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DIREITOS HUMANOS

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AULA 1 - A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A ORDEM JURÍDICA
A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: CONSIDERAÇÕES GERAIS
Vejamos, a seguir, um trecho do famoso poema “Morte e Vida Severina”, de João Cabral de Mello Neto:
No famoso poema, João Cabral de Mello Neto conta a história de Severino, um retirante do interior da Paraíba que foge da seca, em direção a Recife, no litoral de Pernambuco. Lá, Severino acredita que terá uma vida melhor, com melhores condições.
Esse trecho reproduzido se refere ao final da viagem de Severino, já chegando em Recife. Mas, ainda assim, mesmo estando na capital pernambucana, Severino encontra morte e pobreza, da mesma maneira que via no interior do sertão. Decepcionado e desiludido, o trecho reproduzido sugere ao leitor que Severino irá se suicidar para dar fim a sua sina.
Esse sonho desfeito de Severino, escrito pelos idos dos anos 50 do século passado, ainda se mostra atual. Traduzido para o mundo do Direito, traz os desafios que a dignidade humana (ou sua falta ou desrespeito) coloca para as sociedades contemporâneas, e em especial a brasileira.
A dignidade da pessoa humana tem sido considerada por muitas áreas do saber humano, tais como a Filosofia, a Ética, a Política e o Direito, como o ponto central de construção de todo o ordenamento jurídico e do próprio Estado.
Ela é vista até mesmo com um valor suprajurídico, isto é, para além do Direito e da Constituição, já que seria a dignidade um valor ínsito do ser humano. E, desta maneira, a dignidade trata diretamente da essência do ser humano. É, portanto, esse seu caráter supraconstitucional que permite, inclusive, que possamos sustentar sua efetividade independentemente da sua positivação (isto é, seu reconhecimento pelo direito, através de uma norma jurídica, quer seja ela lei ou mesmo uma norma constitucional).
Se pensarmos, por exemplo, nos dramas humanos da atualidade, como entre tantos outros, a questão dos refugiados de guerra ou a fome nos países africanos, salta aos olhos a crise humanitária¹ que vivenciamos e destacamos a importância da valorização e proteção da dignidade humana como bússola para enfrentarmos essas calamidades que assolam o mundo.
Assim, falar de dignidade humana é falar do outro, é falar de direitos, é falar de democracia, é falar de cidadania.
Para as sociedades atuais, a dignidade da pessoa humana coloca uma série de desafios a serem enfrentados, assegurando a todas as pessoas uma vida decente: com respeito, igualdade e liberdade, com acesso aos bens necessários para a realização do projeto de vida de cada um e que leve, enfim, à felicidade. Assim, a dignidade se articula com a própria possibilidade de existir com decência no mundo para nele viver em plenitude.
No entanto, a vida em sociedade é marcada por desigualdades materiais e carências sociais, pois, ainda que expresso de forma simplista, há mais pessoas do que bens disponíveis, isto é, não é possível o acesso igual de todos a todos os recursos disponíveis: aí se coloca o dilema da dignidade humana.
O que temos de fazer para assegurar cada vez mais proteção à dignidade humana, para um número maior de pessoas, sempre em um movimento crescente?
A CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DA DIGNIDADE HUMANA
A ideia de dignidade humana não é uma invenção do século XX. Os estudiosos do tema apontam que, já na Antiguidade Grega, havia um movimento de valorização da pessoa humana. Também entre os orientais a pessoa humana tinha seu destaque. Confúcio², partidário de uma ideia de aperfeiçoamento do ser, em detrimento da caridade pura, já pregava “ame a todos sem distinção”. Posteriormente, com o advento do Cristianismo, a figura do ser humano, à imagem e semelhança de Deus, inspirava uma relação de reconhecimento de si no outro. O fundamento da dignidade morava no divino.
Saltando no tempo, é com o Iluminismo³ que, no Ocidente, a dignidade da pessoa humana passa a derivar da razão, daí decorrendo a criação de vários documentos emblemáticos para o marco do respeito à dignidade humana, como por exemplo, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão4, de 1789, resultado da Revolução Francesa.
Kant5, na famosa obra "Fundamentação da Metafísica dos Costumes" sustentava que as pessoas deveriam ser tratadas como um fim em si mesmas, e não como um meio (objetos). O filósofo assim dizia:
São as noções de Kant que fixaram as bases da compreensão moderna da dignidade humana fixando sua relação com os direitos humanos e que até hoje se colocam como, de certa forma, pertinentes.
Há duas dimensões do pensamento kantiano que merecem destaque:
A ideia de finalidade6, isto é, o homem, por ser dotado de razão, é um fim em si mesmo.
A ideia de autonomia7, isto é, a vontade humana deve estar direcionada para o dever de estabelecer parâmetros de moralidade que sirvam para todos, inclusive para ela mesma, não porque se busca uma vantagem futura, mas sim porque esta é a dignidade do ser dotado de razão.
ATENÇÃO!
Devemos ter em mente que a compreensão da dignidade que hoje temos não equivale ao que se pensava em épocas passadas, já que os contextos históricos e culturais são distintos. Assim, embora a dignidade decorra da existência da própria pessoa, ela hoje está associada à ideia de condição humana8 que se desenha pela e na História, afastando de certa forma sua derivação do Direito Natural9.
Entretanto, de toda forma, a dignidade humana é saudada como o motor do progresso civilizatório, que uniria a humanidade em torno de uma grande causa comum, como veremos ao avançar em nossos estudos e pensarmos, especialmente, no Direito Internacional dos Direitos Humanos.
A PROBLEMÁTICA CONCEITUAL E SUA RELAÇÃO COM OS DIREITOS HUMANOS
Em uma postagem, de março de 2015, no Blog JOTA, Daniel Sarmento, diz que:
“uma rápida pesquisa no site do STF mostra que, sob a égide da Constituição de 1988, o princípio da dignidade da pessoa humana foi explicitamente invocado em nada menos que 260 acórdãos, 2.298 decisões monocráticas, 79 decisões da Presidência, 9 questões de ordem e 3 repercussões gerais. Os temas abordados pelas decisões são os mais variados, indo da vedação de denúncias criminais genéricas à união homoafetiva; da impossibilidade de realização compulsória do exame de DNA ao aborto de fetos anencéfalos; das políticas de ação afirmativa à criminalização da violência doméstica”.
Desses dados apresentados, logo pensamos:
Como propor que um conceito de dignidade dê conta de temas e questões tão diferentes?
Que seja capaz de comunicar um sentido mais objetivo à dignidade humana, que todos sabem o que é, mas têm muitas dificuldades de explicar e acordar um sentido para ser compartilhado?
Veremos que há um esforço doutrinário no sentido de responder nossos questionamentos, embora sem que possamos ter uma definição fechada, com todos os seus elementos determinados.
UM CONCEITO DE DIGNIDADE HUMANA: DESAFIOS
A dignidade humana é uma daquelas expressões chamadas de polissêmicas. Isto quer dizer que ela é portadora de muitos sentidos diferentes, sendo um desafio estabelecer um sentido único para a mesma.
Assim, dignidade humana quer (e pode) dizer respeito a muitas coisas diversas, em razão do sentido que lhe é atribuído e dos interesses que se busca preservar ou defender quando a ela recorremos.
ATENÇÃO!
Essa ausência de sentido único faz com que a dignidade da pessoa humana seja marcada por ambiguidades de sentidos, precisando de um esforço de interpretação maior para definir seu alcance e conteúdo. É nessa ambiguidade que entendemos a perplexidade dos dados levantados por Daniel Sarmento e anteriormente mencionados.
Entretanto, ainda que a dignidade humana possa ser etiquetada como uma cláusula aberta10, podemos fazer aqui alguns acordos quanto ao seu sentido.
Para nossa disciplina, adotaremos o conceito dado por Ingo Wolfgang Sarlet que articula a ideia de respeito a todos os seres humanos, independentemente de suas qualidades. Esse respeito é exigido do Estado e da sociedade como um todo, materializando-se em um feixe de direitos e deveres fundamentais que asseguram uma existênciaminimamente decente, (como, por exemplo, acesso ao saneamento básico, à água potável, dispor de alimentação adequada, etc.) que permita ao ser humano decidir os rumos de sua vida, assegurando sua felicidade e participação na sociedade.
Leia a conceituação de Ingo Wolfgang Sarlet:
A RELAÇÃO DA DIGNIDADE HUMANA COM OS DIREITOS HUMANOS
A despeito da dificuldade semântica já registrada, podemos adotar também uma fórmula para conceituar a dignidade:
Atributo inerente da pessoa humana, pelo simples fato de alguém “ser humano”.
Desse modo, por existir enquanto ser humano, em uma sociedade plural, automaticamente, esta pessoa se torna merecedora de respeito e proteção, independentemente, de sua origem, etnia, sexo, idade, estado civil, religião, filiação partidária, condição sócio econômica, cultura partilhada, ou de qualquer outro fator de identificação ou diferenciação.
Reconhece-se que a dignidade é um princípio fundamental11 que emana de todos os humanos, desde a concepção no útero materno, não se vinculando e não dependendo de atribuição de personalidade jurídica12 ao seu titular para seu reconhecimento.
Aqui, neste ponto de nossa disciplina, não aprofundaremos a distinção entre direitos humanos e direitos fundamentais.
Assim nesta aula, consideraremos os dois como sinônimos, apesar de haver uma distinção entre eles, especialmente, no que tange a sua esfera de incidência:
Desse modo, quer sejam direitos humanos ou direitos fundamentais, ambos emanam, decorrem da dignidade humana. Podemos, então, dizer que dignidade é um critério unificador, ao qual todos os direitos humanos/fundamentais se reportam, em maior ou menor grau de adesão ou concretização.
