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PASSADO, PRESENTE E FUTURO DA GASTROENTEROLOGIA FE DE RA Ç ÃO BR AS ILEIR A DE GASTROENTERO LO G IA 1949 2 Federação Brasileira de Gastroenterologia – FBG Editores Schlioma Zaterka Francisco Sérgio Rangel de Paula Pessoa Décio Chinzon Passado, presente e futuro da Gastroenterologia Temas de atualização do Curso FAPEGE da XIX Semana Brasileira do Aparelho Digestivo - SBAD Digital 2020 FE DE RA Ç ÃO BR AS ILEIR A DE GASTROENTERO LO G IA 1949 3 Copyright©2020 Federação Brasileira de Gastroenterologia – FBG ISBN: 978-65-88475-01-0. Todos os direitos reservados à FBG Av. Brigadeiro Faria Lima, 2391 – 10º andar CEP 01452-000 - São Paulo - SP cientifico@fbg.org.br Tel.: (11) 3813-1610 - Fax: (11) 3032-1460 Coordenação editorial e gráfica Fátima Lombardi Apoio Institucional Takeda Edição e produção Editora Mazzoni Ltda. • Rua Sapucaí, 74, Sala 12 CEP 06710-050 - Cotia - SP • Tel.: (11) 97042-7953 comercial@editoramazzoni.com Proibida a reprodução total ou parcial deste livro, por qualquer meio ou sistema, sem prévia autorização da FBG. A responsabilidade do conteúdo dos artigos é exclusivamente dos autores. 20-49601 CDD-616.3 NLM-WI-100 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Zaterka, Schlioma Passado, presente e futuro da gastroenterologia / Schlioma Zaterka, Francisco Sérgio Rangel de Paula Pessoa, Décio Chinzon. -- 1. ed. -- São Paulo : Editora Mazzoni, 2020. ISBN 978-65-88475-01-0 1. Aparelho digestivo 2. Gastroenterologia 3. Medicina 4. Saúde pública I. Pessoa, Francisco Sérgio Rangel de Paula. II. Chinzon, Décio. III. Título. Índices para catálogo sistemático: 1. Gastroenterologia : Medicina 616.3 Aline Graziele Benitez - Bibliotecária - CRB-1/3129 4 5 Presidente Schlioma Zaterka (SP) Vice-Presidente Áureo de Almeida Delgado (MG) Secretário Geral Décio Chinzon (SP) Diretor Financeiro Celso Mirra de Paula e Silva (MG) 1ª Secretária Eponina Maria O. Lemme (RI) 1º Tesoureiro Luís Alberto Sobral Sousa (PE) FAPEGE Sergio Pessoa (CE) Presidente Eleito Gestão (2021-2022) Décio Chinzon (SP) COMISSÕES PERMANENTES Comissão FAPEGE Sergio Pessoa (CE) – Coordenador Angelo Alves de Mattos (RS) Dulce Reis Guarita (SP) João Galizzi Filho (MG) Laercio Tenório Ribeiro (AL) Lorete Maria da Silva Kotze (PR) Comissão Ensino e Treinamento Américo de Oliveira Silvério (GO) - Coordenador André Castro Lyra (BA) DIRETORIA 2019 - 2020 Hoiti Okamoto (SC) Júlio Carlos Pereira Lima (RS) Liliana Sampaio Costa Mendes (DF) Luciana Teixeira de Campos (DF) Comissão Estatuto e Eleitoral Pedro Ferreira de Sousa Filho (PB) - Coordenador Fernando Antonio Barreiros de Araújo (AL) Irigracin Lima Diniz Basilio (PB) James Ramalho Marinho (AL) José Carlos Ferreira Couto (MG) José de Laurentys Medeiros Junior (MG) Comissão de Ética Médica e Defesa Profissional Mario Benedito Costa Magalhães (MG) - Coordenador Francisco Machado da Silva (DF) José Alves de Freitas (SP) José Nonato Fernandes Spinelli (PB) Luiz João Abrahão Jr. (RJ) Nestor Barbosa Andrade (MG) Comissão Jovem Gastro Adelia Carmen Silva de Jesus (DF) - Coordenadora Humberto Oliva Galizzi (MG) José do Carmo Junior (MG) Lysandro Alsina Nader (RS) Marina Pamponet Motta (BA) Odery Ramos Junior (PR) Comissão Título de Especialista Jorge Carvalho Guedes (BA) - Coordenador Ângelo Zambam de Mattos (RS) Edson Pedro da Silva (SC) Heraldo Arcela de C. Rocha (PB) Joffre Rezende Filho (GO) Octavio Augusto B. Gomes de Souza Junior (PA) 6 COMISSÕES TEMPORÁRIAS Diretor Departamento de Eventos Ismael Maguilnik (RS) - Coordenador Aloisio Antonio Costa Leite Carvalhaes (SP) Fabio Segal (RS) Frederico Passos Marinho (MG) Joaquim Prado P. de Moraes-Filho (SP) Comissão de Apoio e Atenção às Federadas James Ramalho Marinho (Al) - Coordenador Fernando Henrique Porto Barbosa Ramos (GO) Jardel Soares Caetano (BA) Ricardo Correa Barbuti (SP) Robério Motta (CE) Comissão de Assuntos Digitais Eduardo Nobuyuki Usuy Jr. (SC) - Coordenador Joffre Rezende Neto (GO) Lincoln Antinossi Cordeiro da Mata (MG) Marta Mitiko Deguti (SP) Osvaldo Flavio de Melo Couto (MG) Mônica Souza de Miranda Henriques (PB) Comissão das Ligas Acadêmicas Maria da Penha Zago Gomes (ES) - Coordenadora Abadia Gilda Buso Matoso (MG) Ana Luiza Vilar Guedes (SP) Angela Cerqueira Alvariz (RJ) Gardenia Costa do Carmo (CE) Manoel Carlos de Brito Cardoso (SC) Comissão de Pesquisa Luiz Gonzaga Vaz Coelho (MG) - Coordenador Beatriz Nunes Biccas (RJ) Lúcia Libanez Bessa Campelo Braga (CE) Marcellus H. L. Ponte de Souza (CE) Osvaldo Malafaia (PR) Tomás Navarro Rodriguez (SP) Comissão de Relações Internacionais Mauro Bafutto (GO) - Coordenador Antonio Marcio de Faria Andrade (MG) Eduardo G. Hourneaux de Moura (SP) Flavio Steinwurz (SP) Moisés Copelman (RJ) Lincoln Lopes Ferreira (MG) Comissão de Relações Governamentais Júlio César de Soares Veloso (DF) - Coordenador Fábio Ramalho Tavares Marinho (SP) José Mauro Messias Franco (MG) Liliana Andrade Chebli (MG) Laura Vilar Guedes (SP) Comissão de Acervo Histórico Jorge Luiz Jorge (SC) - Coordenador Ana Tereza Ramos Parpaiola de Mendonça (ES) Farid Butros Iunan Nader (RS) Laercio Tenório Ribeiro (AL) Luiz João Abrahão (RJ) Magnus de Oliveira Andrade (MG) Comissão de Gastropediatria Vera Lucia Sdepanian (SP) - Coordenadora Karina Cristiane Takahashi (SP) Comissão de Representação na ANVISA Magnus de Oliveira Andrade (MG) - Coordenador Áureo Augusto de Almeida Delgado (SP) Juliana Delgado Campos Mello (SP) Lorena Pithon Lins (BA) Wellington Monteiro Machado (SP) Ziad Wadie Bishara Badra (RS) Comissão de Editores da FBG na Revista da AMB Carlos Eneas Soares Ricca (CE) - Coordenador Antonio Carlos da Silva Moraes (RJ) Andrea Vieira (SP) 7 Comissão de Representação na AMB Diretoria da FBG: Presidente/Vice/ Secretário Representante no CFM de Cirurgia Bariátrica e Síndrome Metabólica Alexandre Buzaid Neto (SP) - Coordenador Representante na Comissão Nacional de Acreditação Matheus Freitas Cardoso de Azevedo (SP) - Coordenador Editores da GED (Gastroenterologia e Endoscopia Digestiva) Maria do Carmo Friche Passos (MG) - Coordenadora Editor da Revista Arquivos de Gastroenterologia Maria do Carmo Friche Passos (MG) - Coordenadora Editor da Revista FBG Joaquim Prado P. de Moraes-Filho (SP) - Coordenador Comissão Administrativa de Assessoria à SBAD 2019 – Cidade Sede – Fortaleza – Sergio Pessoa (CE) 2020 – Cidade Sede – Florianópolis – Viriato João Leal da Cunha (SC) Comissão Científica de Assessoria à SBAD Associações Filiadas: Rogério Saad-Hossne (SP) - GEDIIB / Grupo de Estudos da Doença Inflamatória Intestinal do Brasil Maria do Carmo Friche Passos (MG) - NBEHPM / Núcleo Brasileiro para Estudo de Helicobacter Pylori e Microbiota José Galvão Alves (RJ) - SBP / Sociedade Brasileira do Pâncreas Ricardo Guilherme Viebig (SP) - SBMDN / Sociedade Brasileira de Motilidade Digestiva e Neurogastroenterologia Sergio Pessoa (CE) - FAPEGE / Fundo Aperfeiçoamento e Pesquisa em Gastroenterologia Comissão de Credenciamento de Cursos Eliza Maria de Brito (MG) - Coordenadora REGIÃO SUL Gabriela Perdomo Coral (RS) - Coordenadora Antônio Cardoso Sparvoli (RS) Eduardo Nobuyuki Usuy Jr. (SC) Glenio Dias Fernandez (RS) Helenice Pankowski Breyer (RS) Hoiti Okamoto (SC) Júlio César Pisani (PR) REGIÃO NORTE / NORDESTE Gardenia Costa do Carmo (CE) - Coordenadora Alan Dave Furtado de Souza (SE) Fabio Gomes Teixeira (MA) Joceli Oliveira dos Santos (PI) Leonardo Soares da Silva (AM) Miraldo Nascimento da Silva Filho (SE) Simone Deda Lima Barreto (SE) REGIÃO CENTRO-OESTE Jonio Arruda Luz (TO) - Coordenador Cacilda Pedrosa de Oliveira (GO) Fernando Henrique Porto Barbosa Ramos (GO) Liliana Sampaio Costa Mendes (DF) Luciana Araujo Bento (MS) Luciana Teixeira de Campos (DF) REGIÃO SUDESTE Luciana Lofêgo Gonçalves (ES) - 8 Coordenadora Eliza Mariade Brito (MG) Guilherme Eduardo Gonçalves Felga (SP) Guilherme Marques Andrade (SP) Liliana Andrade Chebli (MG) Nayle Villela Leite (RJ) COMISSÃO PROJETO DIRETRIZES FBG/AMB Aderson Omar Mourão Cintra Damião (SP) - Coordenador Luciana Dias Moretzsohn (MG) Edna Strauss (SP) Gerson Ricardo de Souza Domingues (RJ) Júlio Maria Fonseca Chebli (MG) Raquel Canzi Almada de Souza (PR) COMISSÃO FBG MULHER Jozelda Lemos Duarte (PI) - Coordenadora Ana Flávia Passos Ramos (MG) Betânia da Costa Cavalcante (PA) Claudia Pinto Marques S. Oliveira (SP) Elaine Moreira Ferreira (MT) Mônica Souza de Miranda Henriques (PB) COMISSÃO GASTRO-ARTE Luiz Eduardo da Silva Goes (BA) - Coordenador CONSELHO FISCAL Titulares Uyapuran Torres Medeiros (PE) Justiniano Barbosa Vavas (AC) Fernando Cordeiro (SP) Suplentes Nelma Pereira