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Livro Psicodiagnostico Hutz

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Prévia do material em texto

Parte  1
O PROCESSO PSICODIAGNÓSTICO
A
1
CONCEITUAÇÃO DE
PSICODIAGNÓSTICO NA ATUALIDADE
Jefferson Silva Krug
Clarissa Marceli Trentini
Denise Ruschel Bandeira
avaliação psicológica clínica com fins diagnósticos é uma prática muito
comum no Brasil. Há décadas, ​muitos profissionais habituaram-se a chamar
essa atividade de “psicodiagnóstico”. No entanto, constatamos que o uso do
termo é mais comum quando, durante o seu desenvolvimento, o profissional se vale de
testes psicológicos para coletar informações sobre o consultante. Nas avaliações em
que esses testes não são empregados ou inexistem para os objetivos do exame, outros
termos se destacam, como avaliação clínica, avaliação psicológica, entrevistas
preliminares, diagnóstico psicológico, etc. (Krug, 2014). Essa constatação nos levou a
questionar o concei​to clássico de psicodiagnóstico e a examinar se a compreensão
desses profissionais quanto à associação direta do termo “psicodiagnóstico” com a
administração de testes também é compartilhada pela literatura da área.
THIAGO
Highlight
O PSICODIAGNÓSTICO EXIGE A APLICAÇÃO DE TESTES
PSICOLÓGICOS?
Ao consultar a literatura, identificamos conver​gências conceituais. Arzeno (1995, p. 5)
diz, por exemplo, que “. . . fazer um diagnóstico psicoló​gi​co não significa
necessariamente o ​mesmo que fazer um psicodiagnóstico. Este termo implica
automaticamente a administração de testes e estes nem sempre são necessários ou con​-
venientes”. Portanto, parece claro o entendimento da autora de que toda avaliação
psicológica que não utilize testes não deva ser nomeada de “psicodiagnóstico”.
Cunha (2000, p. 23, grifo nosso), em concordância, preconiza que
“psicodiagnóstico” é um termo que designa um tipo de avaliação psicológica com
propósitos clínicos, em que “. . . há a utilização de testes e de outras estratégias, para
avaliar um sujeito de forma sistemática, científica, orientada para a resolução de
problemas”. A autora segue afirmando que:
Psicodiagnóstico é um processo científico, limitado no tempo, que utiliza
técnicas e testes psicológicos (input), em nível in​di​vidual ou não, seja para
entender proble​má​ticas à luz de pressupostos teóricos, identificar e avaliar
aspectos específicos, seja para classificar o caso e prever seu curso possível,
comunicando os resultados (output), na base dos quais são propostas
soluções, se for o caso. (Cunha, 2000, p. 26, grifo nosso).
Observamos que, em todas as definições de Cunha (2000), o uso da expressão “e”
sugere a obrigatoriedade do uso de testes para que o processo de avaliação psicológica
clínica seja chamado de “psicodiagnóstico”. Aparentemente, Castro, Campezatto e
Saraiva (2009) também entendem dessa forma, diferenciando “período de avaliação”
de “psicodiagnóstico”. Para as au​toras, durante o “período de avaliação” que precede a
psicoterapia, o psicólogo poderá reali​zar um “psicodiagnóstico” ou fazer o
encaminhamento para outro psicólogo que o realize, quando ocorrer a aplicação de
testes psicológicos: “. . . a aplicação de testes pode ser realizada pelo próprio
psicoterapeuta, se esse dominar as técnicas necessárias e se sentir confortável para tal,
ou por um colega especializado em psicodiagnóstico” (Castro et al., 2009, p. 100).
Em Ocampo e Arzeno (1979/2009), também encontramos a ideia de que o
processo psicodiagnóstico inclui, obrigatoriamente, uma etapa de aplicação de testes e
técnicas projetivas. Para explicar seu posicionamento, as autoras diferenciam a prática
avaliativa que chamam de “psi​codiagnóstico” da prática avaliativa de psicanalistas em
suas primeiras consultas, referindo que, nestas últimas, se tem a possibilidade do uso
THIAGO
Highlight
THIAGO
Highlight
THIAGO
Highlight
THIAGO
Highlight
THIAGO
Highlight
de entrevistas livres ou totalmente ​abertas, algo não viável no psicodiagnóstico devido
à limitação do tempo.
Neste debate sobre a terminologia adotada para a atividade avaliativa clínica,
observamos que, excluindo-se a necessidade de aplicação de testes, as descrições do
processo psicodiagnósti​co contidas nos manuais citados relatam exata​mente o que é
feito pelos profissionais que di​zem não realizar psicodiagnóstico. Dito de outra forma,
o que diferencia a avaliação clínica feita por psicólogos que nomeiam sua prática de
“psi​codiagnóstico” da daqueles que não a chamam assim é, apenas, o uso de testes
psicológicos (Krug, 2014).
Parece-nos infrutífera essa distinção termi​nológica, uma vez que, para nós, o que ​-
define um psicodiagnóstico relaciona-se mais ao caráter investigativo e ao diagnóstico
do que à necessidade do uso de determinado tipo de instrumento de coleta de dados.
Diferentemente dos trabalhos citados, encontramos outros ​autores que defendem a ideia
de que o uso de testes pode não ser necessário em um psicodiagnóstico. Conforme
Trinca (1983), por exemplo, o uso ou não de testes depende do psicólogo e de seu
pensamento clínico em relação a cada paciente.
Tomemos como referência para essa reflexão as definições feitas pelo Conselho
Federal de Psicologia (CFP) para alguns termos comumente utilizados na área. A
definição de “avaliação psicológica” do CFP (2013, p. 11), por exemplo, engloba
qualquer atividade, com ou sem o uso de testes:
A avaliação psicológica é compreendida como um amplo processo de
investigação, no qual se conhece o avaliado e sua demanda, com o intuito de
programar a tomada de decisão mais apropriada do psicólogo. Mais
especialmente, a avaliação psicológi​ca refere-se à coleta e interpretação de
da​dos, obtidos por meio de um conjunto de procedimentos confiáveis,
entendidos co​mo aqueles reconhecidos pela ciência psicológica.
Quanto à diferença entre “avaliação psico​ló​gica” e “testagem psicológica”, a
Cartilha (CFP, 2013, p. 13) diz:
A avaliação psicológica é um processo amplo que envolve a integração de
informações provenientes de diversas fontes, dentre elas, testes, entrevistas,
observações e análise de documentos, enquanto a testagem psicológica pode
ser considerada um processo diferente, cuja principal fonte de informação
são os testes psicológicos de diferentes tipos.
Na Cartilha sobre Avaliação Psicológica, editada em 2007 pelo CFP (2007), não
há referência ao termo “psicodiagnóstico”. Já na Cartilha de 2013 (CFP, 2013, p. 34),
há apenas uma menção ao termo, descrito como uma modalidade de avaliação
psicológica, sem a especifica​ção da necessidade ou não do uso de testes: “. . . no
âmbito da intervenção profissional, os processos de investigação psicológica são
denomina​dos de avaliação psicológica, descritos em ​termos de suas modalidades –
psicodiagnóstico, exame psicológico, psicotécnico ou perícia” (CFP, 2013, p. 34, grifo
nosso).
Portanto, a partir da reflexão sobre o uso do termo “psicodiagnóstico”, podemos
fazer os seguintes questionamentos: as chamadas “en​trevistas preliminares”,
“entrevistas de avaliação” ou “entrevistas iniciais”, conduzidas por psicólogos de
diferentes abordagens teóricas antes de indicar ao paciente uma análise, uma
psicoterapia ou qualquer modalidade de tratamento psicológico ou de outra área, não
poderiam ser consideradas uma prática de avaliação psicológica? A avaliação clínica
inicial feita pelo psicólogo com o objetivo de conhecer aspectos psíquicos do paciente
à luz da teoria psicanalíti​ca ou de qualquer outra teoria não se ​configura como uma
prática de avaliação psicológica? Ou o mais apropriado seria chamar essa prática
psicológica orientada pela teoria psicanalítica de “avaliação psicanalítica” e a prática
de profissionais orientados pelo comportamentalismo de “avaliação comportamental”?
Somente quando um psicanalista, um gestaltista ou um comportamentalista aplica testes
psicológicos durante o período de entrevistas preliminares diagnósticas é que
poderíamos chamar essa prática avaliativa de “psicodiagnóstico”? E, ainda, não
poderemos chamar de “psicodiagnóstico” os processos de avaliação psicológica
clínica com pacientes para os quais não dispomos de testes psicológicos aprovados
pelo CFP? Por fim, sabendo que o profissional,durante uma avaliação clínica, tem o
dever e a liberdade de optar pelas estratégias mais indicadas para realizar o
procedimento, caso deseje realizar um psicodiagnóstico, terá ele de, obrigatoriamente,
aplicar testes psicológicos?
