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DISTÚRBIOS HEMODINÂMICOS EDEMA/CONGES TÃO/HIPEREMIA 1. INTRODUÇÃO O funcionamento adequado do cor po humano necessita, entre outras coisas, do bom aporte sanguíneo para os tecidos. Para isso, é impor tante que todos os componentes do sistema cardiovascular (coração, va sos sanguíneos e sangue) estejam íntegros. Problemas em qualquer um desses componentes podem gerar diversos distúrbios, sendo os principais: ede ma, congestão e choque, que são os distúrbios hemodinâmicos pro priamente ditos, ou seja, relacionados com a fração mecânica do sistema cardiovascular, e ainda hemorragia e trombose, que são distúrbios mais relacionados aos mecanismos de he mostasia. Esses problemas estão en tre as doenças cardiovasculares, que são o grupo de doenças que mais causam mortalidade e morbidade na contemporaneidade. 2. EDEMA Para compreender os mecanismos que provocam edema, é preciso o conhecimento da distribuição dos compartimentos corporais. De forma geral, os líquidos corporais se dividem em três compartimentos: intracelular, extracelular (interstício/ terceiro espaço) e vasos sanguíneos. Ou seja, toda a água do organismo (cerca de 60% do peso corporal) pode estar dentro dos células, no espaço entre elas ou compondo o sangue, que na verdade recebe a menor fração de água entre os três compartimentos. Na água, estão dissolvidos os de mais componentes do organismos. O movimento da água e dos solutos de baixo peso, como os sais, entre os espaços intravascular e intersticial é regulado pelas pressões hidrostáti ca/capilar, composta pelos líquidos, e coloidosmótica, composta principal mente pelas proteínas. Essas pres sões funcionam de forma oposta, ou seja, quando a pressão hidrostática está elevada, a pressão coloidal tende a estar mais baixa, o que basicamen te significa “tem muita água, ou seja, as proteínas estão mais dissolvidas por m³, ou seja, a pressão exercida por elas é menos DISTÚRBIOS HEMODINÂMICOS 4 O líquido sai dos vasos sanguíneos pela terminação arteriolar da micro circulação para o interstício, e daí a maior parte é reabsorvida na termi nação venular. No entanto, uma par te desse líquido fica retido no terceiro espaço, sendo drenada pelos vasos linfáticos para retornar ao sangue através do ducto torácico. Esse fluxo se repete de forma cons tante e ininterrupta na circulação san guínea, porém, quando o líquido se acumula no interstício ocorre o ede ma, o que é provocado pelo aumento da pressão capilar ou diminuição da pressão coloidal. O edema pode se formar em qual quer cavidade do corpo, e com isso recebe diferentes nomenclaturas, como ascite, que se refere ao edema na cavidade abdominal, hidrotórax, quando o líquido se acumula na ca vidade torácica, e assim por diante. Entretanto, o edema também pode ser generalizado, ou seja, por todo o corpo, o que é chamado de anasar ca (mesmas causas dos edemas não inflamatórios). Vale ressaltar que os edemas mais comuns ocorrem nos tecidos subcutâneos (sinal de cacifo), pulmões e cérebro. Figura 2. Pressões hidrostática e osmótica e drenagem linfática. Fonte: https://bit.ly/3ksCgmC DISTÚRBIOS HEMODINÂMICOS 5 Normalmente, o edema é composto por líquido pobre em proteína, sendo chamado de transudato, e esses ca sos são gerados por muitas doenças, especialmente insuficiência cardíaca, renal, hepática e desnutrição. Mas há também os tipos de edema gerados pelo processo inflamatório, no qual é chamado de exsudato e nesse caso o líquido é rico em proteínas – o ede ma aqui é causado pelo aumento da permeabilidade vascular, gerado na inflamação com o objetivo de facilitar a chegadas das células imunes para as regiões afetadas. SAIBA MAIS! Insuficiência cardíaca é uma condição na qual o coração se torna incapaz de bombear san gue suficiente para atender às necessidades do corpo, devido a anormalidades no miocár dio. Isso pode ser provocado por algumas infecções, infartos, defeitos valvulares, sobrecarga hemodinâmica (especialmente hipertensão arterial e DAC), entre outros fatores que causam lesão ao miocárdio. A insuficiência