de Santana (BA) Roberto Oliveira Dantas (SP) Columbano Junqueira Neto (DF) SOCIEDADES FEDERADAS SOCIEDADE ALAGOANA DE GASTROENTEROLOGIA Fernando Antonio Barreiros de Araújo SOCIEDADE AMAZONENSE DE GASTROENTEROLOGIA Everton Ricardo de Abreu Netto SOCIEDADE DE GASTROENTEROLOGIA DA BAHIA Bruno Cesar da Silva SOCIEDADE DE GASTROENTROLOGIA DE BRASÍLIA Zuleica Barrio Bortoli SOCIEDADE CEARENSE DE GASTROENTEROLOGIA Rodrigo Vieira Costa Lima SOCIEDADE DE GASTROENTEROLOGIA DO ESPÍRITO SANTO Hélio Renato Carvalho Fischer SOCIEDADE GOIANA DE GASTROENTEROLOGIA Luiz Henrique de Sousa Filho SOCIEDADE MARANHENSE DE GASTROENTEROLOGIA Livia Ronise Garcia Arraes SOCIEDADE MATO-GROSSENSE DE GASTROENTEROLOGIA E NUTRIÇÃO Elza Maria Moreira Gil SOCIEDADE SUL-MATO-GROSSENSE DE GASTROENTEROLOGIA Heitor Soares de Souza SOCIEDADE DE GASTROENTEROLOGIA E NUTRIÇÃO DE MINAS GERAIS Eduardo Garcia Vilela felipespalenza Realce felipespalenza Realce 9 SOCIEDADE DE GASTROENTEROLOGIA E NUTRIÇÃO DA PARAÍBA Irigracin Lima Diniz Basilio SOCIEDADE PARAENSE DE GASTROENTEROLOGIA Roger Barata Ataide SOCIEDADE PARANAENSE DE GASTROENTEROLOGIA E NUTRIÇÃO Raquel Canzi Almada de Souza SOCIEDADE PERNAMBUCANA DE GASTROENTEROLOGIA Ana Botler Wilhem SOCIEDADE DE GASTROENTEROLOGIA DO PIAUÍ Conceição de Maria de Sousa Coelho SOCIEDADE DE GASTROENTEROLOGIA DO RIO DE JANEIRO Antonio Carlos da Silva Moraes SOCIEDADE DE GASTROENTEROLOGIA DO RIO GRANDE DO NORTE Silvio José de Lucena Dantas SOCIEDADE GAÚCHA DE GASTROENTEROLOGIA Eduardo Emerim SOCIEDADE CATARINENSE DE GASTROENTEROLOGIA Odemari Miranda Ferrari SOCIEDADE DE GASTROENTEROLOGIA DE SÃO PAULO Alexandre Buzaid Neto SOCIEDADE DE GASTROENTEROLOGIA DE SERGIPE Fernando Every Belo Xavier SOCIEDADE DE GASTROENTEROLOGIA DO TOCANTINS Jonio Arruda Luz 10 11 AUTORES Andrea Benevides Leite Mestre em Hepatologia pela Universidade Federal de Ciências da Saú- de de Porto Alegre (UFCSPA). Docente da Faculdade de Medicina da Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Preceptora da Residência Mé- dica em Gastroenterologia do Hospital Geral de Fortaleza (ESP-CE). CRM-CE 7919. Angelo Alves de Mattos Professor Titular da Disciplina de Gastroenterologia e do Curso de Pós- -Graduação em Hepatologia da Universidade Federal de Ciências da Saú- de de Porto Alegre (UFCSPA). CRM-RS 7.089. Ângelo Zambam de Mattos Professor Adjunto de Gastroenterologia e do Curso de Pós-Gradu- ação em Hepatologia da UFCSPA. Mestre e Doutor em Hepatologia. CRM-RS 30.106. Carlos Brito Professor Adjunto de Medicina Clínica da Universidade Federal de Per- nambuco – UFPE. Coordenador Científico do Instituto Autoimune de Pesquisa. Mestre em Medicina Interna da Universidade Federal de Per- nambuco. Doutor em Ciências pelo Instituto Aggeu Magalhães - FIO- CRUZ-PE. Membro Titular do Grupo de Estudo da Doença Inflamatória Intestinal do Brasil - GEDIIB, da Federação Brasileira de Gastroentero- logia - FBG e da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva - SOBED. CRM-PE 10.107. 12 Celso Mirra de Paula e Silva Membro Titular da Federação Brasileira de Gastroenterologia – FBG. Ex-Presidente da Associação Mineira de Gastroenterologia. Membro do American College of Gastroenterology. Administração em Saúde pela Fundação Ezequiel Dias. Membro da Diretoria da Federação Brasileira de Gastroenterologia – FBG, Biênio 2019-2020. CRM-MG 5.457. Décio Chinzon Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – FMUSP. Médico Assistente Doutor do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – HCFMUSP. CRM-SP 49.552. Francisco Sérgio Rangel de Paula Pessoa Chefe do Serviço de Gastroenterologia do Hospital Geral de Fortaleza. Preceptor da Residência Médica em Gastroenterologia do Hospital Ge- ral de Fortaleza (ESP-CE). Coordenador da FAPEGE da Federação Brasi- leira de Gastroenterologia. Vice-Presidente eleito da Federação Brasilei- ra de Gastroenterologia. CRM-CE 4.848. Glauber Lima da Cunha Junior Acadêmico da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Cariri - UFCa. Luiz Gonzaga Vaz Coelho Professor Titular do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG. Coordena- dor Médico do Instituto Alfa de Gastroenterologia do Hospital das Clíni- cas da Universidade Federal de Minas Ferais - UFMG. CRM-MG 6.666. Maria Clara de Freitas Coelho Professora da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais - CMMG. Mestre em Ciências Aplicadas à Saúde do Adulto pela Universidade Fe- deral de Minas Gerais - UFMG. Gastroenterologista pela Federação Bra- sileira de Gastroenterologia – FBG. CRM-MG 49.015. 13 Maria do Carmo Friche Passos Professora Associada da Faculdade de Medicina da Universidade Fede- ral de Minas Gerais - UFMG. Pós-Doutora em Gastroenterologia pela Universidade de Harvard, Estados Unidos. Presidente do Núcleo Brasi- leiro para Estudo do H. pylori e Microbiota. Ex-Presidente da Federação Brasileira de Gastroenterologia - FBG. CRM-MG 18.599. Miriam Chinzon Médica Residente do Departamento de Clínica Médica da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. CRM-RJ 52.116382-5. Raquel Canzi Almada de Souza Professora Adjunta do Departamento de Clínica Médica, na Disciplina de Clínica Médica Ambulatorial e Médica, da Universidade Federal do Para- ná - UFPR. Serviço de Endoscopia Digestiva da Universidade Federal do Paraná - UFPR. Médica do Centro de Videoendoscopia Avançada - Curi- tiba, PR. CRM-PR 11.228. Rebeca Mont’Alverne Barreto de Paula Pessoa Acadêmica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Cariri - UFCa. Schlioma Zaterka Presidente da Federação Brasileira de Gastroenterologia – FBG. CRM-SP 8.533. 14 PREFÁCIO Apesar de toda dificuldade decorrente da pandemia pelo COVID-19, a nossa Federação Brasileira de Gastroenterologia (FBG) conseguiu atingir praticamente todas as metas almejadas. Isto somente foi possível graças ao esforço de todas as nossas Federadas, Comissões e Diretoria. Nessa nova experiência, em que tudo se tornou virtual, preci- sávamos nos adaptar a outra realidade. Nosso curso da FAPEGE também foi virtual, entretanto, a tradicional expressão impres- sa do curso está aqui, agora, nesse momento, para todos vocês, graças ao patrocínio da Takeda, a quem muito agradecemos. Um agradecimento especial a Comissão da FAPEGE, coorde- nada de modo exemplar pelo nosso incansável, Sérgio Pessoa. Uma ótima leitura a todos! Schlioma Zaterka Presidente da Federação Brasileira de Gastroenterologia (FBG) Biênio 2020-2021. 15 Capítulo 1 Hemorragia digestiva alta varicosa .............................................................................. 17 Angelo Alves de Mattos Ângelo Zambam de Mattos Capítulo 2 Microbiota e NASH ............................................................................................................ 27 Andrea Benevides Leite Francisco Sérgio Rangel de Paula Pessoa Glauber Lima da Cunha Junior Rebeca Mont’Alverne Barreto de Paula Pessoa Capítulo 3 Pancreatite aguda grave ...................................................................................................35 Raquel Canzi Almada de Souza Capítulo 4 Doença celíaca: o presente e o futuro .......................................................................... 51 Celso Mirra de Paula e Silva Capítulo 5 Colites microscópicas e microbiota intestinal .......................................................... 61 Maria do Carmo Friche Passos Capítulo 6 Novas opções terapêuticas na doença inflamatória intestinal ............................ 