Essa confusão conceitual é descrita pela li​teratura (Wainstein, 2011; Wainstein &
Bandeira, 2013). Nesses estudos, investigou-se o que profissionais da saúde e da
educação ​entendem e esperam de um processo psicodiagnóstico para crianças e
adolescentes, assim como de que forma encaminham seus pacientes para esse tipo de
avaliação. Os resultados indicaram que o conceito de “psicodiagnóstico” é associado
ao uso de algum instrumento psicológico, mais es​pecificamente testes que avaliam as
capacida​des cognitivas, e sugeriram que os profissionais que encaminham seus
pacientes não sabem ao certo a nomenclatura que deve ser utilizada, usando
“psicodiagnóstico”, “avaliação diagnóstica”, “psicoavaliação”, “testagem”, conforme o
tipo de interesse (aspectos cognitivos, ​aspectos sociais e outros). Essa pesquisa
THIAGO
Highlight
apontou que todas as nomenclaturas usadas representam a avaliação psicológica
clínica, mas o termo que aparenta ser o melhor para esses casos é “psico​diagnóstico”,
que tem uma definição clara de to​do o processo. Para as autoras, não é o uso ou não de
testes, ou de determinados tipos de testes, que configura a realização de um
psicodiagnóstico, uma vez que, em alguns casos, o psicólogo abrirá mão do uso de
testes, especialmente quando não houver testes validados no mercado. Lembram que,
para a avaliação de ​crianças pré-escolares (0 a 6 anos), a observação do de​-
senvolvimento infantil, baseada em critérios, tem sido muito usada entre os
profissionais que costumam trabalhar com essa faixa etária. Por fim, concluem dizendo
que parece não haver um consenso a respeito da nomenclatura utilizada para designar o
encaminhamento de um indivíduo para avaliação psicológica.
DEFINIÇÃO DE PSICODIAGNÓSTICO
A definição encontrada nos manuais ​consultados, que associam a prática de
psicodiagnóstico à obrigatoriedade de aplicação de testes psicológicos, está em
desacordo com a compreensão de muitos profissionais da área da avaliação psico​ló​-
gica sobre o que é um psicodiagnóstico na atua​lidade. Defendemos a ideia de que a
prática realizada por psicólogos, tanto aqueles que nunca se valem de testes
psicológicos quanto aqueles que os usam ocasionalmente, independentemente de sua
teoria de base, também possa ser nomeada de “psicodiagnóstico”. Portanto, em nosso
entendimento, há a necessidade de se rever a definição do termo na atualidade, de
maneira a abranger variadas formas de realização desse procedimento investigativo
clínico, a partir de diferentes teorias psicológicas.
Compreendemos que o ​psicodiagnóstico é um procedimento científico de
investigação e intervenção clínica, limitado no tempo, que emprega técnicas e/ou testes
com o propósito de avaliar uma ou mais características psicológi​cas, visando um
diagnóstico psicológico (descritivo e/ou dinâmico), construído à luz de uma orientação
teórica que subsidia a compreensão da situa​ção avaliada, gerando uma ou mais
indicações terapêuticas e encaminhamentos.
Assim, o psicodiagnóstico pressupõe a adoção de um ponto de vista científico
sobre o fenômeno avaliado. Em psicologia, acreditamos que esse caráter científico é
adquirido por meio de métodos e técnicas de intervenção, com base em teorias
psicológicas.
THIAGO
Highlight
THIAGO
Highlight
O PSICODIAGNÓSTICO NECESSITA DE UMA TEORIA
PSICOLÓGICA QUE O FUNDAMENTE
Felizmente, nas últimas décadas, a área da avaliação psicológica no Brasil tem
investido ​muito no desenvolvimento de instrumentos mais con​fiáveis, construídos a
partir da nossa realidade cultural. É perceptível o aumento da ​oferta e da qualidade dos
testes em nosso país, o que proporcionou maior qualificação dos serviços prestados à
população. Sem dúvida, o estudo desses instrumentais qualificou os testes, mas não o
processo psicodiagnóstico.
Observamos, na atualidade, uma superva​lo​rização dos instrumentos psicométricos
e pro​jetivos em detrimento da escuta e da tarefa de síntese compreensiva que deve ser
realizada pe​lo psicólogo a partir de todas as informações coletadas durante a
avaliação. Em alguns casos, a teoria psicológica tem cada vez menos in​​fluência no
processo, seja por não orientar o pró​prio processo avaliativo, seja por não estar
contemplada na construção dos ​instrumentos que são utilizados de forma
indiscriminada. Veem-se verdadeiros frankensteins técnicos e teóricos quando
psicólogos adotam em seus processos avaliativos técnicas que se estruturam em
diferentes teorias (muitas vezes com concepções teóricas e epistemológicas
conflitantes). Assim, como avaliar a personalidade de um paciente utilizando, ao
mesmo tempo, instrumentos que se alicerçam na psicanálise, na psicologia positi​va, na
gestalt e na neuropsicologia? O resultado é uma total dependência do profissional ao
resultado do teste, fazendo com que ele construa a conclusão de sua avaliação
desconsiderando os aspectos específicos de cada ​disciplina teórica e montando seu
diagnóstico de forma ateórica.
Entendemos que não é possível descuidar da formação teórica do profissional que
deve escolher, administrar, interpretar e integrar os resultados desses instrumentos em
um procedimento clínico como o psicodiagnóstico, sob pena de ficarmos reféns dos
testes para a reali​za​ção de qualquer avaliação. Compreendemos que o aperfeiçoamento
dos testes, tornando-os mais válidos e fidedignos para o que se propõem examinar,
deve ser acompanhado por uma formação teórica que também possibilite um “psicólogo
válido” (Bandeira, 2015), capaz de compreender os resultados de um teste ou de uma
entrevista com base em uma teoria psicológica que fundamente o trabalho de qualquer
psicólogo.
Por esse motivo, defendemos que o ​ensino da avaliação psicológica não pode se
abster do aprofundado estudo das teorias psicológicas que fundamentam a técnica de
coleta e análise de informações adotada em processos avaliati​vos. Não compactuamos
com uma ​proposta de avaliação ateórica e não interventiva por entendermos que
qualquer leitura e intervenção sobre o comportamento humano, seja com instrumentos ​-
THIAGO
Highlight
THIAGO
Highlight
THIAGO
Highlight
objetivos, como testes psicométricos, seja com técnicas me​nos diretivas, como testes
projetivos e entrevistas clínicas, está embasada em paradigmas teóricos e produz
modificação no objeto analisado. Assim, não existe a possibilidade de o psicólogo
trabalhar sem uma teoria de base, uma vez que os fenômenos são observados e
analisados à luz de pressupostos teóricos, em um processo interativo.
O PSICODIAGNÓSTICO É UMA INTERVENÇÃO
O afastamento, percebido na atualidade, entre a área da avaliação psicológica e as
teorias psicológicas pode ser compreendido, também, pelas reflexões de Barbieri
(2008, p. 583). Para ela,
. . . o predomínio do pensamento positivista nas Ciências Sociais e Humanas
trouxe consigo, ao longo da história, uma dissocia​ção entre pesquisa
acadêmica e prática profissional. Essa situação ocasionou um
empobrecimento na produção de conheci​mentos oriundos do trato direto com
as pessoas ou a ele destinados, promovendo um distanciamento daquilo que
deveria se constituir na meta principal do nosso tra​ba​l​ho como psicólogos.
É perigoso considerar as práticas avaliativas apenas em sua dimensão
investigativa, excluindo os aspectos interventivos e ​terapêuticos que lhes são inerentes.
Para Barbieri (2008), a separação entre as atividades de investigação e de intervenção
é resultado do olhar positivista, que busca atingir um ideal de objetividade para a
pesquisa científica. A autora entende que um psi​codiagnóstico isento de intervenções
pode trazer ao paciente muitos malefícios. As entrevistas iniciais empregadas sem
intervenção, além de não atingirem seus objetivos de formular o diagnóstico e iniciar o
tratamento, desperdiçam a chance de o paciente estabelecer conta​to comoutra pessoa, o
que pode resultar em uma experiência terapêutica negativa.
Assim, entende-se que usar o termo “psicodiagnóstico” apenas para as situações
em que os testes psicológicos são utilizados com a intenção de tornar mais objetiva a
avaliação parece estar em consonância com a visão positivista. Pode-se pensar que a
rejeição, por parte de alguns profissionais que realizam avaliações clínicas, ao uso
tradicional do termo “psicodiagnóstico” para a descrição das práticas avaliativas é
uma forma de manter-se distante da perspecti​va positivista de investigação do objeto
totalmente separada do observador. Além disso, essa noção está em desacordo com as
muitas propostas contemporâneas que debatem a complexidade humana e a
intersubjetividade.
Portanto, ao considerarmos as caracterís​ticas da pesquisa qualitativa e quantitativa
pós-moderna associadas à prática avaliativa, pode-se pensar que o uso do termo
“psicodiagnóstico” deva incluir a preocupação clínica não apenas com a objetividade
diagnóstica, mas também com o processo avaliativo. Por meio de relatos, produzidos
em entrevistas e/ou com o uso de outras técnicas, o sujeito conta sua histó​ria, suas
experiências, as revive no relacionamento com o psicólogo, fazendo com que, como
THIAGO
Highlight
afirma Barbieri (2010), possa modificar-se com o auxílio das devoluções.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O psicodiagnóstico abrange qualquer tipo de ava​liação psicológica de caráter clínico
que se apoie em uma teoria psicológica de base e que adote uma ou mais técnicas
(observação, entre​vista, testes projetivos, testes psicométricos, etc.) reconhecidas pela
ciência psicológica. Não sugerimos a adoção do termo para situações avaliati​vas em
contextos jurídicos ou organizacionais, uma vez que, nessas situações, estão presentes
outras variáveis geralmente não encontradas no contexto clínico, como a simulação e a
dissimulação conscientes. Também não com​preendemos que o psicodiagnóstico se
limite, em todos os casos, a uma avaliação de sinais e sintomas, tendo com resultado
apenas um diagnóstico nosológico, o que se aproximaria ​muito de uma avaliação
psiquiá​trica. Tampouco entendemos que uma simples aplicação de um teste, por mais
complexo que ele possa ser, deva ser entendida como psicodiagnóstico. Reservamos o
termo para descrever um procedimento complexo, interventivo, baseado na coleta de
múltiplas informações, que possibilite a elaboração de uma hipótese diagnóstica
alicerçada em uma compreensão teórica.