Por outro lado, também se discute se esses direitos poderão ser relativizados, ou não, na medida em que nenhum direito ou princípio se apresenta de forma absoluta, especialmente quando estudamos o conflito ou colisão entre direitos e suas formas de resolução.
Por exemplo, em nome do direito à intimidade e privacidade é possível que se proíba a circulação de uma reportagem jornalística? Esse é um tema de muita relevância e também delicado.
A relação da dignidade humana com os direitos humanos/fundamentais gera uma dupla obrigação para o Estado quanto ao que dele se pode exigir: uma de caráter negativo e outra de aspecto positivo.
CARÁTER NEGATIVO: Inspirado nos ideais liberais13, remete a uma noção de proteção, de defesa contra o Estado, determinando que o Estado deve se abster de adotar qualquer medida que possa violar a dignidade humana.
Por exemplo, se não houver ordem judicial, o Estado só pode prender as pessoas em flagrante delito14, isto é, se estiverem naquele momento praticando um crime. É o que temos no art. 5º. inciso LXI, da Constituição de 1988, preservando-se, assim, o direito à liberdade:
“LXI – ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei.”
DIMENSÃO POSITIVA: Impõe ao Estado um dever de agir jurídica ou faticamente. Em geral, a dimensão positiva irá se traduzir na prestação de um serviço púbico, tal como a educação, a previdência social, a assistência social e a saúde, entre outros. Ela resulta do modelo de Estado social15, que tem por finalidade proteger e promover, inclusive materialmente, a dignidade da pessoa humana.
No texto constitucional, temos como exemplo o direito à educação, previsto no Capítulo III da Constituição, regulamentado a partir do art. 205.
“Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho".
Ou ainda, como outro exemplo concreto, podemos citar o dever do Estado de prestar assistência social16 a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social17, garantindo um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei (art. 203, inciso V da Constituição de 1988).
ASPECTOS JURÍDICO E CONSTITUCIONAL DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA
A dignidade da pessoa humana, ao ser incorporada à ordem normativa de um país, passa a ostentar um aspecto jurídico que lhe dá todos os atributos que a norma jurídica18 ostenta, deixando de ser apenas uma indicação ética ou moral cuja adesão do sujeito depende apenas de sua consciência.
A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA COMO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO DE 1988
No caso do Brasil, em especial, a dignidade da pessoa humana é uma norma jurídico-positiva de status constitucional e, como tal, dotada de eficácia, sendo, então, capaz de garantir os direitos fundamentais do cidadão.
Logo no art. 1º. Inciso III da Constituição, o princípio da dignidade humana é declarado como um fundamento da República19 e do Estado Democrático de Direito20 do Brasil.
Para comentar este artigo trazemos novamente a contribuição de Ingo Wolfgang Sarlet:
“Consagrando expressamente, no título dos princípios fundamentais, a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do nosso Estado democrático (e social) de Direito (art. 1º, inc. III, da CF), nosso Constituinte de 1988 [...] além de ter tomado uma decisão fundamental a respeito do sentido, da finalidade e justificação do exercício do poder estatal e do próprio Estado, reconheceu categoricamente que é o Estado que existe em função da pessoa humana, e não o contrário, já que o ser humano constitui a finalidade precípua, e não meio da atividade estatal”. (SARLET, 2010: 133)
Em outras palavras, é o Estado que passa a servir ao cidadão, como instrumento para a garantia e promoção da dignidade das pessoas individual e coletivamente consideradas.
Além desse artigo, o princípio da dignidade se encontra previsto de modo expresso ou implícito ao longo do texto constitucional, reforçando a ideia de fundamento, sendo a dignidade humana o eixo valorativo de nosso Estado e direito.
Em outras palavras, é o Estado que passa a servir ao cidadão, como instrumento para a garantia e promoção da dignidade das pessoas individual e coletivamente consideradas.
Além desse artigo, o princípio da dignidade se encontra previsto de modo expresso ou implícito ao longo do texto constitucional, reforçando a ideia de fundamento, sendo a dignidade humana o eixo valorativo de nosso Estado e direito.
A PROTEÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA COMO VETOR PARA UMA HERMENÊUTICA ADEQUADA
Ao estudarmos a dignidade humana, percebemos, também, que ela se encontra diretamente relacionada ao tema da hermenêutica21. Nesse sentido, dois aspectos merecem atenção: a dimensão principiológica e a questão de seus limites ou restrições.
AULA 2 - OS DIREITOS HUMANOS – QUESTÕES GERAIS
O QUE SÃO OS DIREITOS HUMANOS?
Todos parecem saber, mas têm muita dificuldade em determinar um conceito que dê conta de transmitir o sentido dos direitos humanos.
Confira o que Vicente Barreto diz a respeito:
Ainda assim, podemos associar os direitos humanos de um lado a uma ideia de vulnerabilidade do ser humano e de outro à ideia de proteção.
Carlos Nino, um professor argentino, ao pensar sobre DH, chama atenção para o fato de que muitas vezes é o próprio homem que ameaça e põe em risco o outro.
“Esta importância dos Direitos Humanos está dada, como é evidente, pelo fato de que eles constituem uma ferramenta imprescindível para evitar um tipo de catástrofe que com frequência ameaça a vida humana. Sabemos, embora prefiramos não recordá-lo a todo o tempo, que nossa vida é permanentemente espreitada por infortúnios que podem aniquilar nossos planos mais firmes, nossas aspirações de maior alento, o objeto de nossos afetos mais profundos. Não é por ser óbvio que deixa de ser motivo de perplexidade o fato de que este caráter trágico da condição humana esteja dadopela fragilidade de nossa constituição biológica e pela instabilidade de nosso habitat ecológico, por obra de nós mesmos.” (1989:01)
Apesar da ausência de um conceito único, no mundo atual, podemos ao menos concordar que os
Direitos Humanos são direitos de TODAS as pessoas humanas – HOMENS, MULHERES e CRIANÇAS - em TODOS OS LUGARES, sustentam-se na dignidade do ser humano e obrigam os Estados e agentes públicos, protegendo indivíduos e grupos.
Nesse sentido, não podem ser suprimidos, nem negados. São iguais e interdependentes: isto é, nenhum deles é mais importante que os demais e o gozo de qualquer um afeta o gozo dos demais.
Por exemplo, duvidamos que alguém com fome (vítima de violação do direito humano a uma alimentação adequada) possa exercer seu direito de voto de forma adequada, em igualdade de condições com alguém que não passe fome.
Desse modo, os direitos humanos incluem o direito à vida e à liberdade, à liberdade de opinião e de expressão, o direito ao trabalho e à educação, entre muitos outros. Todos merecem esses direitos, sem discriminação.
Há um uso de outros termos que podem ser, em um primeiro momento, confundidos como sinônimos. Entretanto, cada um deles é reservado para um contexto diferente.
Vejamos:
DIREITOS HUMANOS: 
A ONU define os direitos humanos como “garantias jurídicas universais que protegem indivíduos e grupos contra ações ou omissões dos governos que atentem contra a dignidade humana”.
Os direitos humanos são garantidos internacionalmente, juridicamente protegidos e universais. É a expressão que tem uso predominante na ordem jurídica internacional, especialmente nos tratados internacionais.
Em nossa disciplina, privilegiaremos o uso de “direitos humanos”, já que estamos focando nossos estudos na projeção dos direitos humanos na ordem internacional.
DIREITOS HUMANITÁRIOS: 
Dizem respeito aos direitos humanos considerados em contextos de guerra. Fazem parte do chamado Direito Internacional Humanitário¹. Alguns autores consideram que os direitos humanitários são desdobramentos dos direitos humanos.
DIREITOS FUNDAMENTAIS:
Quando os direitos humanos se encontram inseridos na ordem jurídica interna são chamados de direitos fundamentais. Eles podem estar previstos na Constituição ou mesmo em leis esparsas. No Brasil, se encontram previstos no texto da Constituição Federal, especialmente no art. 5º. da Constituição de 1988.
“Art. 5º, caput da CF: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes [...]”
Normalmente, são estudados como parte temática do Direito Constitucional e a doutrina contemporânea tem se esforçado em identificar uma “teoria dos direitos fundamentais”.
Podemos dizer que os direitos fundamentais são o núcleo inviolável de uma sociedade, voltados para assegurar e proteger a dignidade da pessoa humana, com o que não basta apenas seu reconhecimento formal nos instrumentos normativos, mas devem ser materialmente efetivados pelo Poder Público.
GARANTIAS:
A expressão “garantias” muitas vezes acompanha os direitos humanos e fundamentais, inclusive na Constituição de 1988 são tratados em conjunto. Contudo, a ideia de garantia propõe a noção de instrumentos, de proteção.
Há, na garantia, uma dimensão assecuratória do direito. Ao passo que no direito a dimensão é declaratória (isto é, de dizer, reconhecer na ordem normativa posta que o direito existe), tratando de um bem ou de uma vantagem. Por exemplo: para assegurar a liberdade de ir e vir, temos, em nossa ordem jurídica, o Habeas Corpus².
Se a pessoa tem um direito, é preciso que haja a previsão de garantias que estendem seu raio de ação em três direções, sob pena do direito reconhecido ser transformado em pó:
 Contra o de risco de violação - quer dizer, instrumentos que previnam a violação;
 Contra a própria violação - isto é, instrumentos que façam cessar a agressão ou violação ao direito; 
 De proteção ou mesmo de reparação no caso de a violação já ter ocorrido. 
Essas garantias podem ser de natureza institucional e, portanto, se articulam com o desenho que é dado às instituições que compõem o Estado. Por exemplo, a existência de um Poder Judiciário e de um Ministério Público independentes opera em favor da proteção aos direitos contra os abusos cometidos pelo Poder Público. Estas são chamadas de garantias institucionais.