75 Carlos Brito Capítulo 7 Inibidores da bomba de prótons na doença do refluxo gastroesofágico: como e quando suspender .............................................................103 Décio Chinzon Miriam Chinzon SUMÁRIO felipespalenza Realce felipespalenza Realce 16 Capítulo 8 Helicobacter pylori e lesões pré-neoplásicas do estômago ....................................109 Luiz Gonzava Vaz Coelho Maria Clara de Freitas Coelho Capítulo 9 Manifestações extradigestivas da infecção pelo Helicobacter pylori ................129 Schlioma Zaterka 17 Quando avaliado o burden da doença hepática crônica,1 é pro- jetado um acometimento de 1,5 bilhão de pacientes no mundo, sendo as causas mais frequentes a doença hepática gordurosa não alcoólica (60%); os vírus das hepatites B (29%) e C (9%) e a doença hepática alcoólica (2%). É estimado que as hepatopa- tias crônicas sejam responsáveis por 2.000.000 mortes ao ano, número este provavelmente subestimado. No Brasil, a doença hepática é considerada a oitava causa de óbito, sendo a cirrose a principal causa entre as doenças hepáticas.2 Atualmente, quando avaliamos a última classificação da cirro- se, podemos considerar 6 estágios clínicos.3 No estágio 0 obser- vamos doença compensada sem hipertensão porta clinicamente significativa (HPCS - GPVH > 5 mmHg e < 10 mmHg) e com boa resposta ao tratamento etiológico; no estágio 1, a doença per- manece compensada e sem a presença de varizes; no entanto, com HPCS e logo com alto risco de desenvolver varizes, carci- noma hepatocelular e de descompensação, e quando no estágio 2 podemos observar o surgimento de varizes gastroesofágicas - VGE (mortalidade em 5 anos de 10% se não houver descompen- sação). No estágio 3 já é constatado sangramento por ruptura de varizes, sendo a mortalidade em 5 anos de 20% se não houver descompensação da hepatopatia; no estágio 4 observamos o 1º episódio de descompensação, propriamente dita (sem conside- rar sangramento, mais frequentemente com o surgimento de as- cite), com uma mortalidade em 5 anos de 55%-80% e no estágio Hemorragia digestiva alta varicosa CAPÍTULO 1 Angelo Alves de Mattos Ângelo Zambam de Mattos DOI: 10.222288/978658847501000001 FE DE RA Ç ÃO BR AS ILEIR A DE GASTROENTERO LO G IA 1949 felipespalenza Realce 18 5 temos episódios futuros de descompensação, com uma mor- talidade que pode alcançar 90% em 5 anos. Finalmente, no es- tágio 6 temos um paciente com cirrose descompensada de for- ma avançada (ascite refratária, infecção, encefalopatia hepática persistente, icterícia e disfunção renal). Como podemos obser- var, o prognóstico da doença começa a comprometer a sobrevi- da do paciente de forma mais significativa a partir do estágio 3, quando do sangramento por ruptura de VGE. Em linhas gerais, é relevante o conhecimento de que as vari- zes estão presentes em até 40% dos pacientes com cirrose com- pensada (Child A) e em até 85% quando a doença descompensa (Child C).4 Em estudo realizado por nós, avaliando uma coorte de pacientes com doença hepática crônica em nível ambulatorial, o sangramento digestivo foi a segunda complicação mais frequen- te na apresentação desses doentes, principalmente quando a etiologia da doença hepática esteve relacionada ao álcool.5 Res- saltamos que a recorrência do sangramento em um ano pode ser de até 60% e que a mortalidade atual de cada sangramento varia de 15%-20%.4 Os avanços no tratamento da hemorragia digestiva por rup- tura de VGE podem ser constatados através da redução da mor- talidade no decorrer dos anos. Quando da primeira reunião de Baveno, no início da década de 1990, a mortalidade girava entre 30%-40%, e quando da última reunião em 2015 (Baveno VI), en- tre 7%-12%. As cifras retratam, então, o progresso observado no manejo do sangramento.6 Por ser o mais frequente, neste capítulo abordaremos o san- gramento decorrente da ruptura de varizes de esôfago (VE). In- teressante lembrar o estudo de Ardevol et al.,7 onde é demons- trado que o sangramento por outras causas, como por exemplo aquele decorrente de úlcera péptica, em nada diminui a gravida- de do processo, já que a maior parte dos óbitos está na decor- rência da falência hepática ou de comorbidades presentes e não do sangramento propriamente dito. 19 O tratamento do sangramento por ruptura de VE deve ser oferecido prioritariamente em Unidade de Terapia Intensiva, proporcionando ao doente todas as medidas adequadas de con- trole hemodinâmico. A transfusão de hemoderivados deve ser a mais restrita possível. A princípio só realizamos transfusão em pacientes com hemoglobina (Hb) inferior a 7 g/dL. A sobrevida cumulativa é maior nos pacientes que receberam transfusão restritiva, sendo que os pacientes que mais se beneficiaram des- ta conduta são aqueles com cirrose Child-Pugh A e B. O ressan- gramento também é menor no grupo com tratamento restritivo. Por outro lado, tendo em vista o risco de hipervolemia, acredi- ta-se ser adequada uma reposição volêmica que proporcione índices de Hb entre 7-8 g/dL e um hematócrito de 21-24.8 Lem- brar que a transfusão sempre deve ser individualizada, tendo em vista outros fatores que podem ser de relevância, como idade, presença de doença cardiovascular, sangramento ativo e status hemodinâmico. Quando necessária, pode ser realizada nestes enfermos aspi- ração gástrica e/ou intubação endotraqueal. Não há consenso na proposição de medidas profiláticas para a encefalopatia hepática. A despeito da utilização da lactulose/ rifaximina ser uma opção a ser pensada, a American Association for the Study of Liver Diseases (AASLD)9 e a European Association for the Study of the Liver (EASL)10 deixam o tema em aberto, sem um posicionamento definido. No entanto, a profilaxia das infecções é fundamental. Uma re- visão sistemática com meta-análise, avaliando 1.241 pacientes, com ou sem a utilização de antibióticos, demonstrou que a pro- filaxia com antibiótico está associada com redução de infecção bacteriana; de ressangramento; do tempo de hospitalização e da mortalidade.11 O antibiótico a ser utilizado é o norfloxacino (400 mg 2x/d), sendo que nos pacientes com cirrose avançada é preferível a uti- 20 lização da ceftriaxona (1 g/d), pois é mais efetiva no controle da infecção.12 Atualmente a ceftriaxona parece ser a droga de primeira escolha nos pacientes com cirrose descompensada, nos que já realizavam profilaxia com norfloxacino e nos hospitais em que há alta prevalência de resistência bacteriana às quinolonas.10 Nos pacientes com sangramento, a endoscopia pode ser realizada em até 12 horas, contando o momento da chegada do paciente ao hospital, desde que o doente esteja estável.13 Pare- ce ser de utilidade, quando não houver contraindicação (pro- longamento do intervalo QT), a utilização de eritromicina (250 mg e.v.), 30–120 minutos antes da endoscopia, uma vez que esta prática proporciona uma maior incidência de estômago “vazio”; uma menor necessidade de uma segunda endoscopia; de trans- fusão e um menor tempo de hospitalização.14 A terapia específica para os pacientes que sangram por rup- tura de VE deve ser a combinação da ligadura endoscópica das varizes (LEVE) e a utilização precoce de fármacos vasoativos. As drogas vasoativas a serem oferecidas a esta população de pacientes são a terlipressina, a somatostatina e o octreotide. A eficácia das mesmas tem sido discutida, embora uma meta-aná- lise e um importante estudo prospectivo, controlado e randomi- zado, a despeito de eventuais críticas metodológicas, nãoterem demonstrado diferença na eficácia dos fármacos citados.15,16 Em regra, o tratamento farmacológico é utilizado por até cin- co dias. Uma vez que a hemostasia endoscópica seja atingida, re- gimes de tempo de menor duração com estes fármacos têm sido sugeridos, embora não exista uma recomendação clara a este respeito.17 Caberia uma rápida consideração em relação aos inibidores de bomba protônica. Estes medicamentos não apresentam efei- to no sangramento por varizes, mas parece razoável seu uso en- dovenoso enquanto aguardamos a endoscopia, devendo ser des- 21 continuado quando da confirmação do sangramento por varizes. Seu breve uso para evitar úlceras decorrentes da LEVE, embora com tímida evidência em relação a eficácia, quando realizado, deve ser interrompido por ocasião da alta hospitalar.18 Outro ponto que gostaríamos de chamar a atenção é aquele referente à alimentação enteral, quando necessária, com son- da nasogátrica ou nasoentérica após a LEVE, pelo receio de que seja precipitado sangramento. Embora a presença de varizes não seja considerada uma contraindicação, a maioria dos gastro- enterologistas prefere observar 24-48 horas após o tratamento endoscópico, ressalvado o fato da limitação de dados nestas cir- cunstâncias.18 A descompensação da hepatopatia, quando do sangramento, principalmente pela presença de ascite, traz um pior prognósti- co nesta população de pacientes, traduzido em uma maior mor- talidade em 1 ano, quando comparados com os que não desen- volveram esta complicação, independentemente do escore de Child-Pugh ou do MELD.4 Dez a 20% dos pacientes com sangramento maciço não res- pondem ao tratamento convencional. Nesta população de do- entes, tem sido sugerida a utilização de próteses autoexpansi- vas. Em recente meta-análise,19 o tamponamento com balão de Sengstaken-Blakemore mostrou uma pior performance quando comparado aos stents esofágicos, a despeito da média de mor- talidade ter sido semelhante. Embora só um trial compare os tratamentos, as evidências suportam o fato de que os stents são a terapia-ponte mais eficaz e segura nos paciente com sangra- mento agudo refratário. Esta prática, no entanto, ainda não está consagrada em nosso meio. Uma outra proposta terapêutica a ser considerada nos pa- cientes