THIAGO
Highlight
REFERÊNCIAS
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Bandeira, D. R. (2015). Prefácio. In S. M. Barroso, F. Scorsolini-Comin, & E. Nascimento (Eds.), Avaliação Psicoló
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Barbieri, V. (2010). Psicodiagnóstico tradicional e interventivo: Confronto de paradigmas? Psicologia: Teoria e Pesqu
isa, 26(3), 505-513.
Castro, E. K. de, Campezatto, P. V. M., & Saraiva, L. A. (2009). As etapas da psicoterapia com crianças. In M. G. K.
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Artmed.
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http://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2013/05/Cartilha-Avalia%C3%A7%C3%A3o-Psicol%C3%B3gica.pdf.
Conselho Federal de Psicologia (CFP). (2013). Cartilha avaliação psicológica – 2013. Brasília: CFP. Recuperado d
e: http://satepsi.cfp.org.br/docs/cartilha.pdf.
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re: Artmed.
Krug, J. S. (2014). Entrevista lúdica diagnóstica psicanalítica: Fundamentos teóricos, procedimentos técnicos e 
critérios de análise do brincar infantil. (Tese de doutorado não publicada, Universidade Federal do Rio Grande do S
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Ocampo, M. L. S., & Arzeno, M. E. G. (2009). O processo psicodiagnóstico. In M. L. S. Ocampo, M. E. G. Arzeno, 
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Trinca, W. (1983). O pensamento clínico em diagnóstico da personalidade. Petrópolis: Vozes.
Wainstein, E. A. Z. (2011). Um estudo sobre as formas de encaminhamento, descrição e esclarecimentos do proc
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rsidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre).
Wainstein, E. A. Z., & Bandeira, D. R. (2013). Psicodiagnóstico: A contribuição da avaliação psicológica no trabalho c
om crianças. In J. Outeiral, & J. Treiguer (Eds.), Psicanálise de crianças e adolescentes. Curitiba: Maresfield Garde
ns.
http://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2013/05/Cartilha-Avalia%C3%A7%C3%A3o-Psicol%C3%B3gica.pdf
http://satepsi.cfp.org.br/docs/cartilha.pdf
P
2
PSICODIAGNÓSTICO: FORMAÇÃO,
CUIDADOS ÉTICOS, AVALIAÇÃO DE
DEMANDA E ESTABELECIMENTO DE
OBJETIVOS
Denise Ruschel Bandeira
Clarissa Marceli Trentini
Jefferson Silva Krug
ara fazer um psicodiagnóstico, o profissional deve saber avaliar com cuidado a
demanda trazida pelo paciente ou pela fonte de encaminhamento para, a partir
disso, realizar considerações éticas sobre o pedido e, quando essas forem
favoráveis, tecer os objeti​vos de sua realização. Essa tarefa não é nada simples, uma
vez que necessariamente ​envolve um conjunto de habilidades e competências do
psicólogo, inicialmente desenvolvidas no curso de bacharelado em Psicologia,
posteriormente aperfeiçoadas em outros níveis de ensino, como cursos de extensão,
especializações, mestrados e doutorados, sempre perpassando o cuidado com os
aspectos pessoais do próprio psicólogo que pretende desenvolver essa atividade
profissional.
A realização do psicodiagnóstico pressupõe um preparo pessoal e técnico que
inclui o domínio de diferentes saberes psicológicos e de áreas afins, além da
capacidade de reflexão quanto aos aspectos éticos inerentes à realização da atividade.
Entendemos que a formação ética e técnica para a realização do psicodiagnóstico tem
sua base na graduação, mas alcança sua real possibilidade a partir do cuidado de cada
profissional com sua constante atualização quanto aos instrumentos e processos de
avaliação. Além disso, lembramos que o psicólogo precisa investir em seu
desenvolvimento pessoal, realizando acompanhamento terapêutico, preferencialmente
orientado pela teoria psicológica de base que sustenta seu fazer clínico. Todos esses
cuidados, junta​mente à experiência ​clínica adquirida com as primeiras avaliações
supervisionadas, trarão gradativamente ao psicólogo melhores condições de avaliar as
demandas e definir os objetivos de um psicodiagnóstico. Portanto, neste capítulo,
abordaremos aspectos referentes ao psicodiagnóstico em sua dimensão de formação
ética, bem como a avaliação de demanda e a definição de objetivos.
FORMAÇÃO EM PSICODIAGNÓSTICO E QUESTÕES ÉTICAS
Entendemos que o psicólogo é o profissional que pode desenvolver, durante sua
formação, a competência para realizar um psicodiagnóstico. Podemos elencar algumas
das competências designadas pelo Ministério da Educação (Brasil, 2011, p. 3) em suas
Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Psicologia
envolvidos em processo de psicodiagnóstico:
. . . III – identificar e analisar ​necessidades de natureza psicológica,
diagnosticar, ela​borar projetos, planejar e agir de forma coe​rente com
referenciais teóricos e caracterís​ticas da população-alvo; IV – identificar,
definir e formular questões de investigação científica no campo da
Psicologia, vinculando-as a decisões metodológicas quanto à escolha, coleta
e análise de dados em projetos de pesquisa; V – escolher e utilizar
instrumentos e procedimentos de coleta de dados em Psicologia, tendoem
vista a sua pertinência; VI – avaliar fenômenos humanos de ordem cognitiva,
comportamental e afetiva, em diferentes contextos; VII – realizar diagnóstico
e avaliação de processos psicológicos de indivíduos, de grupos e de
organizações; . . . IX – atuar inter e multiprofissionalmente, sempre que a
compreensão dos processos e fenômenos envolvidos assim o recomendar; X
– relacionar-se com o outro de modo a propiciar o desenvolvimento de
vínculos interpessoais requeridos na sua atuação profissional; . . . XIII –
elaborar relatos científicos, pareceres técnicos, laudos e outras comunicações
profissionais, inclusive materiais de divulgação; . . . XV – saber buscar e
usar o conhecimento científico necessário à atuação profissional, assim como
gerar conhecimento a partir da prática profissional.
Nos cursos de bacharelado em ​Psicologia no nosso país, essas competências são
tratadas em diferentes disciplinas, como Psicologia do Desenvolvimento, Psicologia da
Personalidade, Psicopatologia, Avaliação Psicológica, ​Psicometria, Técnicas de
Entrevista, Pesquisa em ​Psicologia, Psicologia Clínica, Neuropsicologia, entre outras.
Além disso, outras modalidades de ensino-aprendizagem, como estágios básicos e
profissio​nais, costumam incluir a necessidade de realização de avaliações psicológicas
supervisio​na​das, entre elas o psicodiagnóstico. Werlang, Argimon e Sá (2015) lembram
que essas atividades sempre devem levar em consideração as questões éticas,
respeitando tais princípios.
Nesse sentido, entendemos que o psicólogo é o profissional com melhor
qualificação para realizar tal atividade. Contudo, destacamos que nem sempre a
graduação em Psicologia é suficiente para quem quer trabalhar em avaliação
psicológica. O aluno de Psicologia necessita de conhecimentos específicos da área. Se
considerarmos que, cada vez mais, os cursos de Psicologia vêm implementando novos
conhecimentos em seus currículos (Bandeira, 2010), compreenderemos que,
frequentemente, um profissional recém-formado não tem condições de realizar todos os
tipos de avaliação psicológica que lhe sejam solicitadas, uma vez que ainda precisa
desenvolver-se teórica e tecnicamente ​naquilo que seu curso não pôde enfatizar durante
o ​desenvolvimento curricular. Compreendemos que a ampliação das áreas de estudo da
Psicolo​gia nos cursos de bacharelado também é ​muito benéfica à área de avaliação
psicológica, contudo, impõe ao profissional a necessidade de constante atualização.
Ainda, via de regra, percebemos que o adequado desenvolvimento da capacidade
técnica para realizar um psicodiagnóstico relaciona-se à possibilidade de o
profissional seguir supervisionando seus casos e buscando o conhecimento que não
pôde ser desenvolvido na graduação e em cursos de pós-graduação, sejam eles lato ou
stricto sensu.