Por outro lado, as garantias podem ser mecanismos jurídico-processuais – que se traduzem em ações específicas - que permitam que o Poder Judiciário seja acionado na hipótese de agressão ou risco para o direito. Quando têm previsão no texto constitucional são chamadas de remédios constitucionais. No plano internacional, essas garantias têm outras feições.
AS GERAÇÕES OU DIMENSÕES DOS DH
Percebemos que os direitos humanos, como hoje são compreendidos, são resultado de um processo histórico que, ao longo do tempo, vai se sedimentando em avanços e retrocessos nesse tema.
Embora a proposta de geração de direitos tenha sido feita por Karel Vasak em 1979, em uma conferência no Instituto Internacional de Direitos Humanos de Estrasburgo (França), entre nós, a ideia de geração de direitos se tornou muito popular a partir da obra de Norberto Bobbio (1992).
Os direitos humanos (ou fundamentais) são organizados a partir de gerações. Esses direitos são associados a um núcleo de valores comuns, em geral referenciados ao lema da Revolução Francesa:
ATENÇÃO!
Assim, teríamos as três primeiras gerações de direitos da seguinte maneira:
· 1ª Geração – direitos individuais (liberdades públicas) e direitos políticos;
· 2ª geração – direitos sociais, econômicos e culturais;
· 3ª geração – direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos.
Em seguida, de forma controvertida, alguns autores, capitaneados por Paulo Bonavides (1998), sustentam já termos, também, os direitos da 4ª geração que seriam, por exemplo, direito à informação, à democracia, ao pluralismo. Outros até falam em quinta e sexta gerações, surgidas com a globalização, com os avanços tecnológicos (cibernética) e com as descobertas da genética (bioética)...
Apesar de simbólica e de seu valor pedagógico, a teoria da geração tem sido criticada uma vez que implica uma sucessão no tempo, como um movimento evolutivo, que não tem comprovação histórica, além de sugerir que uma geração possa vir a substituir outra – o que igualmente não é verdade.
Há ainda muito a ser conquistado, no mundo atual. Entre algumas questões de déficit de efetividade de direitos, por exemplo, nos chamados países periféricos, os relatórios internacionais apontam para problemas envolvendo os direitos de liberdade (que seriam direitos ainda da primeira geração), veja o caso de Cuba ou da Coreia do Norte.
Os direitos sociais, nos Estados Unidos, não são pacificamente reconhecidos como direitos fundamentais, além existir o problema da adoção da pena de morte em muitos estados membros da Federação norte-americana.
Desse modo, ao invés de gerações, tem sido proposta a sistematização pela noção de dimensões. As dimensões melhor se articulam com a ideia de indivisibilidade, conforme reconhecido pela ONU na Carta de 1948. As dimensões de direitos permitem uma compreensão de interdependência estrutural dos direitos humanos, implicando em uma teia de relações e complementariedade.
Nesse sentido, como alinhado por Lima (2003), note-se, por exemplo, como é difícil desvincular:
· o direito à vida (1ª geração) do direito à saúde (2ª geração),
· a liberdade de expressão (1ª geração) do direito à educação (2º geração),
· o direito de voto (1ª geração) do direito à informação (4ª geração),
· o direito de reunião (1ª geração) do direito de sindicalização (2ª geração),
· o direito à propriedade (1ª geração) do direito ao meio ambiente sadio (3ª geração)
E assim por diante...
Por fim, “o ideal é considerar que todos os direitos fundamentais podem ser analisados e compreendidos em múltiplasdimensões, ou seja, na dimensão individual-liberal (primeira dimensão), na dimensão social (segunda dimensão), na dimensão de solidariedade (terceira dimensão) e na dimensão democrática (quarta dimensão). Não há qualquer hierarquia entre essas dimensões. Na verdade, elas fazem parte de uma mesma realidade dinâmica. Essa é a única forma de salvar a teoria das dimensões dos direitos fundamentais”. (LIMA, 2003)
AS CARACTERÍSTICAS DOS DH
Os direitos humanos são fundados sobre o respeito pela dignidade e o valor de cada pessoa, sendo certo que entre eles não há hierarquia.
No que tange as características dos DH, em geral, são apontadas:
A IMPRESCRITIBILIDADE
O decurso do tempo ou a inércia do seu titular não levam a perda do direito em si (ainda que nos casos de direitos patrimoniais o tempo seja um fator importante, como por exemplo, o usucapião³. Mesmo que se perda a propriedade de determinado bem imóvel, não se perde, em tese, o direito de ser proprietário em relação a outros bens).
A INALIENABILIDADE
Não se pode alienar a condição humana, logo os direitos que dela decorrem também não o podem. Ainda que se possa alienar direitos patrimoniais, o direito a ter direitos patrimoniais é inalienável.
A IRRENUNCIABILIDADE
São irrenunciáveis pois não se pode abrir mão de sua própria natureza.
A INVIOLABILIDADE
Não podem ser violados pela ordem jurídica, especialmente no plano interno, por leis infraconstitucionais, nem por atos administrativos de agente do Poder Público, sob pena de responsabilidade civil, penal e administrativa.
A UNIVERSALIDADE
Alcançam a todos os seres humanos sem distinções.
A INTERDEPENDÊNCIA
Um direito depende de outro para sua realização, logo estão inter-relacionados, interligados.
COMPLEMENTARIDADE
Devem ser observados não isoladamente, mas de forma conjunta e interativa com os demais direitos e o próprio ordenamento jurídico.
HISTORICIEDADE
São construções históricas.
ESSENCIALIDADE
Os direitos humanos são inerentes ao ser humano, tendo por base sua dignidade (aspecto material), assumindo posição normativa de destaque (aspecto formal).
Em síntese, os direitos humanos são universais, o que quer dizer que são aplicados de forma igual e sem discriminação a todas as pessoas.
Os direitos humanos são inalienáveis, e ninguém pode ser privado de seus direitos humanos; eles podem ser limitados em situações específicas. Por exemplo, o direito à liberdade pode ser restringido se uma pessoa é considerada culpada de um crime diante de um tribunal e com o devido processo legal.
Os direitos humanos são indivisíveis, inter-relacionados e interdependentes, já que é insuficiente respeitar alguns direitos humanos e outros não. Na prática, a violação de um direito vai afetar o respeito por muitos outros. Todos os direitos humanos devem, portanto, ser vistos como de igual importância, sendo igualmente essencial respeitar a dignidade e o valor de cada pessoa.
AS LIMITAÇÕES E COLISÕES DE DH
As limitações e colisões dos direitos humanos têm por pressuposto o fato dos direitos não serem absolutos, o que já se verifica pela existência de um em número de seus titulares.
Como explica André de Carvalho Ramos:
Assim, é possível que o exercício de um direito possa gerar algum ônus para o direito alheio.
Ao se falar em limitações, em geral, estamos tratando de discutir se é possível a imposição de limites ou restrições normativas ao direitos humanos? E, se possível, em que medida essas limitações são legítimas? As crises constitucionais, como estado de sítio4 e estado de emergência5, justificam a restrição?
Por um lado, essas limitações podem ser impostas pela própria ordem normativa, sendo aí importante levar em conta o princípio da proporcionalidade6 como parâmetro para avaliar se a restrição é justificável.
Por outro lado, há limitações que são impostas pela existência de outros direitos – que aqui chamaremos de conflito ou colisão de direitos. Por exemplo, a direito de acesso à informação em oposição à privacidade ou intimidade.
Na colisão de direitos, há que se levar em conta a questão da ponderação de valores7, no sentido de determinar no caso em concreto qual será o direito que deverá prevalecer em detrimento do outro.
ATENÇÃO!
Não é possível que o direito que cede seja esvaziado totalmente, de modo que dele reste um simulacro (a doutrina aqui fala em respeito ao núcleo essencial do direito8), já que os direitos humanos não guardam hierarquia entre si e todos eles operam em uma lógica de concorrência, isto é, aplicam-se concomitantemente no caso em concreto, podendo ser exercidos de forma cumulada.
Ademais, a solução de uma colisão de direitos humanos não pode implicar diminuição ou redução da proteção ao direito que vem sendo oferecida pelo ordenamento jurídico e pelo próprio estado. É o que a doutrina chama de princípio da vedação do retrocesso9.
Falando de limitações e colisões de direito, é interessante que vejamos na vida real como essas questões podem se dar.
George Marmelstein, em seu blog “Direitos Fundamentais” traz uma coletânea de seis casos pitorescos que envolvem conflitos de direitos, mas que apesar de serem curiosos, valem pelas discussões éticas e filosóficas que colocam.
Por fim, chamamos atenção para os questionamentos que André Carvalho Ramos faz:
“A visão isolada e estática de um direito é irreal e, via de regra, fruto de uma opção ideológica do intérprete, ansioso por justificar sua posição jurídica graças ao apelo a um “direito fundamental”, esquecendo, propositalmente, que outros direitos seriam afetados e mereceriam também proteção.
Esse cenário de interdependência e inter-relação dos direitos nos leva à seguinte dúvida: como justificar racionalmente a prevalência de um direito e o afastamento de outro? Devemos, assim, estudar como evitar o recurso retórico a fundamentações vazias, como o apelo à “dignidade humana” sem maior consideração sobre a existência, no outro polo, de direitos que serão afastados”. (RAMOS, 2012:109)
AULA 3 - A PROTEÇÃO DE DH NO BRASIL
O SISTEMA BRASILEIRO DE DIREITOS HUMANOS/FUNDAMENTAIS
A proposta de estudar o sistema brasileiro de direitos humanos fundamentais, nesta aula, nos remete ao plano da Constituição Federal de 1988 e como ela se coloca como a moldura a ser levada em conta quando falamos na proteção de direitos no Brasil.
