramento por categoria profissional foi extinto, sendo o benefício, então, concedido em razão da comprovação do tempo de trabalho permanente, não intermitente, nem ocasional, em condições especiais que maleficiem a saúde ou a integridade física do trabalhador e da efetiva exposição dos laborados aos agentes nocivos ou prejudiciais a saúde. De acordo com Carlos Domingos, essa lei “poder ser rotulada como o marco incial das significativas alterações que sofreu a aposentadoria especial na vigência do Plano de Benefício da Previdência Social7. A partir da Lei 9.528/97, a relação de agentes nocivos para fins da aposentadoria especial passou a ser determinada pelo Poder Executivo e sua comprovação seria realizada por intermédio a apresentação do Perfil _______________ 4BARROSO, Geny Helena Fernandes. Aposentadoria Especial e a Conversão em tempo comum. Disponível em:<https://jus.com.br/artigos/15051/aposentadoria-especial-e-a-conversao-do-tempo- de-servico-especial-em-comum/3>. Acesso em: 15/09/2020, 5 DEUD, Cláudia Augusta Ferreira. Legislação Relativa à Aposentadoria Especial. Disponível em:<https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/estudos-e-notas-tecnicas/publicacoes-da- consultoria-legislativa/areas-da-conle/tema15/2005_4559.pdf>. Acesso em: 18/09/2020. 6DOMINGOS, Carlos Aposentadoria Especial.antes E Depois Da Reforma Da Previdência. São Paulo: LUJUR, 2020, p. 25. 7 DOMINGOS, Carlos Aposentadoria Especial.antes E Depois Da Reforma Da Previdência. São Paulo: LUJUR, 2020, p. 28. 7 Profissiográfico, sendo este um formulário emitido pela empresa fundado em laudo técnico das condições ambientais, expedido por engenheiro de segurança do trabalho ou médico do trabalho8. Em 11 de dezembro de 1998, a Lei nº 9.723, instituiu contribuição específica para esse benefício, sendo assim, passou a ter um custeio próprio. Além disso, estabeleceu que o laudo técnico das condições do ambiente de trabalho deveria abarcar as informações concernentes a utilização da tecnologia de proteção individual. Por fim, determinou que o segurado que retornasse ou permanecesse à mesma atividade que deu inicío a aposentadoria especial teria seu benefício abolido.9 Em seguida fora publicada a Emenda Constitucional n. 20/1998 onde alterou substancialmente o status da aposentadoria especial, a redação original detinha como garantia e com esta EC n. 20/98, passou a ser uma ressalva, sendo deslocado o artigo 202 para o artigo 20110. Em 2003, o Decreto n. 4.827 alterou os artigos 65 e 68 da Decreto n. 3.048/99, modificando substancialmente o conceito de permanência e instituiu uma nova metodologia para aferir alguns agentes nocivos. Alterou também os critérios acerca do enquadramento dos agentes biológicos e do elemento físico ruído11. No tocante a sua origem, no período de restauração da aposentadoria por tempo de serviço para os ferroviários e demais categorias de trabalhadores, esta provocou certo conflito com as aposentadorias da legislação específica, em especial, a do professor. _______________ 8DEUD, Cláudia Augusta Ferreira. Legislação Relativa à Aposentadoria Especial. Disponível em:<https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/estudos-e-notas-tecnicas/publicacoes-da- consultoria-legislativa/areas-da-conle/tema15/2005_4559.pdf>. Acesso em: 18/09/2020. 9DEUD, Cláudia Augusta Ferreira. Legislação Relativa à Aposentadoria Especial. Disponível em:<https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/estudos-e-notas-tecnicas/publicacoes-da- consultoria-legislativa/areas-da-conle/tema15/2005_4559.pdf>. Acesso em: 18/09/2020. 10“Art. 201. A previdência social será organizada sob forma (...) §1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão da aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados aos casos de atividades exercicias sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidos em lei complementar.” 11DEUD, Cláudia Augusta Ferreira. Legislação Relativa à Aposentadoria Especial. Disponível em:<https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/estudos-e-notas-tecnicas/publicacoes-da- consultoria-legislativa/areas-da-conle/tema15/2005_4559.pdf>. Acesso em: 18/09/2020. 8 Após dez anos sem modificações, em 16 de outubro de 2013 o Decreto n. 8.123 trouxe significativas mudanças aos artigos 64 a 69 do RGPS.12 Por fim, em 13 de novembro de 2019, a Emenda Constitucional restabeleceu o requisito etário para que houvesse a concessão do benefício, tal exigência, conforme aludido fora extirpada do ordenamento jurídico em 196813. Portanto, até novembro de 2019, a aposentadoria exigia carência mínima de 180contribuições, sendo devido ao segurado que se encontra submetido de forma habitual e permanente a riscos ambientais por exposição a agentes insalubres ou periculosos por 15, 20 ou 25 anos, conforme a natureza e o grau de nocividade do agente nocivo (físico, químico ou biológico). Atualmente a redação14 determina que para a concessão do benefício especial se faz necessário a permanência e habitualidade em atividade laboral _______________ 12DOMINGOS, Carlos Aposentadoria Especial.antes E Depois Da Reforma Da Previdência. São Paulo: LUJUR, 2020, p. 31. 13DOMINGOS, Carlos Aposentadoria Especial.antes E Depois Da Reforma Da Previdência. São Paulo: LUJUR, 2020, p. 31. 14 " Art. 1º A Constituição Federal passa a vigorar com as seguintes alterações: Art. 19. Até que lei disponha sobre o tempo de contribuição a que se refere o inciso I do § 7º do art. 201 da Constituição Federal, o segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social após a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional será aposentado aos 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, com 15 (quinze) anos de tempo de contribuição, se mulher, e 20(vinte) anos de tempo de contribuição, se homem. § 1º Até que lei complementar disponha sobre a redução de idade mínima ou tempo de contribuição prevista nos §§ 1º e 8º do art. 201 da Constituição Federal, será concedida aposentadoria: I - aos segurados que comprovem o exercício de atividades com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação, durante, no mínimo, 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, nos termos do disposto nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, quando cumpridos: a) 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 15 (quinze) anos de contribuição; b) 58 (cinquenta e oito) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 20 (vinte) anos de contribuição; ou c) 60 (sessenta) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 25 (vinte e cinco) anos de contribuição; Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade avançada; § 1º É vedada a adoção de requisitos ou critérios diferenciados para concessão de benefícios, ressalvada, nos termos de lei complementar, a possibilidade de previsão de idade e tempo de contribuição distintos da regra geral para concessão de aposentadoria exclusivamente em favor dos segurados: 9 expostas a agentes prejudiciais ou nocivos a saúde do trabalhador, além de cumprir a carência de 180 contribuições. 