Com relação às questões éticas, muito conteúdo consistente e relevante sobre a
atuação ética do psicólogo já foi produzido (p. ex., Anache & Reppold, 2010; Hutz,
2015; Wechsler, 2005). Sugerimos a leitura desses materiais, assim como o acesso aos
textos da The International Test Commission (ITC), associação de psicólogos e
profissionais relacionados à área de avaliação da American Psychological Association,
em especial as divisões 5 (Quantitative and Qualitative Methods), 7 (Developmental
Psychology), 8 (Society for Personality and Social Psychology), 12 (Society of Clinical
Psychology) e 40 (Society for Clinical Neuropsychology) e as resoluções do Conselho
Federal de Psicologia (CFP), órgão que regulamenta a profissão de ​psicólogo no
Brasil. Todas as resoluções editadas pelo CFP são importantes, mas, em relação à área
de avaliação psicológica, recomendamos um estudo aprofundado: a) da aplicação dos
princípios fundamentais contidos no Código de Ética Profissional do Psicólogo
(Conselho Federal de Psicologia [CFP] 2005); b) da Resolução n° 001/2009, que
dispõe sobre a obrigatoriedade do registro documental decorrente da prestação de
serviços psicológicos (CFP, 2009); c) da Resolução n° 016/2000, que aponta a
necessidade de regula​mentar regras e procedimentos que devem ser reconhecidos e
utilizados nas práticas em pesquisa (de laboratório, campo e ação) (CFP, 2000a); d) da
Resolução n° 002/2003, que define e regulamenta o uso, a elaboração e a comerciali​-
zação de testes psicológicos (CFP, 2003a); e) da Resolução n° 007/2003, que institui o
Manual de Elaboração de Documentos Escritos produzidos pelo psicólo​go decorrentes
de avaliação psicológica (CFP, 2003b); e f) da Resolução n° 011/2000, que reflete
sobre a oferta de produtos e serviços ao público (CFP, 2000b).
Cabe ressaltar que, no Brasil, tanto o Instituto Brasileiro de Avaliação Psicológica
(IBAP) quanto a Associação Brasileira de Rorschach e outros Métodos Projetivos
(ASBRO) são instituições que se preocupam com questões éticas na avaliação
psicológica, assim como com outros temas referentes à área. Manter-se em contato com
essas e outras instituições da área, participar de congressos ou atividades
desenvolvidas por elas, ou, ao menos, acompanhar os debates científicos relatados em ​-
publicações sobre avaliação psicológica, são cuidados importantes a serem observados
pelo profissional que realiza psicodiagnóstico.
Além dessas questões, também nos ​parece adentrar ao campo da ética profissional
o necessário cuidado com os aspectos pessoais do psicó​logo. Dessa forma, entendemos
como fundamental que todo profissional que realiza psi​​codiagnóstico tenha um espaço
particular de reflexão e análise, diferente do oferecido pela su​​pervisão, no qual possa
trabalhar a si mesmo e, como consequência, diminuir possíveis pontos cegos que fazem
parte de qualquer processo em que o objeto avaliado se assemelha ao objeto que
avalia.
O tratamento pessoal é extensamente debatido e defendido pelos formadores de
psicoterapeutas, mas não são encontradas muitas referências na área de avaliação
psicológica sobre a importância desse aspecto nas atividades de psicodiagnóstico.
Entendemos que uma ​prática ética e a atualização profissional só ocorrem com a
possibilidade de abertura ao novo, com autocrítica quanto ao fazer diário, refletindo
sobre a relação de seus desejos pessoais e suas escolhas profissionais. Tais
competências não são aprendidas apenas com leituras ou participações em debates
clínicos, mas a partir de um profundo processo de autoconhecimento. Atentando para
esse aspecto, compreendemos que se ampliam as possibilidades de atualização
profissional, di​minuindo muito as ações dogmáticas e cartesianas no fazer
psicodiagnóstico.
Portanto, é só a partir dos cuidados descritos que o psicólogo terá condições de
realizar uma avaliação de demanda trazida pelo ​paciente ou por alguma fonte de
encaminhamento.
PSICODIAGNÓSTICO: PENSANDO NA DEMANDA
Um psicodiagnóstico tem mais chances de ser bem-sucedido quando há uma boa
pergunta a ser respondida. Essa pergunta nem sempre é formulada com clareza pelo
paciente que busca avaliação, uma vez que, em muitas ocasiões, ele próprio não tem
condições de perceber as razões do seu sofrimento. Em outras oportunidades,
deparamo-nos com demandas genéricas relacionadas ao interesse pelo seu próprio
funcionamento, como, por exemplo, o interesse em responder à pergunta “como eu
sou?” ou a ideia de “eu vim aqui para me conhecer melhor”. De modo geral, essas
demandas não caracterizam uma boa pergunta a ser respondida, por tratar-se de
questões muito amplas. Nessas ocasiões, recomendamos uma primeira reflexão clínica,
a partir das entrevistas iniciais e/ou do contato com a fonte encaminhadora, visando
especificar o motivo por trás do “interesse em se conhecer”, por exemplo. A partir
dessa redefinição da demanda, pode-se pensar no planeja​mento de uma atividade
avaliativa. Na realidade, essa reflexão inicial já é o primeiro momento da avaliação, e
deve ser feita com muito cuidado, uma vez que auxiliará a definir o que realmente
precisará ser avaliado.
Como se trata de um processo de ​caráter científico, o psicodiagnóstico não
prescinde da construção de hipóteses.Nesse sentido, boas perguntas são aquelas que
auxiliam o profissional a confirmar ou a refutar determinadas hi​póteses – por exemplo,
em um caso de uma criança encaminhada para avaliação por estar com dificuldades de
leitura e escrita, não conseguindo acompanhar o desempenho da turma. Aqui temos boas
perguntas a responder: teria ela um transtorno específico de aprendizagem? Questões
emocionais e/ou familiares estariam in​terferindo nos processos de aprendizagem de
leitura e escrita? Haveria alguma questão neu​rológica envolvida? Poderíamos pensar
em trans​torno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH)? Quais demandas psíquicas
não estariam sendo atendidas, gerando, consequentemente, o sintoma?
Contratempos no encaminhamento do pa​ciente também acontecem. Por vezes, a ​-
fonte en​caminhadora não tem clareza do que ​envolve um psicodiagnóstico (ver
Wainstein & Ban​deira, 2013), ou um paciente é encaminhado para um profissional que
realiza apenas avaliações psicológicas quando, devido à agudização do quadro,
necessitaria de um atendimento psicoterápico de urgência. Como exemplo, temos o caso
de uma pessoa com perda recente na família, por acidente de trânsito, que apresentava
reações emocionais muito intensas e desorganizadas. O certo seria encaminhá-la a um
profissional que já pudesse realizar uma intervenção com foco terapêutico. Sabe-se que
toda a intervenção é precedida de uma avaliação, mas, como nessa situação se está
diante de uma condição clínica aguda, o processo avaliativo deve ser abreviado ou
realizado concomitantemente ao processo psicoterápico, exigindo que o profissional
também tenha conhecimentos e habilidades voltados à intervenção no sentido
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terapêutico.
Ainda, são encaminhados casos de crianças com dificuldades em acompanhar o
que está sendo dado em sala de aula, e, ao recebê-las no consultório, o psicólogo
percebe que têm dificuldades de visão. Nesse sentido, é função do profissional exercer
um papel educativo, orientando toda a rede que faz uso de avaliações psicológicas.
Uma das fontes encaminhadoras mais comuns nos casos de crianças é a escola. É
nela que os adultos (pais ou professores), ao ​comparar uma criança com as demais,
percebem suas dificuldades e a encaminham para avaliação. Nesses casos, o psicólogo
acaba sendo um dos primeiros profissionais a olhá-la de forma global. Como o
processo de psicodiagnóstico envolve certo número de encontros, o psicólogo passa a
ter uma visão mais aprofundada do caso, que vai além de aspectos emocionais e
cognitivos. Por isso, é importante que tenha conhecimento de aspectos físicos, motores
e neurológicos, a fim de poder encaminhar o paciente de forma correta a outros
profissionais.
Outro aspecto interessante a ser ​observado tem relação com a demanda para o
psicodiagnóstico. Há algumas décadas, a procura por psicodiagnóstico estava
relacionada somente com a definição de um diagnóstico para o paciente. Atualmente,
em grande parte das vezes (dado mais relacionado à demanda infantil, conforme
Wainstein & Bandeira, 2013), o paciente já chega com um diagnóstico, dado por algum
médico ou outro profissional da saúde ou, até mesmo, por um professor da escola.
Nessas situações, deve-se refletir sobre o que está sendo solicitado, podendo caber ao
psicólogo, entre outros: a) realizar a avaliação da pertinência do diagnóstico; b)
realizar o diagnóstico diferencial; c) identificar forças e fraquezas do paciente e de sua
rede de atenção visando subsidiar um projeto terapêutico; d) ampliar a compreensão do
caso por meio da elaboração de um entendimento dinâmico, alicerçada em teoria
psicológica; e e) refletir sobre encaminhamentos necessários ao caso.
Ainda em relação ao público ​encaminhado para psicodiagnóstico/atendimento ​-
psicológico, dados de pesquisas em clínicas-escola no ​Brasil (locais que geralmente
publicam estudos sobre o perfil atendido) mostram que a maioria dos indivíduos
encaminhados são crianças (Borsa, Segabinazi, Stenert, Yates, & Bandeira, 2013),
meninos em maior frequência (Cunha & Benetti, 2009; Rocha & Ferreira, 2006; Santos,
2006; Scortegagna & Levandowski, 2004; Silvares, Meyer, Santos, & Gerencer, 2006).
Outras pesquisas indicam que há certa igualdade entre percentuais de crianças e
adolescentes ao serem comparados a adultos (Campezatto & Nunes, 2007; Louzada,
2003; Romaro & Capitão, 2003). Já quando as pesquisas envolvem a clientela adulta, o
sexo feminino predomina (Campezatto & Nunes, 2007; Maravieski & Serralta, 2011).
