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PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE NA ESCOLA PÚBLICA

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS 
FACULDADE DE EDUCAÇÃO 
 
 
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO 
 
PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE NA ESCOLA PÚBLICA: 
OS MODELOS COLEGIADO E VOLUNTARIADO 
E SEUS CAMPOS DE SIGNIFICAÇÃO 
 
 
 
SUNG CHEN LIN 
Orientador: Prof. Dr. Charles Richard Lyndaker 
 
Este exemplar corresponde à redação final da 
Dissertação defendida por Sung Chen Lin e 
aprovada pela Comissão Julgadora. 
 
 
 Data: _______/__________/________ 
 
 Assinatura: ________________________________ 
 Prof. Dr. Charles Richard Lyndaker 
 
 Comissão Julgadora: 
 
 
 
 
 
_____________________________________________________ 
 
 
 
2003 
© by Sung Chen Lin, 2003. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Catalogação na Publicação elaborada pela biblioteca 
da Faculdade de Educação/UNICAMP 
Bibliotecário: Gildenir Carolino Santos - CRB-8ª/5447 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Sung, Chen Lin. 
 Su72p Participação da comunidade na escola pública : os modelos colegiado e 
 voluntariado e seus campos de significação / Sung Chen Lin. -- Campinas, SP: 
 [s.n.], 2003. 
 
 Orientador : Charles Richard Lyndaker. 
 Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade 
 de Educação. 
 
1. Administração escolar. 2. Gestão educacional. 3. Conselho escolar. 
 4. Participação. 5. Voluntariado em educação. I. Lyndaker, Charles Richard. 
 I. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Educação. III. Título. 
 03-0164-BFE 
 
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Ao meu pai, Sung Min I shiãn sheng, in memorian, 
maior incentivador de meus estudos, que afastado da oportunidade 
de freqüentar a escola foi auto-didata na arte de ler e escrever 
em sua língua natal – o chinês – já com idade avançada. 
À minha mãe, exemplo de vida, que analfabeta em sua 
língua natal, se esforçou em aprender a língua 
portuguesa para junto com seu companheiro prover melhores 
condições de vida para nossa família em terra estrangeira. 
Ao meu companheiro e meus filhos queridos, Francisco, Tom Min e 
Victória, pela caminhada a quatro na busca de ser 
sujeitos comprometidos com uma vida espirituosa e pela 
compreensão dos momentos ausentes. 
Ao meu irmão, minhas irmãs queridas e seus familiares 
por compartilharem momentos de distração. 
 
 
 
 
 
 
 
 
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AGRADECIMENTOS 
 
 
 
 
Ao Ser Supremo, fonte e companheiro de vida; 
Aos meus familiares queridos; 
Ao meu orientador Prof. Dr. Charles Richard Lyndaker, pela orientação; 
A Professora Dra. Raquel Pereira Chainho Gandini e Professor Dr. James Patrick 
Maher, pelas contribuições e considerações pertinentes; 
A Sra. Hermínia Bernardi, pelo polimento deste trabalho contribuindo para tornar 
minhas idéias mais claras; 
A Zédina Silva, pela primorosa contribuição na tradução do resumo; 
Aos interlocutores deste estudo, colegas de profissão (coordenadora regional de 
ensino, diretoras, especialistas em educação, professores), pais de alunos e 
pessoas da comunidade, por disporem de seu tempo para trocar idéias e 
experiências participativas; 
Aos colegas da pós-graduação, Sérgio Lontra, Janaína, Neuza, Leopoldina, e 
tantos outros pela amizade sincera; 
Aos professores da pós-graduação, Dr. Milton Almeida, Dr. Luís Aguilar, Dr. 
Roberto Ruz Perez, Dra. Heloísa Hofling pelo conhecimento disponibilizado e pela 
amizade; 
As funcionárias da Faculdade de Educação/UNICAMP pela ajuda, muitas vezes a 
distância e pela acolhida; 
Ao Professor Dr. Alfredo Veiga-Neto pelos bons conselhos; 
 
 
 
A todos e todas meus sinceros agradecimentos. 
 
 
 
 
 
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RESUMO 
 
 
Nos últimos anos verifica-se que é crescente a demanda pela participação 
da comunidade na escola pública especialmente após o período de governos 
militares no Brasil. Apesar do tema não ser novidade, a participação vem 
ganhando destaque nas discussões da escola contemporânea por ser 
considerada um meio essencial de se promover à democratização do setor público 
educacional. Juntamente com essas discussões, novas aspirações despertam 
inovações participativas que vem preenchendo o espaço escolar. 
Ligado ao compromisso com demandas sociais e ao atendimento do 
imperativo constitucional de gestão democrática no ensino público, duas formas 
de participação vem sendo largamente adotada nas escolas: o Conselho 
Deliberativo Escolar, baseado no modelo colegiado e de caráter obrigatório, e o 
Projeto Amigos da Escola, baseado no modelo voluntariado e de cuja adesão e 
envolvimento social firma-se pela livre vontade de escolas e indivíduos ou grupos 
sociais. Esse é o ponto chave deste estudo: verificar quais são os significados 
dessas duas formas de participação e quais impactos elas causam nas escolas. 
Para se atingir esse objetivo, a pesquisa desenha em três etapas seu 
caminho metodológico. A primeira que busca na literatura corrente e em estudos 
de outros pesquisadores dados que situem a participação social na escola nos 
contextos sócio, político e educacional. A segunda recorre aos suportes 
institucionais que dão sustentação às formas de participação investigadas e a 
terceira que, apoiada num estudo piloto realizado no município de Araranguá/SC 
abrangendo escolas de nível fundamental da rede estadual de ensino, procura 
tecer considerações sobre a prática e os efeitos derivados dos modelos colegiado 
e voluntariado de participação. 
A qualidade da participação; a influência que exercem na democratização 
da gestão escolar e na qualidade de ensino; ambigüidades e vulnerabilidades 
desses processos participativos; aspectos comparativos entre o modelo colegiado 
e o voluntariado são alguns aspectos que dão o tom desse estudo. 
 
 
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 ix
ABSTRACT 
 
In the past years, we have observed that there has been an increasing 
social claim for parents and community participation in Brazilian public schools, in 
particular after the period related to military governments. Although the subject is 
not new, it is getting more and more notability in discussions about current public 
system of education for it is considered an essential way to promote 
democratization in the system. Together with these discussions, recent ideas have 
motivated new manners of participation in public schools. 
Engaged in attending social demanding and the constitutional imperative of 
democratic administration in public school, two forms of participation have widely 
been adopted: the School Council, based on an elected representative group and 
compulsory firmness, and the Amigos da Escola project, based on voluntary action 
in which school and citizen involvement enrolment is based on their free will. 
This is what this research focuses on: studying the meanings of these two 
forms of participation and their impact in schools. 
In order to reach this goal, the present research has three parts. The first 
examines current literature about social participation in the public sector 
comprehending social, political an educational contexts. The second one focuses 
on the institutional bases that give support to the participation forms this research 
investigates, and the third part, which is supported on a study of state-run 
elementary schools in Araranguá – SC, makes remarks aboutthe actual doing in 
council and voluntary models of school participation and their effect. 
Some of the aspects that give expression to this study are the way how 
these forms of participation influence the democratization process of school 
administration and schooling quality, considering the extension of participation they 
allow to parents and community, ambiguity and vulnerability of these participation 
forms, and comparative aspects between the collegiate and voluntarism form of 
participation. 
 
 
 
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SUMÁRIO 
 
Resumo........................................................................................................... vii 
Abstract........................................................................................................... ix 
Introdução...................................................................................................... 1 
 
Capítulo 1. Subsídios teóricos para a pesquisa 
 (revisão bibliográfica)............................................................. 15 
1. Localizando os referenciais ....................................................................... 15 
2. Revisão da literatura ................................................................................... 18 
2.1 Reflexões iniciais sobre a participação ................................................... 19 
2.2 A participação social: dos movimentos sociais aos novos modelos 
 de participação social .............................................................................. 22 
2.3 A cidadania e o direito no contexto da participação social ..................... 37 
2.4 Reflexões sobre a qualidade de ensino .................................................. 46 
2.5 O novo modelo de gestão escolar ........................................................... 54 
2.6 A normatização como forma de regulação da 
 conduta humana...................................................................................... 64 
2.7 Uma rede de proteção social mínima – da educação básica como 
um direito universal e obrigação do Estado à crise da educação 
brasileira ................................................................................................... 71 
2.8 O crescimento do Terceiro Setor e o voluntariado como 
 tendência mundial .................................................................................... 80 
2.9 A contribuição da mídia nas formas contemporâneas 
 de voluntariado........................................................................................ 86 
2.10 A participação da comunidade na escola pública no contexto 
 das reformas educacionais .................................................................... 95 
 
