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Julia Paris Malaco – UCT15 SP3 – Gastroenterologia Fisiologia e anatomia do fígado Localizado no QSD do abdômen abaixo das costelas VII-XI É protegido pela caixa torácica e diafragma Ocupa maior parte do hipocôndrio direito e epigástrio superior e alcança hipocôndrio esquerdo Faces Diafragmática convexa o Lisa em forma de cúpula o Relaciona-se com a face anterior do diafragma o Coberta por peritônio visceral, com exceção na porção nua Visceral, relativamente plana ou côncava o Póstero-inferior, não é revestida por peritônio visceral. o Relação com os órgãos. Hilo hepático: o Fissura transversal entre lobo caudado e quadrado, onde está a artéria hepática própria, veia porta e ducto hepático comum. Impressões Esofágica: sulco no lobo esquerdo Gástrica: fossa no lobo esquerdo Duodenal: fossa rasa no lobo direito, próximo à vesícula biliar Cólica: depressão pela flexura direita do cólon Renal: fossa no lobo direito Adrenal: escavação rasa no lobo direito, próximo à veia cava inferior Recessos: São formados pela flexão do peritônio Subfrênico o São extensões da cavidade peritoneal entre o diafragma e a face hepática Hepatorrenal o Também denominado Bolsa de Morison o Entre a parte direita da face visceral e o rim e adrenal Sub Hepático o Porção supra-cólica, imediatamente inferior ao fígado Ligamentos: são formados pelas reflexões do peritônio Coronário: Circunda o fígado, especialmente na porção superior. Une a parte superior do fígado ao diafragma Triangular esquerdo e direito (diafragmática): Formado pela união do ligamento falciforme e o omento menor Falciforme (diafragmática): Divide o lobo direito e esquerdo Redondo (visceral): Localizado próximo ao hilo. É um remanescente da veia umbilical Venoso (visceral): Próximo a veia cava. Remanescente do ducto venoso Lobos Quadrado: Face visceral, entre vesícula biliar e fissura do ligamento redondo. Anatomicamente pertence ao lobo direito Caudado: Entre a fissura do ligamento venoso e a veia cava inferior. Anatomicamente pertence ao lobo direito Direito (maior): Na face diafragmática é separado pelo ligamento falciforme. Na face visceral pelo linha que une o sulco na veia cava à vesícula biliar Esquerdo Fissuras Porta hepatis: Fissura central que contém veia porta, artéria hepática, ductos hepáticos, plexo nervoso hepático e vasos linfáticos Julia Paris Malaco – UCT15 Drenagem linfática: Linfonodos hepáticos → linfonodos celíacos → cisterna do quilo Suprimento sanguíneo: O fígado, além de receber sangue arterial através da artéria hepática, recebe cerca de 70% a 80% do seu sangue através da veia porta hepática, de modo que quase todo o sangue oriundo do sistema digestório e do baço drena para o fígado. Ambos os vasos sanguíneos alcançam o fígado através do hilo, também conhecido como porta hepatis, com origem na qual se ramificam profusamente até que o sangue arterial e venoso se mistura na ampla rede capilar hepática dos lóbulos, constituída pelos sinusoides hepáticos. Dos sinusóides, o sangue drena para a veia central e desta para as veias hepáticas, as quais drenam para a veia cava inferior. Uma vez nos sinusóides, o sangue entra em íntimo contato com a principal célula parenquimatosa do lóbulo hepático, o hepatócito. Irrigação arterial: Aorta abdominal → tronco celíaco → Artéria hepática comum → artéria hepática própria Artéria hepática própria o Ramo terminal da hepática comum o Bifurca-se em direita e esquerda, para os respectivos lobos o Pode haver um ramo intermédio para lobo quadrado Sistema porta: É a drenagem venosa dos órgãos abdominais que levam os nutrientes para o fígado, exceto as gorduras (via linfática) Drenagem venosa: Veias hepáticas Se formam pela confluência das veias centrais Desemboca na veia cava inferior Classificadas em grupos o Inferior: drena lobo caudado o Superior: outros lobos Nervos: Fígado e árvore biliar são inervados por fibras simpáticas com origem em T7 a T10 e por fibras parassimpáticas com origem nos nervos vagos direito e esquerdo. Os nervos simpáticos pós-ganglionares têm origem nos gânglios celíacos. Fibras derivadas dos gânglios celíacos e do nervo vago formam um plexo nervoso que cursa posterior e anteriormente à artéria hepática. Estrutura Túnica serosa: Peritônio visceral que envolve o órgão. É contínua ao omento menor Túnica fibrosa ou cápsula de Glisson: Adere-se ao peritônio visceral. É uma cápsula de tecido conjuntivo fibroso Estroma: Tecido conjuntivo fibroso (colágeno tipo III) + vasos sanguíneos. 20% do volume Parênquima: Hepatócitos + canalículos bilíferos Lóbulo Lóbulo hepático clássico o É formado por cordões de hepatócitos e capilares sinusóides o São hexagonais, delimitados por tecido conjuntivo o Os sinusóides são os capilares mais fenestrados para a passagem de substância - Fluem no sentido periferia centro, para veia centrolobular o Na periferia do lóbulo encontram-se ramos da artéria hepática, veia porta e ducto biliar → formam espaço porta, onde está a tríade portal - A bile segue no sentido inverso do sangue, ou seja, central → periférico A partir do espaço porta, os ramos da artéria hepática e da veia porta confluem para a rede de capilares sinusóides, onde o sangue venoso se mistura ao sangue arterial. O centro do lóbulo hepático mostra um vaso venoso para onde confluem os capilares sinusóides; por essa razão, a parede dessa veia é interrompida pela abertura desses sinusóides. Por estar no centro do lóbulo, este vaso denomina-se veia central, ou centrolobular. Ácino hepático: Diz respeito à localização dos hepatócitos e do suprimento sanguíneo, sendo uma classificação funcional Zona 1 → periferia lobular o Recebem maior [] de O2 o Hepatócitos desse local realizam metabolismo oxidativo, síntese de ureia, gliconeogênese e formam bile Zona 3 → mais central o Menor [] O2 o Realizam glicólise, glicogênese, lipogênese, corpos cetônicos, glutamina e metabolizar xenobióticos Parênquima Hepatócitos o Células poliédricas dotadas de núcleo central o Se relaciona com hepatócitos vizinhos, canalículo biliar e sinusóides (espaço perisinusoidal ou de Disse) o É rica em organelas Julia Paris Malaco – UCT15 Sinusóides Células endoteliais o Possuem fenestras o Secretam IL1, IL6, IFN, endotelina e NO o Regulam o fluxo sanguíneo Células de Kupffer (macrófagos) o Responsáveis pela defesa o Secretam substâncias vasoativas e citotóxicas, como radicais livres e citocinas Células estreladas, lipócitos ou células de Ito o São armazenadoras de gordura por gotículas o Estocam vitamina A o Auxiliam na regulação do fluxo sanguíneo o Localizadas no espaço de Disse Células NK ou pi cell Metabolismo da bilirrubina: Resumidamente, quando as hemácias tiverem completado seu tempo de vida (em média, 120 dias), ficando muito frágeis para existirem no sistema circulatório,suas membranas celulares se rompem e a hemoglobina liberada