Os quadros clínicos mais comumente encaminhados para psicodiagnóstico
diferem-se por faixa etária. No que se refere a crianças e adolescentes, dados de uma
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pesquisa conduzida no Centro de Avaliação Psicológica da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul (Borsa et al., 2013) apontam que prevalecem problemas de atenção,
seguidos por problemas de ​interação social e de ansiedade e depressão, segundo dados
coletados com o Child Behavior Check​list, ​Achenbach – CBCL (Achenbach, 2001).
Outras ​pesquisas apontam problemas de aprendizagem como motivos comuns de
encaminhamento (Graminha & Martins, 1994; Santos, 2006; Schoen-Ferreira, Silva,
Farias, & ​Silvares, 2002; Scortegagna & Levandoswski, 2004). Problemas afetivos, de
agressividade e de compor​tamento também são frequentes (Cunha & Benetti, 2009;
Santos, 2006). No caso de adultos, costumam aparecer problemas emocionais e de
relacionamento familiar (Louzada, 2003; Maravieski & Serralta, 2011).
Concomitantemente à definição do que se está recebendo como demanda, das
hipóteses e das estratégias de avaliação, é possível que haja necessidade de avaliações
de outros profissionais. Por vezes, só se consegue completar o processo
psicodiagnóstico com avaliações de outros profissionais, como fonoaudiólogos,
neurologistas e psiquiatras. Esse é o momento de aproveitar para discutir o caso. Em
nossa experiência, a troca com outros profissionais tem sido muito rica, gerando
aprofundamento do caso em questão.
Portanto, levando em consideração os aspectos já expostos, o psicólogo realizará
a avaliação da demanda para, caso se mostre válido, estabele​cer os objetivos do
psicodiagnóstico. São esses objetivos que nortearão a eleição das técnicas e/ou
instrumentos a serem utilizados posteriormente.
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OBJETIVOS DO PSICODIAGNÓSTICO
Entendemos que psicodiagnóstico é um procedimento científico de investigação e
intervenção clínica, limitado no tempo, que emprega técnicas e/ou testes psicológicos
com o propósito de avaliar uma ou mais características psicológicas visando um
diagnóstico psicológico (descritivo e/ou dinâmico), construído à luz de uma orientação
teórica que subsidie a compreensão da situa​ção avaliada, gerando uma ou mais
indicações terapêuticas e encaminhamentos. Levando em consideração esse conceito,
acreditamos que ele pode ser realizado de diferentes maneiras e com diferentes
objetivos.
A avaliação da demanda indicará qual aspecto avaliativo deverá ser priorizado
em cada caso, situando-se o objetivo do psicodiagnóstico a partir dessa reflexão
inicial. Segundo Cunha (2000), precursora do psicodiagnóstico em nosso meio, os
objetivos podem priorizar: a) a classificação simples; b) a descrição; c) a classificação
nosológica; d) o diagnóstico diferencial; e) a avaliação compreensiva; e) o
entendimento dinâmico; f) a prevenção; g) o prognóstico; e h) a perícia forense.
Concordamos ​basicamente com Cunha (2000) com relação a esse aspecto. Contudo,
entendemos que, ao realizar uma perícia forense, não necessariamente está se fazendo
um psicodiagnóstico.
Na perícia forense, o objetivo, na maioria das vezes, é responder a quesitos
legais, solicitados pelo juiz (para uma leitura mais aprofunda​da, ver Rovinski, 2013).
Conforme Rovinski (2010, p. 95), “. . . a avaliação fo​rense, mais especificamente,
quando exercida como atividade pericial, diferencia-se em muitosaspectos daquela
realizada no contexto clínico. A não diferenciação de tais padrões de avaliação acaba
por gerar conflitos de papéis e, consequentemente, condutas antiéticas.”.
Uma pessoa que busca auxílio de um psicó​logo para lidar com o sofrimento ​-
geralmente estabelece com o profissional uma relação de cooperação e aliança de
trabalho diferente ​daquele sujeito que é encaminhado para uma perícia em contexto
jurídico. Neste último, fenômenos como simulação e dissimulação conscientes,
inerentes a essa realidade avaliativa, acabam exigindo cuidados técnicos específicos,
que diferem daqueles eminentemente clínicos. Ainda assim, reconhecemos a
semelhança entre muitos aspectos técnicos adotados na perícia e no psicodiagnóstico.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ressaltamos que o psicodiagnóstico é uma atividade profissional do psicólogo, cuja
formação durante o período de graduação é essencial, mas carece de um estudo
continuado, especialmente no que tange aos avanços em termos de instrumentos de
avaliação psicológica e psicopatologia. O cuidado com aspectos psíquicos da pessoa
do psicólogo é condição sine qua non para a abertura à atualização e à reflexão técnica
e o consequente fazer avaliativo adequado.
Assim, os objetivos do psicodiagnóstico são coerentes com essa formação e
exigem do psicólogo amplo conhecimento de competências, além de estudos sobre
diversas áreas da psicologia. A forma de conduzir um processo psicodiagnósti​co será
trabalhada intensamente neste livro, mas, nesse momento, queremos marcar a
necessidade de se ter claro, ao iniciá-lo, o que é esperado, com que tipo de população
se trabalha e o que é possí​vel atingir com ele, de forma que sua potenciali​da​de possa
ser atingida, reconhecendo-se suas forças e limitações, sempre respeitando os preceitos
éticos da profissão.
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Vozes.
E
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O PROCESSO PSICODIAGNÓSTICO
Maisa S. Rigoni
Samantha Dubugras Sá
ste capítulo abordará o processo de reali​zação de um psicodiagnóstico,
apresentando os passos recomendados para a sua execução. Também serão
apresentados os diferentes modelos e objetivos dessa prática, realizada
exclusivamente pelo psicólogo, que represen​ta, como sintetiza Barbieri (2010), um
marco distintivo da identidade desse profissional. A Lei Federal nº 4.119, de 27 de
agosto de 1962, que dispõe sobre a formação em psicologia e regulamenta a profissão
no Brasil, define que a prática de diagnóstico psicológico, bem como a realização de
um psicodiagnóstico, é atribuição exclusiva do profissional da psicologia (Brasil,
1962).
O psicodiagnóstico é um dos tipos de avaliação psicológica realizada com
objetivos clínicos, portanto, não abrange todas as formas de avaliação psicológica.
Atualmente, a avaliação psicológica é entendida como um processo que permite
descrever e compreender a pessoa em suas diferentes características, investigando tanto
aspectos da personalidade quanto aspectos ​cognitivos, abordando possíveis sintomas,
questões do de​senvolvimento, questões neuropsicológicas, características adaptativas e
desadap​tativas, entre outros, permitindo, assim, que se chegue a um prognóstico e à
melhor estratégia e/ou à abordagem ​terapêutica necessária.
De modo geral, pode-se afirmar que o psico​diag​nóstico é um processo bipessoal
(psicólo​go – avaliando/grupo familiar), de duração li​mitada no tempo, com um número
aproxima​damente definido de encontros, que procura descrever e compreender as
forças e as ​fraquezas do funcionamento psicológico de um indivíduo, tendo foco na
existência ou não de uma psicopatolo​gia (Cunha, 2000). Assim, o psicodiagnóstico
pode ser entendido como um processo com início, meio e fim, que utiliza entrevistas,
técnicas e/ou testes psicológicos para compreender as potencialidades e as
dificuldades apresenta​das pelo avaliando, tendo por base uma teoria psicológica e
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buscando, assim, coletar dados mais substanciais para a realização de um encami​nha​-
mento mais apropriado. Então, possibilita descrever o funcionamento atual, confirmar,
refutar ou modificar impressões; realizar diag​nóstico diferencial de transtornos mentais,
comportamentais e cognitivos; ​identificar necessidades terapêuticas e recomendar a
intervenção mais adequada, levando em conta o prog​nóstico (Witternborn, 1999).
Cabe salientar que, como bem lembra Cunha (2000), o psicodiagnóstico derivou
da psi​cologia clínica em torno de 1896, ​quando surgiram os primeiros testes mentais. ​-
Nessa época, o psicólogo se limitava a aplicar um ou outro teste solicitado por outros
profissionais, e trabalhava com um modelo médico de atendimento, mantendo certo
distanciamento do avaliando, buscando não perder a objetividade em seu trabalho. Não
havia um procedimento em que o avaliando fosse atendido de forma integrada e
compreensiva. Esse cenário começou a ser modificado com o surgimento da psicanálise
e com o desenvolvimento das ​técnicas projetivas, o que permitiu que se pudesse ter
uma compreensão mais profunda e abrangente do sujeito avaliado (Carrasco & Sá,
2010; Werlang & Argimon, 2003). Uma das atividades do psicólogo clínico é
identificar e ​compreender, na singularidade do indivíduo, suas caracte​rís​ticas, seus
sintomas e seu funcionamento psíquico, e, assim, explicitar diagnósticos. A pa​lavra
“diagnóstico” origina-se do grego diagnõstikós e significa discernimento, faculdade de
conhecer. No sentido amplo do termo, a ação de diagnosticar é inevitável, já que,
sempre que se explicita a compreensão de um fenômeno, reali​za-se um dos possíveis
diagnósticos. Mas, no campo da ciência, esse termo refere-se à possibilidade de
conhecimento por meio da utilização de conceitos, noções e teorias científicas
(Ancona-Lopez, 1984).