Capítulo 2. Suportes legais e institucionais ............................................. 105 
1. Projeto Amigos da Escola .......................................................................... 106 
2. Conselho Deliberativo Escolar ....................................................................110 
 
 
 xii
Capítulo 3. Buscando na experiência individual e coletiva subsídios 
para considerações sobre a prática da participação nas escolas .......... 121 
1. estudo piloto ............................................................................................. 121 
2. Aspectos principais das formas de participação ..................................... 124 
3. Recuperando passos que nortearam a construção das categorias ......... 129 
4. Revelando a prática das formas de participação sob um 
 olhar comparativo ..................................................................................... 135 
4.1 Categoria I – 
A efetividade dos objetivos das formas de participação por meio do 
Conselho Deliberativo Escolar e do projeto Amigos da Escola .............. 135 
 4.1.1 Promover a democratização da gestão escolar e fortalecer 
 a presença da comunidade na escola .................................................. 135 
4.1.2 Incidir na melhoria da qualidade de ensino ........................................ 162 
4.2 Categoria II – 
Mecanismos operacionais institucionais ................................................. 184 
4.2.1 O aperfeiçoamento e a instrumentalização ........................................ 184 
4.2.2 O provimento do cargo de diretor ....................................................... 197 
4.2.3 A implementação das propostas participativas sugerida como 
 ação suficiente para alcançar os objetivos estabelecidos ..................... 205 
4.3 Categoria III – 
Valores de referência em processo participativo escolar ........................ 215 
4.3.1 Contribuições e influência da mídia na divulgação de 
 modelos de participação ....................................................................... 215 
4.3.2 Os modelos colegiado e voluntariado como as formas mais 
 disseminadas de participação da comunidade na escola pública ........ 223 
4.3.3 Alternativas de processos participativos ............................................ 230 
 
Considerações finais ................................................................................... 245 
Referências bibliográficas .......................................................................... 271 
Apêndices ..................................................................................................... 289 
 
 
 xiii
SIGLAS 
 
PCEP – Participação da Comunidade na Escola Pública 
PCCE – Participação da Comunidade por meio do Conselho Escolar 
PCAE – Participação da Comunidade por meio do “Amigos da Escola” 
CRE – Coordenadoria Regional de Ensino 
CDE – Conselho Deliberativo Escolar 
PPP – Projeto Político Pedagógico 
APP – Associação de Pais e Professores 
APM – Associação de Pais e Mestres 
PAGEPE –Programa de Autonomia e Gestão da Escola Publica Estadual 
CEs – Conselhos Escolares 
AAESC – Associação dos Administradores Escolares do Estado de Santa Catarina 
LDB – Lei de Diretrizes e Bases 
CONSED – Conselho Nacional dos Secretários de Educação 
UNDIME – União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação 
CENPEC – Centro de Estudos e Pesquisa em Educação, Cultura e 
AçãoComunitária 
ONG – Organização não Governamental 
SME – Secretaria Municipal de Educação 
SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas 
GEPEP – Gerência de Planejamento Estudos e Pesquisas 
IES – Institutos de Ensino Superior 
STF – Supremo Tribunal Federal 
PETI – Programa de Erradicação do Trabalho Infantil 
 
 xiv
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 xv
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Fomos formados numa sociedade 
autoritária, criados no silêncio e, 
portanto, nos representamos como 
sujeitos apenas capazes de 
obedecer ao que outros 
determinam e, em conseqüência 
disso, a não nos comprometermos 
com os resultados das nossas 
ações. 
 
Gouvêa, Antônio Fernando. Secretaria da 
Educação da Prefeitura Municipal de 
Porto Alegre. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 xvi
 
 
 
 
 
 
 1
INTRODUÇÃO 
 
 
Falar sobre a participação da comunidade na escola pública não é 
exatamente um assunto novo. Nos últimos anos, mais precisamente a partir da 
nova democracia brasileira em 1988, muito tem se falado sobre a relevância dessa 
participação. Expressões como "gestão compartilhada", "administração 
participativa", "democratização da gestão escolar" vêm fazendo parte da agenda 
da direção de escolas públicas orientadas pelas políticas do setor educacional. 
Essa nova mentalidade gerou a implantação de políticas sociais que 
passaram a garantir a participação de pais e do conjunto da comunidade escolar 
na gestão da escola. Outros motivos decorrentes da própria dinâmicasocietal 
fizeram surgir por parte da iniciativa privada, de organizações não governamentais 
e de parcerias destes com órgãos públicos, propostas participativas no setor 
público educacional. 
Pelo menos dois fatores podem ser indicados como contribuidores para 
essa mentalidade: um, refere-se à transição do regime militar autoritário para o 
período de redemocratização do país, que possibilitou novas formas de 
manifestações sociais em diversos setores da sociedade; outro, a um conjunto de 
fatores ligado ao Estado, representado por reformas surgidas no seu interior (do 
próprio Estado), provocadas por uma crise fiscal e questionamentos sobre seu 
papel no provimento dos bens sociais, levando-o a adotar estratégias de inclusão 
da sociedade civil para suprir o seu menor empenho na prestação de bens e 
serviços sociais, situação da qual o setor educacional não foge à regra. 
Da associação destes dois fatores tem-se que, a partir de 1988, com a 
abertura política emanada da nova Constituição, formas inovadoras de 
participação social oriundas de iniciativas de diversos setores da sociedade civil 
eclodiram em todo o país. No setor da educação, propostas de participação da 
comunidade se intensificaram, especialmente devido a insatisfação quanto ao 
caótico quadro que já se vislumbrava no ensino público brasileiro, gerado em 
grande parte pela incapacidade e ineficiência do Estado em gerenciar e atender o 
setor. 
 
 2
Sob pressões da sociedade civil e interesses políticos, as administrações 
públicas do setor educacional voltaram sua atenção para a escola, que passou a 
ocupar o centro das preocupações das reformas educacionais. As reformas do 
setor orientadas pela cooperação técnica decorrente dos acordos financeiros com 
órgãos multilaterais, postulam a participação da comunidade na gestão escolar 
como ação decisiva para garantir uma maior atuação e envolvimento dos pais e da 
comunidade na escola segundo o discurso de maior envolvimento na gestão 
escolar e da contribuição econômica para a sustentação da infra-estrutura 
escolar1. Tamanho interesse na educação se deve a expectativa de que ela seja 
um caminho eficaz no combate à pobreza2. 
Atendendo a demanda social democratizante, a participação social no setor 
educacional ganha sustentação legal. Ancorada na nova Constituição de 1988 e 
na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) sancionada em 1996, 
pais e comunidade têm sua participação assegurada na gestão das escolas 
públicas mediante a criação obrigatória de órgãos colegiados nas diversas esferas 
públicas. 
O Terceiro Setor da sociedade3, por sua vez, também traz sua parcela de 
contribuição. Atendendo a demandas sociais e a estratégias próprias do mercado, 
passa a organizar ações voluntárias e de parcerias beneficiando setores mais 
carentes da sociedade. A educação é apontada pelas estatísticas do Terceiro 
Setor4 como uma das áreas nas quais há maior investimento voluntário, 
juntamente com a saúde e o meio ambiente. Com o apoio da mídia, estas ações 
se destacam e ganham mais adeptos à causa social. 
Assim, mecanismos legais e institucionais vêm intensificando a convocação 
da sociedade civil para a participação na escola pública. 
Apenas para citar algumas experiências que evidenciam o crescente apelo 
 
1 Análise que TORRES (2000: 136) faz do pacote de reforma educativa proposto pelo Banco 
Mundial, especificamente sobre a convocação dos pais e da comunidade para uma maior 
participação nos assuntos escolares. 
2 De acordo com T.S. SANTOS, in Considerações sobre o desenvolvimento e políticas 
educacionais no Brasil, "uma das prioridades atuais do Banco Mundial é a educação básica 
como motor de desenvolvimento". 
3 Esfera social composta por entidades da sociedade civil, identificadas como organizações 
privadas sem fins lucrativos que geram bens e serviços públicos ou privados. 
 
 3
para trazer pais e comunidade para o meio escolar tem-se: o Projeto Parceiro do 
Futuro, da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo; o Projeto 
Comunidade na Escola, iniciativa de uma escola pública no município de Cocal do 
Sul (SC); Comunidade é a Melhor Parceria, matéria publicada pela revista TV 
Escola n.20 (2000: 31-35). São propostas5 visam buscar a ajuda da comunidade à 
causa escolar e mostrar como a escola aberta à comunidade pode trilhar uma 
trajetória de sucesso. 
Projetos de participação da comunidade na escola pública ganharam maior 
número de adesões sob a motivação do Ano Internacional do Voluntariado – 2001 
– estabelecido pela Organização das Nações Unidas (ONU). Com respaldo 
internacional, um forte vínculo cresceu no país entre o sentido da participação 
social e o trabalho voluntário, refletindo-se diretamente no setor educacional, e em 
outras áreas sociais mais carentes. 
Por força da mídia, a participação da comunidade na escola pública tem 
encontrado eco. Especialmente a mídia televisiva e impressa tem contribuído de 
forma eficiente na divulgação e convocação da sociedade civil, dedicando elevado 
grau de atenção sobre o tema. Propagandas sobre o tema têm sido veiculadas em 
horário nobre, evidenciando o valor dessa ação. Tanto para o cidadão comum 
quanto para o profissional da área da educação, anúncios publicitários diariamente 
imprimem o valor da participação social na escola pública pela ação voluntária. 
O projeto Amigos da Escola, desenvolvido pela empresa de comunicação 
Rede Globo, veicula na tela de suas emissoras a importância de ser um Amigo da 
Escola. Os anúncios cativam o público para a causa, repetindo slogans, entre as 
quais, Todos pela educação; Educação é tudo; Para milhares de brasileiros você 
pode ser um herói – seja você também um Amigo da Escola. Outro anúncio que 
também procura conscientizar os pais para participarem da escola é o Dia 
Nacional da Família na Escola6, recentemente institucionalizado pelo Ministério da 
 