Nesse sentido, trataremos do tema em quatro momentos:
 O sentido da Constituição de 1988;
 A ideia de sistema jurídico;
 A concepção de direitos fundamentais abrigados pela Constituição;
 O rol dos direitos constitucionalmente consagrados.
O SENTIDO DA CONSTITUIÇÃO DE 1988
"A Constituição é mais que um documento legal. É um documento com intenso significado simbólico e ideológico – refletindo tanto o que nós somos enquanto sociedade como o que nós queremos ser", nos ensina Flávia Piovesan (2016), ao citar dois autores estrangeiros, Joel Bakan e David Schneiderman.
Assim, a Constituição de 1988 representa a visão de mundo, de Estado, de sociedade e do cidadão que, pelo exercício do Poder Constituinte¹, adotamos como rota e destino para nosso país e povo.
Como afirma o preâmbulo da Constituição², somos um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias.
O SENTIDO DA CONSTITUIÇÃO DE 1988
Por outro lado, tendo a cidadania e a dignidade da pessoa humana como fundamentos (art. 1º.), as ações do Estado brasileiro, quer no plano administrativo, legislativo ou jurisdicional, devem ser direcionados para:
I. Construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II. Garantir o desenvolvimento nacional;
III. Erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV. Promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade equaisquer outras formas de discriminação.
São esses objetivos fundamentais determinados na Constituição, em seu art. 3º, que revelam um compromisso inafastável com a promoção e proteção dos direitos humanos como eixo de legitimidade do Estado Brasileiro.
A IDEIA DE SISTEMA JURÍDICO
A Constituição também é um sistema jurídico e como tal dotada de organicidade e coerência.
A utilização dessa expressão “sistema jurídico”, como escreve John Rawls, implica “[...] uma ordem coercitiva de regras públicas endereçadas a pessoas racionais, com o propósito de regular certas condutas e assegurar os fundamentos de uma cooperação social. [...] A ordem jurídica é um sistema de regras públicas, endereçadas e pessoas racionais, no qual os preceitos de justiça são associados ao Estado de Direito." (1971: 235-236).
Para Paulo Bonavides, a ideia de sistema remete de plano a outras ideias, como: unidade, totalidade e complexidade.
Para ao autor:
E sendo um sistema, há um desdobramento imediato no plano da interpretação constitucional, que deverá assumir como referencial obrigatório, para a compreensão da norma, toda a dimensão dos princípios da Constituição que apontam para a maior realização possível da dignidade humana traduzidas nos direitos fundamentais.
A CONCEPÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ABRIGADOS PELA CONSTITUIÇÃO
A concepção de direitos humanos adotada pela Constituição está assentada no valor da dignidade humana – o que significa dizer que há uma valorização dos direitos e garantias fundamentais que funcionam como o eixo axiológico (isto é valorativo) de todo o sistema jurídico brasileiro, que deve, por sua vez, incorporar as exigências de justiça e de valores éticos.
Nos dizeres de Flávia Piovesan (2016), “constata-se, assim, uma nova topografia constitucional, na medida em que o texto de 1988, em seus primeiros capítulos, apresenta avançada Carta de direitos e garantias, elevando-os, inclusive, a cláusula pétrea³, o que, mais uma vez, revela a vontade constitucional de priorizar os direitos e garantias fundamentais”.
Entretanto, continua a professora Piovesan (2016), “a Carta de 1988 não se atém apenas em alterar a topografia constitucional tradicional e elevar a cláusula pétrea os direitos e garantias individuais”.
Há uma inovação significativa, pois ao ampliar a dimensão dos direitos e garantias, a Constituição não apenas assegura direitos individuais, mas abarca também as diferentes dimensões dos direitos, como veremos em seguida.
Além do mais, na mesma linha adotada pela Lei Fundamental de Bonn de 19494 e pela Constituição Portuguesa de 1976, a Constituição de 1988, com a finalidade de reforçar a obrigatoriedade das normas que consagram direitos e garantias fundamentais, estabeleceu no parágrafo 1º. do art 5º que “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.”
Isso quer dizer que a ideia do constituinte é evitar que as normas de direitos fundamentais sejam consideradas como “letra morta”. Sendo de aplicabilidade imediata, elas devem ser aplicadas de plano, já que por si só têm o condão de regular diretamente relações jurídicas.
Assim, não ficam sujeitas à edição de lei para lhes dar concretude. Ao contrário, é a lei que deve atentar para as prescrições de direitos fundamentais.
ATENÇÃO!
Dessa forma, este princípio da aplicabilidade de direitos fundamentais está vinculado à efetividade dos direitos fundamentais que vai dizer respeito a sua aptidão de produzir efeitos, mudando a realidade fática.
Por outro lado, a questão da efetividade se relaciona diretamente com o seu cumprimento forçado por intermédio do Poder Judiciário.
DIREITOS DE LIBERDADE: Para os direitos de liberdade, isto é, que demandam do Estado um não fazer, uma abstenção de conduta. Essa questão é menos problemática, já que a intervenção do juiz se dá no sentido de fazer cessar a violação à liberdade (por exemplo, o relaxamento de uma prisão ilegal).
DIREITOS SOCIAIS: Para os direitos sociais, que demandam sua implementação mediante principalmente políticas públicas, a aplicabilidade imediata não é tão fácil de ser obtida pela via judicial. Tanto é que, nesses casos, muito se discute sobre a possibilidade de implementação desses direitos pelo Poder Judiciário, como por exemplo, temos o debate sobre a judicialização da saúde5.
O ROL DE DIREITOS FUNDAMENTAIS CONSTITUCIONALMENTE CONSAGRADOS
No movimento expansivo da dignidade humana, o constituinte recepcionou e organizou os direitos fundamentais da seguinte maneira:
DIREITOS INDIVIDUAIS
Também conhecidos como liberdades públicas, direitos negativos, liberais ou de 1a geração (art. 5o da CRFB/88) - são direitos que apresentam como principais características os indivíduos como titulares e controlar os abusos de poder estatais.
DIREITOS COLETIVOS E DIFUSOS (OU DE 3A GERAÇÃO)
Os coletivos caracterizam-se por serem direitos de um grupamento humano com interesses homogêneos, por exemplo o pleito dos sindicatos. Já os difusos são direitos que pertencem a todos, ou seja, não somos capazes de identificar quem são os seus titulares como, por exemplo, o meio ambiente.
DIREITOS DA NACIONALIDADE
Caracteriza-se como vínculo jurídico-político de uma pessoa com o Estado que nos permite dizer que esta pessoa faz parte do povo deste Estado. Ela pode ser de dois tipos: originária, que chamamos de natos, que no Brasil pode ser adquirida pelo critério misto, ou seja, pelo nascimento em nosso território (ius soli) ou pela consanguinidade (ius sangunis) de pai ou mãe brasileiros ou; derivada, que se adquire com um pedido ao governo brasileiro atendendo aos requisitos de se for originário de país de língua portuguesa: ter visto (autorização de permanência regular no Estado Brasileiro) de permanência, residência ininterrupta por um ano e idoneidade moral e, se originário de outro país: visto de permanência, quinze anos de residência ininterrupta e nenhuma condenação penal. (art. 12 da CRFB/88).
DIREITOS POLÍTICOS
Segundo Pedro Lenza, “direitos políticos nada mais são do que instrumentos através dos quais a Constituição Federal garante o exercício da soberania popular atribuindo poderes aos cidadãos para interferirem na condução da coisa pública, seja direta ou indiretamente”. Esses direitos são basicamente exercidos pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto. O sufrágio (capacidade eleitoral ativa) determina o direito de eleger e ser eleito (capacidade eleitoral passiva). O voto é um direito público subjetivo que tem como características ser personalíssimo, sigiloso, obrigatório, livre, periódico e igual. Apenas para não confundir, vale lembrar que escrutínio significa a maneira pela qual se vota e que a legislação infraconstitucional referente aos direitos políticos é a Lei 4737/65.
DIREITOS SOCIAIS
São direitos sociais ou de segunda geração, se caracterizam por terem como titulares grupos específicos de pessoas como, por exemplo, crianças, mulheres, trabalhadores etc. Exigem do Estado um fazer, um animus de proteção efetiva na persecução desses direitos a fim de amenizarem as desigualdades sociais.
A CLÁUSULA DE ABERTURA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Para além do princípio da aplicabilidade imediata, a Constituição adotou uma cláusula de abertura no que toca ao reconhecimento dos direitos fundamentais.
Essa cláusula também está prevista no art. 5º, em seu parágrafo segundo, estabelecendo que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou, de forma original, dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
Isto quer dizer que há uma abertura material para o reconhecimento de outros direitos fundamentais que topograficamente não estejam listados nem no catálogo do art. 5º, nem no Título II da Constituição e/ou nem mesmo na própria Constituição. Logo, podemos falar de uma não tipicidade que define um regime de direitos fundamentais.
Aliás, nesse mesmo sentido, já entendeu o STF que o rol dos direitos fundamentais (que são cláusulas pétreas– art. 60, §4o ,inciso IV da CRFB/88) é meramente exemplificativo, visto que podemos depreender novos direitos implicitamente como também pela incorporação de tratados internacionais de direitos humanos (art. 5o §§ 2o e 3o da CRFB/88).
A HIERARQUIA DOS TRATADOS INTERNACIONAIS SOBRE DIREITOS HUMANOS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Hoje temos o reconhecimento máximo, sob o plano normativo-formal, da prevalência dos DH como fonte de referência para o Direito brasileiro, bem como os Poderes do Estado e seus agentes e para toda a sociedade civil.