é fagocitada pelos macrófagos teciduais (também denominado sistema reticuloendotelial) por todo o corpo. A hemoglobina é primeiro cindida em globina e heme, sendo o anel do grupo heme aberto para fornecer (1) ferro livre que é transportado no sangue pela ferritina e (2) cadeia reta de quatro núcleos pirrólicos, que constituem o substrato, a partir do qual a bilirrubina será, eventualmente, formada. A primeira substância formada é a biliverdina, mas esta é, rapidamente, reduzida à bilirrubina livre,também chamada bilirrubina não conjugada que é gradualmente liberada dos macrófagos para o plasma. A bilirrubina livre imediatamente se liga fortemente à albumina plasmática, sendo transportada, nessa combinação, por todo o sangue e fluidos intersticiais. Em questão de horas, a bilirrubina não conjugada é absorvida, através das membranas celulares dos hepatócitos. Ao passar para seu interior, ela é liberada da albumina plasmática e, logo depois, cerca de 80% serão conjugados ao ácido glicurônico, para formar glicuronídeo de bilirrubina, cerca de 10% se unirão ao sulfato para formar sulfato de bilirrubina, e em torno de 10% se associarão à diversidade de outras substâncias. Sob essas formas, a bilirrubina é excretada dos hepatócitos, processo de transporte ativo, para os canalículos biliares e daí, para os intestinos. Formação e Destino do Urobilinogênio. Uma vez no intestino, cerca da metade da bilirrubina “conjugada” é convertida, por ação bacteriana, na substância urobilinogênio, que é muito solúvel. Certa quantidade do urobilinogênio é reabsorvida através da mucosa intestinal, de volta para o sangue. Sua maior parte é reexcretada pelo fígado, novamente para o intestino, mas cerca de 5% são excretados na urina, pelos rins. Após a exposição ao ar, na urina, o urobilinogênio é oxidado em urobilina-, alternativamente, nas fezes, é alterado e oxidado para formar estercobilina. O fluxo sanguíneo hepático total representa 25% do débito cardíaco Dois terços do fluxo entram pela veia porta e o terço restante, pela artéria hepática Está estrategicamente situado no sistema circulatório recebendo um suprimento sanguíneo duplo: cerca de 20% do seu fluxo é rico em O2 e provém da artéria hepática, enquanto o restante 80% é rico em nutrientes e provém da veia porta. Esta particularidade permite ao fígado controlar as substâncias que são absorvidas em todo o intestino e determinar quais delas vão entrar, e como vão entrar, na circulação sistémica. Os hepatócitos são as células mais importantes do fígado, constituindo cerca de 2/3 da sua massa. Entre os cordões de hepatócitos estão os sinusóides vasculares revestidos por células endoteliais fenestradas e descontínuas que demarcam o espaço de Disse , para dentro do qual se projectam abundantes microvilosidades da membrana basolateral do hepatócito que está assim em contacto directo com o sangue arterial e venoso portal. A membrana apical dos hepatócitos, com diferentes canais e transportadores em relação à membrana basolateral, vai ser a responsável pela formação dos canalículos biliares através da formação de sulcos entre hepatócitos adjacentes. Estes canalículos biliares que se fundem para formarem dúctulos biliares (ou canais de Hering) e depois a nível das zonas portais ductos biliares, já revestidos Julia Paris Malaco – UCT15 por células epiteliais ou colangiócitos, permitem a excreção de bile. Para além dos hepatócitos, das células endoteliais fenestradas e dos componentes biliares, existem outros tipos de células no espaço de Disse, nomeadamente as células de Kupffer (maior acúmulo de macrófagos em todo o corpo, responsáveis pela fagocitose de diversas substâncias) e as células de Ito ou estreladas (reserva de substâncias lipídicas e papel na fibrose hepática patológica), para além de várias estruturas de suporte. O fígado recebe aproximadamente 25% do débito cardíaco total, o que lhe permite realizar numerosas funções vitais, essenciais à manutenção da homeostasia corporal. Destaca- se a regulação do metabolismo de diversos nutrientes, papel imunológico, síntese proteica e de outras moléculas, armazenamento de vitaminas e ferro, degradação hormonal e a inactivação e excreção de drogas e toxinas. Metabolismo, conjugação e excreção de diversos compostos: O fígado metaboliza uma enorme variedade de compostos, não só endógenos (e.g. sais biliares, bilirrubina, hormonas) mas também exógenos (e.g. drogas e toxinas). O hepatócito lida com todas estas moléculas seguindo 3 passos fundamentais: Captação de substâncias plasmáticas através de vários transportadores e canais existentes na sua membrana basolateral; Processamento dessas substâncias o que inclui o transporte e modificação química intracelular através de numerosas enzimas e cofactores – este passo é essencial já que muitas das substâncias captadas pelos hepatócitos são lipofílicas e estas modificações tornam as substâncias mais hidrossolúveis permitindo a sua posterior excreção a nível renal ou pela bile; Secreção de substâncias – esta secreção pode ser uma forma de excreção, isto é, secreção através da membrana apical para a bile, mas também pode ser uma secreção para o plasma sendo a substância reutilizada ou excretada por outras vias (e.g via renal). Reações de biotransformação que ocorrem em 2 fases. As reações de fase I representam reações de oxidação/redução (hidroxilação, desalogenação, dealquilação, etc) que têm como característica comum a todas a inserção de um átomo de oxigênio no substrato, transformando-o num composto mais polar. As principais enzimas envolvidas nestas reações de fase I são os citocromos P- 450 que existem principalmente no retículo endoplasmático (RE) e tipicamente catalizam reações de hidroxilação. Como as reações de fase I, apesar de essenciais, apenas conferem um aumento modesto na solubilidade, a maioria das substâncias, mas não todas, terá que sofrer reações da fase II. Na reação da fase II o hepatócito procede à conjugação dos metabólitos formados na fase I com compostos como o glucuronato, sulfato, glutationa, radicais metil e acetil entre outros, de maneira a produzir compostos mais hidrofílicos e/ou menos tóxicos que rapidamente são secretados no sangue ou na bile. Apesar do hepatócito usar várias reações de conjugação as 3 mais importantes são: (1) a conjugação com o glucuronato através das UGTs (uridine diphosphate glucuronosyl transferases) que existem principalmente no RE; (2) a conjugação com o sulfato, através das sulfotransferases; (3) a conjugação com a glutationa através das glutationa -S- transferases, estas 2 últimas enzimas a existirem principalmente no citosol. Síntese proteica: O fígado sintetiza quase todas as proteínas plasmáticas mais importantes entre as quais a albumina, transportadores de hormonas, fatores da coagulação e fibrinolíticos, fibrinogénio, diversos fatores de crescimento, globulinas, lipoproteínas, entre