4 Disponível em www.portaldovoluntario.com.br - acesso em 02.10.2001 
5 Ver na sessão dos apêndices. 
6 Instituído pelo MEC, sua primeira experiência deu-se em 24 de abril de 2001, seguida da 
segunda versão em 23 de novembro do mesmo ano. Em 2002, o dia estabelecido para essa 
parceria com os pais foi anunciado para 4 de junho. Tem como objetivo mobilizar e envolver os 
pais para o melhor desempenho do aluno na escola. No dia previsto as escolas públicas de todo 
 
 4
Educação (MEC). No estado de Santa Catarina os anúncios sobre o concurso 
Escola Referência7 apelam para o prestígio que a participação dos pais traz e a 
corrida para a conquista do prêmio, que acaba criando um estado de competição 
entre as escolas. 
Com essas propostas inovadoras, uma nova abordagem rearticula, 
reconstrói e resignifica a participação da comunidade na escola pública. 
Rearticula, reconstrói e resignifica porque, sob o mesmo discurso de 
democratização da educação, que já constituía um ideário progressista, setores 
tidos como conservadores passam a também defender a participação da 
sociedade no meio escolar. 
Assim, da mesma forma, o assunto divide atenção e importância em fóruns 
públicos; em movimento populares; em movimento sindical do setor educacional; 
em reformas educacionais; na nova lei de diretrizes e bases da educação 
brasileira; em diretrizes que regem os sistemas de ensino nas diversas esferas 
públicas; em documentos emitidos por órgãos de financiamento e cooperação 
internacional. 
Este é o perfil inicial que procura retratar a importância que vem sendo 
dado ao tema proposto neste estudo. Mesmo na introdução do tema já se percebe 
a complexa trama de interesses e os grupos que convivem no campo analisado. 
Antes de avançar na apresentação e discussãodo que se propõe, porém, faz-se 
necessário conceituar algumas expressões que povoam o universo desse estudo: 
escola; comunidade escolar; comunidade; sociedade civil. 
Tomando-se como base a constituição do sujeito, e tendo em vista que 
esse não se constitui sozinho, mas vive em grupos que se aproximam e interagem 
segundo um sistema de interesses, neste estudo adotou-se uma base referencial 
 
o país deverão abrir suas portas e organizar-se para receber a visita da família. Jornal do MEC, 
n. 14, out. 2001. 
7 O Prêmio Escola Referência foi instituído em 1998 pelo governo do estado através da Secretaria 
da Educação e do Desporto em parceria com a RBS, afiliada da Rede Globo, com o objetivo de 
avaliar as ações decorrentes dos progressivos graus de autonomia das unidades escolares com 
base na descentralização e participação da comunidade educacional. O prêmio utiliza os mesmos 
critérios de avaliação do Prêmio Nacional de Referência em Gestão Escolar que tem a missão de 
identificar, valorizar e dar publicidade às escolas públicas que se destacam pela qualidade de 
serviços prestados. Fonte: Escolas de Sucesso, Escolas de Referência. Secretaria de Estado da 
Educação e do Desporto/SC, Florianópolis, 1999. 
 
 5
para essas expressões, que teve como ponto de partida a definição de 
comunidade escolar dada pelo sistema de ensino do estado de Santa Catarina, 
por ser de onde se tomou como referencial um estudo piloto na investigação das 
formas de participação pelo conselho escolar e pelo projeto Amigos da Escola. 
Dessa forma, com base na Lei Complementar 170/98/SC, parágrafo único 
do art. 15, cap. III, entende-se por comunidade escolar o conjunto de docentes, 
especialistas, pessoal técnico-administrativo e de serviços lotados e em exercício 
na instituição; pais ou responsáveis pelos educandos, educandos matriculados e 
com freqüência regular na instituição. Por comunidade entende-se a população 
que reside no entorno escolar: no bairro onde se localiza a escola e em 
localidades circunvizinhas que a escola procura servir, mesmo que essa 
população seja constituída de beneficiários da escola pública que jamais a 
requeiram como usuários8, ou seja, população usuária efetiva ou potencial. Por 
escola entende-se os profissionais que atuam no seu interior, já que a escola em 
si não tem significado sem as pessoas e os profissionais que nela atuam. 
Quando se fala em sociedade civil, neste estudo, procura-se abarcar todo 
o conjunto da sociedade, exceto o de cunho comercial, e que, nesse sentido, é 
composta de: qualquer agrupamento de pessoas físicas ou jurídicas com o 
objetivo de praticarem e realizarem negócios de natureza civil9. 
Desta forma, sob uma concepção relacional e operacional, essas 
expressões são empregadas no sentido de situar os grupos sociais envolvidos no 
tema da participação social na escola pública e as dimensões progressivas em 
que se organizam. No entendimento da pesquisadora, embora outras acepções 
possam também definir as expressões apresentadas, as que foram aqui utilizadas 
dão conta da abordagem que se dá no contexto deste estudo. 
 
 
 
 
8 De acordo com LOBATO (1997:43), por princípio, a política social é fornecedora de um bem 
público. Um bem que é custeado pelo conjunto da sociedade e dirigido a todos aqueles que 
pertencem a ela, mesmo que jamais o requeiram, ou seja, todos os cidadãos são tanto 
responsáveis quanto merecedores do bem público. 
 
 6
Tratando do problema 
 
Um aspecto polêmico que se levanta das recentes propostas de 
participação na escola pública é o fato de a sociedade civil vir a compensar as 
deficiências da ação do Estado em detrimento de uma visão mais alargada de 
participação. Em outras palavras, se por um lado alguns grupos dos setores 
governamental e empresarial têm a participação da sociedade como uma forma 
democrática para solucionar os problemas apresentados no setor educacional, de 
outro lado, alguns estudiosos do assunto (SOARES, L. T., 2000; TORRES, 1999; 
GENTILLI, 1999c; CORAGGIO, 1999) entendem que a proposta de envolvimento 
da população na gestão escolar, apresentada pelas reformas educacionais, são 
estratégias para solucionar os problemas apresentados no setor educacional de 
forma a complementar o papel do Estado. Tal proposta visa redefinir o papel do 
Estado em relação à educação que ao endereçar às famílias e à comunidade uma 
contribuição maior, reduz a intervenção do Estado nas questões educacionais. 
A ambigüidade que envolve o tema pode ser entendida ao se observar os 
diferentes interesses políticos que circundam e se enfrentam na arena política. 
Tais interesses carregam cada qual seu discurso e produzem distintas 
significações que vão repercutir no meio escolar. 
Nas escolas, a questão da participação suscita muitas vezes esperança e 
descrédito. Experiências pessoais da pesquisadora, que preenche a função de 
administradora escolar em uma unidade escolar pertencente à rede pública do 
estado de Santa Catarina, demonstram que mesmo diante do arsenal em torno da 
inclusão da comunidade na gestão da escola, o processo participativo tem ainda 
muitas barreiras a vencer. Exemplo disso é que constantemente significativo 
número de usuários (alunos e pais) se afastam das escolas em que estão 
matriculados e buscam outras ofertas escolares por motivo de descontentamento. 
Para efeitos de registro, outras causas que levam os usuários a trocarem de 
escola dizem respeito à mudança de residência, gravidez precoce indesejada, 
 
9 Essa acepção contempla o conceito de sociedade civil proposto por PLÁCIDO E SILVA in 
Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1990. 
 
