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Anna lillian canuto bittencourt Ideias gerais • A anemia megaloblástica é um distúrbio ocasionado por um bloqueio na síntese do DNA, que se caracteriza por um estado em que a divisão celular se torna lenta, a despeito do crescimento citoplasmático; - Assincronia da maturação do núcleo em relação ao citoplasma, já que as células se preparam para uma divisão celular que não ocorre. • As células mais afetadas são aquelas que possuem renovação rápida: - Precursoras da medula óssea; - Células da mucosa do TGI. OBS: Pode ser vista também em leucócitos, plaquetas, língua e útero. • A anemia megaloblástica é uma das causas de anemia macrocítica, ou seja, com hemácias de tamanho e volume aumentado (VCM alto); • O termo “megaloblastose” não se refere a uma alteração no tamanho das hemácias circulantes, mas sim a uma anormalidade morfológica nos núcleos dos progenitores eritroides no interior da medula óssea; - Os eritroblastos que desenvolvem essa alteração nuclear são reconhecidos como megaloblastos. • Os megaloblastos são reconhecidos como células defeituosas pelos macrófagos da medula óssea, sendo destruídos no interior da própria medula (eritropoiese ineficaz); • A anemia megaloblástica está associada à carência de importantes cofatores para a síntese de DNA: - Vitamina B12 (cianocobalamina); - E/ou Ácido fólico (folato). Anemia megaloblástica Anna lillian canuto bittencourt Ácido fólico • O ácido fólico tem como principal função transferir carbonos (metileno) para dar origem a bases nitrogenadas, purinas e pirimidinas, constituintes do DNA; • O folato doador é o tetraidrofolato (THF) e, após a doação de grupos metileno, transforma-se em diidrofolato (DHF); • Sem a metilação adequada do DNA, os precursores hematopoiéticos começam a ter dificuldades na maturação do núcleo (o que ocorrer na deficiência de ácido fólico); • Principais fontes naturais: vegetais verdes frescos (+ importantes), fígado, aveia e algumas frutas; - Está na forma de poliglutamato. • A necessidade mínima diária aumenta de acordo com períodos de alta demanda metabólica, como lactação, gravidez ou hemólise; • O ácido fólico da doença é absorvido pelo duodeno e jejuno proximal, onde contêm enzimas em suas microvilosidades, chamadas carboxipeptidases; - Essas enzimas convertem o poliglutamato em mono ou diglutamato, permitindo uma rápida absorção. • Após ser absorvido, o folato circula no plasma como metiletraidrofolato (MHTF), um monoglutamato, ligado a proteínas; • Quando vai penetrar nas células, um grupamento metil é retirado de sua fórmula pela enzima metionina sintase (dependente da vitamina B12), liberando no citoplasma o tetraidrofolato – forma ativa do ácido fólico; - Isso demonstra uma interdependência do metabolismo do ácido fólico e da cobalamina (vitamina B12). • O maior reservatório corpóreo de folato é o fígado; • O folato é secretado na bile, para ser reabsorvido no jejuno, pela circulação êntero-hepática), além de ser excretado pela urina; • A deficiência de folato pode ser causada por: - Dieta inadequada; - Má absorção; - Utilização da vitamina de forma exagerada. • A má absorção de folato pode ser causada por um distúrbio primário da mucosa duodeno-jejunal ou pelo uso de medicamentos que interferem nesse processo, como a sulfasalazina e alguns anticonvulsivantes. Anna lillian canuto bittencourt CAUSAS DA DEFICIÊNCIA DE FOLATO: • A deficiência de ácido fólico pode ser causada por: - Alcoólatras; - Gestantes; - Portadores de síndromes disabsortivas no jejuno proximal, como a doença celíaca e o espru tropical. • Condições como gestação, anemia hemolítica crônica, câncer e doenças cutâneas esfoliativas (como psoríase) predispõem à carência de ácido fólico simplesmente por aumentarem a utilização desta vitamina; • As reservas de folato são reduzidas ao nascimento, e podem ser rapidamente depletadas em função do crescimento acelerado nessa fase; • Na criança prematura as necessidades são ainda mais elevadas, uma vez que a maior parte do armazenamento de folato ocorre ao final da gestação; • A concentração de ácido fólico no leite materno depende das reservas de folato da mulher e da duração da lactação; • O leite maduro possui maior concentração de ácido fólico do que o colostro. Vitamina B12 • A vitamina B12 é a cobalamina, um cofator de duas reações importantes: 1°: A cobalamina é cofator da enzima metionina sintase, que é a enzima responsável por transformar o folato em sua forma celular (que é a ativa); - Se houver uma deficiência de vitamina B12, a formação de THF a partir do MTHF é impedida; - A deficiência de cobalamina prejudica a síntese de DNA dessa forma, prejudicando a ação da enzima metionina sintase; - A reposição de altas doses de ácido fólico pode resolver PARCIALMENTE a anemia megaloblástica por carência de B12; - Na reação da metionina sintase, o grupamento metil do MTHF é transferido para a homocisteína, formando a metionina. Quando há a deficiência de folato ou de vitamina B12, esta reação fica prejudicada, levando a um aumento celular e plasmático de homocisteína; Anna lillian canuto bittencourt >> A hiper-homocisteína é lesiva ao endotélio, podendo aumentar o risco de aterosclerose. 