2.2 APOSENTADORIA ESPECIAL A aposentadoria especial, desde o princípio, foi um benefício com muitos questionamentos e sua aplicabilidade era concedida com rígidos requisitos, com avaliação e validação do direito e, consequentemente, sua concessão labutável. Consideráveis modificações sucederam em sua jornada legal até os dias atuais, entretanto, ainda se faz necessário diversos requisitos até sua concessão. 2.2.1 Conceito e Natureza Jurídica: A aposentadoria especial consiste em um benefício distinto concedido pelo Estado ao segurado que venha comprovar a permanente exposição a agentes nocivos. É umas das modalidades de aposentadoria por tempo de contribuição, entretanto, com redução do tempo. A finalidade primordial desta consiste na garantia ao beneficiário do Regime Geral da Previdência Social como forma de compensação em razão do desgaste derivado do tempo de labor realizado em condições prejudiciais à sua integridade física ou psíquica ou saúde. Nas palavras de Horvath Júnior, a aposentadoria especial consiste em um “Direito subjetivo excepcional de quem preenche aspecto especial porque requer, além do tempo de serviço, principalmente, a exposição ao risco15.” Sérgio Pardal, por sua vez, a define historicamente como “modalidade de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição diminuído para 15, 20 ou 25 anos em razão das condições de trabalho insalubres, perigosas ou penosas a que estiver submetido o trabalhador16”. É de suma importância ressaltar que, essa modalidade de aposentadoria se denomina “especial” em razão do efeito compensatório ou indenizatório ao trabalhador com o propósito de gratificar, de algum modo, a execução de atividades I - com deficiência, previamente submetidos a avaliação biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar; II - cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação. 15HORVATH JÚNIOR. Miguel. Direito Previdenciário. 10. ed. São Paulo: QuartierLatin, 2014, p 333. 16 FREUDENTHAL, Sérgio Pardal. Aposentadoria Especial. São Paulo: LTr, 2000. p. 13. 10 excepcionais, no entanto essenciais, com sua exposição constante ao risco, diferente das demais atividades comuns por representarem perigo de dano à sua saúde e integridade, física e psíquica. No tocante a sua característica “especial”, esta consiste no fato de retirar o trabalhador da exposição da atividade nociva como maneira de prevenir ocorrência futura de certeza relativa, enquanto as demais modalidades de aposentadoria apontam precaução à evento futuro e incerto. Para que haja a devida concessão deste benefício se faz necessário a comprovação de exposição da integridade física do empregado a agentes nocivos que é feita por meio do preenchimento do formulário Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), sendo preenchido pela empresa com base em Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT) declamado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho. Vale frisar, desde o princípio, a indicação nas diferenças típicas aos conceitos de prevenção e precaução. Enquanto a precaução consiste na proteção do segurado frente aos acontecimentos de determinado evento, tempo de contribuição ou até mesmo, idade avançada. A prevenção consiste na retirada prévia do trabalhador em atividade cuja execução são exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou integridade. Nas palavras de Carlos Domingos, é um benefício de natureza preventiva, que permite ao segurado exposto a agentes nocivos físicos, químicos, biológicos ou à associação destes agentes, “retirar-se aos aposentos” mais cedo, com o fito de preservar o que ainda lhe resta de saúde, exaurida justamente devido à esta exposição insalutífera ao longo de 15, 20 ou 25 anos.17 Para que haja a concessão deste benefício especial, o segurado deverá cumprir com os requisitos dispostos pela lei18 em vigor ao tempo em que este exerceu o labor com condição especial pelo qual, atualmente se faz necessário cumprir a carência de 180 contribuições e o requisito etário, além da habitualidade e permanência em atividades que prejudiquem a saúde ou a integridade física do trabalhador. _______________ 17DOMINGOS, Carlos Aposentadoria Especial.antes E Depois Da Reforma Da Previdência. São Paulo: LUJUR, 2020, p. 24. 18Art. 57 da Lei 2.213/91. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. 11 Destarte, conclui-se que aposentadoria especial, nas palavras de Saliba: “a aposentadoria especial pode ser definidacomo benefício previdenciário em razão das condições de trabalho com exposição a agentes físicos, químicos, biológicos ou associação desses agentes, passíveis de prejudicar a saúde ou a integridade física do trabalhador19.” 