 7
trabalho infantil longe do local de estudo e outros motivos de naturezas as mais 
diversas. 
O descontentamento dos usuários da escola e as informações geradas pelo 
contato com eles estabelecidos indicam que essa mudança se deve à forma como 
as relações entre a instituição escolar e a comunidade em seu entorno se 
estabelecem, especialmente quando se trata de alunos e pais. De um lado, falas 
de superioridade; controle interno das decisões e atividades escolares; difícil 
ruptura do poder estabelecido no interior da escola; de outro, conformismo; 
passividade; pouco conhecimento sobre questões que envolvem o universo 
escolar ainda provocam grande desigualdade no processo participativo escolar. 
Esses fatores indicam que os caminhos para a inclusão dos pais e da 
comunidade no processo participativo escolar merecem ser constantemente 
revistos. Especialmente porque a proposta participativa envolve duas dimensões: 
uma discursiva e outra prática. Ainda que tudo indique crescente avanço do 
discurso de democratização na gestão escolar, o fato de se adotarem propostas e 
políticas de participação que incluam pais e comunidade nas atividades escolares 
apenas na dimensão discursiva não faz da escola ou do sistema público de ensino 
aspirante ou praticante da democratização. A prática participativa vai, em muitos 
aspectos, além da implantação de formas de participação institucional. Envolve 
um caminhar próprio e particular de cada comunidade escolar. Ao privilegiar a 
adoção de propostas e políticas participativas originadas de fonte externa e de 
caráter homogeneizante, corre-se o risco de abafar ritmos locais e inibir a 
evolução ou o surgimento de possíveis práticas participativas nascidas do interiordas comunidades escolares. 
Algumas práticas que se solidificaram na escola também desfavorecem 
uma participação mais ampliada, especialmente dos pais. São práticas 
alimentadas pela resistência e por receio de perder posição de superioridade; pelo 
costume de criticar e censurar a forma como pais e responsáveis conduzem a 
educação de seus filhos ou (não) acompanham sua aprendizagem escolar, ou 
ainda de reclamar da indisciplina dos filhos na escola. Os pais, por sua vez, 
 
 8
freqüentemente se afastam, ou comparecem na escola apenas quando 
convocados. 
Nesse cenário, um profundo faz-de-conta envolve o processo participativo 
no meio escolar. Mesmo com a adoção de políticas participativas, muitas vezes o 
clima é de “eu finjo que executo, tu finges que estás satisfeito, nós fingimos que 
está dando certo e todos fingem que a inclusão dos pais na gestão escolar é uma 
realidade”. 
Por estar atenta às políticas de inclusão participativa da comunidade na 
escola pública e nos apelos da mídia para tanto, o assunto despertou grande 
interesse na pesquisadora. 
Observando movimentações mais recentes nesse sentido, percebeu que 
duas formas de participação na escola se destacam no cenário nacional e podem 
ser apontadas como tendo maior abrangência: a participação por meio do 
Conselho Deliberativo Escolar (PCDE) e outra que se refere ao projeto Amigos da 
Escola (PCAE). Essas constituem propostas de participação firmadas 
institucionalmente, que promovem, incentivam e mesmo garantem a presença dos 
pais e da comunidade no interior da escola pública. A primeira, decorrente de 
demandas democratizantes surgidas da nova democracia brasileira, caracterizada 
como modelo colegiado que convoca todos os membros da comunidade escolar 
para participar; a segunda, desenvolvida pela Rede Globo, uma das maiores 
empresas de comunicação do país, é tida como um modelo voluntário. Essas 
formas de participação passam a ser o foco de atenção deste estudo. 
Assim, sustentada por inquietações surgidas da prática escolar e face a 
tantos apelos que envolvem a participação da comunidade na escola pública a 
pesquisadora teve seu interesse despertado para analisar como se processam 
esses dois modelos de participação. Passam por esse interesse analisar alguns 
"porquês". Por que determinadas preocupações públicas que se constituem 
problemas sociais de relevância, portanto não menos merecedoras de atenção, 
não obtêm o ibope que a participação da comunidade na escola pública vem 
atingindo? Por que, apesar de tantas promoções em favor da participação da 
comunidade na escola pública, permanecem desencontros e insucessos? 
 
 9
Entendendo que a participação dos pais e da comunidade na gestão da 
escola pública é possível, mas sentindo-se frágil em provocar mudanças na 
comunidade escolar em que está inserida, o trabalho acadêmico que precisava 
elaborar pareceu ser uma boa oportunidade para que a pesquisadora 
preenchesse algumas lacunas que surgiram de reflexões sobre o assunto. Poder 
avançar na tarefa de aproximar escola e comunidade para uma convivência de 
respeito mútuo e colocar em prática um processo participativo ampliado, 
integrador e libertário, não desprezando as conquistas já obtidas, ao contrário, 
valorizando-os, foi objetivo perseguido pela pesquisadora. E, quem sabe, sugerir 
um outro olhar, que venha a contribuir para ampliar os caminhos de democracia 
participativa na escola pública. 
Esse é o mapa inicial que gerou a proposta deste estudo. 
 
 
Conferindo importância ao tema (justificativa) 
 
Ignorar a relevância deste tema é estar alheio ao aparato institucional e 
legal que nos últimos anos vem insistentemente convocando a sociedade civil a 
participar da escola pública, sensibilizando a escola a abrir suas portas para 
receber os pais de alunos e a comunidade. 
Assim, este estudo se justifica dado o significativo valor que vem sendo 
depositado na participação comunitária na escola pública, atualmente em amplo 
processo de popularidade. Conforme já apontado, esse valor é percebido por toda 
a sociedade e pode ser constatado pela importância que o tema vem adquirindo 
em âmbito nacional. Combinada com projetos de iniciativa privada e crescente 
valorização por órgãos governamentais, a participação da sociedade na escola 
pública vem rapidamente ganhando adeptos, especialmente graças à mídia. 
Nessa dinâmica, um novo redimensionamento vem norteando o tema da 
PCEP e suas relações na construção do processo participativo escolar e, 
conforme já mencionado, vêm ocupando posição polêmica entre as severas 
críticas sobre o abandono do Estado inerente às suas responsabilidades com o 
 
 10
ensino público e a promissora perspectiva democratizante na gestão escolar. 
Tendo em vista as duas formas de participação já indicadas, tão amplamente 
difundidas, cabe verificar se, na prática, seus objetivos são alcançados. 
Dessas ponderações iniciais, tem-se a impressão de já se estar tecendo os 
primeiros fios desta trama que vai se revelando complexa, tendo em vista o 
envolvimento de diversos atores, cada qual com seus interesses na partilha do 
bem que representa o ensino público. 
 
 
Objetivos 
 
Alguns dos questionamentos que conduziram esta pesquisa merecem ser 
destacados: A que tipo de participação as propostas apontadas se referem? Qual 
o grau participativo que estes processos guardam em si e qual seu caráter? Até 
que ponto tais formas de participação contemplam as demandas sociais 
democratizantes? Até que ponto as formas de participação investigadas neste 
estudo atingem seus objetivos? Quais os atuais resultados destas formas de 
participação? 
Orientadas por estas questões e com base nas recentes garantias e 
incentivos que a participação da comunidade na escola pública vem ganhando, 
neste estudo pretende-se investigar a participação dos pais e da comunidade por 
meio de dois instrumentos: o conselho deliberativo escolar e o projeto Amigos da 
Escola, caracterizados pelos modelos colegiado e voluntariado, focando suas 
dimensões ideais, institucionais e reais. 
Para a consecução de tal objetivo central buscou-se: a) recorrer à produção 
científica que envolve o assunto, entendendo em que contexto os modelos de 
participação enfocados vêm se enquadrando no novo cenário sócio-político-
educacional; b) recorrer a normas institucionais e legislação que fundamentam e 
dão sustentação à política pública e proposta de participação social que visam 
incluir novos interlocutores no processo escolar; c) tecer considerações sobre a 
 
 11
prática e os efeitos derivados dos modelos de participação colegiado e 
voluntariado. 
Enquanto forma de aproximação dos itens a e b das considerações 
apontadas no item c, três objetivos específicos foram estabelecidos. A 
investigação se propôs a: 1) verificar até que ponto essas formas de participação 
enfocadas têm o poder de ruptura com a herança centralizadora, autoritária e 
excludente da administração escolar, herança de nossa própria formação, e 
modificar o quadro que apresenta uma tradição participativa de desacertos e 
desencontros já enraizada; 2) averiguar a efetividade dos objetivos centrais das 
formas de participação enfocadas que visam metas de democratização na gestão 
da escola pública, contribuir para a melhoria da qualidade do ensino e incidir sobre 
a garantia, promoção, mobilização e fortalecimento da presença e participação da 
comunidade na escola; 3) tornar visível situações e mecanismos que contribuem 
para maior ou menor êxito da participação social na escola no contexto da 
institucionalização. 
Este é o tom neste trabalho: reconhecer a participação da comunidade na 
escola pública como algo promissor em termos democratizantes e, buscar apoio 
nas bases legais e institucionais, para extrair delas um melhor proveito. 
 
 
Organização do estudo 
 
 
Leituras iniciais sobre as recentes formasde participação da comunidade 
na escola pública conduziram a algumas questões que foram se apresentando 
como necessárias para a compreensão mais aprofundada do assunto. Entre elas, 
a qualidade e a melhoria do ensino; o papel da mídia na conversão de um novo 
conceito de participação; a ação dos movimentos sociais em contrapartida aos 
novos canais de participação, revelando-se como instrumentos à disposição do 
Estado e elites dominantes; as contradições que ocorrem no discurso e na prática 
da "democratização da gestão escolar"; os significados sociais da participação na 
escola pública no contexto das reformas educacionais; a influência da forma de 
 