Além dos parágrafos 1º e 2º do artigo 5º, a Emenda 45 de 2004 acrescentou mais um parágrafo terceiro:
“§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”.
O mencionado dispositivo é de extrema relevância, pois dá aos tratados de DH uma hierarquia normativa superior a da lei no sentido formal (lei ordinária ou lei complementar), fazendo com que os mesmos tenham o status de norma constitucional derivada (Emenda constitucional).
Para tanto, a aprovação deste tratado deverá observar procedimento mais qualificado, bastante rígido:
Aprovação em dois turnos;
Em cada casa em separado (Câmara e Senado Federal);
Quórum de três quintos dos membros.
 
Atente que, ao assumir o valor formal de emenda à Constituição, o tratado de DH se coloca como um parâmetro a ser seguido por todo o ordenamento jurídico que necessariamente deve observar seus preceitos sob pena de vício de inconstitucionalidade6, passível de correção pelos mecanismos de controle de constitucionalidade adotados pela nossa ordem constitucional.
Logo, o legislador ordinário está vinculado à proteção desses direitos e, ao exercer a função legislativa, deverá tê-los como norte ao propor as regulamentações legais.
O SISTEMA DE GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
O mundo contemporâneo tem revelado sistemas de garantias dos direitos fundamentais variados, que incorporam muitas experiências diferentes, em distintos níveis normativos. Muitas delas se repetem nos diferentes países, especialmente se considerado o mundo ocidental. Veja-se, por exemplo, a proteção à liberdade de ir e vir internacionalmente adotada pelo Habeas Corpus ou instrumento equivalente.
A Constituição de 1988 prestigia uma estrutura protetiva, ao menos no plano normativo (já que nem sempre a previsão em texto de lei corresponde a uma real e efetiva proteção), bastante extensiva e que contempla um sistema de proteção que pode ser articulado em circunstâncias distintas, levando em conta o tipo de violação perpetrada contra o direito fundamental considerado, a estrutura procedimental oferecida e a quem compete acionar esse sistema de proteção.
Também podemos falar em um sistema genérico que não foi especialmente concebido para a proteção de direitos fundamentais, mas que tem nos direitos sua última finalidade.
E há, ainda, um sistema previsto explicitamente para a proteção dos direitos fundamentais que se compõe de figuras jurídicas constitucionais garantidoras dos direitos fundamentais (que trata das ações voltadas para proteção de direitos fundamentais, chamadas de remédios constitucionais); assim como do incidente de deslocamento de competência, como veremos adiante.
Em ambos os sistemas, ressalta-se a importância do Poder Judiciário como estrutura do Estado, à qual é atribuída a missão de zelar pela cidadania, com a entrega da prestação jurisdicional, em situações de conflito entre as pessoas, assegurando que os direitos fundamentais sejam respeitados.
O sistema genérico basicamente se organiza em torno de dois grandes eixos:
O MODELO DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
O controle de constitucionalidade tem por finalidade assegurar que toda a produção normativa do Estado seja feita em conformidade com a Constituição. Logo, o controle busca suprimir a incompatibilidade expressa ou implícita entre a norma infraconstitucional com dispositivo que conste expressamente na Constituição.
O sistema de controle adotado pela Carta de 1988, oferece um leque variado de possibilidades que leva em conta alguns critérios para a caracterização do modelo que adotamos.
O sistema brasileiro se admite um controle chamado de misto:
· Controle político, que deve ser, em regra, preventivo, exercitado pelo próprio Poder Legislativo;
· Controle jurisdicional que:
· é repressivo, e pode se dar na modalidade indireta (no bojo de qualquer ação qualquer) quando efetuado por todas as instâncias jurisdicionais;
· na modalidade direta, através das ações especialmente desenhadas para o controle de constitucionalidade – controle direto - cuja competência, na esfera federal, no que toca a Carta de 1988, é do Supremo Tribunal Federal.
Entre as ações de controle direto, há duas espécies tratam explicitamente da proteção dos direitos fundamentais. São elas:
AÇÃO DE DESCUMPRIMENTO PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF)
A ADPF está prevista no art. 102, § 1º da Constituição. Tem por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público ou quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual, municipal, incluídos os anteriores à constituição.
Pela redação do caput do art. 102, é possível notar a enorme abrangência da ADPF que pode ser utilizada não apenas para censurar atos normativos, mas os atos administrativos e até os judiciais, inclusive atos normativos anteriores a promulgação da Constituição, como por exemplo, contratos administrativos, editais de licitação de concurso, decisões dos tribunais de contas. Logo, esses atos ficariam, também, sujeitos ao crivo do controle concentrado de constitucionalidade – o que não seria possível na tradicional via da Ação Direta de Inconstitucionalidade.
A doutrina tem entendido que os preceitos fundamentais são os princípios fundamentais, os direitos fundamentais, as cláusulas pétreas e os princípios constitucionais. Daí sua relevância no sistema de proteção dos DH. Hoje, a ADPF está regulamentada na Lei n. 9882.
AÇÃO DIRETA INTERVENTIVA (ADIN INTERVENTIVA)
A ação direta interventiva (art. 36, III da CRFB/88) é uma modalidade de controle de constitucionalidade concreto e concentrado para um conflito federativo, proposta na esfera federal pelo chefe do Ministério Público Federal, o Procurador-Geral da República7, quando um dos Estados membros desrespeita lei federal ou um dos princípios constitucionais sensíveis8 (art. 34, VII da CRFB/88). Entre eles, se encontra a DIGNIDADE HUMANA.
O ACESSO À JUSTIÇA
O acesso à justiça, traduzido aqui no direito de ação9, pode ser considerado, também, ferramenta de proteção aos direitos fundamentais, nas violações em concreto da esfera jurídica do cidadão, já que, nos termos do art. 5º. inciso XXXV da Constituição, a lei poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.
É o chamado de princípio da inafastabilidade da jurisdição que se traduz no direito da parte de acionar a Poder Judiciário, em busca de proteção/reparação ao direito fundamental violado. Esse direito se articula pelo princípio do devido processo legal10 que deverá ser observado como forma de se alcançar a solução adequada para a controvérsia apresentada ao juiz e que demanda uma resposta jurisdicional que é chamada de prestação jurisdicional.
AS FIGURAS JURÍDICAS CONSTITUCIONAIS GARANTIDORAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Os remédios são instrumentos processuais que visam assegurar o exercício dos direitos fundamentais quando violados. São eles:
Significa “tomes o corpo do delito”. É uma ação gratuita que visa proteger a liberdade de locomoção, e dispensa a necessidade de advogado. Ela pode ser proposta a seu favor ou de terceiros, preventiva (quando se há ameaça à liberdade) ou repressivamente – art. 5o, inciso LXVIII da CRFB/88.
Ação que pode ser individual ou coletiva, que visa proteger direito líquido e certo, ou seja,aquele que pode ser provado de plano, isto é, só pode ser provado por provas documentais irrefutáveis e apto a ser exercido no momento da impetração, que não seja protegido por habeas corpus ou habeas data quando se sofre uma ilegalidade de poder por uma autoridade pública. (art. 5o, incisos LXIX e LXX da CRFB/88 e LEI Nº 12.016, DE 7 DE AGOSTO DE 2009.
Significa “tomes a informação”. Segundo José Afonso da Silva “tem por objeto proteger a esfera íntima dos indivíduos contra: a) usos abusivos de registro de dados pessoais coletados por meios fraudulentos, desleais ou ilícitos; b) introdução nesse registro de dados sensíveis; c) conservação de dados falsos ou com fins diversos autorizados em lei”. É uma ação gratuita. (art. 5°, inciso LXXII da CRFB/88, Lei 9507/97 e súmula 2 do STJ).
Remédio que objetiva garantir a toda pessoa a eficácia plena de direitos fundamentais assegurados pela Constituição, de forma que busque obrigar o Poder Público a estabelecer norma regulamentadora – art. 5°, inciso LXXI da CRFB/88 LEI Nº 13.300, DE 23 DE JUNHO DE 2016.
Ação gratuita própria de cidadão em sentido estrito que visa proteger atos lesivos ao patrimônio público ou de entidades que o Estado participe, a moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico – art. 5°, inciso LXXIII da CRFB/88 e lei 4717/65 e súmula 35 do STF.
Remédio cabível para defesa do patrimônio público e social, do meio ambiente e de interesses difusos e coletivos e tem a sua única previsão constitucional no art. 129, inciso III. (Lei 7347/85).
O INCIDENTE DE DESLOCAMENTO DE COMPETÊNCIA
O Incidente de Deslocamento de Competência (IDC) foi trazido pela Emenda Constitucional no. 45 de 2004. Entre as várias novidades introduzidas pela emenda, o IDC permite ao Procurador-Geral da República, nos casos de grave violação aos Direitos Humanos, suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, a remessa do caso para a Justiça Federal que passaria a ter competência para processar a violação.
Confira o texto constitucional:
Desde a sua origem, em 2004, o incidente não tem sido muito frequente, o que nos leva a indagar o motivo de seu baixo grau de adesão, já que as violações aos DH, infelizmente, na atualidade, não são raras.
Aliás, essa crítica de baixa efetividade pode ser formulada para todo o sistema de proteção dos direitos fundamentais, eis que, na atualidade, o grande desafio que se coloca não é mais o reconhecimento normativo, a positivação dos DH, mas sim como realmente protegê-los, de modo que se possa consolidar na vida de todos e de cada um uma dimensão real e plenamente vivenciada da dignidade humana.
Ainda assim, com a previsão normativa do incidente marca-se o seu valor simbólico no sentido de apontar o compromisso do Estado Brasileiro com os DH.