2°: A segunda reação é a conversão do metilmalonil CoA em succinil Coa; - Na deficiência de B12 (sem relação com o ácido fólico), os níveis séricos e urinários de ácido metilmalônico aumentam significativamente, o que pode ser utilizado para fins diagnósticos; - O quadro neurológico devido a carência de B12 é devido a: >> Níveis aumentados de metilmalonil CoA, que promoverão a síntese de ácidos graxos não fisiológicos e se incorporam aos lipídios naturaias; >> A metionina, quando não formada adequadamente, promove uma diminuição da produção de fosfolipídios contendo colina, que são elementos fundamentais na formação da bainha mielina. • As únicas fontes dietéticas são os compostos de origem animal, como carnes, ovos e laticínios; - CUIDADO com vegetarianos estritos. • O principal reservatório corpóreo de vitamina B12 é o fígado; • A cobalamina da dieta vem sempre ligada às proteínas alimentares, precisando sofrer a ação do ácido gástrico e da pepsina para se desprender; • Durante a digestão gástrica, a cobalamina é liberada e imediatamente se liga a uma glicoproteína - o ligante R – que é secretado pela saliva e mucosa gástrica; • No duodeno, o complexo vitamina B12- ligante R é dissolvido sob a ação das proteases secretadas pelo pâncreas e a a B12 é liberada, sendo captada pelo Fator Intrínseco (FI); >> O FI é uma glicoproteína produzida pelas células parietais do fundo e corpo gástricos, secretada em paralelo com o ácido clorídrico. • O complexo B12-FI é resistente à degradação proteolítica e prossegue até o íleo distal, onde receptores específicos situados na borda em escova da mucosa Anna lillian canuto bittencourt ligam o complexo e possibilitam finalmente a absorção da vitamina. CAUSAS DE DEFICIÊNCIA DE B12: • A deficiência de vitamina B12 pode ser causada por: - Acloridria gástrica quando não ocorre a separação da vitamina B12 das proteínas alimentares; - Deficiência de fator intrínseco (anemia perniciosa, gastrectomia total); - Insuficiência exócrina pancreática (pancreatite crônica), em que não há a separação da B12-ligante R no lúmen duodenal; - Doença primária ou ausência da mucosa ileal; - Vegetarianos e populaçãoes de baixarenda, que não consomem, ao longo de anos, alimentos de origem animal, como carne, ovos, laticínios, em quantidades adequadas. • A anemia perniciosa é a doença que mais comumente causa deficiência de cobalamina, enquanto que o alcoolismo, a gestação e a desnutrição figuram como os principais fatores associados à carência de folato Anna lillian canuto bittencourt Fisiopatologia • A hematopoese normal compreende intensa proliferação celular, que por sua vez implica a síntese de numerosas substâncias como DNA, RNA e proteínas; • Tanto os folatos como a B12 são indispensáveis para a síntese da timidina, um dos nucleotídeos que compõem o DNA, e a carência de um deles tem como consequência menor síntese de DNA; - Os folatos, na forma de THF, cedem um radical metil para a dUMP, que se transforma em timina e será incorporada ao DNA. • A vitamina B12 participa indiretamente nessa reação, funcionando como coenzima da conversão de homocisteína em metionina e, simultaneamente, o MHTF em THF; • A síntese inadequada de DNA tem como consequência: - Modificações do ciclo celular; - Retardo da duplicação; - Defeitos no reparo do DNA. • Como a timidina não faz parte da estrutura do RNA, a síntese do mesmo não está impedida, por isso o crescimento celular/citoplasmático continua normal; - A célula cresce mas não se divide. • A maioria das células são destruídas na própria medula óssea; • O quadro morfológico do sangue periférico e da medula óssea é idêntico nas deficiências de folatos ou de vitaminas B12: • Essa desordem está mais evidente na série eritroide, mas também pode ser visto nas plaquetas e nos leucócitos; DISSOCIAÇÃO DE MATURAÇÃO NUCLEO- CITOPLASMÁTICA, produzindo células de tamanho aumentado e com alterações morfológicas características Anna lillian canuto bittencourt - Assim, além da anemia macrocítica, com megaloblastos na medula óssea e número de reticulócitos normal ou baixo, pode também ocorrer neutropenia, com neutrófilos polissegmentados e moderada plaquetopenia. • Além disso, essa desordem produz um aumento de morte celular intramedular, sendo que apenas 10-20% dos eritrócitos sobrevivem e tornam-se viáveis para