outras. Metabolismo energético e de carboidratos: O fígado providência energia aos outros tecidos fundamentalmente pela exportação de 2 substratos, a glicose e os corpos cetónicos. Estes últimos são uma importante fonte de energia providenciada pelo fígado, principalmente em situações em que a utilização de glicose está comprometida como no jejum, ou em situações patológicas como a diabetes. O fígado tem um papel essencial em manter o nível plasmático de glicose mais ao menos constante e dentro da normalidade. Quando os níveis de glicose estão altos, o fígado capta a glicose. Muita da glicose captada é convertida em glicogênio que funciona como reserva de glicose. Se os níveis estão baixos de glicose, o glicogênio armazenado é convertido em glicose – glicogenólise. É também o sítio principal onde se procede à gliconeogénese, isto é, a conversão de aminoácidos, ou mesmo carboidratos simples (lactato) em glicose. Julia Paris Malaco – UCT15 Metabolismo lipídico: Os lipídios absorvidos deixam o intestino através do sistema linfático sob a forma de quilomícrons. Estes quando entram na corrente sanguínea sofrem a ação da lipoproteína lípase na superfície das células endoteliais libertando glicerol e ácidos gordos que são captadospelos adipócitos. A parte da molécula que resulta deste processo são os remanescentes dos quilomicrons que são captados e metabolizados a nível hepático. O fígado também sintetiza e secreta VLDLs (very-low-density lipoproteins) a partir de lípidos e colesterol absorvidos ou sintetizados de novo. Estas sofrem novamente a ação da lipoproteína lípase, que remove triglicerídeos da molécula, formando IDL (intermediate-density lipoprotein) e posteriormente LDL. O colesterol é transportado dos tecidos para o fígado pelas HDL (high-density lipoprotein) onde é absorvido pela lípase hepática. No entanto, esse colesterol pode também ser reciclado a LDL ou VLDL pela CETP (cholesterol-ester transport protein). Estas lipoproteínas são a fonte principal de triglicerídeos e colesterol disponível para os outros tecidos. O fígado é assim o principal orgão responsável pela homeostasia do colesterol não só pela sua capacidade de sintetizar colesterol, através da enzima HMG-CoA reductase mas principalmente porque a conversão hepática de colesterol em ácidos biliares através da 7a-hidroxílase é a via mais importante de eliminação de colesterol. Resumindo: Principal responsável pela homeostasia de colesterol → sintetiza colesterol e converte o colesterol em ácidos biliares (via mais importante de eliminação de colesterol) Metabolismo protéico: Quando as proteínas são degradadas libertam aminoácidos que, não podendo ser armazenados, ou são utilizados de forma imediata ou catabolizados formando amônia (NH3). Esta substância não é metabolizada pela maioria dos tecidos e é extremamente tóxica. A sua degradação ocorre principalmente no fígado através da sua conversão em uréia - ciclo da ureia. A ureia produzida pelo ciclo da ureia abandona o hepatócito para o plasma através da aquaporina 9, sendo posteriormente excretada a nível renal. Acredita-se que os transportadores dos hepatócitos para a captação de aminoácidos são muito semelhantes aos existentes nos enterócitos. Resumindo: Faz a degradação de amônia (substância extremamente tóxica) através de sua conversão em uréia e é posteriormente excretada a nível renal Armazenamento de substâncias: O fígado armazena várias substâncias como as vitaminas A, D, E, K (lipossolúveis, principalmente armazenadas nas células de Ito), vitamina B12, ferro, ácido fólico, entre outras. Para algumas destas substâncias as reservas hepáticas permitem meses a anos de privação sem consequências clínicas evidenciáveis. Resumindo: as células do hito fazem o armazenamento de substancias (principalmente vitaminas lipossoluveis (A, D, E e K), vitamina B12, ferro... Função endócrina: Apesar de o fígado não ser considerado um órgão do sistema endócrino tem a capacidade de converter importantes hormonas e vitaminas numa forma mais activa. Destaca-se a hidroxilação inicial da vitamina D, a desoxidação da tiroxina (T4) em triiodotironina (T3) e a síntese de IGF-1 em resposta à hormona de crescimento produzida na hipófise. Para além disso, tem também um papel importante na degradação de diversas hormonas. Resumindo: tem capacidade de converter hormônios e vitaminas em uma forma mais ativa (vitamina D, T3 e T4) e também possui importante atividade na degradação de hormônios Função Imunológica: As células de Kupffer hepáticas correspondem a cerca de 80-90% da população fixa de macrófagos do sistema reticuloendotelial. Providenciam um importante mecanismo de filtro para a circulação sistémica não só por removerem do sangue partículas exógenas estranhas como bactérias, endotoxinas, parasitas mas também partículas endógenas como os eritrócitos senescentes Resumindo: as células de kupffer correspondem a maior rede de macrófago no organismo Formação e secreção de bile: Para que o fígado possa captar substâncias do plasma através da sua membrana basolateral e posteriormente secretá-las na sua forma modificada para a bile através da membrana apical é necessário diversos transportadores membranares, muitos dos quais ainda não identificados. Na fig.4 podemos ver alguns dos principais transportadores já conhecidos. Mecanismo de lesão e reparo: Os hepatócitos podem ser submetidos a uma série de alterações degenerativas, mas potencialmente reversíveis, tais como o acúmulo de gordura (esteatose) e de bilirrubina (colestase). Quando a lesão não é reversível, os hepatócitos morrem principalmente por dois mecanismos: necrose ou apoptose. Na necrose dos hepatócitos, as células sofrem tumefação devido à regulação osmótica Julia Paris Malaco – UCT15 defeituosa na membrana celular: o fluido flui para dentro da célula, que incha e se rompe. Mesmo antes da ruptura, formam-se bolhas na membrana, levando os conteúdos citoplasmáticos (sem organelas) para o compartimento extracelular. Os macrófagos se aglomeram em tais locais de lesão e marcam os locais de necrose dos hepatócitos, assim as células mortas se rompem e desaparecem. Esse tipo de lesão predominante de morte em lesões isquêmicas/hipóxicas e uma parte significativa da resposta ao estresse oxidativo. A apoptose de hepatócitos é uma forma ativa de morte celular “programada” que resulta em encolhimento dos hepatócitos, condensação da cromatina nuclear (picnose), fragmentação (cariorrexe) e fragmentação celular em corpos apoptóticos acidófilos. Os hepatócitos apoptóticos foram descritos com clareza pela primeira vez na febre amarela por William Thomas Councilman e, portanto, têm sido muitas vezes chamados de corpúsculos de Councilman; uma vez que a apoptose ocorre em muitas formas de doença hepática, por convenção esse epônimo fica restrito a esta doença. Nas configurações mais frequentes em que os