Pensando no conceito de psicodiagnóstico, palavra também de origem grega
(psique = mente, dia = atráves, gnosis = conhecimento), Sendín (2000) entende que se
trata da expressão mais antiga e que melhor reflete, etimologicamente, o caráter
processual da tarefa de diagnosticar, pois se refere a um conhecimento dos aspectos
mais relevantes do funcionamento psíquico. Embora na contemporaneidade se entenda o
psicodiagnóstico como um processo de avaliação amplo, esse termo ainda está
associado à sua procedência do campo médico, com enfoque diagnóstico estritamente
classificatório. Em função disso, alguns psicólogos rechaçam esse termo e defendem
sua substituição pela expressão avaliação psicológica. Entretanto, Cunha (1993)
esclarece que essa expressão é um conceito muito amplo, enquanto “psicodiagnóstico”
explicita uma avaliação psicológica com propósitos clínicos. A autora salienta, ainda,
que o termo “testagem” se refere a um tipo de recurso da avaliação psicológica,
enquanto o “psicodiagnóstico” pressupõe a utilização de outros
instrumentos/procedimentos que vão além do emprego de testes, a fim de abordar os
dados psicológicos de forma mais sistemática, científica e orientada para a re​solução
de problemas.
Diante dessa situação, surgiu a necessida​de de um enquadramento que atendesse às
características específicas do psicodiagnóstico, por se tratar de um processo limitado
no tempo e que utiliza técnicas e/ou testes psicológicos, po​dendo, assim, ter vários
objetivos. Esses objetivos podem ser referentes a uma classificação simples, a uma
descrição ou até mesmo a uma classificação nosológica, entre outros, conforme o que
foi abordado no Capítulo 2.
Nessa perspectiva, Arzeno (1995) refere que o psicodiagnóstico contempla
algumas finalidades, como:
1. Investigação diagnóstica: tem como objetivo ex​plicar o que acontece
além do que o avaliando consegue expressar de forma consciente – e isso
não significa rotulá-lo.
2. Avaliação do tratamento: visa avaliar o anda​mento do tratamento. Seria
o “reteste”, no qual se aplica novamente a mesma bateria de testes
usados na primeira ocasião ou uma bateria equivalente.
3. Como meio de comunicação: procura ​facilitar a comunicação e, em
consequência, a ​tomada de insight.
4. Na investigação: com o intuito de criar novos instrumentos de
exploração da ​personalidade e, também, de planejar a investigação para
o estudo de uma determinada patologia, etc.
Ampliando os conceitos de Arzeno (1995), acreditamos que, além do que foi
exposto anteriormente, um psicodiagnóstico pode ter um alcance ainda maior. Embora
não seja sua ​principal finalidade, pode ser terapêutico, uma vez que o vínculo
estabelecido entre avaliador e avaliado, assim como os resultados obtidos e
comunicados, pode contribuir para uma decisão mais assertiva por parte do avaliado
quanto à ​escolha entre um ou outro tratamento, à mudança de um estilo de vida, ou
mesmo quanto ao rumo que dará às recomendações do avaliador. Outro ponto relevante
diz respeito ao uso ou não de uma bateria de testes e “retestes”, isto é, entendemos que
os testes psi​cológicos e as técnicas são recursos disponíveis, mas que em nenhum
momento substituem ou são mais ​importantes do que a escuta e o olhar clínico do
avaliador, pois nem sempre será necessária a utilização des​sas ferramentas.
Quando se opta pelo uso de testes psicológicos, Ocampo, Arzeno e Piccolo
(2005), Arzeno (2003) e Trinca (1984) inferem que a escolha das estratégias e dos
instrumentos a serem empregados é feitasempre de acordo com o ​referencial teórico,
com a finalidade e com o objetivo (clí​nico, profissional, educacional, forense, etc.) do
psicodiagnóstico. Arzeno (1995, p. 10) refere que “. . . as conclusões de todo o
material obtido são discutidas com o interessado, com seus pais, ou com a família
completa, conforme o ca​so e o sistema do profissional”. Dessa forma, a entrevista de
devolução visa informar os resultados, mas nela podem surgir, de ​maneira involuntária,
efeitos terapêuticos, ​denominados de psicodiagnóstico interventivo, que ​equivale a uma
avaliação terapêutica, caracterizada pela realização de intervenções como
assinalamentos, in​terpretações, entre outros, durante as entrevistas e as aplicações de
técnicas projetivas (Barbieri, 2010). Salientamos, assim, a ​existência de estudos que
consideram o psicodiagnóstico uma possibilidade de intervenção terapêutica, e não
apenas diagnóstica (Carrasco & Sá, 2010). No que diz respeito ao psicodiagnóstico
interventivo, ele será mais bem analisado no Capítu​lo 15.
Entretanto, “diagnosticar” alguém é algo se​​cundário, caso se pense que, ao
identificar as forças e as fraquezas do avaliando, estamos ​ten​tan​do entender o que se
passa com ele nesse mo​​mento de sua vida e de quais recursos dispõe pa​ra que seja
possível formular recomenda​ções te​rapêuticas ade​quadas (terapia breve e prolon​gada,
individual, sistêmica, de grupo, entre ou​tras; frequência; tratamento ​medicamentoso;
etc.). Mesmo quando é de​tectada a presença de algum transtorno ​mental, o objetivo
maior do psicodiagnóstico é encaminhar o indivíduo para o tratamento mais adequado.
O processo tem início no ​encaminhamento, que é o que justifica a sua realização.
Vários são os profissionais que podem solicitar a ​avaliação psicológica, como
neurologistas, psiquiatras, pedagogos, entre outros. No entanto, ​muitas vezes o
encaminhamento é vago, cabendo ao psi​cólogo o seu esclarecimento prévio, para en​tão
ter certeza de que a indicação é, de fato, para um psicodiagnóstico. E como se realiza
um psi​codiagnóstico?
Para Ocampo e colaboradores (2005), o pro​cesso envolve quatro etapas. A
primeira principia no contato inicial, estendendo-se até a primeira entrevista com o
avaliando; a ​segunda consiste na aplicação de testes e técnicas psicológicas; a terceira
diz respeito à conclusão do processo, com a devolução oral ao ​avaliando (e/ou aos
pais); e a última refere-se à elaboração do informe escrito (laudo/relatório) para o
solicitante e para o avaliando (e/ou aos pais). Propomos, de forma mais detalhada, oito
etapas (ver Quadro 3.1).
QUADRO 3.1
Passos de um processo de psicodiagnóstico
Passos Especificações
1. Determinar os motivos da consulta e/ou do encaminhamento e levantar dados sobre a história pessoal
(dados de natureza psicológica, social, médica, profissional, escolar).
2. Definir as hipóteses e os objetivos do processo de avaliação. Estabelecer o contrato de trabalho (com o
examinando e/ou responsável).
3. Estruturar um plano de avaliação (selecionar instrumentos e/ou técnicas psicológicas).
4. Administrar as estratégias e os instrumentos de avaliação.
5. Corrigir ou levantar, qualitativa e quantitativamente, as estratégias e os instrumentos de avaliação.
6. Integrar os dados colhidos, relacionados com as hipóteses iniciais e com os objetivos da avaliação.
7. Formular as conclusões, definindo potencialidades e vulnerabilidades.
8. Comunicar os resultados por meio de entrevista de devolução e de um laudo/relatório psicológico. Encerrar
o processo de avaliação.
Vejamos o passo a passo: uma vez de posse do encaminhamento, cabe ao
psicólogo ampliar o motivo, elencando as principais queixas e sofrimentos psíquicos
apresentados pelo avaliando. O psicodiagnóstico pode ser realizado em consultórios
privados, clínicas ​psicológicas ou psi​quiá​tri​cas, instituições, postos de ​saúde ou hospi​-
tais. Dependendo do local onde irá ocorrer o ​pro​cesso, poderá haver certa ​urgência na
avaliação. Por exemplo, em um ambiente de internação, geralmente sua realização
ocorre de forma mais ​breve, pois, muitas vezes, a conclu​são e a emissão do laudo serão
determinantes para a adequação de alguma medicação ou mesmo para a alta e futuro
tratamento ambulatorial. Já em uma avaliação em uma clínica, cujo fun​cionamento
costuma ser ambulatorial, há mais tempo para a realização do processo; no entanto, o
mesmo tende a durar, em média, dois meses, podendo ter uma frequência ​semanal maior
ou menor, dependendo do caso, totalizan​do, aproximadamente, 6 a 12 encontros, no
máximo.