2.2.2 Princípios previdenciários e constitucionais Os princípios basilares de proteção do trabalhador encontram-se assegurados na Costituição Federal vigente, sendo estes o direito à vida, à saúde e direito ao meio de trabalho equilibrado. Estes direitos sociais são assegurados através dos princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade, da cidadania, princípio da vedação da proteção social insuficiente e do não retrocesso, tais são considerados de segunda geração, com força de cláusula pétrea, uma vez que são fundamentais. No tocante ao sistema de Seguridade Social, este tem previsão na Constituição Federal de 1988, tendo como finalidade auferida pelo Estado o bem estar social, atuando concomitantemente nas áreas de saúde, assistência social e previdência social, de maneira que as contribuições sociais galgaram a custear as ações do estado nas áreas citadas. A Constituição Federal traz em seu artigo 194, o conceito de seguridade social, onde dispõe ser o “conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”. A Previdência Social, por sua vez, possui caráter contributivo e de filiação obrigatória, encontra-se prevista no artigo 201 da Carta Magna, tendo como objetivo resguardar os segurados contra eventuais doenças, invalidez, morte, desemprego involuntário e idade avançada, ficando garantido a proteção à maternidade, o auxílio-reclusão e o salário família. Já a aposentadoria especial é um benefício de proteção ao trabalhador que esta sujeito a riscos ambientais que possam causar eventuais danos a saúde integridade física, psíquica, biológica e fisiológica ou ao risco de morte, tendo respaldo constitucional no artigo 201, parágrafo primeiro, consistindo em um direito _______________ 19 SALIBA, Tuffi Messias. Aposentadoria Especial. 2. ed. São Paulo: LTR, 2013, p. 7. 12 de segunda dimensão, de cunho social, com amparo no artigo 7º, Incisos XXIII e XXIV da Constituição Federal. Segundo Castro e Lazzari, a aposentadoria especial é espécie de aposentadoria por tempo de contribuição, com redução do tempo necessário à inativação, concedida em razão do exercício de atividades consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo que seria um benefício de natureza previdenciária que busca reparar financeiramente o trabalhador sujeito a condições de trabalho inadequadas20. Diante disso, a aposentadoria especial consiste em um benefício excepcional, com natureza extraordinária, tendo concessão restrita a determinadas categorias de segurados do Regime Geral de Previdência Social, objetivando preservar a integridade física do trabalhador, ao retirar o trabalhador antecipadamente do mercado de trabalho, sendo evidente seu cunho preventivo. Nas palavras de Frederico Augusto, fato é que o legislador poderia ter continuado categórico na oposição do trabalho em ambiente nocivo, o que levaria a inexistência desse benefício, fosse o caso de ter fixado um prazo para a eliminação ou a neutralização da insalubridade do ambiente de trabalho e penalidades rigorosas para aqueles que não cumprissem, contrapondo a aceitação do simples pagamento de adicional ao operário que fica exposto, o que implicaria na não obrigação de instituição do benefício especial21. A Emenda Constitucional 103/2019 que trouxe a reforma previdenciária, no que tange a aposentadoria especial, com relação à fixação da idade mínima violará os princípios garantidos na Constituição Federal, restando caracterizado o retrocesso, nos transportando de volta ao ano de 1960, onde se deu inicio a tudo. A recente fixação de idade mínima, por meio da Emenda Constitucional 103/09, caracteriza na prática a supressão da aposentadoria especial, podendo ser enquadrada em uma anulação a conquistas legislativas e judiciais dos segurados. Em suma, as alterações feitas no Regime Geral de Previdência Social, são as mais crúeis no tocante a Aposentadoria Especial, com prejuízo à diversos princípios legais. Muitos são os princípios constitucionais que norteiam a seguridade social e a aposentadoria especial, conforme encontram se alencados nos artigos 194, _______________ 20 CASTRO, Carlos Alberto Pereira; LAZZARI, João Batista Lazzari. Manual de Direito Previdenciário.12 a. ed. São José: Conceito Editoria, 2010. p. 637. 21 AMADO, Frederico Augusto Di Trindade, Direito Previdenciário Sitematizado. ed. 2. Salvador: Juspodivm, 2011. 13 paragráfo único e artigo 195, paragráfo 5º da Constituição Federal. Contudo, alguns princípios merecem destaques. Após a promulgação da atual Carta Magna na década de 90, algumas classes trabalhistas passaram a sofrer ataques no tocante a direitos sociais por meio de emendas constitucionais e medidas provisórias, com restrições e exclusões nos direitos fundamentais dos trabalhadores. Em razão disso, para ser resguardado os direitos constitucionais e conquistas sociais, surgiu o princípio do não retrocesso. Nas palavras de Cunha, este princípio consiste na “vedação ao legislador de suprimir arbitrariamente a disciplina constitucional ou infraconstitucional de um direito fundamental social” 22. Sendo assim, os direitos sociais já realizados e efetivados via medidas legislativas devem ser consideradas garantidas constitucionalmente e, caso haja quaisquer medidas que venham por extinguir, anular ou revogar estas, sem que se tenha uma medida alternativas que a substituam, são consideradas inconstitucionais visto a inviabilidade de proteção ao índividuo. Portanto, é dever do legislador manter o propósito de aumentar, progressivamente, as ferramentas para que se concretizem os direitos fundamentais sociais, por meio de garantias protetivas à medida que nela se evolui. Além disso, a dignidade da pessoa humana é, de modo geral, um dos grandes princípios do direito brasileiro. Sendo assim, dignidade é um termo que detém diversos significados, mas comumente está ligada a ideia de “merecimento ético”, em virtude de um status social ou de condutas baseadas em honradez e honestidade. É um cargo conferido a quem seja “merecedor”. Ingo Wolgang Sarlet, conceitua dignidade da pessoa humana como sendo uma qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existentes mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover _______________ 22CUNHA, Jarbas Ricardo Almeida. O princípio da proibição do retrocesso social como norte para o desenvolvimento do direito à saúde no Brasil. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/code2011/chamada2011/pdf/area8/area8-artigo3.pdf>. Acesso em: 10/10/2020 14 sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos23. A Pessoa humana, por sua vez, consiste em uma identificação jurídica baseada em critérios filosóficos e biológicos, distinguindo o homem dos demais seres vivios e objetos. Outrossim, os princípios constitucionais encontram sua compreensão e origem no homem, fundamento de todo dever, direito e arrazoamentos ao indivíduo. E, por se tratar de um fundamento, o homem não institui, em si, um princípio, uma vez que, o “fundamento não é um princípio, mas a justificação radical dos próprios princípios”24. Na esfera jurídica, como nas demais áreas,“o homem é a medida de todas as coisas25”. Em vista disso, o objetivo final do direito consiste na realização dos valores do ser humano, ou seja, o direito mais se aproxima de seu objetivo quanto mais se aproxima o homem, em todas as suas dimensões, sucedendo os valores que lhe são mais validos. Desta forma, a dignidade traduz-se em um atributo essencial da pessoa humana pelo simples fato de alguém “ser humano”, se tornando instantaneamente merecedor de proteção e respeito, independente de sua raça, origem, sexo, estado civil ou condição econômica. Nas palavras de Gisela Ramos, dignidade da pessoa humana consiste “no ponto de partida na construção dos direitos fundamentais, estes só podem ser assim qualificados se e quando forem expressão perfeita daquela, e não apenas nos estreitos limites das normas jurídicas, mas no amplo espaço da realidade pela qual todos e cada um de nós somos, indiscutivelmente, responsável”26. É um princípio fundamental inerente a todos os seres humanos desde a concepção ulterina, não sendo dependente ou vinculado a atribuição de personalidade jurídica ao titular, pelo qual automaticamente ocorre devido ao nascimento com vida. _______________ 23Sarlet, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constiuição Federal de 1988, pág 60. 24 COMTE-SPONVILLE, André. A sabedoria dos Modernos. Ed. Martins Fontes. 1999, p. 90. 25 Conforme renomada frase de Protágoras: “O homem é a medida de todas as coisas, das coisas que são, enquanto são, das coisas que não são, enquanto não são.” 26RAMOS, Gisela Gondin. Princípios jurídicos. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 407. 15 Rizzato Nunes27, por sua vez, declara ser este princípio como sendo um supraprincípio constitucional, ou seja, estando este acima dos demais princípios constitucionais. A dignidade constitui um valor universal, independente das diversidades sócio-culturais dos povos. Embora diferentes em sua singularidade, detém, pela sua condição humana, as mesmas faculdades e necessidades vitais.28 Outrossim, esta é composta por um conjunto de direitos existenciais compartilhados por todos os cidadãos, em igual proporção. Em razão disso, não há que se falar em maior ou menor dignidade, o homem apenas por ser não perde sua dignidade, por mais reprovável que seja sua conduta. Portanto, este princípio infere a igualdade entre os indivíduos. Este é um de seus pilares, segundo Peter Singer “o princípio da igual consideração de interesses não permite que a nossa prontidão em considerar os interesses dos outros dependa de aptidões ou de outras características destes, excetuando-se a característica de ter interesses.29” Outro pilar da dignidade é a liberdade na sua concepção ampla, onde permite o homem efetivar plenamente seus direitos existenciais. É imprescindivel a pessoa humana a liberdade interior, para realizar suas escolhas, sonhar, construir projetos e planos, manifestar suas opiniões. Contudo, isso não significa que o homem seja livre para ofender a honra alheia, ou expor a vida do outrem. A liberdade encontra limite frente a outros direitos que integram a personalidade humana, como é o caso da honra e da intimidade. Tais pilares encontram-se destacados no texto do artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, conforme traçado “Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. São dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”. Desta forma, a partir do momento em que o homem não é verdadeiramente livre, ou seja, não tem acesso a condições mínimas e dignas, como é o caso da saúde, educação, informação, não há que se falar em dignidade. _______________ 27 NUNES, Rizzato. Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana: Uma Análise do Inciso III, do Art. 1º, da Constituição Federal de 1988. São Paulo: Celso Bastos Editor, Intituto Brasileiro de Direito Constitucional, 1999, p. 19-20. 28 Cf. DALLARI, Dalmo de Abreu. Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo: Moderna. 2002. p. 8. 29 SINGER, Peter. Ética Prática. Ed. Martins Fontes. 1998, p. 32. 16 Certamente, o trabalho é considerado imprescindível à sobrevivência humana. Na origem da humanidade, o homem tem a possibilidade de usufruir de uma vida digna por meio do trabalho, visto que, em razão disso se afirma que o trabalho dignifica o homem. Em razão disso, quando se trata de trabalho, este deve ser visto sob a óptica daquele que preserva a integridade moral e física do trabalhador, uma vez que, caso contrário, o trabalho deixaria de ser uma ferramenta que dignifica o homem, resultando em uma fonte maléfica, sendo retomado sua antiga conotação que remetia ao instrumento romano de tortura, tornando este, um meio propicio a violar o princípio constitucional da dignidade humana. Sendo assim, é possível notar através da Constituição Federal em seus artigos 1º, inciso IV; artigo 6º; artigo 170 e artigo 193 buscam proteger a dignidade do trabalhador. Quando se trata de proteção da dignidade do trabalhor, isto significa em proteger o trabalhador em sua atividade e de seu ambiente de trabalho. “ulterior ao seu estado físico, psíquico e emocional da sua jornada de trabalho. Ademais, este princípio traz a vida como um bem inviolável, sendo subentendido respeito a integridade psíquica e física do trabalhador, assegurando condições adequadas e justas para a vida do individuo e de seus familiares, visto que tais condições devem ser estendidos e aplicados no meio de trabalho. Em uma nova era de valorização e ampliação dos direitos trabalhistas, a Constituição Federal inovou ao dedicar um capítulo exclusivamente ao ambiente de trabalho, o que antes não passava de uma fundamentação teórica, passou a ter status de norma fundamental, mesmo que não esteja presente no rol de direitos e garantias fundamentais. O conceito de ambiente de trabalho encontra-se fundado no artigo 225, conjugado com os dispositivos30 que tratam acerca da saúde e direitos do trabalhador presentes