o sangue periférico (hematopoese ineficaz). Manifestações clínicas • A principal manifestação clínica é a anemia; - Com queixas como palpitações, fraqueza, cefaleia, irritabilidade, etc. • Apesar de plaquetopenia e neutropenia ocorrerem com frequência, sangramento ou infecções secundárias à plaquetopania são pouco comuns; - Eventualmente nota-se petéquias e púrpuras devido a presença de plaquetopenia. • A deficiência da síntese de DNA afeta a divisão em outros tecidos em que há multiplicação rápida, como o TGI, podendo ter queixas como: - Diarreia; - Glossite (ardência, dor e aparência vermelha da língua, “língua careca”); - Queilite; - Perda do apetite; - Esplenomegalia discreta a moderada. • A deficiência de vitamina B12 determina ainda uma degeneração do cordão posterior da medula espinal, que inclui: - Sensações parestésicas dos pés (formigamento ou picada de agulhas), pernas e tronco; - Distúrbios motores, principlamnete dificuldades na macha; - Redução da sensibilidade vibratória; - Comprometimento da sensibilidade postural; - Marcha atáxica; - Sinal de Romberg; - Comprometimentos das sensibilidades termoalgésicas e dolorosa “em bota” ou “em luva”. • A tríade de fraqueza, dor na língua e parestesias é clássica na deficiência de vitamina B12; • São comuns manifestações mentais como a depressão e os déficits de memória, disfunção cognitiva e demência; • A deficiência de folatos não causa envolvimento do sistema nervoso, mas a sua deficiência durante a gravidez Anna lillian canuto bittencourt aumenta a incidência de defeitos de tubo neural em recém-nascidos. Tratamento • É preciso identificar a causa e removê- la, se possível; • Excepcionalmente há necessidade de tratar esses pacientes com transfusões sanguíneas, uma vez que a reposição do nutriente é acompanhada de pronta resposta, com rápida normalização hematológica; • Em casos de deficiência de ferro concomitante, o tratamento é simultâneo. TRATAMENTO PARA CARÊNCIA DE VITAMINA B12: • A anemia perniciosa deve ser tratada com vitamina B12 por via parenteral por toda a vida, uma vez que o defeito de absorção é irreversível; • Existem numerosos esquemas terapêuticos que se baseiam na noção de recompor os depósitos com doses iniciais repetidas, seguidas de injeções periódicas a intervalos regulares para suprir as necessidades; • Pacientes com atrofia gástrica e má absorção por dificuldade de dissociação da vitamina B12 do alimento e vegetarianos beneficiam-se preventivamente com doses orais de vitamina. TRATAMENTO PARA CARÊNCIA DE FOLATO: • Correção da dieta, aumentando a ingestão de verduras; • Ácido fólico por via oral na dose de 5mg/dia até que a causa da carência tenha sido removida; • Em muitos casos a causa da carência é autolimitada, como na gravidez e em prematuros; • Tratamento permanente é necessário em pacientes que têm doenças que aumentam o consumo de folatos, como anemias hemolíticas crônicas e pacientes submetidos à diálise. RESPOSTA TERAPÊUTICA: • A melhora subjetiva acontece em 48 horas, com o restabelecimento da hematopoese normal; • A contagem de reticulócitos aumenta até atingir o pico no 5-8° dia, e sua elevação é proporcional ao grau de anemia; • A hemoglobina e o hematócrito começam a melhorar já na primeira semana, e a hemoglobina deve atingir o seu valor normal em cerca de um mês; - Se isso não ocorrer, deve ser investigada a associação da anemia megaloblástica com outras doenças que cursam com anemia hipocrômica. Anna lillian canuto bittencourt • O número de neutrófilos normaliza em uma semana e hipersegmentação desaparece em 10-14 dias; • Quanto maior o tempo de duração dos sintomas neurológicos, menor a probabilidade de serem reversíveis. Pós-gastrectomia • A gastrectomia consiste na retirada de parte ou de todo o estômago, refazendo o trânsito gastrointestinal através de anastomose com o duodeno; • A mucosa gástrica é responsável pela produção da substância Fator Intrínseco (FI) que se liga a B12 para que ocorra a sua absorção no intestino; • Com a gastrectomia, a retirada da mucosa gástrica faz com que a FI não seja liberada e ocorra uma redução na absorção de B12 no intestino; - Pode também ocasionar uma anemia ferropriva. • O ácido fólico também pode estar deficiente, proveniente de uma ingestão diminuída desse composto, que pode ser suplementada com polivitamínicos; • Os pacientes pós-operados precisam ter um acompanhamento médico nutricional para que as deficiências e outras possíveis complicações da cirurgia possam ser identificadas e tratadas precocemente. Referências MEDCURSO. HEMATOLOGIA – Anemias Parte I. vol. 1, 2019. ZAGO, Marco Antônio; FALCÃO, Roberto Passetto; PASQUINI, Ricardo. Tratado de hematologia. São Paulo: Atheneu, p. 205-223, 2013.
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