Seja qual for o local, em um primeiro mo​​mento deve-se realizar a primeira
entrevista (en​trevista inicial) para que se esclareça o encami​nhamento. Ocampo,
Arzeno e Piccolo (2009, p. 29) referem que, “. . . No motivo de consulta deve-se
discriminar entre o motivo manifesto e motivo latente”. O motivo manifesto diz
respeito ao que levou à solicitação do psicodiagnóstico, e é o que, de fato, preocupa, a
ponto de tornar-se um sinal de alerta; já o motivo latente diz ​respeito ao que não é tão
óbvio, às hipóteses subjacentes elaboradas pelo psicólogo en​quanto escuta e reflete
sobre o que é manifes​to. Ainda nesse ​primeiro encontro, é preciso que fiquem bem
definidos os papéis do psicólo​go, dos familiares e do avaliando. O primeiro deve
coletar o máximo de informações possível para que se possa conhecer exaustivamente a
pessoa a ser avaliada e extrair da entrevista da​dos para a formulação de hipóteses,
viabilizan​do, assim, o planejamento da avaliação; aos demais cabe não sonegar in​-
formações ao profissional. Se não tivermos os objetivos bem claros e acordados entre
o avaliador e a pessoa que solicitou o psicodiagnósti​co, o processo dificilmente será
satisfatório (Urbina, 2007). Também nesse primeiro contato, após se esclarecer como o
processo ocorrerá, sugerimos que se proceda à assinatura de um termo de
THIAGO
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consentimento livre e esclarecido, em que a pessoa a ser avaliada ou o seu responsável
legal autorizará a realização da avaliação. É importante salientar que, no caso de
crianças, a primeira entrevista precisa ser feita com os pais ou responsáveis; já no caso
de adultos, nem sempre é necessário entrevistar algum familiar. Em alguns casos, torna-
se relevante a inclusão de en​trevistas com membros da família que possam estar
implicados na demanda do avaliando (Ancona-Lopez, 2002).
No que diz respeito ao psicodiagnóstico de adolescentes, a primeira entrevista
poderá ser realizada com os pais/responsáveis ou com o próprio adolescente,
dependendo de seu caso e/ou idade. Ainda assim, salientamos que o contato com os
pais/responsáveis é imprescindível, uma vez que eles precisam autorizar o processo de
avaliação, já que se trata de um menor de idade.
Muitas vezes, em caso de avaliandos crianças e adolescentes, embora seja
solicitado que em um primeiro momento compareçam ​somente os pais ou responsáveis,
os avaliandos acabam por vir junto. Nesses casos, é de suma importância que o
psicólogo tenha muito cuidado com o que será abordado na primeira entrevista,
procurando preservar o avaliando, evitando expor questões mais delicadas. É
fundamental que, ao final desse primeiro encontro, fique agendado um próximo
momento somente com os pais ou responsáveis, devendo-se explicar para o avaliando
que isso ocorrerá uma vez que não é necessária sua presença, pois serão ​coletadas
informações que ele não teria condições de fornecer. Com o intuito de manter um
vínculo com o avaliando, agenda-se um horário somente com ele, dando início à escuta
privativa, procurando valorizar esse espaço ao demonstrar a importância de escutá-lo.
Para que o psicólogo tenha clareza do que deverá ser investigado, bem como para
que tenha dados suficientes para construir a ​história de vida do avaliando, podem ser
realizadas quantas entrevistas forem necessárias. Ainda assim, o profissional dispõe de
um tempo limitado, pois tanto a duração excessiva do ​processo como o seu
abreviamento podem ser prejudiciais. Ao longo dessasentrevistas, o psicólogo
naturalmente elenca algumas hipóteses, e, dessa forma, define que tipo de instrumentos
preci​sará utilizar e em que ordem deverá aplicá-los.
A partir do que foi coletado nas ​primeiras entrevistas, o psicólogo terá condições
de ela​borar o plano de ação. O plano inicia com as pri​meiras entrevistas, e, ao longo
delas, se constrói o contrato de trabalho, em que são ​previstos os papéis de cada parte;
a questão de sigilo e privacidade; o número aproximado de encontros, incluindo-se as
primeiras entrevistas; a bateria de testes que será utilizada, se necessário; as entrevistas
de devolução; e a forma como serão pagos os honorários (caso se trate de ​consultas
particulares ou em uma instituição paga). Esse plano é construído nos primeiros
encontros, podendo sofrer variações ao longo do processo. Por exemplo, ao ser feita
uma hipótese inicial, decide-se, então, pela aplicação de alguns testes, mas pode
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ocorrer que, em um segundo teste, se obtenha uma resposta para a ​demanda. Assim,
deve-se abrir mão da aplicação de outros instrumentos planejados a priori, pois ela
não será mais necessária, e, com isso, o número de en​contros diminui. O inverso
também pode ocorrer, uma vez que se pode acrescentar outros métodos, testes ou
técnicas, o que ​acarretaria um número maior de entrevistas para que se tenha uma
compreensão mais exata do caso. Por meio do instrumental utilizado no
psicodiagnóstico, é possível alcançar uma compreensão da demanda, incluindo os
problemas, os sintomas e as queixas apresentados pelo avaliando, com mais brevidade
do que o necessário com outros métodos (González, 1999).
Um exemplo: em uma avaliação ​psicológica em que o avaliando veio encaminhado
por seu psiquiatra com suspeita de déficit intelectual, ve​rificamos, durante a testagem,
que seus resultados no WAIS-III foram todos superiores à média estimada para sua
faixa etária, ​mudando, assim, o rumo da investigação. Em ​decorrência disso, tornou-se
necessária a utilização de ou​tros testes que focassem no funcionamento da
personalidade e não no intelecto. Logo, o plano de avaliação deveria contemplar todo o
processo e servir de orientação ao profissional; ou seja, é o passo a passo do que será
realizado.
Quanto à duração do processo, cabe ressaltar que, quando o profissional abrevia o
tempo, corre o risco de deixar hipóteses em aberto, o que acaba resultando na
precariedade dos resultados por um déficit de informação, independentemente dos
recursos utilizados (Ocampo et al., 2009), e, com isso, compromete o encaminhamento.
Já o oposto, isto é, o ​prolongamento do processo, pode ocasionar um vínculo inade​-
quado para o psicodiagnóstico, fazendo o ava​liando confundir o processo com uma
psicoterapia, o que dificulta o fechamento e também compromete o encaminhamento.
Um bom exemplo disso seria quando o avaliando não busca o tratamento indicado,
argumentando desejar um seguimento com o profissional que o avaliou. No entanto,
muitas vezes o ​profissional trabalha exclusivamente com avaliação psicológica, e,
nesses casos, ao final do processo, realizam-se os devidos encaminhamentos; outros
psicólogos preferem iniciar seus ​atendimentos com um psicodiagnóstico e, a partir
disso, iniciar ou não um processo psicoterapêutico, dependendo dos achados ao longo
do processo.
Ainda sobre os passos do ​psicodiagnóstico, pode-se incluir a aplicação de testes
e/ou técnicas psicológicas, que constituem ​ferramentas auxiliares no trabalho do
psicólogo. Tais ferra​mentas podem ser um meio para se alcançar um fim, porém nunca
um fim em si (Urbina, 2007). Dessa maneira, “. . . como outras ferramen​tas, os testes
psicológicos podem ser ​extremamente úteis – e até mesmo insubstituíveis – quando
usados de forma apropriada e hábil” (Urbina, 2007, p. 14). Então, em um segundo
momento, define-se a bateria a ser utilizada. O planejamento deve levar em
consideração as características do caso (idade, sexo, escolaridade, ocupação/pro​-
fissão, condições físicas, etc.), a sequência (ordem de aplicação) e o ritmo (número de
en​trevistas previstas para a aplicação dos testes se​lecionados).
Os testes psicológicos (psicométricos ou projetivos) refinam a capacidade do ​-
profissional de captar e compreender indivíduos, grupos e fenômenos psicológicos
(Urbina, 2007; Werlang, Villemor-Amaral, & Nascimento, 2010). Contudo, para que os
resultados alcançados sejam válidos, além de seguir à risca as instruções e o sistema de
levantamento e ​interpretação do instrumento, é fundamental também garantir condições
básicas no ambiente físico, certifi​car-se dos estados físico e psicológico do exami​nado,
bem como gerenciar o contexto clínico em que será desenvolvida a avaliação (Werlang
& Argimon, 2003). As condições físicas e psicológicas do examinado devem estar
preservadas pa​ra que a tarefa a ser desenvolvida seja compreen​dida de forma correta,
sendo essenciais a motivação, o interesse e o desejo de se submeter ao processo de
avaliação. Em situações especiais, como em casos de internação psiquiátrica, é
fundamental considerar o estado mental e até mesmo a possibilidade de impregnação
por medicamentos que possam diminuir a motivação para o trabalho e alterar os
resultados da testagem. No caso de avaliação forense, em que o periciado não se
submete por livre vontade ao processo psicodiagnóstico, mas por imposição judicial, a
resistência a responder aos testes, a não cooperação e a distorção consciente e
intencional das respostas certamente irão repercutir na validade dos achados. Em
situações especiais, o psicólogo deve contar com sua sensibilidade clínica para
manejar a situação com propriedade, atenuando os obstáculos, observando e analisando
todos os indícios comportamentais de modo a isentar as variáveis que possam
prejudicar o processo de avaliação.
Quando pensamos na ordem de aplicação da bateria de testes selecionada, é
recomendável que os primeiros testes sejam os menos ansiogê​nicos para a pessoa a ser
avaliada, justamente para que não se desenvolva alguma resistência an​te o processo.
Dito de outra forma, o teste que mo​biliza o motivo manifesto para a realização do
psicodiagnóstico nunca deve ser o ​primeiro a ser administrado. Assim, por exemplo,
em uma criança encaminhada para avaliação ​cognitiva, jamais se deve iniciar a bateria
de testes pelo WISC-IV.
Fica evidente, então, que o primeiro objeti​vo diz respeito à formação do vínculo
entre o profissional e seu avaliando, a fim de garantir o bom andamento do processo, o
que justifica a não utilização, em um primeiro momento, de testes que mobilizem uma
conduta que corresponda ao sintoma. Tais testes devem ser deixados para um segundo
momento.