no texto da Constituição Federal. Em vista disso, a garantia do ambiente de trabalho equilibrado implica além de inexistência de fatores de risco no local de trabalho, mas também de condições que efetivam o bem-estar social do trabalhador e sua proteção. _______________ 30 Artigo 1º, inciso III, c/c artigo 3º, incisos I e IV, c/c artigo 5º, caput, c;c artigo 6º, c/c artigo 7º, caput, e incisos, c/c artigo 170, caput e inciso VI, c/c artigo 200, incisos II e VIII, caput, CF. 17 Desta forma, o ambiente de trabalho deve ser íntegro, haja vista proteger a saúde e segurança do empregado, para que assim este não seja acometido da dignidade do trabalhador em vista a relação trabalhista. Vale salientar que, a mera existência de EPI (equipamentos de proteção individual e/ou coletivo), que devem ser ofertados pelo empregador, não extinguem os riscos que possam vir a sofrer os trabalhadores, apenas buscam garantir a proteção frente a exposição aceitável, dentro de um limite de tolerância. No entanto, o legislador se importou em resguardar os trabalhadores que laboram em condições especiais, com a finalidade de impedir que o trabalhador viesse a ser tomado pela invalidez antes mesmo de usufruírem dos direitos previdenciários assegurados constitucionalmente pela aposentadoria especial em seu artigo 201 da Constituição Federal. Portanto, ampliar o tempo de exposição aos agentes nocivos, perigosos e penosos é, equivalente a reduzir o tempo de vida do segurado, agregando problemas a saúde, doenças ocupacionais, incapacidades. Além disso, acabará por aumentar o númedo de trabalhadores afastados por auxílio a doença e aposentadoria por invalidez, sendo violado a finalidade primordial inerente à aposentadoria especial. Outrossim, no que tange a igualdade, proporcionalidade e razoabilidade,a Constituição Federal de 1988 prevê, logo em seu preâmbulo que o ordenamento jurídico brasileiro tem como fim, dentres outros, assegurar a igualdade como soberano vulto de uma sociedade fraterna. Segundo Flávia Piovesan, encontra-se consolidado “tanto do Direito Internacional como no Direito Brasileiro, o valor da igualdade, com o respeito à diferença e à diversidade.31” Desta forma, nota-se que em nosso sistema jurídico, a igualdade fora elevada a uma condição especial, junto ao princípio da dignidade da pessoa humana, acima dos demais princípios. Nesse sentido José Afonso da Silva, citando Carmen Lúcia Rocha, afirma que “a igualdade constitucional é mais que uma expressão de Direito; é um modo justo de se viver em sociedade. Por isso é princípio posto como pilar de _______________ 31 PIOVESAN, Flávia. Implementação do direito à igualdade, Temas de direitos humanos, 2. ed., São Paulo: Max Limonad, 2003, p. 196 18 sustentação e estrela de direção interpretativa das normas jurídicas que compõem o sistema jurídico fundamental.32” O artigo 5º, caput, da Constituição Federal traz, por sua vez, o princípio constitucional da igualdade perante a lei. Este princípio dispõe a identidade de eficiência e possibilidades virtuais entre os cidadãos de usufruir de tratamento igualitário pela lei. Sendo assim, em vista do princípio da igualdade ficam vedadas quaisquer diferenciações arbitrárias e utópicas, não amparado pelos valores dispostos na Carta Magna. Nas palavras de José Afonso Silvam a “igualdade constitui o signo fundamental da democracia.33 Desta forma, o princípio da equidade pressupõe que os indivíduos sejam colocados em diferentes situações e em razão disso sejam tratados de forma deseiguais, na medida de suas desigualdades. Nas palavras de Nery Junior “dar tratamento isonômico às partes significa tratar os igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades34”. Portanto, ao pegar um grupo variado e tralá-los de forma igual, no que se refere a aposentadoria especial, viola o princípio resguardado pela Constituição Federal, visto que ao se fixar um requisito etário para os benefícios distintos, levando em consideração a expectativa de vida de cada individuo, acaba por aplicar uma fórmula àqueles que buscam a inatividade ao serem submetidos à condições severas. Conforme esclarece José Afonso Silva, o princípio não pode ser entendido em sentido individualista, que não leve em conta as diferenças entre grupos. Quando se diz que o legislador não pode distinguir, isso não significa que a lei deva tratar todos abstratamente iguais, pois o tratamento igual não se dirige a pessoas integralmente iguais entre si, mas àquelas que são iguais sob aspectos tomados em consideração pela norma, o que implica que os iguais podem diferir totalmente sob outros aspectos ignorados ou considerados irrelevantes pelo legislador.35 Ademais, a inconstitucionalidade não consiste na fixação de uma idade mínima, mas ao definir tal requisito sem ser considerado os agentes nocivos caso a _______________ 32SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo, 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 213. 33 Ibidem, p. 210. 34NERY, Junior, 1999. p. 42. 35 SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo, cit, p. 215.. 19 caso, havendo desproporcionalidade frente as questões fáticas que são impostas, como é o caso do ambiente de trabalho nocivo capaz de incapacitar o trabalhador ao fulminar a saúde do mesmo. Destarte, o presente princípio ainda requer que haja proporcionalidade e razoalidadedo requisito etário frente aos critérios previstos na atual Constituição Federal, de modo que, ao ser fixado algum novo requisito, não se tenha excesso de rigor ou acabe por diminuir a proteção social a ponto de a torná-la insuficiente. Por fim, o princípio da vedação da proteção insuficiente consiste em uma proibição de uma proteção deficiente, ou seja, consiste em uma não permissão de uma deficiência na prestação legislativa, de maneira a não resguardar bens jurídicos fundamentais, visto que, na aposentadoria especial, bem jurídico protegido é a saúde física, psíquica e biológica do trabalhador. Portanto, ao condicionar o benefício especial a requisitos etários, sem se observar as particularidades de nocividade das atividades insalubres, acabará aumentar radicalmente, o número de segurados afastados em razão de acidentes, invalidades, adoecimentos e até mortes decorrentes dos ambientes de trabalho. 