com sangramento é a utilização de transjugular intrahepa- tic portosystemic shunt (TIPS). Em regra, esta opção terapêutica era oferecida a pacientes que falhavam ao tratamento endoscó- 22 pico (sangramento persistente ou ressangramento nos primei- ros cinco dias) ou, de forma mais precoce, aos pacientes com um gradiente de pressão venosa hepática (GPVH) maior do que 20 mmHg, uma vez que estes pacientes sangram com maior inten- sidade e apresentam uma maior falha à terapia endoscópica.20 É de se salientar que o TIPS recoberto (com politetrafluoreti- leno), a despeito do elevado custo, mostrou-se superior ao TIPS convencional, apresentando melhora significativa da patência; redução da encefalopatia hepática e uma menor mortalidade.21 Em 2010, García-Pagán et al.22 publicaram um estudo onde o TIPS era indicado de forma precoce/preemptiva (nas primei- ras 72 horas) em pacientes com Child-Pugh C (escore < 14) ou Child-Pugh B com sangramento na endoscopia. Esta conduta favoreceu a um menor ressangramento ou falha de controle e a uma maior probabilidade de o paciente permanecer sem san- gramento em um ano, com um baixo índice de encefalopatia he- pática. O mais importante é que este estudo demonstrou uma maior sobrevida atuarial em um ano. Posteriormente um estudo chinês, utilizando TIPS recoberto, também controlado e pros- pectivo, confirmou estes achados.23 Os excelentes resultados com o TIPS preemptivo foram con- firmados por cinco estudos observacionais;20 no entanto, ainda há controvérsia no que tange à população que mais se beneficia- ria com esta prática. Recentemente, estudo multicêntrico inter- nacional, com mais de 650 pacientes considerados de alto risco, demonstrou ser a população de pacientes Child-Pugh C a que mais se beneficiaria desta proposta, uma vez que foi a que apre- sentou menor mortalidade.24 Desta forma, aguarda-se resultado de meta-análise de pacientes Child-Pugh B com sangramento, para ver até que ponto esta população de pacientes só obtém benefícios em eventuais complicações (desenvolve menos asci- te) ou se também apresenta ganho de sobrevida.20 A despeito de necessitar de confirmação, é interessante o es- 23 tudo que demonstrou que a presença de acute-on-chronic liver failure (ACLF) é preditora de mortalidade em pacientes com san- gramento varicoso e que estes pacientes também seriam bene- ficiados com a utilização de TIPS preemptivo.25 Ressaltamos que o uso do TIPS preemptivo ainda não foi in- corporado na prática clínica em nosso país e em diversos pa- íses do mundo. A este respeito chamamos atenção de recente estudo, que ao avaliar mais de 5.500 TIPS colocados nos EUA, relaciona a importância da experiência dos centros com a mor- talidade observada. Concluem os autores que uma menor mor- talidade é verificada naqueles centros que têm uma experiência em colocar no mínimo 20 TIPS ao ano.26 A mortalidade nos pacientes Child-Pugh C (com pontuação 14-15) é muito elevada durante um episódio de sangramento e os dados atuais sugerem a futilidade em usar TIPS nesta popu- lação de pacientes, quando não seguida de transplante de fíga- do. Outro dado importante em relação ao TIPS é a necessidade de haver uma cuidadosa seleção dos pacientes quando de sua indicação. Assim, pacientes com mais de 75 anos, com creatini- na maior do que 3 mg/dl, carcinoma hepatocelular fora dos cri- térios de Milão ou com trombose total da veia porta devem ser excluídos.4 A este respeito é importante lembrar que a descompensa- ção cardíaca é observada em até 20% quando considerado um período de 1 ano após a colocação da prótese. Parece que a de- terminação dos níveis do peptídeo natriurético cerebral –BNP (< 40 pg/mL) ou do pró-peptídeo natriurético cerebral N-ter- minal -NT-proBNP (< 125 pg/mL) e a realização de um ecocar- diograma (disfunção diastólica) podem ser de auxílio quando da seleção dos pacientes.27 É importante lembrar, com o intuito de diminuir complicações (encefalopatia hepática), que o diâmetro máximo do TIPS a ser utilizado é de 8 mm (e não de 10 mm como nos trabalhos menos recentes).20 24 Tendo em vista a melhoria da sobrevida dos pacientes com a utilização do TIPS preemptivo e da melhora das complicações que estes pacientes com frequência apresentam (ascite), são ne- cessários esforços para conscientizar a coletividade médica da importância de seu uso em população selecionada, uma vez que esta recomendação já era feita quando da reunião de Baveno VI.28 Um rápido comentário poderia ser feito em relação à aplica- ção precoce de Hemospray no manejo do sangramento das VE. Assim, estudo prospectivo, controlado e randomizado sugere que esta estratégia, ao levar a uma hemostasia temporária, po- deria ser utilizada em centros com pouca expertise no atendi- mento de urgência destes pacientes. Assim, se proporcionaria um “segundo tempo” no atendimento destes doentes, para uma terapia mais definitiva, traduzindo grande benefício. Por óbvio, esta prática necessita de mais estudos antes de sua implemen- tação.29 Do que foi aqui exposto, creio ser importante levar o leitor a revisitar as considerações atualizadas da Sociedade Brasileira de Hepatologia30 no que tange à hemorragia digestiva por rup- tura de VE, uma vez que traduzem a realidade do que está sendo feito ou do que pode ser feito em nosso país. 25 Referências 1. Moon AM, Singal AG, Tapper EB. Contemporary epidemiology of chronic liver disease and cirrhosis. Clin Gastroenterol Hepatol 2019 Aug [Epub ahead of print] 2. Nader LA, Mattos AA, Bastos GA. Burden of liver disease in Brazil. 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Ainda não há meios de se tratar exclusivamente o fígado gor- duroso; é preciso abordar o doente integralmente,1 o que englo- ba mudanças no estilo de vida e a associação de drogas direcio- nadas à patologia em si, quando indicadas. O tratamento é de difícil aderência, multifacetado e por toda a vida. O desenvolvimento e a progressão da DHGNA envolvem pro- cessos fisiopatológicos complexos,2 que são influenciados por fatores como polimorfismos genéticos, dieta e, mais recente- mente estudado, alterações quantitativas e qualitativas da com- posição da microbiota intestinal (MI), denominadas disbiose.3,4 O alto conteúdo calórico da dieta ocidental é um dos princi- pais determinantes do aumento de peso na população, associa- 28 do à mudança de composição da MI. Esta tem a capacidade de potencializar a transferência de monossacarídeos consumidos na dieta hipercalórica para a circulação portal, promovendo as- sim um aumento na lipogênese no tecido hepático e no tecido gorduroso periférico.1 Além desses aspectos no desenvolvimen- to da DHGNA, devem ser consideradas modificações molecula- res, como o aumento da permeabilidade intestinal em indivíduos que possuem a proteína de adesão celular JAM1 ou MUC2, que aumenta o risco de inflamação hepática em seres que estão sub- metidos a uma dieta rica em gordura. Modificações no metabo- lismo de aminoácidos e do carbono também estão presentes em indivíduos com DHGNA.2 A MI é considerada um “órgão invisível”, que possui distribui- ção heterogênea,sendo o cólon o local com maior densidade, devido às condições favoráveis de proliferação de micro-orga- nismos, tais como peristaltismo lento, ausência de secreções intestinais e presença de suprimento nutricional. A coloniza- ção bacteriana corporal ocorre antes mesmo do nascimento e se perpetua por toda a vida. Acredita-se que existam cerca de 36.000 espécies diferentes de bactérias que colonizam o intes- tino,5 variando quantitativa e qualitativamente entre os indiví- duos.6 Essas bactérias pertencem aos filos Firmicutes (64%), Bac- teroidetes (23%), Proteobacteria (8%) e Actinobacteria (3%).7 As principais funções da MI incluem atividades imunológi- cas e metabólicas. A função metabólica mais proeminente da MI é a fermentação de componentes não digeríveis da dieta. Os produtos dessa complexa atividade metabólica constituem um espectro de ácidos orgânicos, que são uma importante fon- te de energia para o hospedeiro. Além disso, as células epiteliais do intestino participam de processos imunológicos. As vias de sinalização dessas células são altamente reguladas para evitar respostas inflamatórias não controladas.8 Outra importante função é a proteção contra micro-organismos exógenos, inibin- do o crescimento de micro-organismos patogênicos através da 29 síntese de substâncias antimicrobianas ou competindo por nu- trientes e reduzindo a fixação e a penetração de patógenos nas células epiteliais.9 Estudos demonstram haver uma relação entre disbiose e DHGNA. Acredita-se que alguns fatores como dieta, estresse e uso de antibióticos, por exemplo, modulem a MI de tal maneira que uma composição transitória prevaleça sobre a composição habitual. Em última análise, a disbiose promoveria crescimento bacteriano excessivo, produção de toxinas e aumento da per- meabilidade intestinal, resultando em modificações imunológi- cas e efeitos hormonais, predispondo a desordens gastrointes- tinais.9 Estratégias terapêuticas Pesquisadores têm estudado cada vez mais a modulação da MI como um novo alvo terapêutico da DHGNA, desenvolvendo modalidades terapêuticas que incluem antibióticos, probióticos, prebióticos, simbióticos e transplante de microbiota fecal,10 por exemplo. 