hepatócitos apoptóticos são vistos, (p. ex., na hepatite aguda e crônica), o termo corpúsculos acidófilos é utilizado devido às suas características de coloração profundamente eosinofílica. Quando há perda generalizada do parênquima, muitas vezes há evidências de necrose confluente, uma perda zonal severa de hepatócitos. Isso pode ser observado em lesões isquêmicas ou tóxicas agudas ou na hepatite viral ou autoimune grave. A necrose confluente pode começar como uma zona de perda de hepatócitos em torno da veia central. O espaço resultante é preenchido por detritos celulares, macrófagos, e os remanescentes da rede de reticula-a. Na necrose em ponte essa zona pode unir as veias centrais aos tratos portais ou tratos portais adjacentes (muitas vezes com uma veia central inaparente dentro da zona de lesão). Mesmo em doenças como a hepatite viral, em que os hepatócitos são os principais alvos dos ataques, às agressões vasculares secundárias à inflamação ou trombose levam à extinção do parênquima devido às grandes áreas de morte de hepatócitos contíguos. A regeneração dos hepatócitos: Ocorre principalmente pela replicação mitótica dos hepatócitos adjacentes àqueles que morreram, mesmo quando há uma necrose confluente significativa. Os hepatócitos são bastante semelhantes às células-tronco na sua capacidade de continuar a replicar mesmo durante anos de lesão crônica, e, desse modo, a participação de células-tronco geralmente não é significativa no reparo do parênquima. Nas formas mais graves de insuficiência hepática aguda, há ativação do nicho primário de células- tronco intra-hepáticas, ou seja, o canal de Hering, porém a contribuição das células-tronco para a substituição dos hepatócitos em tal cenário permanece incerta. No entanto, eventualmente em muitos indivíduos com doença crônica, os hepatócitos alcançam a senescência explicativa e, por isso, há uma clara evidência de ativação de células-tronco observada na forma de reações ductulares. Essas estruturas tipo ductos (duct like), algumas vezes semluz, se desenvolvem a partir das células-tronco e contribuem significativamente para a restauração do parênquima. A principal célula envolvida na formação de cicatrizes é a célula estrelada hepática. Na sua forma de repouso, ela é uma célula que armazena lipídio (vitamina A). No entanto, em várias formas de lesão aguda e crônica, as células estreladas podem ser ativadas e convertidas em miofibroblastos altamente fibrogênicos. Outras células provavelmente contribuem significativamente para a formação de cicatrizes em diferentes aspectos, incluindo fibroblastos portais. Reações ductulares também desempenham um papel, tanto através da ativação e recrutamento de todas essas células fibrogênicas, como também, talvez, através da transição epitelial-mesenquimal. Os papéis relativos desempenhados por essas outras células e processos são menos compreendidos. Doença hepática alcoólica Doença hepática alcoólica é um espectro de doenças hepáticas crônicas, que vão desde fígado gorduroso alcoólico até hepatite alcoólica e cirrose. O consumo crônico e excessivo de álcool constitui uma das principais causas de doença hepática. A patologia da doença hepática alcoólica consiste em três lesões principais, raramente existindo lesão em uma forma única: Esteatose hepática, Hepatite alcoólica Cirrose. Julia Paris Malaco – UCT15 Esteatose hepática Mesmo após uma ingestão moderada de álcool, gotículas lipídicas microvesiculares se acumulam nos hepatócitos. Com a ingestão crônica de álcool, os lipídeos se acumulam, criando glóbulos grandes e claros, que comprimem e deslocam o núcleo do hepatócito para a periferia da célula. Macroscopicamente, o fígado gorduroso do alcoolismo crônico é um órgão grande e mole (chegando a pesar 4 a 6 kg), que é amarelo e untuoso. Embora exista pouca ou nenhuma fibrose no início, com a ingestão continuada de álcool, um tecido fibroso se desenvolve ao redor das veias hepáticas terminais, estendendo-se para os sinusóides adjacentes. A alteração gordurosa é completamente reversível, se houver abstinência da ingestão de álcool subsequente. Caracteriza-se pelo: Compromete o parênquima hepático pela acumulação de gordura nos hepatócitos, decorrente do consumo crônico do etanol O etanol e os efeitos tóxicos do seu metabolismo originam várias alterações na função normal do fígado. Desta forma, cabe ressaltar que a formação de acetaldeído e acetato, tanto pela via da enzima álcool desidrogenase assim como pela via do citocromo P450 2E1, causa disfunções mitocondriais → aumentando a síntese e absorção dos ácidos graxos e diminuindo a sua oxidação, resultando no acúmulo nos hepatócitos Os pacientes geralmente são assintomáticos . ao exame físico podem apresentar hepatomegalia discreta Nos exames laboratoriais - normal ou aumento discreto TGO/TGP e GGT Hepatite alcoólica Patogenia: Indução do citocromo p450: faz degradação de substancias exógenas (o álcool ativa o p450 para poder degradar o álcool). Quando se toma álcool em grande quantidade, esse p450 é ativado constantemente e isso acaba induzindo a produção de hidrogênios reativos que são danosos ao hepatócito Álcool faz liberação de radicais livres durante o processo de oxidação: isso começa alterar a membrana celular dos hepatócitos, e com isso, todo o metabolismo de gordura que o fígado faz fica prejudicado e ao invés de ser drenado, começa a se acumular no fígado porque a metabolização da gordura é falha O álcool afeta os microtubulos, mitocôndrias e membrana celular: diminuindo a respiração celular e favorece alterações nos componentes citoplasmáticos, tudo isso lesa mais ainda os hepatócitos Álcool libera acetaldeído: induz a peroxidação dos lipídeos, destruindo a função citoesquelética da membrana. O álcool pode levar a um ataque imunológico: por ser uma substância toxica, pode acabar gerando uma reação inflamatória caracterizada por uma hepatite Achados histológicos Esteatose (por acumulo de triglicérides) Balonizaçao de hepatócitos: Focos únicos ou dispersos de células sofrem tumefação (balonização) e necrose. A tumefação resulta do acúmulo de gordura e água, Neutrófilos ao redor dos lóbulos hepáticos: Neutrófilos permeiam o lóbulo hepático e sofrem acúmulo ao redor dos hepatócitos em degeneração, particularmente aqueles que possuem corpos de Mallory-Denk Corpúsculos de mallory: Esses corpos estão geralmente presentes como material eosinofílico, amorfo e acumulado em hepatócitos balonizados. Fibrose perivenular: A fibrose é a característica essencial da lesão progressiva do fígado. A fibrose é um processo dinâmico de deposição de colágeno e remodelagem. Tudo isso pode ser reversível se ocorrer a retirada do álcool Cirrose hepática Hepatite crônica irreversível caracterizada por: Fibrose (significa que houve substituição tecidual, ou seja, perda da função do órgão), Desarranjo arquitetural Formação de nódulos