3 ANÁLISE COMPARATIVA DA APOSENTADORIA PRÉ E PÓS REFORMA 3.1 APOSENTADORIA ESPECIAL ANTES DA REFORMA: Conforme já aludido, a aposentadoria especial é benefício previdenciário antecipado conferido ao trabalhador que labora em atividades expostas a agente químicos, biológicos e físicos, que acabam por causar prejuízo a integridade e saúde do trabalhador. Antes da promulgação da Emenda Constitucional 103/2019, o laborado detinha o direito à aposentadoria especial se preenchido o requisito temporal de contribuição referente ao trabalho realizado. Sendo assim os trabalhadores que exerciam atividades em minas subterrâneas detinham o direito ao benefício com 15 anos de contribuição. Nos casos de segurados que exerciam atividades em contato direto com amianto ou trabalho em minas podiam se aposentar com 20 anos de contribuição. 20 Já aqueles que exerciam atividades laborativas em outras funções, porém, expostos a agente nocivos, seriam necessários 25 anos de contribuição. A referida carência encontrava-se disposta no artigo 57 da Lei 8.213/91, conforme redação: A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei36. Vale ressaltar que aqueles trabalhadores que atingiram o tempo de contribuição antes da entrada em vigor da nova lei, detém direito adquirido e ainda há a possibilidade de se aposentar com as condições aqui descritas. Entretanto, já o segurando que se encontrava no mercado de trabalhando durante a promulgação da EC 103/19, porém, não preenchendo os requisitos, deverão seguir as novas regras. O trabalhador que estava no mercado de trabalho durante a reforma e não preencheu os requisitos deverá cumprir as novas condições. 3.2 APOSENTADORIA ESPECIAL APÓS A REFORMA: Após a Reforma da Previdência, promulgada com a Emenda Constitucional 103/2019, foi adicionado um novo requisito para a concessão desse benefício previdenciário, sendo este, o chamado requisito etário. Desta forma o trabalhador que labora exposto a agentes físicos, químicos e biológicos sendo nocivos à saúde, deverá cumprir tanto o requisito de contribuição quanto a idade mínima e tempo de exposição aos agentes prejudiciais. Tais requisitos são destinados aos segurados vinculados ao Regime Geral de Previdência Social e, encontram-se dispostos no artigo 19, paragráfo 1º, da Emenda Constituicional 103/19, que estabelece: Até que lei complementar disponha sobre a redução de idade mínima ou tempo de contribuição prevista nos §§ 1º e 8º do art. 201 da Constituição Federal, será concedida aposentadoria: I - aos segurados que comprovem o exercício de atividades com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação, durante, no mínimo, 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 _______________ 36BRASIL, lei 8.213/91. Art. 57 21 (vinte e cinco) anos, nos termos do disposto nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, quando cumpridos: a) 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 15 (quinze)anos de contribuição; b) 58 (cinquenta e oito) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 20 (vinte) anos de contribuição; ou c) 60 (sessenta) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 25 (vinte e cinco) anos de contribuição.37 Portanto, em conformidade com o requisito etário, os trabalhadores em minas subterrâneas deverão ter 15 anos de contribuição e idade mínima de 55 anos. Os segurados que trabalham em contato com amianto ou em minas deverão ter 20 anos de contribuição e idade mínima de 58 anos. Já os trabalhadores que exercem atividade laborativa exposto a agentes nocivos, deverão seguir os requisitos de 25 anos de contribuição e idade mínima de 60 anos. 3.3 ANÁLISE DOS RESULTADOS A aposentadoria especial se distingue das demais aposentadorias, especialmente, por retirar o trabalhador da exposição aos agentes nocivos de modo preventivo e na tentativa de amenizar ou afastar a possibilidade de ter sua saúde ou integridade física e psíquica afetada em razão do labor. Na concepção de Martins: “Trata-se de um benefício de natureza extraordinária, tendo por objetivo compensar o trabalho do segurado que presta serviços em condições adversas à sua saúde ou que desempenha atividade com riscos superiores aos normais38“. A grande problemática esta na ideia de que os danos concernentes à saúde e integridade dos trabalhadores que laboram em atividades insalubres ou perigosas não se encontram subordinada a uma faixa etária, mas ao tempo que ficam expostos aos agentes tidos como nocivos, pois o objetivo central da aposentadoria especial consiste na prevenção ou condução preventiva de lesões adversas, que não podem ser restauradas ou revertidas. Até a Emenda Contitucional 103/2019 o segurado detinha o direito de obter a aposentadoria especial preenchendo o requisito do tempo de contribuição _______________ 37BRASIL. Constituição (1988). Emenda Constitucional nº 103, de 12 de novembro de 2019. Art. 19. §1º. 38MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. São Paulo: Atlas, 2009, p. 353. 22 relacionado a atividade que ele realizava, após, ficou sujeito também ao requisito da idade mínima. O novo requisito culmina na descaraterização da aposentadoria especial como natureza preventiva, no que tange a proteção e preservação da saúde e integridade física e psíquica do trabalhador, sendo este o problema a ser pautado. A Emenda Constitucional 103, de novembro de 2019, trouxe sérias e profundas mudanças na Previdência Social Brasileira, mediante a admissão de novas regras, obstando sobremaneira o acesso a diversos benefícios previdenciários, impondo novos requisitos, alterando diversos tópicos, sendo prejudiciais aos segurados. A referida emenda constitucional é oriunda da PEC n. 06/2019, de autoria do Poder Executivo, tramitando perante o Congresso Nacional somente dez meses. Segundo o Carlos Domingos queimando importantes etapas do processo legislativo, aprovada em tempo que reputo insuficiente para que ocorressem os necessários estudos, análises e debates imprescindíveis para respaldar alterações de tamanha magnitude, que reduziram de maneira drástica e incisiva direitos e garantias fundamentais dos cidadãos brasileiros39. Ademais, segundo