Habitualmente, os testes gráficos tendem a ser os mais apropriados, uma vez que ​-
abarcam aspectos mais dissociados, são mais ​econômicos quanto ao tempo e envolvem
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materiais mais simples e familiares ao avaliando, ​propiciando, dessa forma, o
estabelecimento de um vínculo favorável para a continuidade do processo. Em grande
parte dos casos, desenhar é uma tarefa conhecida e que o avaliando já realizou em
algum outro momento da vida, utilizando lápis e papel. Obviamente, essas tarefas não
são recomendáveis para avaliandos que tenham, por exemplo, alguma dificuldade de
motricidade fina, devendo-se optar, então, por algum teste psicométrico que não
provoque ansiedade.
Em seguida, pode-se usar os testes que abor​dam, de certa forma, o conflito ou a
pro​blemática que originou o processo. No caso da necessidade de se verificar as ​-
características da personalidade, é interessante que seja acrescentado um teste
projetivo e outro psicométri​co, que devem chegar a conclusões aproximadas,
objetivando uma intervalidação de resultados. Na sequência, pode-se dar continuidade
com a utilização de testes que avaliam as questões cognitivas, tendo sempre o cuidado
de fechar a bateria com um teste que não eleve a ansiedade, pois isso pode prejudicar o
momento da devolução, com a recusa do avaliandoa comparecer à entrevista de
devolução.
A questão dos testes já foi bastante discutida ao longo da profissão de psicólogo,
mas acreditamos que seu uso é extremamente útil para que se tenha mais objetividade e
para que não se tenha um olhar subjetivo em relação à história e às reações do
avaliando. Urbina (2007) refere dois motivos para a utilização de testes psicológicos.
O primeiro seria a eficiência, já que contemplam tempo e custo reduzidos, uma vez que,
em certas situações, como, por exemplo, para a determinação de um diagnóstico
diferencial visando a definição do uso de medicação, não é oportuna a realização de
observações e intera​ções prolongadas com quem está sendo avaliado. O segundo
motivo seria a objetividade, pois os testes seguem padrões de fidedignidade e validade
que asseguram quem está aplicando; porém, os dados observados são organizados de
modo não sistemático, o que pode levar a julgamentos pouco precisos. Ainda assim,
nenhum teste isolado substitui o olhar clínico acurado do profissional durante as
entrevistas e a condução do psicodiagnóstico, ou seja, o psicólogo não é meramente um
“testólogo”, mas um profissional habilitado e capaz de integrar os achados da testagem
e das entrevistas, denotando um olhar mais amplo e compreensivo em relação ao
avaliando.
Contudo, antes de aplicar qualquer teste, cabe ao profissional estar habilitado para
usá-lo, isto é, o psicólogo deve ter domínio ​quanto à aplicação, ao levantamento e à
interpretação dos testes por ele escolhidos. Deve também consultar o Sistema de
Avaliação de Testes Psicológi​cos (Satepsi) – disponível no site do Conselho Federal
de Psicologia (CFP)1 –, a fim de certificar-se que o teste escolhido apresenta parecer
favorável para o uso profissional, contendo estudos de validade, fidedignidade,
normatização e padronização para a população brasileira (CFP, 2003a).
É dever do psicólogo manter-se atualizado quanto à literatura da sua área de
atuação, e, no que tange à avaliação psicológica, é imprescindível que esteja atualizado
quanto às pesquisas mais recentes realizadas com os instrumentos que utiliza.
Recomendamos que o ​profissional busque informações além daquelas ​fornecidas nos
manuais, lembrando que esses fornecem informações básicas, não tendo como abarcar
todos os dados da literatura já publicados (Alves, 2004).
Cabe relembrar a importância da ​Resolução 002/2003 (CFP, 2003a), um marco
fundamental na profissão do psicólogo no Brasil, que determinou os requisitos mínimos
e obrigatórios que os instrumentos psicológicos devem atender para o seu uso adequado
(Noronha, Primi, & Alchieri, 2004). A partir dela, o CFP passou a recomendar somente
o uso dos testes avaliados com parecer favorável da Comissão Consultiva; os demais,
com parecer desfavorável ou ainda não avaliados, continuam tendo seu uso permitido
apenas em pesquisa.
Dando continuidade ao processo de psicodiagnóstico, após a aplicação, o
levantamento e a interpretação dos resultados obtidos, espera-se que o profissional
chegue a uma conclusão que responda à demanda que o originou. ​Diante disso, deve
comunicar os resultados ​encontrados, visando um encaminhamento adequado para o
avaliando. A transmissão dessa informação é, sem dúvida, o objetivo primordial dessa
avaliação, que culmina em uma entrevista final, posterior à aplicação do último teste
(Ocampo et al., 2009).
Essa comunicação ocorre em duas vias: escrita e oral. A primeira é realizada por
meio de um laudo/relatório, devendo conter uma linguagem clara, concisa, inteligível e
precisa, adequada ao requerente, conforme orientação do CFP (2003b) por meio da
Resolução 007/2003, restringindo-se às informações que se fizerem necessárias. A
segunda trata da ​comunicação verbal, que pode ser realizada na forma de uma ou mais
entrevistas de devolução. Uma boa devolução inicia com um aprofundado conhecimento
do caso, que proporcionará uma base sólida para que se proceda com eficácia
(Ocampo et al., 2009).
Mais uma vez, é fundamental que o psicólogo conheça e siga as recomendações
contidas na Resolução 007/2003 (CFP, 2003b), que insti​tui o Manual de Elaboração de
Documentos Escritos produzidos pelo psicólogo, decorrentes da avaliação psicológica.
Essa resolução serve de orientação ao profissional no momento de redigir qualquer
documento que se torne necessário durante e/ou ao final do psicodiagnóstico. Deve ser
evita​da a elaboração de laudos/relatórios de pouca qualidade técnico-científica, que
contenham universalidades e ambiguidades, assim co​mo a elaboração de
laudos/relatórios sofisti​cados (excessivamente técnicos), sendo mais adequado um
estilo que ressalte a individualidade e a objetividade, usando uma linguagem correta,
simples, clara e consistente, que facilite a comunicação clínica.
Objetivando o término do processo, as en​​tre​vistas de devolução podem ocorrer de
forma sistemática ou assistemática. A forma sistemáti​ca é a entrevista mais habitual,
que tem como objetivo a devolução dos resultados e a en​trega do laudo. Já a forma
assistemática é co​mumente utili​zada nos casos em que há o pre​domínio de uma
ansiedade mais elevada por parte do avaliando e/ou do seu responsável, em que se
considera pertinente o fornecimento de pequenos feedbacks ao longo do andamento do
processo, visando a dirimir essa ansiedade. Outra situação em que se faz necessária a
devolução assistemática é em casos graves ou de risco de suicídio.
Ainda no que tange à entrevista de devolu​ção, recomenda-se que se inicie
abordando os aspectos mais sadios, adaptativos e/ou preservados da dinâmica de
funcionamento do avaliando, para, em seguida, comunicar aqueles que requerem maior
cuidado, na medida e no ritmo em que possam ser compreendidos e tolerados pelo
avaliando e/ou seus responsáveis, já sugerindo os encaminhamentos apropriados. Se
realizado dessa forma, acreditamos que o processo favorecerá a compreensão e a
aceitação das indicações terapêuticas sugeridas pelo profissional.
Essas entrevistas devem ser realizadas dentro do contexto global do processo e
serão de res​ponsabilidade única e exclusiva de quem rea​lizou o psicodiagnóstico. Mas,
uma vez que não há um jeito de saber como será acolhido ou não o encaminhamento
recomendado, torna-se arriscado mobilizar, no avaliando e/ou em seus responsáveis,
mais do que suas possibilidades egoicas lhes permitem entender ou suportar. Outra
questão diz respeito à escolha da linguagem mais apropriada para o momento. É
fundamental que o profissional seja claro, não utilize uma terminologia técnica, evite
termos ambíguos e utilize, na medida do possível, a mesma linguagem do avaliando
e/ou de seus responsáveis, como bem salientam Ocampo e colaboradores (2009).
Na devolutiva, é importante salientar a linguagem a ser empregada. No caso de ​-
devolução para colegas psicólogos, pode-se usar termos técnicos, inclusive fazendo
referência aos recursos utilizados e discutindo de forma aprofunda​da os achados mais
primitivos, regressivos e ma​duros do avaliando. Porém, quando a devolutiva for
dirigida a outros profissionais, é im​prescindível ater-se apenas às informações re​-
levantes, respondendo à demanda e preservando o sigilo e a confidencialidade (Pellini
& Leme, 2011).
No decorrer deste capítulo, não nos aprofundamos na questão dos honorário, mas
este é um aspecto essencial. O profissional deverá levar em consideração que, no ​-
psicodiagnóstico, seu trabalho vai muito além das sessões com o avaliando. Além de
todo o planejamento do processo, o avaliador precisa integrar os dados obtidos,
estudar o caso em questão e refletir sobre os encaminhamentos mais adequados. Nessa
linha de raciocínio, pensamos que cada profissional precisa definir seu valor, isto é, os
honorários que fazem jus a seu trabalho. Cada profissional é livre para dispor sobre
seus honorários, mas sugerimos que, no contrato inicial, verbal ou escrito, fique claro
ao avaliando e/ou aos seus responsáveis de que valor se trata. Mediante essa
comunicação e aceitação por ambas as partes, o profissional poderá

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