30 A disbiose da microbiota intestinal e a barreira intestinal prejudicada foram elucidadas como fatores patogênicos na doença hepática gordurosa não alcoólica. Antibióticos, probióticos, prebióticos, simbióticos, transplante de microbiota fecal e componentes e metabólitos deri- vados da microbiota intestinal são tratamentos importantes direcionados à microbiota intes- tinal. * TMF: Transplante de microbiota fecal. Imagem reproduzida de: Chen HT et al. Microbiota-targeted therapies against NAFLD.10 Figura 1. Terapias voltadas à microbiota contra a doença hepáti- ca gordurosa não alcoólica Epitélio intestinal prejudicado Epitélio intestinal normal Fígado saudável Prebióticos Antibióticos Probióticos Simbióticos TMF* Componentes e derivados metabólitos da microbiota intestinal Fígado gorduroso Disbiose Microbiota intestinal normal A utilização de probióticos no tratamento da DHGNA surge como uma opção terapêutica promissora, tendo em vista o seu baixo custo e a ausência de efeitos colaterais severos. Os pro- bióticos supostamente são capazes de retardar a progressão da doença e de prevenir complicações através da modulação da flo- 31 ra intestinal, da permeabilidade intestinal e da resposta inflama- tória, além de diminuir a deposição de gordura no fígado e dimi- nuir a inflamação hepática, sendo observada em alguns estudos a melhora dos níveis das transaminases (AST e ALT) durante o uso de probióticos. Acredita-se que ao suplementar um paciente com probióticos, permite-se a restauração da MI e consequen- temente reduz-se a inflamação hepática, considerando a relação anatômica e funcional do eixo intestino-fígado.11 Apesar das evidências científicas apontarem que há uma as- sociação entre disbiose intestinal e DHGNA, ainda é preciso que mais estudos sejam elaborados para estabelecer sua eficácia.10 A utilização de prebióticos é outra opção de terapia adjuvante para doenças hepáticas, que causa melhora sintomática através da restauração da MI.12 Prebióticos são substratos quebrados em metabólitos pela própria microbiota, promovendo, assim, o crescimento de bactérias benéficas.13 Essas drogas estimulam, por exemplo, o crescimento de bifi- dobactéria e normalizam os níveis plasmáticos de endotoxinas,14 resultando na restauração da MI e consequentemente na redu- ção da lipogênese, perda de peso e de gordura, melhora dos ní- veis glicêmicos e diminuição da inflamação.15 Já os simbióticos consistem na combinação de probióticos e prebióticos. Estudos evidenciaram que pacientes tratados com Bifidobacterium e fruto-oligossacarídeos (FOS) por seis meses evoluíram com diminuição significativa dos níveis séricos de ALT e AST comparados ao grupo que recebeu apenas placebo.16 Outros estudos mostraram a importância de aliar a mudan- ça no estilo de vida com o uso de simbióticos e probióticos, pois assim havia melhores resultados no controle da inflamação he- pática e da deposição de gorduras no fígado quando compara- dos aos pacientes que foram submetidos apenas a mudanças alimentares e de atividade física. Há evidências crescentes quanto a eficácia do uso criterioso 32 de antibióticos em variadas doenças hepáticas, considerando que essas drogas podem reduzir os componentes da microbiota que teriam ação deletéria sobre a saúde do hospedeiro.17 A neo- micina, desde os anos 1950, e mais recentemente metronidazol e rifaximina, vêm sendo usados extensivamente no tratamento de cirrose e encefalopatia hepática.18 No entanto, é preciso cautela quanto ao uso dessas drogas. Enquanto o uso curto dessas drogas parece ter um efeito tera- pêutico, o uso prolongado pode levar a resistência bacteriana, limitando a eficácia e aumentando o risco de infecções secundá- rias.19 O transplante de fezes, adequadamente chamado transplan- te de microbiota fecal, consiste em uma estratégia terapêutica em que há a transferência do microbioma de indivíduos saudá- veis para o trato gastrointestinal de pacientes que apresentam disbiose.20 Pode ser realizado através de cápsulas ingeridas, tubos nasogástricos, nasoenterais, endoscopia digestiva alta e colonoscopia. Entre os efeitos positivos observados, estão o au- mento da sensibilidade à insulina, diminuição da esteatose he- pática e da inflamação intra-hepática.10 Apesar de promissor, a estabilidade da microbiota transplantada parece ser limitada, o que poderia resultar a longo prazo em redução dos efeitos te- rapêuticos. Assim, é necessário que mais estudos clínicos sejam realizados para confirmar o benefício dessa estratégia. Conclusões - As alterações da MI associam-se a várias doenças hepáticas, metabólicas e sistêmicas. - O fígado é constantemente exposto a produtos e metabóli- tos bacterianos oriundos do intestino. - Modelos animais e estudos clínicos iniciais evidenciam rela- ções claras entre a MI e a DHGNA e NASH. - Dieta pobre em gorduras e rica em frutas e vegetais, ativida- 33 de física regular e o uso criterioso de antibióticos são formas de corrigir/reduzir a disbiose em portadores de DHGNA e NASH. - A manipulação da MI através do uso de probióticos, prebióti- cos, simbióticos e transplante de microbiota parece ser uma es- tratégia promissora, associada ao tratamento padrão, na abor- dagem da DHGNA e NASH. Referências 1. Day CP, Saksena S. Non-alcoholic steatohepatitis: definitions and pathogenesis. J Gas- troenterol Hepatol 2002;17:S377-S384. 2. Duarte SMB; Stefano JT, Oliveira CP. 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Porém, a forma grave, que compreende cer- ca de 20% a 30% dos pacientes, tem taxa de mortalidade em cer- ca de 15% e requer manejo especializado. A identificação precoce dos quadros que evoluirão para a for- ma grave, apesar de muitas vezes desafiadora, é fundamental, pois pode contribuir para reduzir essa taxa de mortalidade. A PA é considerada grave nos casos de falência orgânica persistente (mais de 48 horas) ou presença de complicações locais ou sistê- micas1,2 e o objetivo deste capítulo é revisar aspectos importan- tes dessa situação para o gastroenterologista. Diagnóstico precoce O tempo ideal para o diagnóstico da PA é dentro das primeiras 48 horas de admissão hospitalar; portanto, esse diagnóstico deve sempre ser suspeitado em paciente com dor abdominal sugestiva e persistente, seguido da dosagem de enzimas séricas (amilase e lipase). Na dúvida diagnóstica, realizar tomografia abdominal com contraste, pois informará se há edema, borramento da gor- dura peripancreática e inflamação na glândula pancreática.3-6 36 Adequada reposição de volume Imediatamente após o diagnóstico da PA é fundamental iniciar infusão intravenosa adequada de fluidos.3-5 Essa medida, nos estágios iniciais da PA (dentro das 24 horas), tem sido as- sociada à redução da mortalidade e morbidade. Individualizar a quantidade de fluidos a ser infundida de acordo com a função cardiopulmonar e renal e reavaliar os alvos clínicos a cada seis ou oito horas. Nas primeiras 48 horas, a necessidade de fluidos deve ser reavaliada frequentemente. A quantidade será ajustada com bases clínicas, hematócrito, ureia e diurese. Após 48 horas pode não ser mais adequado fazer infusão volumosa de fluidos, pois parece estar associada a risco aumentado de necessidade de intubação orotraqueal e desenvolvimento de síndrome com- partimental abdominal. A reposição adequada de fluidos pode ser confirmada pela melhora dos dados vitais (FC < 120 batimentos/minuto, pressão arterial média entre 65 a 85 mmHg), diurese (> 0,5 a 1 ml/kg/ hora), redução do hematócrito (alvo de 35 a 44%) e da ureia nas 24 horas, principalmente se estavam aumentados no início do quadro. Cinco a dez mL/kg de solução cristaloide isotônica (SII ou solução de Ringer Lactato), exceto se comorbidades cardio- vasculares, renais contraindiquem. Na depleção volêmica grave, reposição rápida com 20 mL/kg EV em 30 minutos, seguidos por 3 mL/kg/hora por 8 a 12 horas. Nas raras situações de PA devido a hipercalcemia, Ringer Lactato é contraindicado. Embora a re- posição/infusão de fluidos possa ser feita com soluções salinas isotônicas ou coloides, a recomendação de vários trabalhos é infusão de Ringer Lactato, que parece estar associada a diminui- ção de inflamação em pacientes com PA.7,8 Esse efeito está ligado à ação inibitória do lactato nas células inflamatórias. Porém, pela revisão não há evidências convincen- tes da superioridade de um tipo de fluido, volume e duração da administração na redução de mortalidade e falência de órgãos. 