AULA 4 - A COMUNIDADE INTERNACIONAL E OS DH
DH E A COMUNIDADE INTERNACIONAL
Um dos grandes desafios das sociedades contemporâneas, que se desdobra em suas ordens jurídicas, é a proteção dos direitos humanos, o que ganha especial relevo na esfera internacional e na forma como os Estados nela se articulam e se posicionam.
Tal relevância, por sua vez, pode ter seu marco temporal moderno na Segunda Guerra Mundial, que lançou as bases para a consolidação de um discurso de proteção ao ser humano para além das fronteiras geográficas do Estado Nação.
Por outro lado, esses desafios, na atualidade, podem ser sistematizados em quatro tipos que podem se combinar:
• As questões de violações em razão de conflitos bélicos internos ou mesmo externos;
• O baixo grau de institucionalidade de certos estados que colocam em risco a própria noção do rule of law¹.
Problemas vinculados à pobreza extrema que colocam sob ameaça a própria existência humana;
• Problemas vinculados à pobreza extrema que colocam sob ameaça a própria existência humana;
• Os riscos aos regimes democráticos que compõe o sistema internacional.
Esses desafios impõem aos estados e à chamada comunidade internacional uma agenda, muitas vezes sujeita a severas críticas, que demanda legitimação discursiva, quer no plano jurídico ou no plano político.
Nesse panorama chama atenção a forma com que os países lidam com tais cenários e de que maneira se engajam em processos motivados para a proteção dos direitos.
A PROTEÇÃO DE DH EM CONTEXTOS HISTÓRICOS DISTINTOS
A proteção de DH tem contornos distintos se levarmos em conta os contextos históricos em que essa discussão se coloca.
Nesse sentido, o desenho da proteção de DH tem se influenciado também pelos tipos de violações aos direitos humanos – o que se traduzirá em redes de política externa e compromissos jurídico-políticos assumidos frente a comunidade internacional e seus organismos. Esses arranjos integram o que chamamos de Direito Internacional Público.
Podemos ainda dizer que o Direito Internacional Público passou por um desenvolvimento histórico agrupado, segundo Jorge Miranda (2000), em oito momentos distintos e como consequência segue atualmente algumas tendências:
UNIVERSALIZAÇÃO:
O Direito internacional é um Direito universal e não é mais um Direito euroamericano a partir da desintegração dos impérios marítimos europeus e do império continental soviético.
REGIONALIZAÇÃO:
Solidariedade e cooperação entre Estados dentro de determinado espaço regional. Como exemplo, cita-se a criação da União Europeia.
INSTITUCIONALIZAÇÃO:
O Direito Internacional deixa de ser um direito das relações entre Estados para se tornar mais presente nos organismos internacionais, como a ONU.
FUNCIONALIZAÇÃO:
O Direito Internacional extravasa a esfera das relações externas e penetra nas matérias pertencentes tanto ao direito interno como ao próprio contexto das relações internacionais.
HUMANIZAÇÃO:
Aspecto humanizador do Direito Internacional que se apresenta com o surgimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos, desde a Carta das Nações Unidas em 1945, o desenvolvimento da Declaração Universal dos Direitos do Homem em 1948, e os vários tratados internacionais surgidos no pós-guerra, que se voltaram para a proteção dos direitos humanos.
OBJETIVAÇÃO:
Criação de regras e normas internacionais, presentes no moderno Direito Internacional, que são independentes e livres da vontade dos Estados.
CODIFICAÇÃO:
A Carta das Nações Unidas prescreveu em seu artigo 13 o incentivo ao desenvolvimento do Direito Internacional e sua codificação o que é realizado pelas comissões de Direito Internacional e de Direitos Humanos da própria ONU.
JURISDICIONALIZAÇÃO:
Com o desenvolvimento das regras de proteção internacional dos direitos humanos aumenta-se a necessidade de criação de tribunais internacionais, como por exemplo o Tribunal Penal Internacional.
A ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS
Hoje, a grande rede de proteção de DH e que um valor simbólico no cenário internacional é a Organização das Nações Unidas (ONU).
A ONU, abreviação de Organização das Nações Unidas (UN, United Nations, em inglês) é uma instituição supranacional, isto é, além dos Estados nação², tem por objetivo principal garantir a paz no mundo mediante o relacionamento amistoso entre os países. Está situada em Nova York, nos Estados Unidos.
A ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS
Essa organização tem com objetivos:
• Salvar as gerações futuras do flagelo da guerra;
• Reafirmar a fé nos direitos humanos fundamentais;
• Criar as condições sob as quais a justiça e o respeito às obrigações emanadas de tratados e outras fontes do direito internacional possam ser mantidos;
• Promover o progresso social e melhores padrões de vida num cenário de maior liberdade.
Infelizmente, embora em muitos casos ela não tenha atingido seus objetivos pacifistas, a ONU desempenha, também, um importante papel humanitário, buscando amenizar as desigualdades sociais no mundo, fomentando ações que buscam, por exemplo, combater a fome e a desnutrição.
Apesar de sua importância no mundo contemporâneo, como grande defensora de DH, cabe ressaltar que a ONU não dispõe de poder de coerção (salvo para os casos relacionados às ameaças contraa paz e à segurança internacionais e que estão previstos no capítulo VII da Carta).
Ainda assim, suas decisões tem importância pelo significado ético-humanitário.
A CARTA DAS NAÇÕES UNIDAS
A Carta das Nações Unidas³ de 1948, ou também chamada de Carta de São Francisco, é o documento que concebeu a ONU e procurou estabelecer, como uma de suas prioridades, a criação de um sistema internacional que protegesse os Direitos Humanos de forma ampla.
Adotada e assinada em 26 de junho de 1945, passou a ter vigência no dia 24 de outubro de 1945. A Carta estimula os direitos às liberdades fundamentais sem distinção por motivos de sexo, raça, religião ou idioma.
No entanto, tal propósito se tornou, e ainda se torna, dificultoso pela necessidade de não ingerência dessas determinações dentro dos assuntos internos dos Estados signatários da Carta.
O TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL – TPI
O Tribunal Penal Internacional/TPI, conhecido como Internacional Criminal Court (ICC) em inglês ou Court Pénale Internacionale (CPI) em francês, é uma organização independente, não pertencendo a ONU e que foi criada pelo Estatuto de Roma em 2002.  
Tem por finalidade processar e julgar, subsidiariamente ao Poder Judicial dos Estados (isto é, se não houver julgamento interno pelo Estado) acusados de crimes de genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e crimes de agressão.
GENOCÍDIO:
Nos termos do art 6º do Estatuto de Roma, entende-se por genocídio qualquer um dos atos praticado com intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso, enquanto tal:
• Homicídio de membros do grupo;
• Ofensas graves à integridade física ou mental de membros do grupo;
• Sujeição intencional do grupo a condições de vida com vista a provocar a sua destruição física, total ou parcial;
• Imposição de medidas destinadas a impedir nascimentos no seio do grupo;
• Transferência, à força, de crianças do grupo para outro grupo.
CRIMES CONTRA A HUMANIDADE:
Estão previstos no art. 7º e são entendidos quando cometidos no quadro de um ataque, generalizado ou sistemático, contra qualquer população civil, havendo conhecimento desse ataque. Caracterizam-se por:
• Homicídio;
• Extermínio;
• Escravidão;
• Deportação ou transferência forçada de uma população;
• Prisão ou outra forma de privação da liberdade física grave, em violação das normas fundamentais de direito internacional;
• Tortura;
• Agressão sexual, escravatura sexual, prostituição forçada, gravidez forçada, esterilização forçada ou qualquer outra forma de violência no campo sexual de gravidade comparável;
• Perseguição de um grupo ou coletividade que possa ser identificado, por motivos políticos, raciais, nacionais, étnicos, culturais, religiosos ou de gênero, tal como definido no parágrafo 3o, ou em função de outros critérios universalmente reconhecidos como inaceitáveis no direito internacional, relacionados com qualquer ato referido neste parágrafo ou com qualquer crime da competência do Tribunal;
• Desaparecimento forçado de pessoas;
• Crime de apartheid;
• Outros atos desumanos de caráter semelhante, que causem intencionalmente grande sofrimento, ou afetem gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental.
CRIMES DE GUERRA:
São definidos pelo Estatuto tendo como base as violações graves do direito internacional humanitário contidas principalmente nas Convenções de Genebra e seus Protocolos adicionais de 19774. Pressupõe-se que sejam cometidos dentro de um contexto de guerra e que o crime tenha relação com esta. O que diferencia os crimes de guerra dos crimes contra a humanidade é a necessidade de existência de um conflito, tenha ele caráter internacional ou não.
CRIMES DE AGRESSÃO:
Tendo em vista a controvérsia que existe a seu respeito, o Estatuto de Roma deixou a questão por ainda ser definida.
Continuando nosso estudo sobre o TPI, vamos nos apropriar das explicações5 que o Itamaraty6 nos oferece:
“O Brasil apoiou a criação do Tribunal Penal Internacional, por entender que uma corte penal eficiente, imparcial e independente representaria um grande avanço na luta contra a impunidade pelos mais graves crimes internacionais. O Governo brasileiro participou ativamente dos trabalhos preparatórios e da Conferência de Roma de 1998, na qual foi adotado o Estatuto do TPI.
Com sede em Haia (Países Baixos), o TPI iniciou suas atividades em julho de 2002, quando da 60ª ratificação ao Estatuto [...]. O TPI julga apenas indivíduos – diferentemente da Corte Internacional de Justiça, que examina litígios entre Estados. A existência do Tribunal contribui para prevenir a ocorrência de violações dos direitos humanos, do direito internacional humanitário e de ameaças contra a paz e a segurança internacionais. O Brasil depositou seu instrumento de ratificação ao Estatuto de Roma em 20 de julho de 2002, sendo incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro por meio do Decreto nº 4.377, de 25 de setembro de 2002.”