de regeneração. Julia Paris Malaco – UCT15 Os capilares sinusoidais passam entre os cordões dos hepatócitos – espaço entre o cordão do hepatócito e o sinusoide hepático chamado de espaço de disse. O fígado tem capacidade de regeneração e mantem exatamente a estrutura daquele lóbulo hepático (em casos de agressão aguda). Em casos de agressão crônica, chega um determinado momento que ele não consegue mais se regenerar, começando o processo de cirrose. No espaço de disse existe uma célula chamada célula estrelada, essa célula tem como função fazer o armazenamento de vitamina A. quando o fígado é agredido constantemente, as células estreladas vão mudar sua função, deixando de armazenar vitamina A e passando a sintetizar colágeno, esse colágeno faz um preenchimento no espaço de disse, dando origem a fibrose, então começam a aparecer faixas de fibrose entre o cordão de hepatócitos e o sinusoide hepático, formando uma barreira entre eles, dificultando a passagem do sangue do sinusoide para o hepatócito, prejudicando a nutrição. A célula estrelada além de colágeno, também começa a produzir citocinas inflamatórias, que em determinado momento essa agressão crônica faz com que o fígado se “regenere” de forma anárquica, ou seja, um hepatócito em cima do outro, modificando a arquitetura do lóbulo hepático e diminuindo a função normal do fígado, causando uma insuficiência hepatocelular crônica, perdendo todas as funções do fígado. Com o tempo o fígado começa a ficar atrofiado Esses pacientes tem maior risco de evoluir para carcinoma. Causas: Alcoolismo Hepatites virais crônicas (B/C), Hepatite autoimune Doenças metabólicas: hemocromatose; doença de Wilson; def. de alfa 1-antitripsina Cirrose criptogênica Manifestações Clínicas Estigmas Periféricos: o Ginecomastia o Aranhas Vasculares o Eritema palmar o Atrofia testicular o Consumo muscular periférico o Contratura de Dupuytren o Aumento de Parótidas Fase inicial (cirrose compensada). A função de síntese hepática é quase, ou totalmente, normal. A pressão portal, embora aumentada, é inferior ao valor limite necessário para o desenvolvimento de varizes ou ascite. À medida que a doença progride, a pressão portal aumenta e a função hepática diminui, o que resulta, consequentemente, no desenvolvimento de ascite, sangramento gastrointestinal, encefalopatia e icterícia. Fase progressiva rápida (cirrose descompensada) - desenvolvimento de complicações da hipertensão portal ou disfunção e hepática (ou ambas). A progressão para a morte pode ser acelerada em decorrência do desenvolvimento de outras complicações, como sangramento gastrointestinal recorrente,insuficiência renal (ascite refratária, síndrome hepatorrenal), síndrome hepatopulmonar e sepse (peritonite bacteriana espontânea). O desenvolvimento de carcinoma hepatocelular pode acelerar o curso da doença em qualquer estágio. A média de tempo para a descompensação é de cerca de seis anos. Exames laboratoriais TGO e TGP: muito aumentado (agudo), pouco aumentado (crônico). Predomínio de TGO sobre TGP (falha de vitamina B6 para fazer a síntese de TGP, por isso TGO está maior) Fosfatase alcalina/GGT: aumentado. Aumento das duas ao mesmo tempo pensar em colestase (qualquer impedimento no fluxo da bile) Bilirrubina: aumentada. Função hepatocelular prejudicada falha na conjugação da bilirrubina aumento de bilirrubina indireta Hipergamaglobulinemia: fígado esta hipertenso – hipertensão porta falha na passagem do sangue desvio de sangue para circulação sistêmica resposta do linfócito B que se diferencia em plasmocito liberação de anticorpos Hipoalbuminemia: diminuição da albulmina também revela diminuição da função hepática Alargamento do tempo de Protrombina: fatores de coagulação são produzidos no fígado (2, 7, 9 e 10). O fator 7 espelha a função hepática, é o tempo de protrombina quem avalia esse fator. Consequências da cirrose Disfunção hepatocelular Hipertensão porta: dificuldade de passagem do sangue pelo fígado, não consegue passar pela veia porta, ocorre inversão do fluxo sanguíneo. Julia Paris Malaco – UCT15 o Varizes Esôfago o Hemorroidas o Circulação colateral o Esplenomegalia o Ascite o Colestase o Encefalopatia hepática Insuficiência hepática: problema no hepatócito. o Hipertransformação de testosterona em estrogênio - hiperestrogenismo - Ginecomastia - Atrofia testicular - Rarefação de pelos - Eritema palmar - Telangiectasias. o Coagulopatia o Hipoalbuminemia o Encefalopatia hepática o Sd. Hepatopulmonar: toxinas que passam pelo fígado para a circulação sistema atuam no endotélio e estimulam a proliferação de oxido nítrico, que faz vasodilatação nos capilares pulmonares. As hemácias que estiverem em mais contato com o alvéolo fazem a troca gasosa, as que não estão em contato não conseguem fazer essa troca, prejudicando a oxigenação. o Sd. Hepatorenal: pelo mesmo sistema de vasodialaçao, não chega sangue suficiente nos rins levando a insuficiência renal, podendo ainda causar ascite Hipertensão portal, acompanhada de um estado circulatório hiperdinâmico → o desenvolvimento de varizes e ascite é uma decorrência direta. Insuficiência hepática → icterícia → resulta da incapacidade do fígado de excretar a bilirrubina. A encefalopatia se origina tanto da hipertensão portal como da insuficiência hepática. A ascite, por sua vez, pode tornar-se complicada por infecção, quando então é denominada peritonite bacteriana espontânea e pela insuficiência renal funcional, que é chamada síndrome hepatorrenal. O estado circulatório hiperdinâmico eventualmente resulta na insuficiência cardíaca de alto débito com utilização periférica de oxigênio diminuída, uma complicação que tem sido descrita como cardiomiopatia cirrótica. A vasodilatação no nível da circulação pulmonar desencadeia hipoxemia arterial, a marca registrada da síndrome hepatopulmonar. Capilares pulmonares normais têm 8 μm de diâmetro e os glóbulos vermelhos (um pouco menos que 8 μm) passam através deles, uma célula por vez, facilitando, assim, a oxigenação. Na síndrome hepatopulmonar, os capilares pulmonares estão dilatados até cerca de 500 μm, de modo que a passagem dos eritrócitos pelos capilares pulmonares pode ter diâmetro superior ao de muitas células. Como resultado, um grande número de eritrócitos não está oxigenado, o que causa o equivalente a um desvio (shunt) direita-esquerda. De maneira contrária, a hipertensão portopulmonar ocorre quando o leito pulmonar é exposto a substâncias vasoconstritoras que podem ser produzidas na circulação esplâncnica e passar pelo metabolismo hepático; o resultado inicial é uma hipertensão pulmonar reversível. No entanto, como estes fatores resultam na proliferação endotelial, vasoconstrição, trombose in situ e obliteração dos vasos, segue-se uma hipertensão pulmonar irreversível. Diagnóstico Deve ser considerado em qualquer paciente com doença hepática crônica. Cirrose compensada e