37 Monitoramento As primeiras 48 horas de acompanhamento do paciente aju- darão na graduação da PA e com isso na escolha da estratégia de tratamento. O constante monitoramento é fundamental, pois os casos inicialmente leves ou moderados podem progredir ra- pidamente para quadros graves. Os principais parâmetros que devem ser acompanhados com rigor são os sinais vitais, o débito urinário, o nível de ureia sérica e o hematócrito.5-8 Embora amilase e lipase sejam úteis no diagnóstico da pan- creatite, não são marcadores de gravidade, nem de prognóstico ou mesmo determinantes do manejo clínico. Controle rigoroso da saturação arterial de oxigênio e suplementação de oxigênio, para manter o PaO2 superior a 95%, deve ser instituído. Além da oximetria de pulso, a coleta de gasometria deve ser realizada se a saturação estiver abaixo de 90%. A causa da hipoxemia per- sistente deve ser investigada, lembrando que pode ser secun- dária a atelectasias, derrames pleurais, shunts intrapulmonares ou síndrome da angústia respiratória aguda. Monitoramento da ureia é importante na admissão, pois sua elevação durante as primeiras 24 horas é preditora de mortalidade. Acompanhamen- to rigoroso da diurese deve ser mantido (> 0,5 a 1 ml/kg/hora). É importante notar que uma diurese baixa pode refletir necrose tubular aguda e não depleção volêmica persistente. Nessa situa- ção, infusão agressiva de fluidos pode levar a edema periférico e pulmonar, sem melhora da diurese. Eletrólitos devem ser mo- nitorados frequentemente,especialmente com ressuscitação fluida agressiva. Atenção especial para hipocalcemia, que deve ser corrigida se cálcio baixo ou se houver sinais de irritabilidade neuromuscular, tetania (sinal de Chvostek ou Trousseau). Mag- nésio baixo também pode causar hipocalcemia e deve ser corri- gido. Glicemia sérica deve ser monitorizada, com atenção cuida- dosa se hiperglicemia (níveis maiores que 180 mg/dl), pois pode favorecer o risco de infecção pancreática secundária.5,6 38 Definição de PA grave O sistema de classificação mais comumente usado para PA é a da revisão de 2012 de Atlanta1,2 (tabela 1). A gravidade é clas- sificada como leve, moderada (moderadamente grave) ou grave. A forma leve (pancreatite edematosa intersticial) não apresenta falência de órgãos, complicações locais ou sistêmicas e geralmen- te reverte na primeira semana. Se houver insuficiência orgânica transitória (menos de 48 horas), complicações locais ou exacerba- ção de comorbidades prévias, ela é classificada como moderada ou moderadamente grave. Pacientes com falência orgânica per- sistente (mais de 48 horas) ou com complicações locais ou sistê- micas persistentes apresentam a forma grave da doença. Critérios de Atlanta 1992 Revisão de Atlanta 2012 Pancreatite Aguda Leve Pancreatite Aguda Leve Ausência de falência de órgão Ausência de falência de órgão Ausência de complicações locais Ausência de complicações locais Pancreatite Aguda Grave Pancreatite Moderadamente Grave Complicações locais e/ou Falência de órgão Complicações locais e/ou Falência transitória de órgão < 48 horas Hemorragia digestiva Pancreatite Aguda Grave Choque PAS ≤ 90 mmHg Falência persistente de órgão > 48 horas* PAO2 ≤ 60% Complicações locais Creatinina ≥ 2 mg/dl *Escore Modificado Marshal Tabela 1. Classificação de gravidade de pancreatite aguda 39 Na determinação de gravidade devem ser avaliados a falência orgânica (comprometimento cardiovascular, respiratório, renal ou outros) e escores que quantifiquem a síndrome de resposta inflamatória sistêmica. Outros parâmetros podem ser utilizados, como a impressão clínica de gravidade e fatores indicadores de gravidade, como obesidade, Apache II > 8 nas primeiras 24 horas de admissão e 72 horas, proteína C-reativa >150 mg/l, Glasgow ≥ 3, persistência de falência orgânica após 48 horas de admis- são (apesar de infusão fluida), BISAP (ureia > 25 mg/dL, estado mental alterado, presença da síndrome da resposta inflamatória sistêmica - SIRS, idade > 60, presença de derrame pleural).5-7 A tabela 2 resume vários parâmetros de gravidade na PA. Além disso, pela classificação de Atlanta, a PA pode ser dividida em duas categorias: Intersticial, edematosa, que é caracterizada pela inflamação do parênquima ou peripancreática, sem necrose tecidual detec- tável e geralmente evoluem de forma leve. Necrotizante, que, como o nome diz, apresenta inflamação associada à necrose do parênquima ou peripancreática. Em geral, os pacientes com PA grave precisam ser manejados em centros de terapia intensiva, com suporte respiratório, renal, circulatório e hepatobiliar, o que pode minimizar sequelas sistê- micas.4-6 40 Etiologia da PA Os fatores etiológicos na PA devem ser identificados com ra- pidez e precisão sempre que possível, pois, juntamente com a Preditores Clínicos Preditores Laboratoriais Idade > 60 anos Hemoconcentração (VG > 44%) Obesidade Ureia elevada > 20 mg/dL na admissão e elevação nas 24 horas Etiologia alcoólica Glicemia elevada, cálcio na admissão e no seguimento > 15 mg/dl Falência orgânica - persistente (≥ 48 horas) Creatinina sérica elevada dentro das 48 horas de admissão > 1,8 mg/dl Comorbidades - doença pulmonar, doença cardiológica, doença renal Proteína C-reativa > 150 mg/L nas 48 horas da admissão Hipotensão persistente - PAS < 80 mmHg ou PAM < 60 mmHg ou PAD > 120 mmHg RX tórax com derrame pleural e/ou infiltrado pulmonar nas primeiras 24 horas da admissão Taquicardia persistente TC ou RM com necrose pancreática ou peripancreática* Hipoxemia persistente Procalcitonina elevada Oligúria ou anúria Peptídio de ativação do tripsinogênio na urina elevado** Rebaixamento do nível de consciência Tripsinogênio aniônico urinário** Dispneia persistente Procarboxipeptidase-B; peptídio de ativação da carboxipeptidase-B; tripsinogenio-2 sérico; fosfolipase A-2 *TC = tomografia computadorizada, RM = ressonância magnética, indicadas após 72 horas da admissão para avaliar gravidade ** com pouca disponibilidade Tabela 2. Preditores de gravidade da pancreatite aguda 41 avaliação da gravidade, têm um impacto importante no trata- mento. Definir o fator etiológico em ao menos 80% dos casos é o ideal.7 Sintomas ou episódios prévios, história ou diagnóstico de cálculos biliares, consumo de álcool, hipertrigliceridemia ou hipercalcemia devem ser levantados, entre outros. Controle da dor abdominal É o sintoma predominante e deve ser tratado adequadamen- te, pois dor abdominal persistente pode contribuir para instabi- lidade hemodinâmica. Em geral, analgésicos potentes, como os de opioides por via endovenosa, são seguros e efetivos, inclusi- ve por meio de bombas de infusão controladas pelos pacientes. Fentanil (em bolus de 20 a 50 microgramas com intervalos de 10 minutos) e hidromorfona podem ser usados. Meperidina é preferível à morfina, esta última pode aumentar a pressão do es- fíncter de Oddi. Também, a infusão adequada de fluidos por si só irá contribuir na melhora da dor abdominal, já que hipovolemia e hemoconcentração podem causar ou agravar a dor por isquemia pancreática e acidose lática.5-7 Nutrição Na pancreatite grave, um suporte nutricional sempre será necessário, visto que em muitos pacientes não será possível re- torno da alimentação oral em cinco a sete dias. Alimentação por sonda nasogástrica ou enteral (usando fórmula elemental ou se- mielemental) é preferível que nutrição parenteral total (NPT).9 O tempo de reiniciar alimentação oral depende da reversão da gravidade da PA, da ausência de “íleo paralítico” ou náuseas e vômitos. Na ausência desses sintomas, alimentação oral deve ser tentada precocemente, de acordo com a tolerância dos pa- cientes, principalmente se a dor abdominal diminuiu e se hou- ver melhora dos marcadores inflamatórios. Inicia-se com dieta líquida, pobre em resíduos, hipogordurosa, progredindo a con- 42 sistência para sólidos conforme tolerância, mesmo sem total resolução da dor abdominal e normalização das enzimas pan- creáticas. Por outro lado, alguns pacientes podem não tolerar a dieta sólida oral, apresentando dor pós-prandial, náuseas ou vômitos, sintomas