 12
escolha do diretor de escola; o uso da noção de cidadania e direito como forma de 
mediar a participação da comunidade; a crise do ensino público; o voluntariado 
como "a tendência da moda" na zona de atividade da participação social; o 
surgimento e crescimento do Terceiro Setor, todas elas, questões que vão se 
entrecruzando ao longo deste estudo, estabelecendo uma rede em torno do 
discurso da participação. Assim, o referencial teórico constituiu a primeira parte 
deste estudo. Pela revisão bibliográfica procurou-se dar sustentação teórica ao 
que se propôs neste trabalho e conferir a este primeiro capítulo um caráter que 
aponta para aspectos ideais da participação social na escola pública. 
Conforme indica LUNA (1989: 31) a teoria é sempre um recorte, um retrato 
parcial e imperfeito da realidade, que ao ser elaborada, serve a dois propósitos: 
indica lacunas em nosso conhecimento da realidade e serve de referencial 
explicativo para os resultados que vão sendo observados. Com base nesses 
propósitos, recorreu-se a diversos estudiosos do tema, os quais foram tomados 
como base que possibilitasse uma percepção mais clara das inferências da 
pesquisadora. Também para servir de suporte teórico, recorreu-se a estudos já 
realizados sobre a participação dos pais na escola pública por órgãos 
colaborativos, buscando neles interlocução com pesquisadores que, mediante 
suas ricas contribuições, têm a participação dos pais e da comunidade como 
condição indispensável no processo de democratização e emancipação do meio 
escolar. 
Na segunda parte do estudo procura-se levantar suportes institucionais e 
legais da proposta do projeto Amigos da Escola e do conselho deliberativo escolar 
do sistema catarinense de ensino destacando suas âncoras de apoio e 
sustentação. Com esse tratamento pretende-se enfocar a dimensão legal e 
institucional da participação social na escola. A especificidade quanto a escolha 
do sistema de ensino se dá por se tratar da rede de ensino na qual atua a 
pesquisadora e nela se inserir um estudo piloto que objetiva contribuir para dar 
forma as considerações sobre a prática nas escolas dos modelos de participação 
colegiado e voluntariado. 
Na terceira parte são tecidas considerações sobre a dimensão da prática, 
 
 13
do real, nos processos participativos enfocados. Enquanto forma de articular as 
dimensões do ideal, legal e institucional e real um estudo piloto foi realizado. 
Dados que contextualizam o estudo piloto serão apresentados no terceiro bloco 
desse estudo (capítulo III). Também, uma terceira forma de participação que 
marca presença com regularidade nas escolas públicas da região onde atua a 
pesquisadora será apresentado. 
Essa forma de construir o estudo, buscando articular as dimensões do 
teórico e das normas com a da concretude visa buscar uma melhor compreensão 
das possibilidades da participação social nas relações do cotidiano escolar. Desta 
articulação foram se construindo categorias, que a pesquisadora procurou 
trabalhar no capítulo III, tendo o sentido de agrupar considerações que 
constituíram suas idéias, dados extraídos de fundamentação teórica, institucional 
e empírica. Esta última enriquecida com vivências e discursos de sujeitos que 
tiveram participação neste estudo na condição de interlocutores. 
Este caminho não tem o significado de ser único, mas de se apresentar 
como um dos possíveis na articulação do real com o quadro teórico inicial, 
podendo ser contestado pelo leitor. 
Passando para a parte final apresentam-se algumas considerações que 
tratam da trajetória deste estudo. As considerações apresentadas não constituem 
conclusões finais, dado o próprio caráter processual de processos participativos, 
mas considerações da produção que está essencialmente ao alcance do 
pesquisador. 
Por último apresentam-se as referências bibliográficas, dispondo ao leitor o 
acesso às fontes consultadas e referendadas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 14
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 15
CAPITULO I 
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 
 
 
1. Localizando os referenciais 
 
A revisão da literatura teve por objetivo recorrer à produção científica que 
envolve a atual prática de participação escolar. A investigação procurou articular 
conhecimentos anteriores construídos por estudiosos da área às indagações e 
inquietações da pesquisadora previamente apresentada. Já na fase exploratória 
inicial, a investigação remeteu a questões que abarcam o recente quadro da 
participação comunitária na escola pública, que foram elucidando o estudo na 
medida que levaram à compreensão de como a dinâmica social, política e 
econômica vem influindo na participação da comunidade na escola pública 
(PCEP). Baseando-se em orientações de MINAYO (1999: 18), o referencial teórico 
elaborado teve como meta levantar questões acerca da participação da 
comunidade na escola pública com mais propriedade possibilitando iluminar a 
análise dos dados organizados, lembrando que esse referencial representa 
explicações parciais do tema investigado. 
 Como forma de apresentação do referencial teórico, que envolve a 
organização do pensamento do pesquisador, optou-se por um esquema que não 
fosse rígido, por entender que as questões a que se chegou permite uma leitura 
não-linear, uma vez que ao mesmo tempo em que se ligam ao tema proposto se 
interligam entre si. Ainda, estando o tema envolvido em contexto mais amplo da 
sociedade, marcado pela dinamicidade, pluralidade de interesses e rápidas 
mudanças que ocorrem na atualidade, estas características patrocinam novos 
campos de significação e demandas que convivem em meio a convergências e 
divergências. Nesse contexto, práticas participativas vão sofrendo alterações ao 
longo do seu próprio processo incorporando novos fatores e novas identidades 
aos já tradicionais movimentos de participação popular. Por esta dinâmica, torna-
se improvável falar em ordenações rigorosas, leituras lineares ou exposições 
conclusivas. 
 
 16
Assim, a organização desta apresentação seguiu um esquema próprio da 
pesquisadora. A revisão da bibliografia possibilitou a compreensão do entorno de 
interesses, blocos de poder, regimes de verdades, estratégias discursivas, 
intenções pouco transparentes da atual política e propostas de participação da 
comunidade no contexto escolar. 
Compondo o esquema, encontram-se questões cuja relevância foram 
percebidas pela pesquisadora como condição de enriquecimento para uma visão 
mais completa acerca do tema investigado. Tais questões, que vão se revelando e 
se entrecruzando nas recentes formas de PCEP, abarcam parâmetros acerca da 
qualidade do ensino; papel da mídia na conversão de um novo conceito de 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
( figura ) PCEP e as questões que abarcam o tema 
 
 
 
Terceiro 
Setor e o 
voluntariado 
Novo modelo 
de gestão 
escolar 
 Reflexões 
sobre 
qualidade de 
ensino 
Uma rede de 
proteção 
social mínima 
 
Poder da mídia
Cidadania: direitos 
e deveres na 
participação escolar 
A PCEP no 
contexto da 
agenda 
neoliberal 
A normatização 
como regulação 
 da conduta 
 humana 
Participação da 
comunidade naescola pública 
 
 
 17
participação; ação dos movimentos sociais em contrapartida aos novos canais de 
participação; contradições que ocorrem no discurso e na prática da 
democratização da gestão escolar; significados da participação social na escola 
pública no contexto das reformas educacionais; uso da noção de cidadania e do 
direito como forma de mediar a participação da comunidade; crise do ensino 
público; a influência do Terceiro Setor na construção de uma mentalidade voltada 
para a responsabilidade social e sua contribuição no crescimento da participação 
social por meio da ação voluntária; a normatização da participação como 
estratégia de regulação da conduta dos sujeitos envolvidos na participação. 
Validando esta forma de apresentação, buscou-se em DELEUZE & 
GUATTARI (citados por ALVES, et al., 2000) uma nova possibilidade de se 
compreender os problemas educacionais. Estes autores propõem o paradigma 
rizomático, como metáfora ao rizoma – tipo de caule que se ramifica formando 
inúmeras raízes emaranhadas que se entrelaçam constituindo um conjunto 
complexo no qual todos os elementos se remetem uns aos outros e também para 
fora do próprio conjunto. Nessa proposta pode-se considerar múltiplas 
possibilidades de conexões, aproximações, cortes, percepções em vários 
sentidos, sem hierarquização ou direção pré-definida, o que permite uma nova 
forma de trânsito entre as questões apresentadas. Ao mesmo tempo, permite 
contemplar grau de prioridade a todas as questões, aqui submetidas à apreciação 
do leitor. Tal proposta, numa perspectiva particular e pessoal da pesquisadora, 
constitui "uma leitura possível" do tema, que não descarta outros entendimentos 
que possam surgir, enriquecendo ainda mais esta reflexão. Desta forma, espera-
se que o leitor se sinta à vontade para determinar, segundo sua própria leitura, 
como as questões a serem apresentadas se articulam com relação à participação 
dos pais e da comunidade na escola pública, ponderando sobre seus novos 
significados. 
Importante ressaltar que ao se fazer menção a estas questões não houve 
pretensão de se contemplar todos os prismas possíveis, mas de desenvolvê-las 
até o ponto em que pudessem estabelecer relação com o tema proposto. 
 
 18
Tampouco houve pretensão de esgotar todas que possam existir com relação ao 
tema. 
Um último esclarecimento diz respeito à perspectiva de incompletude, 
reconhecendo que somos sujeitos que buscamos nos completar com o 
conhecimento compartilhado assumindo que ainda há muito por ser dito. 
 
 
2. Revisão da literatura 
 
Recuperando as questões apresentadas na figura anterior, preenchendo 
este capítulo, procurar-se-á desenvolvê-las perseguindo o objetivo de relacioná-
las com o tema da participação social na escola pública, tendo em vista as re-
significações que vão se construindo na rede de interesses dos grupos sociais. 
As questões, cujo plano de apresentação estimula a optar por uma 
seqüência não-necessariamente ordenada, teria num plano virtual uma 
apresentação do tipo hiper-texto, que possibilitaria uma leitura de múltiplas 
conexões, sem hierarquias ou direção pré-definida. Ao ingressar nas questões, 
convida-se o leitor para este espírito de leitura. 
 