assintomáticos → sinais típicos de cirrose podem estar ausentes, e os exames físico e laboratoriais podem ser totalmente normais. Biópsia hepática → “padrão-ouro”. Julia Paris Malaco – UCT15 Forma não invasiva → combinação de biomarcadores séricos, técnicas de imagem e medições de rigidez hepática. Exame Físico Sinal de cirrose → atrofia muscular envolvendo principalmente as regiões musculares bitemporais e as eminências tenar e hipotenar; aranhas vasculares, mais habitualmente no tronco, face e membros superiores; e eritema palmar envolvendo as eminências tenar e hipotenar e as pontas dos dedos. ***Embora a atrofia muscular seja uma marca de insuficiência hepática, angiomas aracnóideos e eritema palmar são marcas de vasodilatação e circulação hiperdinâmica. Os homens podem ter perda de cabelo no peito e abdômen, ginecomastia e atrofia testicular. Petéquias e equimoses podem estar presentes como resultado da trombocitopenia ou tempo de protrombina prolongado. A contratura de Dupuytren, que é um espessamento da fáscia palmar, ocorre mais comumente na cirrose alcoólica. Uma característica patognomônica da cirrose é o achado no exame físico de um lobo hepático direito menor, com extensão de menos de 7 cm na percussão, e o lobo esquerdo palpável, nodular, com consistência mais densa. A esplenomegalia também pode estar presente e é indicativa de hipertensão portal. A circulação colateral na parede abdominal (caput medusae ou cabeça de medusa) também pode desenvolver-se como consequência da hipertensão portal. Estudo de Imagens Tomografia computadorizada, o ultrassom e a ressonância magnética. Achados compatíveis → contorno hepático nodular, fígado diminuído com ou sem hipertrofia do lobo caudado ou esquerdo, esplenomegalia e, em particular, a identificação de vasos colaterais intra- abdominais indicativos de hipertensão portal. Com o aumento da fibrose, o fígado torna-se rígido e esta rigidez pode ser medida por ultrassonografia (elastografia hepática transitória, imagem de impulso de força de radiação acústica) ou por ressonância magnética. achados típicos em qualquer desses estudos de imagem, juntamente com um quadro clínico compatível, são indicativos da presença de cirrose. Uma biópsia do fígado, então, não seria necessária, a menos que o grau de inflamação ou outras características requeiram investigação. Tratamento (todos) A abstinência completa do álcool constitui a base do tratamento da hepatopatia alcoólica. Maior sobrevida e um potencial para a reversão da lesão histológica independente da manifestação clínica inicial estão associados à cessação total da ingestão de álcool. O encaminhamento dos pacientes a conselheiros experientes e/ou a programas de tratamento relacionados com o álcool deve constituir uma rotina no tratamento dos pacientes com hepatopatia alcoólica. A atenção deve ser dirigida aos estados nutricional e psicossocial durante os períodos de avaliação e tratamento. Em razão de dados sugerindo que os mecanismos patogênicos na hepatite alcoólica envolvem a liberação das citocinas e a perpetuação da lesão por processos imunológicos, os glicocorticoides foram avaliados extensamente no tratamento da hepatitealcoólica. Os pacientes com hepatite alcoólica grave, definida por uma função discriminante de >32 ou por MELD >20, devem receber prednisona, 40 mg/dia, ou prednisolona, 32 mg/dia, durante 4 semanas seguidas por um período de redução progressiva dos esteróides. Os critérios de exclusão incluem hemorragia digestiva ativa, insuficiência renal ou pancreatite. As mulheres com encefalopatia devido à hepatite alcoólica grave podem ser particularmente boas candidatas aos glicocorticoides. Um escore de Lille >0,45 utiliza variáveis de pré- tratamento, mais a alteração da bilirrubina total no dia sete de administração de glicocorticoides para identificar pacientes que não respondem à terapia. O papel da expressão do TNF-α e da atividade dos receptores na lesão hepática alcoólica deu origem a um teste de inibição do TNF como alternativa aos glicocorticoides para a hepatite alcoólica grave. O inibidor inespecífico do TNF, pentoxifilina, demonstrou maior sobrevida no tratamento da hepatite alcoólica grave, primariamente pela redução na síndrome hepatorrenal. Os anticorpos monoclonais que neutralizam o TNF sérico não devem ser usados na hepatite alcoólica, pois estudos recentes relataram um maior número de mortes secundárias à infecção e insuficiência renal. Julia Paris Malaco – UCT15 O transplante hepático é uma indicação aceitável para tratamento em pacientes selecionados e motivados com cirrose em fase terminal. Os desfechos são iguais ou superiores em relação a outras indicações de transplante. Em geral, a condição de candidato a transplante deve ser reavaliada após um período definido de abstinência. Os pacientes que apresentam hepatite alcoólica têm sido geralmente excluídos de listas de transplante devido ao risco percebido de maior mortalidade cirúrgica e altas taxas de recidiva após o transplante. Recentemente, um grupo europeu multidisciplinar relatou excelentes desfechos clínicos a longo prazo em pacientes altamente selecionados com hepatite alcoólica florida. A aplicação generalizada de transplantes nesses pacientes ainda aguarda a confirmação dos desfechos de outros estudos. Fibrose hepática A fibrose hepática alcoólica pode ser definida como uma resposta de cicatrização às lesões hepáticas desencadeadas pelo abuso crônico de etanol e é caracterizada por uma deposição excessiva de matriz extracelular, contendo: glicoproteínas colágenos e proteoglicanos Como anteriormente referido, o etanol promove a fibrogênese tanto através do seu metabolito primário, o acetaldeído, assim como pelo desenvolvimento de ROS, que ao originar stress oxidativo ativa as células de Kupffer, aumentando a produção de citocinas pró-inflamatórias e consequente ocorre a ativação das células estreladas hepáticas. Nesta sequência, as células hepáticas estreladas, localizadas no espaço de Disse, e quando ativadas, proliferam-se e adquirem as características de miofibroblastos Neste contexto, a deposição excessiva da matriz extracelular é resultante do desequilíbrio entre a fibrogênese e a fibrólise no fígado, sendo que a deposição de matriz extracelular passa a ser maior que a sua remoção, principalmente a nível de colagénio tipo I e II, mas também proteoglicanos e glicoproteínas. Em condições normais, o metabolismo da matriz extracelular é realizado por metaloproteinases (MMPS), que são produzidos pelas células estreladas hepáticas e células de Kupffer. Estas enzimas e os seus inibidores específicos (TIMPsinibidores tissulares de metaloproteínases), garantem o equilíbrio na remodelação da matriz extracelular, uma vez que estão envolvidas na degradação das proteínas da matriz, nomeadamente o colagénio I, o principal tipo presente no fígado fibrótico Porém, estas