relacionados à inflamação gastroduodenal e/ ou compressão extrínseca por coleções fluidas, levando à obs- trução gastroduodenal. Esses pacientes vão necessitar de nutri- ção enteral. Com a melhora das complicações, novamente dieta oral deve ser estimulada. A nutrição enteral irá ajudar a manter a barreira intestinal e prevenir translocação bacteriana intestinal associada a infecções. Lembrando que a persistência de enzimas pancreáticas ou presença de coleções fluidas pancreáticas não são necessariamente contraindicações da alimentação enteral. A nutrição parenteral será indicada em poucos casos que não tolerem nutrição enteral ou em que não se consegue adequada nutrição dentro das primeiras semanas.5,6 Antibióticos A maioria das diretrizes não recomenda profilaxia de infecção com antibióticos, mesmo na pancreatite grave, aguardando-se a confirmação de infecção para introdução de antibióticos. No caso de necrose infectada, fica óbvio o uso de antibióticos, mas nem sempre é evidente a confirmação ou não da presença de in- fecção, pois o processo inflamatório intenso e a própria necrose podem confundir esse diagnóstico. A procalcitonina apresenta elevada sensibilidade e especificidade para distinguir SIRS (Sín- drome da Resposta Inflamatória Sistêmica) de sepse, podendo ajudar a diferenciar necrose pancreáticainfectada da não in- fectada. Deve-se optar por antibióticos que penetrem áreas de necrose pancreática (quinolonas e metronidazol, ou carbapene- mes).5,6 43 Antifúngicos A administração de antifúngicos de forma profilática também não é recomendada. Aproximadamente 9% dos pacientes com pancreatite necrotizante apresentarão infecção fúngica na área de necrose.6 Inibidores da protease e outros medicamentos Ainda é incerta a importância de inibidores de protease nos quadros de PA, não sendo recomendados, aguardando-se maio- res comprovações em estudos clínicos. Alguns estudos estão em andamento avaliando inibidores da tripsina, como o anticoa- gulante dabigatrana em fases iniciais da PA. Também o uso de biológicos inibidores do Fator de Necrose Tumoral (TNF-α), que está relacionado com a patogênese da PA, como o infliximabe, está em estudo.6 Tomografia A TC de abdome não é recomendada rotineiramente na apresentação inicial da PA, pois não mostrará áreas necróticas ou isquêmicas e não modificará o manejo clínico durante a pri- meira semana da doença. No entanto, quando o diagnóstico é in- certo, e o ultrassom de abdome não conseguiu ajudar, a TC deve ser considerada, especialmente para descartar peritonite por perfuração secundária ou isquemia mesentérica. A extensão da necrose pancreática ou peripancreática pode se tornar eviden- te somente após 72 horas do início do quadro.5,10 Pacientes com PA grave, com sinais de sepse ou piora clínica 72 horas após o início do quadro devem realizar TC com contraste para avaliar presença de necrose pancreática ou extrapancreática ou com- plicações locais, áreas com hemorragia ativa ou trombose asso- ciada à pancreatite. 44 Escores de gravidade Muitos escores de gravidade têm sido relatados no intuito de ajudar a indicar manejos mais rigorosos e precoces, mas nenhum é considerado perfeito. A recomendação é, se possível, associar critérios de gravidade na avaliação do paciente com PA, não se baseando somente em um deles.11 A tabela 3 mostra diversos escores de gravidade. A falência de órgãos é central para a defi- nição de PA grave. O paciente corre alto risco de morte (um em cada três) se esse quadro persistir por mais de 48 horas. Além disso, um período de doença com uma resposta inflamatória acentuada (SIRS) precede a falência de órgão. Alguns escores levam 48 horas para trazer a informação da gravidade da PA e só podem ser utilizados uma vez, no início do quadro, não ten- do alto grau de sensibilidade e especificidade (os tradicionais critérios Ranson e Glasgow). Outros, apesar de maior comple- xidade, permitem contínua avaliação, como o escore Apache Escores de Gravidade Ranson Glasgow Apache II Apache III Escore da Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica BISAP Balthazar - índice de gravidade tomográfica Escores baseados em falência de órgãos (Marshall, Goris, Bernard, SOFA - sequential organ failure assessment) Tabela 3. Exemplos de escores de gravidade na pancreatite aguda 45 II - The Acute Physiology and Chronic Health Examination II, que avalia parâmetros fisiológicos, presença de comorbidades e já é usado rotineiramente em centros de terapia intensiva. Algumas variáveis foram adicionadas para melhorar a acurácia, criando o Apache III. Ambos os escores foram inicialmente desenvolvidos para avaliar pacientes gravemente enfermos e não são específi- cos para PA, mas contribuem para distinguir quadro leve do gra- ve da PA. O escore da síndrome da resposta inflamatória agu- da ou sistêmica (SRIS), que usa como parâmetro temperatura < 36°C ou > 38°C; frequência respiratória > 20/min ou PaCO2 < 32 mmHg; frequência cardíaca > 90/min; leucócitos < 4.000/mm ou >12.000/mm ou mais que 10% bastonetes - desvio nuclear à esquerda, pode ser feito diariamente, sendo de fácil aplicação e baixo custo. Outro escore utilizado é o BISAP - Bedside index of severity in acute pancreatitis, que usa como parâmetros a ureia sérica, a presença de derrame pleural, idade acima de 60 anos e o escore da SRIS e o estado mental., sendo que este escore é se- melhante ao Apache II para avaliar prognóstico, onde uma pon- tuação de 5 ou mais está associada a mortalidade de 22%. Alguns escores avaliam a gravidade baseados na falência de órgãos, na persistência da falência e se é múltipla, trazendo boa acurácia à avaliação, como exemplo o SOFA (sequential organ failure assess- ment). O índice de Balthazar, um escore baseado nos resultados tomográficos, graduando pela presença e extensão de inflama- ção e necrose pancreática e presença de coleções fluidas, sendo importante na indicação terapêutica de intervenções.10-12 Complicações locais Incluem coleções fluidas peripancreáticas, pseudocistos, coleções necróticas e necrose delimitada ou encapsulada (WON-walled-off necrosis) e complicações vasculares. Tanto o pseudocisto como a necrose emparedada desenvolvem-se fre- quentemente após mais de quatro semanas do início da PA. 46 Coleções fluidas peripancreáticas Ocorrem usualmente na fase aguda da PA, sendo coleções fluidas sem uma parede bem desenvolvida, a maioria resolven- do-se espontaneamente, sem necessidade de drenagem. Caso contrário, persistindo por mais de quatro semanas, desenvol- vem cápsula e passam a ser chamados como pseudocistos. Pseudocistos pancreáticos Coleção fluida encapsulada, geralmente peripancreática e com mínima ou nenhuma necrose, se desenvolvem após quatro semanas do início da PA intersticial. Aqueles que forem volumo- sos e causarem sintomas pela compressão deverão ser drena- dos. Coleções necróticas Áreas de necrose podem resultar em coleções necróticas agudas, mal delimitadas, que eventualmente com o passar do tempo, em geral mais de quatro semanas, podem se organizar, tornando-se encapsuladas por uma parede inflamatória bem delimitada (walled-off necrosis -WON). Tanto a coleção necrótica quando a WON são inicialmente estéreis, podendo se tornar in- fectadas. A maioria dos pacientes com necrose estéril pode ser tratada de maneira conservadora. A infecção da necrose pan- creática e peripancreática ocorre em cerca de 20%-40% dos pa- cientes com PA grave e está associada ao agravamento das dis- funções orgânicas, determinando acentuada morbimortalidade. Deve ser suspeitada nos pacientes que pioram o quadro clínico, com sepses, instabilidade clínica, febre, aumento da leucocitose, ou falha em melhorar após sete ou dez dias de hospitalização. Si- nais clínicos de infecção abdominal e presença de gás dentro da área de necrose são sugestivos de infecção, sendo mandatório início de antibioticoterapia. Nessas situações, os pacientes ge- ralmente necessitam de uma intervenção de drenagem, embora 47 o procedimento deva ser postergado até o paciente ultrapassar quatro semanas do início do quadro, quando a necrose estará “madura” e a drenagem é mais satisfatória. Deve ser indicada a drenagem menos invasiva, que pode ser percutânea, endoscópi- ca (necrosectomia guiada por ecoendoscopia) de acordo com a disponibilidade.13 A maioria das infecções é causada por patóge- no do trato gastrointestinal (Escherichia coli, Pseudomonas, Kle- bsiella e Enterococcus). Portanto, devem ser usados antibióticos que penetram na necrose pancreática, e atuem contra micro-or- ganismos Gram-negativos e Gram-positivos aeróbios e