2.1 Reflexões iniciais sobre participação 
2.2 A participação social: dos movimentos sociais aos novos modelos de 
participação social 
2.3 Cidadania e o direito no contexto da participação social 
2.4 Reflexões sobre a qualidade de ensino 
2.5 O novo modelo de gestão escolar 
2.6 A normatização como forma de regulação da conduta humana 
2.7 Uma rede de proteção social mínima - da educação básica como um 
direito universal e obrigação do Estado à crise da educação brasileira 
2.8 O crescimento do Terceiro Setor e o voluntariado como tendência mundial 
2.9 A contribuição da mídia nas formas contemporâneas de voluntariado 
 
 19
2.10 A participação da comunidade na escola pública no contexto das 
reformas educacionais 
 
 
2.1 Reflexões iniciais sobre participação 
 
A participação não é somente um instrumento para a solução de problemas mas, 
sobretudo, uma necessidade fundamental do ser humano... a participação é o caminho 
natural para o homem exprimir sua tendência inata de realizar, fazer coisas, afirmar-se a 
si mesmo e dominar a natureza e o mundo... Sua prática envolve a satisfação de outras 
necessidades, não menos básicas, tais como a interação com os demais homens, a auto-
expressão o desenvolvimento do pensamento reflexivo, o prazer de criar e recriar coisas, 
e ainda, a valorização de si mesmo pelos outros. 
BORDENAVE (1995: 16) 
 
Baseado em BORDENAVE (1995: 17-19), tem-se que a participação é 
inerente à natureza social do homem ... e ... a frustração da necessidade de 
participar constitui uma mutilação do homem social. O oposto da participação é 
entendido pelo autor como a marginalidade (no sentido de ser colocado à margem 
do processo participativo) e que ocorre como resultado lógico e natural do 
desenvolvimento modernizador em sociedades onde o acesso aos benefícios está 
desigualmente repartido. 
Apontar a existência dessas dimensões, da participação e da 
marginalidade, torna-se fundamental pois possibilita compreender as implicações 
de ordem social que determinam as várias significações e os múltiplos usos do 
termo participação que variam de uma ponta a outra dessas dimensões. Como por 
exemplo, a participação em sociedades onde o acesso aos benefícios está 
desigualmente repartido pode ser entendida como “estratégia integradora”, ou, 
como a “inclusão” aos bens materiais e culturais inerentes ao desenvolvimento 
modernizador. 
Em termos de potencialidade, BORDENAVE entende que participar engloba 
as dimensões fazer parte, tomar parte, sentir parte e ter parte numa determinada 
atividade. O autor entende, no entanto, ser possível fazer parte sem tomar parte 
 
 20
mas aponta que o apenas “fazer parte” remete à condição de uma participação 
passiva; enquanto que o “tomar parte” à uma participação ativa, diferença que 
distingue a ação de um cidadão inerte daquele engajado no processo participativo. 
Isso porque no segundo caso, a idéia é que, quando se toma parte de algo, ou 
melhor, na condução do processo, sente-se parte dele, portanto, tem-se parte na 
sua construção. 
Ainda tratando de participação social, BORDENAVE (p.24) distingue a 
macroparticipação a ocasião quando há intervenção das pessoas nos processos 
dinâmicos que constituem ou modificam a sociedade. São processos em que se 
toma parte na produção, na gestão e no usufruto dos bens e serviços. Desta 
forma, conceitua a participação social como o processo mediante o qual as 
diversas camadas sociais têm parte na produção, na gestão e no usufruto dos 
bens de uma sociedade historicamente determinada. 
Considerando esta premissa, se os pais ou a comunidade produzem e 
usufruem, ou apenas usufruem da escola enquanto um bem social, mas não 
tomam parte na sua gestão, então, não se pode afirmar que eles realmente 
participem da escola. E aponta a microparticipação como uma dimensão que 
compreende a associação voluntária de duas ou mais pessoas numa atividade 
comum, podendo elas tirar benefícios pessoais e imediatos ou não. 
Distinguindo os tipos de participação, BORDENAVE (p. 30) aponta vários: a 
participação espontânea (decorrente de grupos, panelinhas ou gangs, que não 
supõem uma organização estável com propósitos claros e definidos, senão que 
satisfazer necessidades psicológicas); a participação imposta (situação em que o 
indivíduo é obrigado a fazer parte por compromissos de diversas naturezas como 
é o caso da missa dominical ou do voto obrigatório); a participação voluntária 
(resultante de uma proposta própria, definida pelo próprio grupo, tal como o 
sindicato, a associação de profissionais, a cooperativa); a participação provocada 
por agentes externos (típicos em propostasde participação dirigida e manipulada, 
na qual quem propõe “usa” outros para atingir seus próprios objetivos 
anteriormente estabelecidos); e, por último, a participação concedida (situação em 
que a participação é dada ou outorgada por superiores, passando a ser 
 
 21
considerada como legítima por todos. Esta modalidade faz parte de uma 
estratégia de melhor dominação, concedendo e mantendo uma participação 
restrita dos grupos, criando uma ilusão de participação. 
Com base nas definições de BORDENAVE (p. 30) e nas situações de 
desigualdades existente em processos participativos que aponta, quanto aos 
graus e níveis de participação, do menor ao maior, pode-se dizer que na escola os 
graus de participação variam de apenas acesso às informações sobre decisões já 
tomadas, facultando ou não o direito à reação; consulta aos pais englobando 
críticas, sugestões ou dados na resolução de problemas, podendo ser uma atitude 
obrigatória ou facultativa da direção cabendo sempre a decisão final ao diretor; 
inclusão dos pais na elaboração de propostas e medidas administrativas, 
pedagógicas ou envolvendo o setor financeiro, podendo estas serem aceitas ou 
rejeitadas sob justificação; a co-gestão, num grau superior de participação dos 
pais, representando a atuação de órgãos colegiados garantidos por mecanismos 
de co-decisão descritos no projeto político pedagógico (PPP) e viabilizados em 
sua atuação; a atuação autônoma da comunidade escolar – neste grau, o autor 
defende uma completa autoridade da administração escolar (entendido como o 
órgão colegiado) – nas tomadas de decisão, ou seja, sem necessidade de 
consultar órgãos superiores. 
Relativo aos níveis, o autor chama a atenção para a existência de decisões 
de muita e pouca importância, que podem variar da mera execução das tarefas, 
até a formulação e o planejamento das políticas e ações educativas. 
Tomando as instâncias de macro e microparticipação, de tipos, graus e 
níveis de participação já expostos, pode-se observar que, para se atingir os pontos 
mais elevados de participação, há uma árdua escalada para a derrubada de 
poderes já estabelecidos no interior da escola, e em relação aos órgãos 
superiores. Nesse sentido, o autor aponta que experiências democráticas 
vivenciadas e cursos de capacitação fazem uma frente de peso na mudança dos 
quadros de baixo índice participativo, e estas mudanças vêm fatalmente 
acompanhadas de lutas e conflitos contra o poder estabelecido. 
 
 22
Assim, a noção de conflito relacionada com a participação se deve às 
condições de desigualdade existentes em sociedades sócio-economicamente 
estratificadas, as quais tendem a ser reproduzidas nos sistemas de ensino. Estes, 
atrelados à uma estrutura de poder, concentram as decisões numa elite 
minoritária. 
Por essa breve contribuição de BORDENAVE (1995) depara-se com 
múltiplos usos do termo “participação”. Verificar as formas de emprego nos 
processos participativos aqui investigados e atingir a compreensão de suas várias 
significações foi o que se perseguiu no primeiro bloco desse estudo. 
Por entender que uma escola participativa deve se apoiar numa estrutura 
onde toda a comunidade escolar detém o mesmo grau de poder para que se 
possa atingir o mesmo grau e nível de participação de forma igualitária, e que, 
para se atingir uma participação assim definida, dada as condições de 
desigualdade e exploração, inevitavelmente verifica-se o envolvimento de lutas e 
conflitos, é que torna-se útil retomar as formas de emprego de processos 
participativos sociais em períodos anteriores. 
É no sentido de alinhavar o íntimo parentesco que a participação social tem 
com os movimentos sociais, que no próximo segmento serão apresentados 
aspectos conceituais dos movimentos sociais e sua evolução no setor 
educacional. 
 