cardíaca pode ser tanto na câmara direita quanto na es querda, que podem ser diferenciadas por algumas manifestações características, porém em estágios mais avançados da doença as duas câmaras costumam estar comprometidas. O edema, no entanto, é mais característico da IC ventricular direita, devido à congestão venosa. Além de edema, pacientes com ICC podem cursar com dispneia, fadiga, dor torácica, entre outros sintomas cardiorrespiratórios. Com isso, é possível se dividir duas classes de edemas: edemas inflama tórios e edemas não inflamatórios. Edema inflamatório O edema inflamatório é causado pelo acúmulo de líquido nos locais de in flamação, o que ocorre graças ao au mento da permeabilidade vascular, que permite o escape do exsudato. A permeabilidade vascular pode ser au mentada por vários mecanismos: • Contração das células endote liais, gerando espaços intersticiais aumentados; • Lesão endotelial, causando necro se da célula endotelial e conse quentemente seu desprendimento; • Transporte aumentado de fluidos e proteínas através da célula endo telial (transcitose). Vale ressaltar ainda que o edema in flamatório normalmente estará acom panhado dos outros sinais flogísticos: rubor (vermelhidão), calor, dor e/ou perda de função. Edema não inflamatório As causas do edema não inflamató rio são: aumento da pressão hidros tática, redução da pressão coloidal, retenção de sódio e água e obstru ção linfática. Como já mencionado, o aumento da pressão hidrostática pode provocar drenagem venosa de ficiente na região gerando edema, o que ocorre, por exemplo, na trombo se venosa profunda que causa ede ma nas extremidades. Por outro lado, na insuficiência cardíaca, o edema é sistêmico, visto que a deficiência no bombeamento do sangue da câmara direita cardíaca para a artéria pulmo nar causa acúmulo de sangue na cir culação venosa. A redução da pressão coloidal é mais frequentemente causada pela defi ciência de albumina, principal pro teína plasmática, quando esta não é sintetizada adequadamente ou quan do a mesma é perdida, principalmen te na urina. Esse quadro se apresenta principalmente nas síndromes renais (nefrótica) e hepáticas (cirrose), mas também é comum em casos severos de desnutrição proteica. Sem a pres são exercida pela albumina, o líquido é “perdido” para o terceiro espaço, e então o edema é formado. Síndromes renais também podem causar edema por meio da retenção de sal, que ocorrem tanto nas desor dens primárias renais, quanto nos ca sos de hipoperfusão renal, comumen te causada pela insuficiência cardíaca (ICC). Como na ICC o maior problema é o déficit do débito cardíaco, o siste ma renina-angiotensina-aldosterona é ativado para reverter esse quadro, elevando as concentrações de ADH, retendo sal e consequentemente DISTÚRBIOS HEMODINÂMICOS 7 água. No início, esse mecanismo fun ciona, mas com o agravamento da ICC, o líquido retido aumenta apenas a pressão venosa, gerando edema. Na disfunção renal grave, é comum que inicialmente se forma edema periorbital. Por fim, a obstrução linfática pode ge rar linfedema, cuja causa mais conhe cida é a filariose (elefantíase). Nesse caso, a obstrução é gerada pela fibro se nos vasos linfáticos e linfonodos, que por sua vez é gerada pela presen ça das filárias (inflamação crônica). ICC SAIBA MAIS! icos A Síndrome nefrótica é caracterizada por proteinúria maciça (>3,5g/dia), hipoalbuminemia, edema generalizado (anasarca) e hiperlipidemia. Essa condição pode ser causada por qual quer doença que provoque o desarranjo das paredes dos capilares glomerulares, o que au menta a permeabilidade para as proteínas plasmáticas. Assim, pode ser idiopática ou secun dária a doenças como diabetes, amiloidose e lúpus eritematoso sistêmico (LES). O edema pode apenas sinalizar algu ma doença mas também pode gerar complicações. O edema pulmonar, por exemplo, que normalmente na insuficiência ventricular esquerda, impede a difusãodo oxigênio e tor na o ambiente mais vulnerável a in fecções bacterianas. Em outro caso, o edema cerebral pode causar hernia ção, devido a incapacidade craniana DISTÚRBIOS HEMODINÂMICOS 8 de se expandir, gerando lesão dos centros bulbares, o que é fatal – o cé rebro é “expulso” pelo forame magno ou comprime a perfusão do tronco cerebral. 