anaeró- bios, como carbapeném isolado, ou quinolona, ceftazidima ou cefepima, combinados com agentes contra bactérias anaeróbias como metronidazol. Não há uma correlação entre a extensão da necrose e o risco da infecção, que ocorre na maioria das vezes tardiamente, após dez dias. Também em coleções necróticas não encapsuladas, mas infectadas, eventual drenagem percutâ- nea ou ecoendoscópica pode ser necessária. Necrosectomia ci- rúrgica só deve ser indicada se os procedimentos minimamente invasivos (endoscópico ou percutâneo) não forem possíveis ou falharem.5-7 A necrose estéril muitas vezes não vai requerer tra- tamento de drenagem, porém estará indicadose houver obstru- ção biliar ou gastrointestinal por compressão da coleção, persis- tência da dor abdominal e vômitos, ou perda de peso e anorexia após oito semanas do início da PA. Síndrome do ducto desconec- tado (transecção completa do ducto pancreático principal), com coleções sintomáticas persistentes após oito semanas do início da PA, também pode requerem intervenção.4-6 Complicações vasculares peripancreáticas Trombose venosa Trombose venosa esplâncnica (esplênica, portal ou das veias mesentéricas) pode ser encontrada incidentalmente em 1% a 14% dos pacientes com PA. O tratamento deve ser primeiramen- 48 te voltado para a PA, pois pode levar a resolução espontânea da trombose. Anticoagulação deve ser iniciada se houver extensão do coágulo para veia portal ou mesentérica superior que possa comprometer a perfusão intestinal ou levar a descompensação hepática. Pseudoaneurisma Apesar de raro, deve ser suspeitado em pacientes com PA com hemorragia digestiva ou queda do hematócrito inexplicáveis ou súbito aumento de coleções fluidas pancreáticas. Muitos desses casos serão manejados pela radiologia intervencionista com em- bolização do pseudoaneurisma. Síndrome abdominal compartimental Essa síndrome é definida como um aumento persistente da pressão intra-abdominal > 20 mmHg associado à falência de ór- gão. Pode ocorrer nos pacientes com PA grave pelo edema teci- dual após infusão agressiva de fluidos, pela inflamação peripan- creática, por ascite ou por “íleo paralítico”. Pode ser monitorada e diagnosticada pela pressão intravesical. Conclusão A PA grave está associada à insuficiência orgânica persisten- te (principalmente cardiovascular, respiratória e/ou renal) e alta mortalidade. Diagnóstico precoce com definição da gravidade, adequada reposição de volume intravenoso, monitoramento rigoroso dos sinais vitais, alívio da dor abdominal, alimentação oral ou enteral precoce, evitar uso de antibióticos profiláticos, evitar cirurgia em pacientes com necrose estéril, abordagem mi- nimamente invasiva e tardia (após quatro semanas ao menos) na necrose infectada, são primordiais no manejo dessa situação. No momento, nenhum teste laboratorial é consistentemente preci- so para prever a gravidade na PA, embora numerosos biomar- 49 cadores estejam sendo estudados. Usar variados e simultâneos escores de gravidade ainda é o preferível. Referências 1. Banks PA, Bollen TL, Dervenis C, et al. Classification of acute pancreatitis--2012: revision of the Atlanta classification and definitions by international consensus. Gut 2013;62:102. 2. Nawaz H, Mounzer R, Yadav D, Yabes JG, Slivka A, Whitcomb DC, Papachristou GI. Revi- sed Atlanta and determinant-based classification: application in a prospective cohort of acute pancreatitis patients. Am J Gastroenterol. 2013;108:1911–7. 3. Working Group IAP/APA Acute Pancreatitis Guidelines. IAP/APA evidence-based guide- lines for the management of acute pancreatitis. Pancreatology 2013;13(4 Suppl 2):e1–15 4. Vege S, Di Magno M, Forsmark CE et al. Initial medical treatment of acute pancreatitis: AGA Institute Technical Review. Gastroenterology. 2018;154(4):1103-1139. 5. Leppäniemi A, Tolonen M, Tarasconi A et al. 2019 WSES guidelines for the management of severe acute pancreatitis. World J Emerg Surg 2019;14:27. 6. Hines O Joe, Pandol Stephen J. Management of severe acute pancreatitis BMJ 2019;367:l6227. 7. Tenner S, Baillie J, DeWitt J, Vege SS. American College of Gastroenterology. American College of Gastroenterology guideline: management of acute pancreatitis. Am J Gastro- enterol. 2013;108:1400–15;1416. 8. Zhao G, Zhang J, G Wu HS et al. Effects of different resuscitation fluid on severe acute pancreatitis. World J Gastroenterol. 2013;19:2044-2052. 9. Singh N, Sharma B, Sharma M, et al. Evaluation of early enteral feeding through nasogas- tric and nasojejunal tube in severe acute pancreatitis: a noninferiority randomized con- trolled trial. Pancreas 2012;41:153. 10. Balthazar EJ. Acute pancreatitis: assessment of severity with clinical and CT evaluation. Radiology. 2002;223:603–13. 11. Cho JH, Kim TN, Chung HH, Kim KH. Comparison of scoring systems in predicting the severity of acute pancreatitis. World J Gastroenterol. 2015;21:2387–94. 12. van Dijk SM, Hallensleben NDL, van Santvoort HC et al. Acute pancreatitis: recent ad- vances through randomised trials. Gut. 2017;66:2024-2032. 13. van Brunschot S, van Grinsven J, van Santvoort HC et al. Endoscopic or surgical step-up approach for infected necrotising pancreatitis: a multicentre randomised trial. Lancet 2018;391:51. 50 51 Doença celíaca: o presente e o futuro CAPÍTULO 4 Celso Mirra de Paula e Silva DOI: 10.222288/978658847501000004 FE DE RA Ç ÃO BR AS ILEIR A DE GASTROENTERO LO G IA 1949 A doença celíaca é uma enteropatia crônica do intestino del- gado imunomediada, iniciada pelo contato alimentar com o glú- ten em pessoas geneticamente predispostas, caracterizada por autoanticorpos específicos contra transglutaminase tissular, en- domísio e/ou peptídeo deaminado da gliadina.1 Cerca de 40% da população é portadora do genótipo HLA- -DQ2 ou HLA-DQ8, que é necessário para o desenvolvimento da doença celíaca; contudo, somente 2% a 3% deles desenvolvem a doença.2 A doença celíaca afeta mais as crianças, mas pode se desenvolver em qualquer idade. A sua prevalência na popula- ção geral é em torno de 1%, mas essa incidência varia muito de acordo com as regiões do mundo. Os grupos de risco para a doença celíaca são os pacientes por- tadores de diabetes tipo 1, tireoidite autoimune, hepatopatia autoimune, síndrome de Down e síndrome de Turner em indiví- duos geneticamente predispostos.3 Apresentação clínica A apresentação clássica da doença celíaca é a má absorção, que se manifesta por diarreia e déficit somático na infância, ano- rexia, flatulência, vômitos, dor abdominal e manifestações ex- traintestinais, como anemia, ansiedade, artralgias, artrite, ata- 52 xia, retardo na puberdade, dermatite herpetiforme, fadiga de causa não explicada, infertilidade, aftas recorrentes, mialgias, baixa estatura e outros. Quadro 1. Prática clínica atual na suspeita de doença celíaca Diagnóstico atual Atualmente o diagnóstico é baseado, além da suspeita clíni- ca, em três pilares: exames sorológicos, exame histopatológico e teste genético. A sorologia utiliza anticorpo antigliadina e an- tigliadina deaminado, anticorpo antiendomísio e anticorpo anti- transglutaminase tecidual IgA ou IgG em caso de deficiência de IgA. A histologia de fragmentos de biópsias de bulbo, primeira e segunda porções de duodeno mostra aumento de linfócitos in- traepiteliais (25 ou mais por 100 enterócitos), hiperplasia de criptas e atrofia de vilosidades. Em situações especiais usamos estudo genético utilizando o HLA-DQ2 e HLA-DQ8. Sorologia Anticorpo Antigliadina IgA Anticorpo Antiendomísio IgA Anticorpo Antitransglutaminase Tecidual IgA Histologia Biópsia de duodeno 1ª e 2ª porção Aumento de linfócitos intraepiteliais (≥ 25 por 100 enterócitos) Hiperplasia de criptas Atrofia de vilosidades Situações especiais Pesquisa de HLA-DQ2 e HLA-DQ8 53 Perspectivas futuras no diagnóstico da doença celíaca, em estudo, poderão auxiliar tanto no diagnóstico não invasivo da doença quanto na avaliação do acompanhamento da aderência à dieta isenta de glúten. Perspectivas futuras no diagnóstico Teste salivar para TG2 Biossensores (imunoeletrossensores) Concentração plasmática da sinvastatina Genes 1-α regeneradores Peptídeos imunogênicos do glúten Teste salivar para TG24 Ensaio imunoeletroquímico realizado na saliva, teste de bai- xo custo e execução rápida, útil em screening. Capaz de detectar anti-tTG IgA com especificidade de 89% e sensibilidade de 90%. Biossensores Imunoeletrossensores capazes de detectar peptídeos do glú- ten na urina, sendo úteis para acompanhamento clínico de pa- cientes celíacos e monitorização não invasiva de aderência
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