Domingos, a Nova Previdência é extremamente lesiva para os trabalhadores brasileiros e seus segurados, uma vez que caracteriza um evidente retrocesso social e colide de frente aos alicerces e finalidades da República Federativa do Brasil, estando dispostos nos artigos 1º e 3º da Carta Magna. A necessitade do requisito etário contrária a própria essência da aposentadoria especial, uma vez que, retira do benefício sua natureza necessariamente protetiva e preventiva. Este tema, inclusive, já fora debatido em sede do Congresso Nacional em 1968, onde os parlamentares e estudiosos da época entendido pelo descabimento da imposição de requesito etário para esta modalidade de prestação. Nas palavras de Carlos Domingos, mesmo decorridos quase cinquenta e dois anos da publicação da Lei nº 5.440-A/68, não surgiu nada de tão inovador nós cenários jurídico, médico e cientifico, nem nas décadas de 1970, 1980, etc., nem em 2019 capaz de provar que o organismo humano suporta uma considerável carga maior de exposição aos agentes nocivos conhecidos de forma que permita ao _______________ 39DOMINGOS, Carlos Aposentadoria Especial.antes E Depois Da Reforma Da Previdência. São Paulo: LUJUR, 2020, p. 361. 23 segurado permanecer tanto tempo mais sujeito a tais elementos deletérios, sem prejudicar incisivamente sua saúde.40 O legislador constituinte originário determinou como alicerce da nossa Carta Magna os valores sociais do trabalho e a dignidade da pessoa humana, entre outros, tendo como objetivos fundamentais a redução das desigualdades sociais e regionais, a erradicação da pobreza e a promoção do bem de todos. Vale ressaltar que o direito à previdência social é considerado uma garantia fundamental, conforme encontra-se disposto no artigo 6º da Constituição Federal, e que o primeiro princípio da seguridade social é a universalidade da cobertura e do atendimento41. Desta forma, a compreensão das novas redações dos artigos trazidos por meio da Emenda Constitucional 103/2019, não pode ocorrer de modo isolado, mas em conjunto com todo o conteúdo normativo constitucional, especificamente no que tange aos direitos e garantias fundamentais, os alicerces da atual Carta Magna. Carlos Domingos ainda afirma que, o caráter reducionista das disposições dos citados artigos da EC n. 103/19, a imposição de uma idade mínima como condição de acesso à aposentadoria especial, e a extinção da conversão dos períodos, não encontram arrimo quando estudados com o restante do texto constitucional, visto que afrontam gravemente os fundamentos objetivos da República, além de contrariarem diversos outros princípios fundamentais da Carta Cidadã.42 Outrossim, ao ser estabelecido um requisito etário para a inativação antecipada, sem haver uma apuração técnica ou cientifica, afronta a razoabilidade e a lógica, uma vez que, além de descaracterizar o caráter preventivo e protetivo deste benefício, acabará por inviabilizar sua concessão. Há que se falar, ainda, que a imposição etária para o presente benefício ainda obstruirá o acesso ao mesmo, visto que muitos segurados certamente ficarão incapacitados antes mesmo de concretizar o mencionado requisito, devido ao aumento de tempo ao exercício da atividade laboral. Domingos complementa dizendo, Por distarem veementemente da realidade; por não possuírem fundamento técnico, jurídico, médico, científico, econômico ou social; por ferirem _______________ 40DOMINGOS, Carlos Aposentadoria Especial.antes E Depois Da Reforma Da Previdência. São Paulo: LUJUR, 2020. p. 397, 41BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Art. 194, parágrafo único, I. 42DOMINGOS, Carlos Aposentadoria Especial.antes E Depois Da Reforma Da Previdência.cit, p. 398. 24 garantias fundamentais; por colidirem com as bases e finalidades da República; por agredirem a lógica e a razoabilidade, ao contrariarem a própria essência preventiva do benefício e, finalmente, por caracterizarem nítido retrocesso social, o implemento de idade mínima para fins de concessão de aposentadoria especial, assim como a eliminação da conversão, exigirão do intérprete do direito acurada atenção no sentido de verificar se as restrições impostas pelas novas normas encontram agasalho.43 Sendo assim, o caráter social da norma deve nortear o interpréte buscando uma solução adequada ao caso em que se encontra. Ou seja, há de ser averiguado o objetivo desejado pelo legislador contrapesando também o destinatário da norma, o trabalhador, beneficiário da Previdencia Social, expostos a agentes nocivos à sua saúde.Cumpre asseverar, ainda, que a imposição etária para a concessão desse benefício malfere o “sobreprincípio” da dignidade da pessoa humana, uma vez que, obrigará o trabalhador a permanecer exposto a agentes prejudiciais a sua saúde por mais tempo do que o permitido. Nesse diapasão Célia Rosenthal afirma que mesmo que não seja caso de lacuna do ordenamento jurídico, o princípio da dignidade há que ser observado a cada aplicação da lei, a cada julgamento, bem como a cada medida a ser tomada pelo Executivo ou pelo Legislativo, e em toda ação de qualquer índividuo da sociedade. É princípio cuja observação propicia o conhecimento do homem como ser digno de proteção.44 Leciona José Afonso da Silva: Dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida. 'Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais [observam Gomes Canotilho e Vital Moreira], o conceito de dignidade da pessoa humana obriga uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma qualquer ideia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido da dignidade humana defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a nos casos de direitos sociais, ou invocá-la para construir "teoria do núcleo da personalidade" individual, ignorando-a quando se trate de garantir bases existência humana. Daí decorre que a ordem econômica há de ter por fim assegurar a todos a existência digna (artigo 170), a ordem social visará realização justiça social (artigo 193), a educação, o desenvolvimento da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania (art.205) etc., não como meros enunciados formais, mas como indicadores conteúdo normativo humana.45 _______________ 43Ibidem, p. 399. 