O Itamaraty adverte “como qualquer instrumento jurídico internacional, o Estatuto de Roma é produto de seu tempo e é passível de ajustes para seu aprimoramento.”
E ainda para o Itamaraty, “O Brasil tem exercido papel de liderança nas reuniões em que os Estados partes tratam de ajustes com vistas a promover maior aceitação e a consolidação do TPI – a exemplo das discussões que levaram à adoção, em 2010, na Conferência de Revisão de Campala (Uganda), das emendas relativas ao crime de agressão, que estabelecem as condições para que o TPI possa exercer sua jurisdição sobre esse crime”.
Para alguns autores o TPI marca uma nova era na História do Direito internacional e das Relações Internacionais7.
INTERVENÇÕES HUMANITÁRIAS
Conflitos geram impactos sobre os direitos humanos – considerados, no mundo contemporâneo, como eixo de proteção da pessoa humana, tanto na esfera interna dos Estados quanto na esfera internacional.
Quando esses conflitos, dentro de um Estado soberano, geram consequências devastadoras para a população que nele se encontra?
Seria lícito e aceitável que outros países interviessem em Estados soberanos, com a justificativa de ajudar e salvar a população atingida?
Há uma responsabilidade de proteger que autorizaria as intervenções em nome dos direitos humanos?
Essas são as perguntas que se colocam quando estudamos as intervenções humanitárias e como tais ações repercutem na esfera de soberania nacional dos estados. E as respostas não são simples, pois não existe uma norma que autorize expressamente a intervenção humanitária.
Muito pelo contrário: a Carta da ONU estabelece o princípio da não intervenção como norteador da conduta dos Estados no âmbito internacional.
A Carta, em seu artigo segundo, itens 3 e 4, estabelece que “todos os Membros deverão resolver suas controvérsias internacionais por meios pacíficos, de modo que não sejam ameaçadas a paz, a segurança e a justiça internacionais” e que “todos os Membros deverão evitar em suas relações internacionais a ameaça ou o uso da força contra a integridade territorial ou a dependência política de qualquer Estado, ou qualquer outra ação incompatível com os Propósitos das Nações Unidas”.
No entanto, no mesmo documento, o artigo 42 do capítulo VII preconiza o uso da força (aérea, naval ou terrestre) para manter ou reestabelecer a paz e a segurança.
Tais dispositivos nos permitem concluir que se não se cita explicitamente na Carta a intervenção armada com justificativa humanitária, também não se cita nenhuma proibição à guerra, seja ela justa ou injusta. Dessa forma, a resposta para as intervenções humanitárias não está estampada na norma de Direito Internacional.
Há, porém, que sustente que é possível estabelecer duas exceções a esse princípio:
I. legítima defesa individual ou coletiva;
II. quando o Conselho de Segurança da ONU (CS) determinar que uma situação constitui uma ameaça à paz ou segurança internacional.
A questão fica ainda mais complexa quando as intervenções, ditas humanitárias, e geral com o uso de força bélica, ocorrem sem que o estado que sofre a intervençãotenha solicitado a presença de ajuda externa, como no caso do Kosovo em 1999, ou na Líbia em 2011, ou mesmo quando não houver a autorização do CS da ONU.
Para aqueles que admitem as intervenções, quando há o intuito protetivo e ações respaldadas no discurso da necessidade de defesa de DH, sustenta-se que mais importante do que a soberania de um estado que agride seus próprios habitantes é a proteção aos direitos.
Nesse cenário, a intervenção humanitária não deve ser vista somente como um instrumento justificador para que potências econômicas e militares aproveitem de sua superioridade para adentrar o território de outro estado que possua, por exemplo, riquezas de interesse do Estado interventor. Há, nessas ações, a responsabilidade de proteger, baseado nos DH, que impõe uma obrigação de agir em prol dessa proteção.
AULA 5 - CORRENTES PEDAGÓGICAS PROGRESSISTAS: LIBERTADORA, LIBERTÁRIA E CRÍTICO SOCIAL DOS CONTEÚDOS
A PROTEÇÃO INTERNACIONAL DE DH
A proteção internacional dos direitos humanos se organiza em dois níveis que funcionam de forma complementar. Assim, falamos em um sistema global e em sistemas regionais.
O SISTEMA GLOBAL DE DH
O sistema global se organiza a partir da ONU e é também conhecido como sistema universal e tem sido fonte de inspiração dos demais níveis de proteção dos direitos humanos.
Nos termos da Declaração Universal dos Direitos Humanos¹, o sistema tem uma vocação universalista, já que se destina a todas as pessoas em todos os lugares. Como estabelecido no preâmbulo da Declaração, ele se coloca como ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, a fim de que todos os indivíduos e todos os órgãos da sociedade se esforcem:
· Pelo ensino e pela educação.
· Por desenvolver o respeito dos direitos e liberdades.
· Por promover, por medidas progressivas de ordem nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicação universais e efetivos tanto entre as populações dos próprios estados membros como entre as dos territórios colocados sob a sua jurisdição.
DOCUMENTOS INTERNACIONAIS DE DEFESA DE DH (NO ÂMBITO DO SISTEMA GLOBAL DE PROTEÇÃO DE DH)
DECLARAÇÃO UNIVERSAL DE DIREITOS HUMANOS
O Sistema Global de Proteção dos Direitos Humanos tem como principal fonte normativa a chamada Carta Internacional de DH² que é o conjunto de vários documentos voltados para a promoção e proteção dos DH, como veremos adiante. Entre eles está a Declaração Universal dos Direitos Humanos (chamada de Universal Declaration of Human Rights - UDHR, em inglês).
Em Paris, França, no dia 10 de dezembro de 1948, a Declaração foi adotada e proclamada pela Resolução n. 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas.
Este instrumento é considerado o marco inicial do Direito Internacional dos Direitos Humanos e, consequentemente, da tutela universal dos direitos humanos, que visa à proteção de todos os seres humanos, independente de quaisquer condições.
Registramos que a Declaração Universal de Direitos Humanos não é um tratado (isto é um documento pactuado entre os Estados signatários), mas se trata de uma resolução da Assembleia Geral da ONU, sem força de lei, no sentido estrito da palavra.
Apesar disso, a verdade é que, desde cedo, a Declaração Universal ganhou força, tanto no campo legal, como no político. Considerada como forma de direito costumeiro, no âmbito internacional, ela tem servido para a elaboração dos tratados sobre direitos humanos. Na esfera interna dos Estados tem servido de inspiração normativa, pois vários de seus dispositivos vieram a ser incorporados por constituições de muitos Estados. Inclusive, em várias oportunidades, seus dispositivos têm sido invocados por tribunais nacionais como direito costumeiro e fonte de interpretação de dispositivos sobre a matéria de DH.
Este documento simbólico estabelece que os Estados-partes devem promover a proteção dos direitos humanos e das liberdades fundamentais. Dessa forma, impõe a necessidade de efetivação desses direitos – o que se opera mediante a ideia de vigilância, com a adoção de um sistema de monitoramento, supervisão e controle.
INSTRUMENTOS NORMATIVOS GERAIS E ESPECIAIS
O Sistema da ONU é integrado por instrumentos normativos gerais e especiais e por organismos e mecanismos de vigilância, supervisão, monitoramento e fiscalização dos direitos humanos. Vamos estudá-los.
INSTRUMENTOS GERAIS
São, principalmente, aqueles que integram a chamada Carta Internacional de Direitos Humanos, que é composta por três documentos:
Eles são chamados de gerais porque se dirigem a toda e qualquer pessoa humana, sem qualquer tipo de distinção.
INSTRUMENTOS ESPECIAIS
Os instrumentos normativos especiais são voltadas, fundamentalmente, à prevenção da discriminação ou à proteção de pessoas ou grupos de pessoas particularmente vulneráveis, que merecem tutela especial. Leia aqui sobre os Instrumentos Especiais.
CONVENÇÃO CONTRA A TORTURA E OUTROS TRATAMENTOS OU PENAS CRUÉIS, DESUMANOS OU DEGRADANTES:
De 10.12.1984
Ratificada pelo Brasil em 28.09.1989. Protocolo Facultativo à Convenção da ONU Contra Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, ratificado pelo Brasil em 2007. Leia o texto completo aqui.
CONVENÇÃO SOBRE A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE DISCRIMINAÇÃO RACIAL:
De 21.12.1965
Ratificada pelo Brasil em 27.03.1968. Leia o texto completo aqui.
CONVENÇÃO SOBRE A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE DISCRIMINAÇÃO CONTRA A MULHER:
De 18.12.1979
Ratificada pelo Brasil em 01.02.1984. Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher de 15.10.1999, ratificada pelo Brasil em 28.06.2002. Leia o texto completo aqui.
Acesse, também, o DECRETO N° 4.316, DE 30 DE JULHO DE 2002.
CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DAS CRIANÇAS:
De 20.11.1989
Ratificada pelo Brasil em 24.09.1990 e Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança Referente à Venda de Criança, à Prostituição Infantil e à Pornografia Infantil de 25.05.2000. O Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança Relativo ao Envolvimento de Crianças em Conflitos Armados de 25.05.2000, ratificado pelo Brasil em 27.01.2004. Leia o texto completo aqui.
CONVENÇÃO PARA A PREVENÇÃO E REPRESSÃO DO CRIME DE GENOCÍDIO:
De 09.12.1948
Ratificada pelo Brasil em 04.09.1951. Recorde-se que esta Convenção já pedia a criação de um Tribunal Penal Internacional – o que se dá com o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional de 17.07.1998, ratificado pelo Brasil em 20.06.2002, como já vimos em aula anterior. Leia o texto completo aqui.