enzimas são reguladas por inibidores fisiológicos, que estão atuantes no processo fibrótico e impedem a atividade dessas enzimas sobre o excesso de matriz, que por sua vez não é degradada e se acumula, resultando em fibrose hepática Deste modo, a ativação de células estreladas hepáticas em resposta à lesão hepática, ocorre em duas etapas: a iniciação e a perpetuação A iniciação é provocada por estímulos solúveis, que incluem ROS, resultante do stress oxidativo, assim como por lipopolissacarídeos, células de Kupffer, hepatócitos, células endoteliais sinusoidais, leucócitos, plaquetas e corpos apoptóticos circulantes A perpetuação que se segue é caracterizada por um certo número de alterações fenotípicas específicas, incluindo proliferação, fibrinogênio, contratilidade, degradação da matriz extracelular, quimiotaxia e sinalização inflamatória Cabe ressaltar que inicialmente na doença hepática alcoólica, o excesso de matriz extracelular, isto é, a lesão fibrótica inicia-se na zona III do lóbulo hepático com fibrose perivenular que acomete a veia centrolobular. No entanto, posteriormente ocorre a evolução para fibrose septal, ocorrendo ligação entre as veias centrolobulares e os espaços portais, com consequente formação de septos fibrosos Além disso, a transformação das células estreladas em miofibroblastos e consequente desorganização da arquitetura parenquimatosa, também origina o aumento da resistência vascular, pois ocorre a ativação de substâncias vasoconstritoras, o que constringe os canais vasculares, resultando na resistência portal aumentada A progressão da fibrose hepática leva à cirrose, podendo ocorrer descompensação desta, com consequente hipertensão portal, e em última análise, insuficiência hepática Encefalopatia hepática A encefalopatia hepática (EH) compreende um amplo espectro de distúrbios neurológicos ou neuropsiquiátricos associados a insuficiência Julia Paris Malaco – UCT15 hepática aguda ou crônica, ocorrendo também em pacientes submetidos a derivação portossistêmica na ausência de doença hepatocelular. O termo “encefalopatia hepática” é uma síndrome neuropsiquiátrica potencialmente reversível que pode surgir em pacientes portadores de hepatopatia crônica avançada ou na insuficiência hepática fulminante. A encefalopatia é causada pela passagem de substâncias tóxicas (provenientes do intestino) para o cérebro, que em uma pessoa normal seriam depuradas pelo fígado. A disfunção hepatocelular grave é um elemento primordial para o desenvolvimento da síndrome, porém, na cirrose hepática avançada, um outro fator deve ser considerado: a hipertensão portal, que desvia o sangue mesentérico para a circulação sistêmica ‘bypassando' os sinusóides hepáticos. Por isso a expressão tão frequentemente usada - encefalopatia porto-sistêmica. Uma das substâncias mais implicadas na gênese da encefalopatia hepática é a amônia (NH)! As principais fontes de amônia intestinal são: enterócitos - metabolismo do aminoácido glutamina Bactérias colônicas - catabolismo de proteínas alimentares e da uréia secretada no lúmen intestinal. É importante ressaltar que o fígado normal depura quase toda a amônia presente no sistema porta. Os hepatócitos transformam esse composto de alta toxicidade no aminoácido glutamina ou numa substância bem menos tóxica para o organismo - a uréia. Existem inúmeros fatores supostamente incriminados na gênese da encefalopatia hepática. Em primeiro lugar, a natureza ‘metabólica' da disfunção cerebral é revelada pela sua reversibilidade (pelo menos parcial) e pela ausência de alterações neuropatológicas orgânicas que, por si só, poderiam explicar a síndrome. Apesar desse conceito irrefutável, a encefalopatia hepática crônica pode, de fato, produzir alterações orgânicas degenerativas no cérebro que provavelmente são consequências (e não causas) do processo patológico. A principal alteração descrita consiste nas mudanças morfológicase funcionais dos astrócitos do tipo II decorrente de edema celular. Surge, nesses casos, degeneração de células nervosas e de fibras axonais do cérebro, cerebelo e medula espinhal, com áreas de cavitação microscópicas, conferindo a aparência esponjosa. Para esse tipo de alteração patológica, emprega-se o termo 'degeneração hepato cerebral adquirida'. A hiperamonemia é um achado quase universal na insuficiência hepática grave. A amônia é uma importante neurotoxina e provavelmente o mais importante 'vilão' da encefalopatia hepática. Outras neurotoxinas, como os mercaptanos e os ácidos graxos de cadeia curta, potencializam o efeito neurotóxico da amônia. Alguns efeitos da amônia no metabolismo cerebral: Aumenta a captação de aminoácidos aromáticos pela barreira hematoencefálica Aumenta a osmolaridade das células gliais (astrócitos), fazendo com que estas células se tornam edemaciadas - edema cerebral do tipo celular Inibe a atividade elétrica neuronal pós- sinaptica. Os aminoácidos aromáticos dão origem aos neurotransmissores inibitórios do tipo serotonina e aos falsos neurotransmissores (octopamina, feniletanolamina), caracteristicamente aumentados na encefalopatia hepática. Um ponto importante da patogênese da encefalopatia hepática é a hiperatividade do sistema neutrotransmissor GABAérgico. O GABA (ácido gamaaminobutírico) é um neurotransmissor inibitório cujo receptor pós-sinaptico pode ser estimulado pelos benzidiazepínicos e barbitúricos. De alguma forma as neurotoxinas e outros fatores aumentam a atividade desse sistema. Um fato curioso: foram identificados benzodiazepinas endógenas que se acumulariam em pacientes com encefalopatia hepática. Isso explica o porquê de alguns pacientes obterem melhora dos sintomas com o flumazenil – um antagonista benzodiazepínico. Ascite Denomina-se ascite o acúmulo de líquido de origem patológica na cavidade abdominal (peritoneal). A ascite, em geral, é clinicamente detectável quando há acúmulo de, pelo menos, 500 mL. Os mecanismos são complexos e não completamente compreendidos. A patogenia da ascite envolve os seguintes mecanismos: Hipertensão sinusoidal O extravasamento de líquido ocorre nos sinusóides – Aumento de pressão sinusoidal (ocorre por hipertensão portal sinusoidais, pós-sinusoidais ou pós-hepáticas). A hipertensão sinusoidal altera as forças de Starling (baixa pressão oncótica em razão da hipoalbuminemia e aumento da pressão na veia Julia Paris Malaco – UCT15 porta) e impele o líquido para o espaço de Disse, de onde é removido pelos linfáticos hepáticos. *Líquido ascítico – flui para cápsula hepática e cai para cavidade peritoneal. Percolação da linfa hepática para a cavidade peritoneal – Aumento da formação de linfa hepática. O fluxo linfático normal no ducto torácico corresponde a aproximadamente 800 a 1.000 mL/dia. Com a cirrose, o fluxo linfático hepático pode atingir 20 L/dia, excedendo a capacidade do ducto torácico. A linfa hepática é rica em proteínas e pobre