44 ZISMAN, Célia Rosenthal. Estudos de Direito Constitucional – O princípio da dignidade da pessoa humana. São Paulo: IOB-Thomson, 2005. p. 33. 45SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 109. 25 Logo, declinar ao trabalhador a compensação pela depreciação de sua saúde, possibilitando que se retire mais cedo dos ambientes laborais para lhe preservar o que ainda lhe resta de salubridade física, certamente não coaduna com o princípio da dignidade da pessoa humana. Ademais, o cabimento ou não da admissão de idade mínima na aposentadoria especial já foi matéria de estudos e discussão no âmbito do Congresso Nacional nos anos de 1968, onde o Poder Legislativo à época arbitrou que não seria cabível a imposição de idade mínima no que tange a aposentadoria especial. Portanto, se trata de um gritante retrocesso social, sem respaldo científico, o mesmo Poder da República adotar tal contudo totalmente contrária. Especificamente do que tange a proibição do retrocesso no ambiente das reformas previdenciárias, a Professora Thaís Riedel ensina: Embora as reformas dos regimes previdenciários sejam um fenômeno mundial, o Brasil tem realidade próprias, típicas dos países periféricos, que ainda não alacançaram um pleno Estado de bem-estar social, diferentemente dos países centrais. [...] Portanto, entende-se que enquanto ainda houver a probabilidade da ocorrência de um dano, cujo risco social já era protegido pela ordem jurídica, atráves de direitos sociais, não pode o legislador, mesmo sob o poder reformador da Constituição, retirar do ordenamento ou restringir sua proteção, sem alguma medida compensatória, enquanto risco ainda existir, sob pena de violar o princípio da vedação do retrocesso. Afinal, o núcleo essencial dos direitos fundamentais sociais encontra-se diretamente vinculado ao princípio da dignidade da pessoa humana que assegura acada indivíduo um conjunto de prestações materiais indispensáveis para uma vida com dignidade.46 Além disso, em conformidade com o artigo 1º da Carta Magna, em seu inciso IV, um dos fundamentos da República Federativa do Brasil é o valor social do trabalho, desta forma, quando realizado em condições contrárias e prejudiciais a saúde do trabalhador, deve receber proteção ainda mais reforçada. Destarte, qualquer regra que diminua ou limite esta proteção, deve ser vista como uma afronta aos princípios fundamentais da República. Domingos conclui dizendo, “qualquer restrição ao acesso à aposentadoria especial deve ser entendida como “investida” contra o direito a vida, não havendo fragmentação, classificação, separação dos direitos fundamentais do homem que _______________ 46ZUBA, Thais Maria Riedel de Resende. O Direito Previdenciário e o Princípio da Vedação do Retrocesso. São Paulo: LTr, 2013. p. 132-133. 26 possa respaldar tal atentado, muitos menos levianos e falaciosos argumentos econômicos, calcados em números e estatísticas inverídicos.47” Portanto, é possível afirmar que obrigar o trabalhador a perdurar muito mais tempo diante a condições agressivas a saúde em seu ambiente de trabalho, por meio da imposição de um requisito etário, se compreende em um grave atentado ao maior dos bens tutelados, qual seja, a vida, o que não deve ser admitido em qualquer esfera do direito. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Mediante as razões aqui expostas, que arguem por si, concomitante o que eventualmente se trata de atualidade, tem por finalidade o presente trabalho brunir á luz da razão a manutenção e sustentação de vitorias outrora alçadas no aspecto jurídico, trabalhista, calcada em nossa Carta Magna; A Reforma Previdenciária se faz necessária, mas é primordial manutenir a soberania conquistada. No decorrer do trabalho fora exposto o surgimento da previdência social em vista da necessidade humana e sua evolução histórica. O qual resvalou em alguns pontos específicos pertinentes a aposentadoria especial e seu nascimento, sendo cotejado o amparo social com os fins protetivos constitucionais. Fora, ainda, mencionados os pontos principais que violam os princípios constitucionais. É necessário destacar que a solução para dominar a inconstitucionalidade existente na Emenda Constituciona 103/19 baseia-se na individualização de cada trabalhador, uma vez que, não é possível determinar uma idade mínima para um determinado grupo. É preciso haver uma análise a fundo de cada caso a fim de melhor assegurar o direito do trabalhador. A conclusão que se chega é de que, por mais que nos últimos tempos se teve avanços acerca da conscientização da sociedade no tocante a importância da segurança do trabalho e da preservação da saúde ocupacional, ainda não são suficientes para extinguir as atividades em ambientes que acarretam risco à saúde e integridade do laborado. _______________ 47 DOMINGOS, Carlos Aposentadoria Especial.antes E Depois Da Reforma Da Previdência. cit. p. 403. 27 Logo, ao submeter o trabalhador a continuar por muito mais tempo frente a condições agressivas de saúde em seu ambiente de trabalho, por meio da adição de um requisito etário, apresenta um atentado ao maior dos bens tutelados, a vida, não devendo ser admitido. Por fim, a alteração ao critério de um benefício, que em suma já é considerado de injusta concessão, torna-se lesivo com a adição de requisitos objetivos que em nada se agregam como forma preventiva, ressarcitória ou protetiva; eficiente a retirar ou, tão pouco, amenizar os danos causados ao trabalhador. Conclui-se que a reforma da aposentadoria especial recém imposta, aparentemente, fere a Constituição, pois pode levar sofrimento aos segurados que desempenham atividades insalubre ou perigosas. 28 REFERÊNCIAS AGOSTINHO, Theodoro Vicente; Salvador, Sérgio Henrique; Silva, Ricardo Leonel da. A nova aposentadoria especial e inviabilidade protetiva pelaincompatibilidade do requisito etário a partir da pec 06/2019(reforma da previdência). Revista síntese trabalhista e previdenciária, são paulo, v. 30, n.366 , p.[09]-33, dez/2019. AMADO, Frederico Augusto Di Trindade.Direito Previdenciário Sitematizado. ed. 2. Salvador:Juspodivm, 2011. BARROSO, Geny Helena Fernandes. 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