3. HIPEREMIA E CONGESTÃO A hiperemia e congestão são resulta do do aumento local do volume san guíneo. A hiperemia é um processo ativo, que ocorre como consequência da dilatação arteriolar, como ocor re no músculo esquelético durante o exercício ou nos locais de inflamação, gerando aumento do fluxo sanguí neo. Nesses casos, forma-se eritema no tecido afetado por conta do “con gestionamento” dos vasos com san gue oxigenado. Em outras palavras, a hiperemia é provocada por processos fisiológicos que visam aumentar o flu xo sanguíneo em determinado local com a alguma finalidade. Figura 3. Hiperemia dos vasos oculares. Fonte: https:// bit.ly/3gO30Mi O processo de congestão por outro lado, é passivo e resulta da redução do fluxo sanguíneo no tecido, o que pode ser uma condição sistêmica, como ocorre na insuficiência cardía ca, ou local, como na obstrução veno sa isolada (trombose), ou seja, é um processo patológico. Os tecidos que sofrem congestão normalmente se apresentam com cianose, por conta da estase dos glóbulos vermelhos e acúmulo de hemoglobina desoxige nada. A congestão frequentemente provoca edema, por conta do aumen to do volume e da pressão. Nos ca sos crônicos, a congestão pode causa hipóxia crônica, gerando lesão teci dual isquêmica e cicatrização (fibro se). Além disso, a congestão crônica pode ainda causar pequenos focos hemorrágicos, que podem se apre sentar com grupamentos de macró fagos carregados de hemossiderina (pigmento amarelado), por conta do catabolismo dos glóbulos vermelhos extravasados. Os tipos de congestão mais comuns são a congestão pulmonar e a con gestão hepática, ambos podem ter manifestação aguda ou crônica. Na congestão pulmonar aguda, os capila res alveolares ficam congestionados, cursando com edema septal alveolar (aumento da pressão hidrostática) e hemorragia intra-alveolar focal. Já na congestão pulmonar crônica, os sep tos alveolares estão espessados e fibróticos, devido aos processos de DISTÚRBIOS HEMODINÂMICOS 9 inflamação crônica e cicatrização, e nesses casos os alvéolos costumam apresentar macrófagos carregados de hemossiderina (células da insufici ência cardíaca). Na congestão hepática aguda, a veia central e os sinusoides hepáticos se apresentam distendidos, os hepatóci tos centrolobulares podem estar se veramente isquêmicos, ao passo que os hepatócitos periféricos continuam bem oxigenados, porém apresentam SAIBA MAIS! Congestão pulmonar e Congestão Hepática: Tanto a congestão pulmonar quanto a hepá tica podem ser consequência da insuficiência cardíaca. A insuficiência ventricular esquerda gera congestão pulmonar por conta da redução da fração de ejeção, que provoca acúmulo de sangue nas câmaras esquerdas, que consequentemente sobrecarregam os vasos pulmona res, que não conseguem vencer a pressão, e consequentemente o sangue (oxigenado) fica acumulado nos vasos pulmonares. No caso da congestão hepática, normalmente a causa é a insuficiência cardíaca direita, visto que a incapacidade de expulsar o sangue da câmara direita para a artéria pulmonar gera uma congestão no sistema veia cava, consequentemente gerando sobrecarga venosa no fígado. Vale ressaltar que a insuficiência ventricular esquerda, quando não tratada, costuma gerar insuficiência na câmara direita também. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Robbins & Cotran - Patologia - Bases Patológicas Das Doenças - 9ª Ed. 2016. GOLDMAN, L. et al: Cecil Medicina. 25 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2018. Hoffbrand, A. Victor. Fundamentos em hematologia. 6. ed. Porto Alegre: Artmed,2013. ZAGO, Marco Antônio; FALCÃO, Roberto Passetto; PASQUINI, Ricardo. Tratado de hemato logia. São Paulo: Atheneu, 2013. FRANCO, Rendrik F. Fisiologia da coagulação, anticoagulação e fibrinólise. Medicina (Ribei rão Preto. Online), v. 34, n. 3/4, p. 229-237, 2001. DISTÚRBIOS HEMODINÂMICOS 31
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