 
2.2 A participação social: dos movimentos sociais 
 aos novos modelos de participação social 
 
A educação, considerada instrumento e ação estratégica para se atender 
aos interesses políticos e sociais de uma sociedade, nos últimos tempos vem 
sendo considerada área prioritária para o desenvolvimento da sociedade 
(SOARES, M., 2000: 30). Reconhecida por organismos multilaterais de 
financiamento como um caminho eficaz no combate à pobreza, o setor tem 
apresentado mais problemas do que soluções. Na busca de soluções mais 
 
 23
eficientes, a participação e o envolvimento da comunidade vêm sendo 
intensamente sugeridos e incentivados por setores governamentais e não-
governamentais como alternativa para a melhoria da escola pública. 
Refletindo sobre a situação do setor educacional, GOHN (1994) afirma que, 
após os anos de regime militar e início dos anos 70, ocorreu no Brasil amplo 
processo de massificação do ensino público e queda geral de sua qualidade, 
resultando em problemas de ordem funcional e estrutural que vêm se arrastando 
até os dias atuais. 
A participação popular no cenário educacional brasileiro no período que 
marca a nova democracia – definido pela Constituição de 88 – bem como nos 
diversos setores sociais, apresentava-se como um discurso de oposição ao 
regime militar. Apoiada nos movimentos de base, preconizava uma participação 
vinda das bases, do compartilhamento, do exercício à democracia, visando às 
necessidades e aos desejos da comunidade. De acordo com GOHN, eram 
movimentos sociais que agiam e se manifestavam mediante lutas e reivindicações 
para conquistar espaços democráticos numa sociedade conduzida pela ordem da 
ditadura militar. 
Segundo MELUCCI (1989), a noção de movimentos sociais envolve 
interesses e paixões dos atores envolvidos e supõe a adesão e o 
compartilhamento de objetivos e de motivações, cuja ação coletiva não é um 
dado, mas resultado de processos sociais assentados em bases históricas, 
implicando algo que se move na sociedade. A ação dos movimentos sociais deve 
apresentar uma dimensão educativa que, por meio de experiências vivenciadas, 
leva ao aprendizado de como identificar os distintos interesses dos atores 
envolvidos. Para MELUCCI (p. 28), a ação coletiva da sociedade movimenta-se 
em duas direções: uma, na direção da ação e dos conflitos sociais; outra, na 
direção da cidadania, e ambas vêm combinadas no aspecto de luta e conflito 
social pela inclusão dos excluídos na esfera da cidadania. Pelo viés da ação 
coletiva, o processo participativo deve se basear na capacidade dos atores 
partilharem uma identidade coletiva, reconhecendo e sendo reconhecido como 
uma parte da mesma unidade social, que não é realizada apenas com fins de 
 
 24
troca de bens num mercado político e cujo objetivo nem sempre pode ser 
calculado. 
No Brasil, os movimentos sociais – que já ocorriam durante o regime militar 
pós-64 – foram se intensificando durante a elaboração da Constituinte10, 
articulados com base no conflito contra o poder centralizador e autoritário do 
Estado e das elites sociais, tidos como "inimigos" do processo de democratização. 
Estes dois representantes sociais repudiavam a participação da sociedade civil 
nos processos decisórios, cerceando-a, perseguindo-a e caçando as 
manifestações e os manifestantes da democratização. 
Segundo a avaliação de GOHN (1994), durante a década de 80 os 
movimentos na área educacional geraram saldos positivos11. Várias reivindicações 
foram feitas, entre elas o acesso à escolaridade e a universalização do ensino. 
Ainda de acordo com GOHN, após 1988 ocorreu um fato marcante que fez mudar 
o curso dos movimentos sociais no Brasil. A vitória eleitoral de vários partidos de 
oposição em diversos estados brasileiros levou lideranças dos movimentos sociais 
a assumir cargos na administração pública. Como reflexo, muitas das 
reivindicações sociais passaram para o terreno das conquistas, sendo inscritas em 
leis. Este acontecimento desencadeou uma grande desmobilização dos 
movimentos sociais, bem como estabeleceu uma novarelação entre sociedade 
civil, lideranças políticas e governos estaduais. Outras manifestações como as 
lutas pelas "diretas já" e as manifestações a favor do processo de impeachment 
do presidente Collor, contribuíram para instalar uma abertura política na sociedade 
civil brasileira. Desta forma, a partir do final da década de 80 e início dos anos 90, 
um novo perfil político surgiu no país. 
Concomitante a estes acontecimentos, alguns setores da sociedade 
representados pelas elites dirigentes passaram a reivindicar maior atuação nos 
setores sociais junto ao Estado que, movido por uma forte onda neoliberal, criou 
possibilidades de interferência direta do setor privado no setor público. O ingresso 
 
 10 Segundo a análise do GRUPO DE ESTUDOS SOBRE CONSTRUÇÃO DEMOCRÁTICA, 
Revista Idéias,1998-1999. 
 11 Deve-se lembrar que estes movimentos ocorreram de forma ampla nos diversos setores 
sociais. 
 
 25
do setor privado no espaço público foi apresentado como "a grande solução" para 
os problemas da crise fiscal do Estado, numa trama que transferia a 
responsabilidade do Estado com a área social para as comunidades organizadas, 
utilizando o argumento da “política participativa”. 
De acordo com GOHN (1991: 15), foi nesta época que surgiram as políticas 
sociais reelaboradas pelo Estado em torno de negociações com a sociedade, 
consolidando-se o que a autora denominou como o ideal de participação enquanto 
fórmula de gerenciamento dos negócios do Estado, quando o Estado criou novas 
regras sociais como forma de atender a reivindicação do direito de participação da 
sociedade organizada. 
Com efeito, SILVA, M. L. (s/d.:105) afirma que não se pode falar em 
movimentos sociais na atualidade sem considerar as transformações ocorridas no 
interior do próprio Estado a partir da nova república brasileira, quando este 
assume uma posição de aliado diante da sociedade civil. Em direção à uma 
melhor definição da posição dos movimentos sociais contemporâneos, SILVA 
menciona que em tese os movimentos sociais trabalham sobre o legítimo, e o 
Estado, sobre o legal. Para a autora, apesar da fragilidade nas atuais 
possibilidades de manifestação social, as oportunidades de articulação e 
organização social possíveis de serem criadas a partir do Estado constituem 
aspectos que devem ser considerados. 
CARDOSO (1999: 87), analisando os rumos dos movimentos sociais na 
década de 90, refere-se a uma visão de refluxo e cooptação com o Estado. 
Segundo a autora, se no início dos movimentos sociais, particularmente nos anos 
70 e início dos 80, a demanda defendia um corte de relações com o Estado por 
ele não atender às reivindicações populares, durante todo o processo da nova 
Constituinte, ao surgirem possibilidades concretas de participação social, as 
reivindicações da sociedade passaram para o terreno da legalidade. Diante deste 
quadro de mudanças políticas criou-se um novo contexto, estabelecendo uma 
nova relação entre a sociedade civil e o Estado, que levou a sociedade a não ter 
mais o Estado como inimigo mas a estabelecer com ele uma nova relação: de 
posição de opositora às ações governamentais, passou a ocupar uma posição de 
 
 26
parceria. Por conseguinte, a participação social deixou seu cunho reivindicatório 
de um modelo de luta, passando para a posição de “parceria” com o Estado, 
situando a comunidade como parceira ideal das ações governamentais. 
Na mesma perspectiva de GOHN (1994), a análise do Grupo de Estudos 
sobre a Construção Democrática da Unicamp (1998/1999) entende que este fato 
mudou o curso das ações dos movimentos sociais, que foi deixando para trás 
suas características de lutas, conflitos e reivindicações. 
CARDOSO (1999) defende este novo referencial na relação entre Estado e 
sociedade civil como uma proposta de união de esforços para solucionar os 
problemas sociais. Segundo a autora, estas mudanças levam o Estado a abrir 
espaço para a participação da sociedade nas questões públicas, como um modo 
mais moderno e mais adequado de gerenciar as políticas públicas. É este modo 
mais "moderno e adequado" que leva o Estado a introduzir em seu interior a idéia 
de conselhos como modelo de participação, abrindo formas de participação 
institucional. 
Outro fato que mudou o comportamento político tradicional das camadas 
populares na última década foi a ação das ONGs, que passaram a ocupar o lugar 
dos movimentos sociais e, por sua vez, se acomodaram na passividade, 
aguardando a iniciativa de “outros” para liderar novas mobilizações. 
Porém, nem só retrocessos marcaram os movimentos sociais nos anos 90. 
Em 1996, um movimento de peso liderado e articulado pelo sociólogo Herbert de 
Souza estabeleceu, numa ação nacional, a campanha pela Ação da Cidadania 
contra a Fome, a Miséria e pela Vida, revelando a força e a capacidade de 
organização da sociedade brasileira. Este movimento, cujos pilares de 
sustentação foram os sentimentos de solidariedade, fraternidade, filantropia e 
ações cidadãs promovidas pela própria sociedade, mostrou para a sociedade 
brasileira que ação social e ação política não são incompatíveis, e que 
mobilizações imensas poderiam ser feitas com a parceria e a participação da 
sociedade civil, sem palanque ou comando político partidário. ASSIS (1993:5), 
fazendo referência ao sociólogo Herbert de Souza, articulador nacional do 
movimento, acredita que o aspecto ético, o compromisso com o ser humano e 
 