OS MECANISMOS DE EFETIVAÇÃO DOS TRATADOS DE DH (NO ÂMBITO DO SISTEMA GLOBAL DE PROTEÇÃO DE DH)
Segundo o jurista italiano Norberto Bobbio (1992), as atividades internacionais na área de proteção dos direitos humanos podem ser classificadas em três categorias: promoção, controle e garantia. Vejamos cada uma delas.
Assim, buscando a vigilância, supervisão, monitoramento e fiscalização do cumprimento dos instrumentos normativos gerais e especiais de proteção aos DH foram criados organismos e mecanismos extraconvencionais e convencionais.
Os convencionais, como o próprio nome expressa, são aqueles pactuados pelos Estados que participam dos tratados de DH e, portanto, já previstos no documento protetivo. São chamados em inglês de treaty-monitoring bodies (órgãos de monitoramento de tratados).
Os extraconvencionais, por sua vez, não estão baseados em acordos específicos, e são extraídos de uma interpretação alargada dos objetivos da ONU de proteção dos DH e do dever de cooperação dos Estados em perseguir esses objetivos.
Borges e Borges (2016) nos explicam melhor essa diferença:
Gianella e Castanheira (2016) afirmam que os mecanismos de proteção aos DH também podem operar tanto ao serem provocados pelo interessado (sistema de petições), quanto ex officio (sistema de relatórios e investigações):
O SISTEMA DE PETIÇÕES:
Consiste nas reclamações individuais ou de Estados, cujas condições de admissibilidade estão consignadasnos respectivos instrumentos de direitos humanos que as prevêem.
Não raras vezes podem surgir problemas pela utilização simultânea ou sucessiva de procedimentos distintos de petição, diante da multiplicidade e diversidade dos tratados na esfera mundial e regional. A configuração da "mesma matéria" sendo tratada por diferentes órgãos internacionais, em procedimentos distintos, é averiguada em relação ao objeto da causa ratione materiae e em relação às partes ratione personae.
Configurada a identidade, tem prevalência para examinar a questão o órgão da Convenção que der a mais ampla proteção ao direito lesado.
Em princípio, cabe ao reclamante escolher qual o procedimento, entre os previstos nos instrumentos coexistentes, que considere mais favorável a seu caso, pois terá que arcar com a solução dada. O direito internacional pretende ser um droit de protection o mais efetivo possível e, assim, não condiciona nem limita o uso dos instrumentos internacionais, deixando o caminho livre ao reclamante.
O SISTEMA DE RELATÓRIOS:
É um método de controle dos direitos humanos exercido ex officio pelos órgãos de supervisão internacional instituídos nos tratados, ou pelos Estados-partes.
Diversos tratados de direitos humanos dispõem que os Estados-partes devem enviar relatórios periódicos aos órgãos de supervisão, a fim de informarem sobre o cumprimento dos pactos. Recebidos os relatórios, os órgãos de supervisão, por sua vez, elaboram seus relatórios, que eventualmente servem de base para tomada de medidas contra os Estados-partes.
OS PROCEDIMENTOS DE INVESTIGAÇÃO:
Podem ser permanentes ou ad hoc. Os primeiros são institucionalizados, pois previstos nos tratados para situações específicas. Os últimos decorrem indiretamente do sistema de relatórios e de petições, uma vez que se iniciam a partir do recebimento de uma comunicação de violação aos direitos humanos
Essas investigações compreendem visitas in loco, contratação de profissionais peritos em determinadas matérias para avaliarem as queixas, oitiva de testemunhas e produção de provas em geral.
No que toca ao Sistema Global temos três organismos e mecanismos de proteção:
• O Conselho de Direitos Humanos da ONU;
 • Os Comitês de Direitos Humanos da ONU;
 • Os Relatores Especiais e os Grupos de Trabalho.
Para continuar lendo sobre os Procedimentos de Investigação, clique aqui.
OS SISTEMAS REGIONAIS DE DH
O aparecimento e o desenvolvimento dos sistemas regionais de proteção de DH têm confirmado a crescente internacionalização dos direitos humanos em esfera regional.
Esse fenômeno confirma a ideia de que a proteção dos direitos humanos não deve ser reduzida ao nível interno-nacional, já que ela manifesta um interesse internacional legítimo e que tem se desdobrado também em proteção em níveis distintos, com diferentes amplitudes territoriais.
Hoje temos três grandes Sistemas Regionais:
OS SISTEMAS REGIONAIS DE DH
O formato clássico dos sistemas de proteção regional foi definido na Convenção Europeia de Direitos Humanos de 1950, com a criação de uma comissão e uma corte. Hoje, porém, os sistema regionais podem adotar também formatos diferentes.
Como já visto, os sistemas regionais se encontram geograficamente localizados e seguem em linhas gerais um desenho básico similar:
· a adoção de um catálogo de direitos a serem observados pelos povos e Estados que adotaram o sistema;
· em seguida, os sistemas criam mecanismos para assegurar o cumprimento dessas normas.
O procedimento é comum nos três sistemas: uma vez que uma determinada pessoa tenha percorrido todos os caminhos disponibilizados internamente por sua ordem jurídica, para ter seus direitos protegidos e houve recusa de proteção pela jurisdição de seu Estado, ela pode se dirigir à Comissão de Direitos Humanos criada pelo sistema regional.
Nesse sentido, os sistemas regionais têm um caráter subsidiário, pois não devem se substituir à jurisdição do Estado, mas podem ser acionados quando o Estado falha na proteção dos direitos humanos/fundamentais.
Em comparação com o sistema global, nos sistemas regionais, temos a possibilidade de definir os direitos humanos a partir de uma perspectiva regional e adotar mecanismos de cumprimento que se adequem melhor à realidade local.
AULA 6 - O SISTEMA EUROPEU DE PROTEÇÃO DE DH
 
O SISTEMA EUROPEU DE PROTEÇÃO DE DH
Como já registrado anteriormente, o Sistema Europeu de proteção de Direitos Humanos foi criado com a Convenção Europeia de Direitos Humanos em 1950.
É o mais antigo e consolidado modelo no âmbito regional e se tornou o padrão clássico de proteção. Além disso, seu sistema de monitoramento de DH tem sido considerado o mais avançado do mundo quer “seja pelo texto da Convenção Europeia de Direitos Humanos (com suas várias reformas, via Protocolos Adicionais), seja pela farta jurisprudência da Corte Europeia em matéria de proteção desses direitos” (MAZZUOLI, 2010).
A CONVENÇÃO EUROPEIA DE DH E SEUS PROTOCOLOS ADICIONAIS
A Convenção Europeia de Direitos Humanos foi elaborada no Conselho da Europa¹, assinada em Roma em 1950, e entrou em vigor em setembro de 1953. Tratava-se, na intenção dos seus autores originais, de tomar as medidas a assegurar a garantia de alguns dos direitos previstos na Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948. Desde então, tem sido atualizada e modificada por protocolos adicionais.
· Os Protocolos nºs 1, 4, 6 e 7 acrescentaram direitos e liberdades aos que já estavam consagrados na Convenção.
· O Protocolo nº 2 deu ao Tribunal o poder de emitir pareceres consultivos.
· O Protocolo nº 9 abriu, aos requerentes individuais, a possibilidade de transmitir o caso ao Tribunal, sob reserva da ratificação do referido Protocolo pelo Estado requerido e da aceitação da transmissão por um comitê de filtragem.
· O Protocolo nº 11 reestruturou o mecanismo de controle da Convenção.
· Os outros Protocolos eram relativos à organização das instituições criadas pela Convenção e aos respectivos aspectos processuais.
Desse modo, conforme afirma Mazzuoli (2010), a Convenção Europeia é composta de três partes:
 “Na primeira (Título I, arts. 2º a 18), são elencados os direitos e liberdades fundamentais, essencialmente civis e políticos, como o direito à vida, à proibição da tortura, à liberdade, à segurança, a um processo equitativo, à vida privada e familiar, à liberdade de pensamento, de consciência e de religião, à liberdade de expressão, de reunião e de associação, ao casamento, a um recurso efetivo, à proibição de discriminação etc.”
 “Na segunda parte (Título II, arts. 19 a 51), a Convenção regulamenta a estrutura e o funcionamento da Corte Europeia de Direitos Humanos (v.g., o número de juízes, eleição dos mesmos, duração do mandato, questões sobre admissibilidade e arquivamento de petições, sobre intervenção de terceiros, sobre as sentenças da Corte, sua fundamentação e força vinculante, competência consultiva da Corte, privilégios e imunidades dos juízes etc.)”
 “E, finalmente, na terceira parte (Título III, arts. 52 a 59), a Convenção estabelece algumas disposições diversas, como as requisições do Secretário-Geral do Conselho de Europa, poderes do Comitê de Ministros, reservas à Convenção, sua denúncia etc.”
A fim de alargar o seu rol normativo originário, continua Mazzuoli (2010),
Assim, a estrutura normativa do sistema regional europeu se apresenta dessa forma, como sistematizado pelo Gabinete de Documentação e Direito Comparado/GDDC.
Vejamos as Epígrafes dos artigos da Convenção Europeia, introduzidos pelo Protocolo n.º 14:
CONVENÇÃO DE 1950:
Artigo 2.º: Direito à vida;
Artigo 3.º: Proibição da tortura;
Artigo 4.º: Proibição da escravatura e do trabalho forçado;
Artigo 5.º: Direito à liberdade e à segurança;
Artigo 6.º: Direito a um processo equitativo;
Artigo 7.º: Princípio da legalidade;
Artigo 8.º: Direito ao respeito pela vida privada e familiar;
Artigo 9.º: Liberdade de pensamento, de consciência e de religião;
Artigo 10.º: Liberdade de expressão;
Artigo 11.: Liberdade de reunião e de associação;
Artigo

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