 27
com a vida foram as diretrizes norteadoras do movimento que prestigiou a ação da 
coletividade, agiu sobrepondo-se às políticas, às ações governamentais e não-
governamentais, às atividades comerciais, financeiras, produtivas ou a outros 
interesses12. 
De maneira geral, a demanda pela participação social desacelerou nos 
anos 90, apresentando um quadro de participação mínima dos indivíduos nos 
movimentos, chegando a uma desmobilização geral. Assim analisando, GOHN 
(1994: 102) entende que as causas básicas que levaram a este declínio estão 
refletidas em fatores de ordem externa aos movimentos sociais, apontados como 
a crise econômica do país, a crise do modelo centralizador do Estado, as políticas 
neoliberais, a crise das utopias, a descrença na política e em fatores de ordem 
interna caracterizados pela falta de independência e autonomia nos projetos 
políticos que acompanharam estes movimentos, uma vez que a maior parte deles 
era liderada e conduzida por projetos de outras instituições (igreja, mediante 
pastorais religiosas, ou partidos políticos). Outros fatores apontados por GOHN 
como estimuladores do movimento de participação da sociedade constituem 
movimentos populares, sociais, sindicais, acadêmicos, de entidades de base, 
como a OAB, e de ONGs que tinham como objetivo fortalecer a atuação civil na 
vida pública nacional. Todos estes representam demandas sociais em conquistar 
mais espaço de participação na política nacional. 
Assim, o conceito de participação social tinha sua ação vinculada à noção 
de movimentos sociais, caracterizada pela luta, reivindicação, protesto e conflito, 
apresentando um cunho transformador. Concordando com a análise de GOHN 
sobre a evolução dos movimentos sociais no Brasil, GENTILLI (1999b: 121), 
aponta que as demandas democratizadoras de conteúdo progressista no campo 
educacional expandiram-se no início dos anos 80, porém, acabaram apresentando 
uma sobrevida curta. Para o autor, este percurso se deve a promessas de 
liberdade e de progresso do discurso empresarial, levando as demandas 
participativas a passarem por uma reconfiguração, assumindo um conteúdo de 
caráter conservador. 
 
12 Para saber mais sobre o movimento iniciado por Herbert de Souza (Betinho), acesse 
 
 28
CARDOSO (1999) analisa essa reconfiguração como uma nova condição 
da participaçãosocial nascida do apelo à união de esforços entre a sociedade civil 
e o governo, desencadeando um reordenamento das relações que se 
estabelecem entre o Estado e a sociedade civil. Ao serem redefinidas e 
resignificadas, passam a estabelecer novas práticas de participação, baseadas em 
práticas de solidariedade, humanitarismo e dever social. 
Na opinião de TELLES (1998: 113), a nova noção de espaço público foi 
politicamente construída para uma versão comunitária. A autora sugere uma 
leitura que difere da de Cardoso: 
 [...] Há aí um peculiar deslocamento do campo em que a noção do espaço público 
não-estatal é definida. De uma noção política politicamente construída para uma versão 
comunitária apresentada como terreno da solidariedade, não a dos direitos sociais, a 
solidariedade da benemerência. E não por acaso onde antes o discurso de cidadania e dos 
direitos tinha algum lugar ou pertinência no cenário público hoje é ocupado pelo discurso 
humanitário da filantropia, uma filantropia renovada e modernizada. 
 
Nesta nova acepção de participação, CORAGGIO (1999: 78-82) situa a 
educação nas amarras do poder dos organismos multilaterais, cuja influência e 
capacidade de intervir nas relações econômicas dos países devedores chegam a 
ser fatores decisivos na formulação das políticas públicas destes países. Segundo 
o autor, utilizando o argumento da crise fiscal dos Estados-nações, estes 
organismos têm como orientação minimizar o gasto público. O objetivo principal é 
reestruturar as ações do governo, deixando cada vez mais nas mãos da 
sociedade civil a alocação de recursos para os serviços públicos, que passam a 
ser dirigidos pelo mercado. Na realidade, esta é a situação que vem se 
apresentando no conjunto dos serviços sociais públicos, não apenas no setor 
educacional. 
CARDOSO (1994: 87), que defende a nova condição da participação social 
e a idéia de conselhos como um modelo de participação institucional, aponta 
algumas dificuldades na sua implantação devido à identidade cultural. Para a 
autora, como a identidade dos movimentos sociais era calcada na idéia de 
espontaneidade e conflitos com o Estado, tornava-se difícil para as lideranças dos 
movimentos de base encontrar os caminhos para participação conjuntamente na 
 
www.acaodacidadania.com.br. 
 
 29
administração pública. Esta nova ordem simplesmente não se encaixava no modo 
como os movimentos se identificavam. Além de a crise de identidade, questões 
como a representatividade, expressas em perguntas como: De que forma as 
comunidades podem ser representadas num órgão público? Mais ainda, sem que 
sejam manipuladas por eles? levavam a uma baixa mobilização, muitas vezes ao 
esvaziamento desta nova forma de participação política. Segundo CARDOSO, 
estas questões representam o elemento fundamental do desencontro e da 
dificuldade de se entender como o diálogo, nesta nova trama, seria melhor 
redefinido. 
Na análise do Grupo de Estudos sobre a Construção Democrática – GECD 
(1998: 80) estas novas oportunidades de participação social revelam interesses 
antagônicos nos processos participativos. O Grupo aponta para certos riscos da 
parceria entre Estado e sociedade civil. Se de um lado existe demanda social para 
conquistar mais espaços de participação, de outro a crise do modelo de Estado 
centralizado leva a sociedade civil a se tornar mero instrumento à disposição do 
Estado. 
O GECD, por sua análise, confirma que algumas produções teóricas se 
referem à crescente presença da sociedade civil na construção de mecanismos 
institucionais de participação social junto ao Estado, como um refluxo dos 
movimentos sociais – abandonados aos ideais revolucionários e adesão à uma 
perspectiva reformista. Outros estudiosos apontam para uma forma de legitimar a 
participação dos cidadãos nos processos decisórios no sentido de uma nova 
possibilidade de democratização das estruturas políticas, percebendo na 
sociedade civil legítimos interlocutores no cenário político (CACCIA BAVA, citado 
por GECD, 1998/1999: 83). Outros ainda, entendem que tal participação 
represente formas legítimas, que passam a ser reguladas por amarras legais, 
seguindo a lógica do incluir para melhor controlar, inibindo seu potencial 
transformador. 
No entendimento do GECD (1998/99: 84), constata-se que muitas das 
atuais propostas de participação social não prevêem a participação da sociedade 
 
 30
civil na formulação das políticas públicas, mas apenas a transferência da 
execução das políticas públicas para os movimentos e organizações voluntárias. 
Um elemento primordial, porém ausente nas novas propostas de 
participação, pode ser apontado como o que GOHN (1994) e MELUCCI (1989), 
chamam de cultura da participação, indicada por estes autores como uma das três 
fontes básicas de inspiração dos movimentos sociais nos anos 70/80. Esta cultura 
funda-se no princípio da autonomia das ações e no desejo da autodeterminação 
dos grupos excluídos. Caracteriza-se por sujeitos que lutam pela sua própria 
história, rejeitando ser meros objetos de política e políticos (GOHN, 1994: 107). Na 
cultura da participação, a liberdade de expressão visa ser o atributo fundamental, 
objetivando não apenas o bem material imediato, mas principalmente o 
crescimento e o amadurecimento do indivíduo. GOHN entende que neste sentido, 
a cultura da participação almeja ser uma expressão manifesta na forma plural de 
seus participantes, possibilitando a construção de identidades diferenciadas nas 
quais a igualdade se refere ao acesso às oportunidades. 
Especificamente quanto à forma de participação pela atuação do conselho 
escolar, GOHN (1995: 92) entende que esta deve ultrapassar as fronteiras da 
instituição escolar 
[...] a criação do Conselho e a participação na escola implicam abertura de canais 
de participação na administração, tendo como meta a transparência administrativa. O 
Conselho de Escola deve existir para criar políticas e não apenas para executar decisões. 
Deve estar inserido em um plano estratégico amplo, sem ser o único instrumento de 
democratização da escola. Deve deliberar sobre currículo, calendário escolar, formação 
de classes, horários, atividades culturais etc. e deve apontar soluções para os problemas 
no conjunto de interesses da escola, tais como a aplicação de recursos, racionalização 
de horários de trabalho e seu funcionamento geral... Os Conselhos representam a 
possibilidade da escola transformar-se em um espaço de cidadania e democracia no 
bairro e na região. Assim, cabe ao Conselho garantir que a escola não seja uma unidade 
voltada só para sua clientela, mas uma unidade de educação para toda a comunidade. 
 
Na proposta de GOUVÊA (1997), pode-se perceber a expectativa de uma 
atuação emancipatória do conselho escolar: 
Uma escola que apresente uma proposta pedagógica que atenda aos interesses 
da comunidade desencadeia um processo de reavaliação da participação comunitária 
nas decisões e caminhos a serem trilhados. O Conselho da Escola passa a ser o fórum 
pertinente para as discussões e deliberações a respeito das questões pedagógicas e 
administrativas. Pais e alunos, ao lado de educadores e funcionários, são co-autores do 
destino educacional da unidade escolar. Tanto na escolha das temáticas a serem 
abordadas nos diferentes semestres, quanto nas questões relacionadas a 
operacionalização das ações, as decisões devem ser tomadas levando em consideração 
 
 31
as variáveis e os interesses da comunidade local e dos educadores: funcionários, 
professores, técnicos e equipe diretiva. Um espaço democrático de construção dos 
saberes não se organiza com poderes centralizados, autoritarismo e clientelismos 
corporativistas. A gestão democrática é, além de um direito, uma necessidade 
pedagógica.

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