em triglicerídeos, o que explica a presença de proteína no líquido ascítico. Vasodilatação esplâncnica (induzida pelo óxido nítrico – potente dilatador) e circulação hiperdinâmica: Destacam-se 3 teorias que ocorrem sempre em determinado paciente, porém em momentos diferentes de sua doença: o Vasodilatação – Presente na fase pré- ascítica e importante em toda a evolução posterior. o “Overflow” (super-fluxo) – Importante nos primeiros meses do desenvolvimento da ascite. o “Underfill” (baixo enchimento) – Em pacientes com vários meses de ascite. Nas fases iniciais da cirrose hepática há vasodilatação periférica e retenção renal de água e sódio. A vasodilatação arterial na circulação esplâncnica tende a reduzir a pressão arterial. A seguir ocorre “overflow” (super-fluxo) e escape de fluido para a cavidade peritoneal (vindo principalmente da superfície hepática). Com o agravamento da vasodilatação, a frequência cardíaca e o débito cardíaco não conseguem manter a pressão arterial. Depois que a ascite começa a se formar e piora a vasodilatação periférica, o “underfill” (baixo enchimento) passa a assumir papel relevante, com queda do volume efetivo circulante (hipovolemia relativa – a quantidade de sangue é mesma, mas os vasos estão dilatados). Para compensar essa hipovolemia relativa, ocorre a ativação permanente dos sistemas vasoconstritores, incluindo o sistema renina- angiotensina-aldosterona (retenção renal de Na+/H2O), aumenta a secreção do hormônio antidiurético, levando à retenção contínua de água e sódio pelos rins e ativação do Sistema nervoso simpático, que aumenta o débito cardíaco. A saturação da capacidade de drenagem linfática abdominal, e principalmente a limitação da drenagem linfática hepática, contribuem para o acúmulo final de líquido na cavidade peritoneal. Portanto, a combinação de hipertensão portal, vasodilatação e retenção de sódio e água aumenta a pressão de perfusão dos capilares intersticiais, causando o extravasamento de líquido para a cavidade abdominal. O conceito mais moderno sugere que as 3 teorias estão presentes no mesmo paciente com cirrose, dependendo do tempo de evolução de sua doença. Desta forma, diante de um paciente com ascite, podemos especular qual o mecanismo atuante de forma predominante em um determinado momento. Se a história obtida for de ascite de recente começo (até 1 a 2 meses) provavelmente a vasodilatação estará presente e o “overflow” predomina. Um paciente com ascite de longa duração (4 a 6 meses) terá grau mais acentuado de vasodilatação periférica com predomínio do “underfill”. Resumindo: Os fatores são a vasodilatação esplâncnica induzida pelo óxido nítrico, as alterações das forças de Starling nos vasos do sistema porta (baixa pressão oncótica em razão da hipoalbuminemia, além do aumento da pressão na veia porta), avidez renal pela retenção de sódio (a concentração urinária de sódio é tipicamente < 5 mEq/L) e possivelmente aumento da formação de linfa hepática. A vasodilatação do sistema arterial esplâncnico pode ser o fator desencadeador, mas o papel específico e a inter-relação desses fatores ainda permanecem desconhecidos. Além da hipertensão portal, a hipervolemia contribui para o mecanismo da ascite. Pode ser manifestação clínica de várias doenças hepáticas ou do próprio peritônio. Cirrose hepática (1ª maior causa – 75%); Neoplasias – Ascite associada a malignidade (2ª maior causa – 10%) Carcinomatose peritoneal; Metástases hepáticas; Obstrução linfática pelas células tumorais; Insuficiência cardíaca (3ª maior causa – 3%); Infecções peritoneais – Tuberculose peritoneal (4ª maior causa – 2%), fúngicas; Julia Paris Malaco – UCT15 Hipoalbuminemia – Síndrome nefrótica, desnutrição grave; Outras – Insuficiência renal, pancreatite, mixedemia. Ascite e cirrose: A doença mais associada com ascite é a cirrose hepática → Em 85% dos casos, a ascite é causada por cirrose. Aproximadamente 50% dos pacientes com cirrose irão desenvolver ascite em um período de 10 anos de observação. O surgimento da ascite marca a transição da fase compensada para a fase descompensada. Uma vez que a doença se desenvolva, a mortalidade esperada em 2 anos é de 50%, e em 1 ano é de 20%. Diagnóstico O exame físico é pouco sensível para detectar ascite. Geralmente, os pacientes precisam ter aproximadamente 1.500 mL de líquido para que o exame possa detectar ascite com acurácia. Pode-se observar ao exame físico: Macicez nos flancos/ Macicez móvel: O líquido ascítico encontra-se livre na cavidade peritoneal. Para verificar se há macicez móvel, posiciona-se o paciente em decúbito lateral e percute-seo flanco sobre o qual ele está apoiado, obtém-se um som maciço, a seguir, sem retirar o dedo do local, solicita-se que o paciente vire apoiando-se no decúbito contralateral e realiza-se nova percussão, obtém-se o som timpânico. Semicírculos de Skoda: O líquido ascítico ocupa as áreas de declive do abdome, em hipogástrio e flancos, ao se percutir o abdome a partir do andar superior, delimita-se uma linha circular na transição entre o timpanismo e macicez das áreas de maior declive, a concavidade estará voltada para a região epigástrica, fazendo diagnóstico diferencial com cisto gigante de ovário, que tem sua concavidade voltada para o púbis. Sinal do piparote: Posiciona-se uma das mãos em um dos flancos, no lado oposto posicionar a ponta do dedo médio, dobrado, apoiado e tensionado contra o polegar, disparar contra o flanco contralateral; o abalo irá produzir uma onda de choque que será transmitido no líquido ascítico, sendo percebido pela palma da mão no flanco oposto. Sinal da poça: O paciente fica na posição genopeitoral por alguns minutos, assim o líquido se acumula pela gravidade. Percutir a área umbilical para observar um som maciço e determinar a presença do líquido. Resumindo a clínica Aumento do peso; Aumento do volume abdominal; Edema de mmii; Julia Paris Malaco – UCT15 Bolsa escrotal; Hérnias umbilical e inguinal; Circulação colateral no abdome; Desconforto respiratório Desconforto ou dor abdominal; Desconforto respiratório; Eritema palmar; Telangiectasias/ “Aranha vascular” (vasos muito finos na superfície da pele - microvasos ou vasinhos); Fenômenos hemorrágicos; Ginecomastia; Pelos escassos; Cullen + Grey turner. Sinais de outras doenças que possam levar a ascite também devem ser pesquisados, principalmente sinais de insuficiência cardíaca, câncer, tuberculose, insuficiência renal e doença pancreática, que são as causas mais comuns de ascite após a cirrose. Várias outras condições, tais como cisto ovariano, hidronefrose e cistos renais, podem simular uma ascite. Resumindo exame físico Sinais indicativos na palpação + percussão Abaulamento do flanco Macicez no flanco Macicez móvel Sinal do piparote Sinal da poça Semicírculo de Skoda Confirmada a ascite, sua etiologia deve ser determinada por paracentese, um procedimento realizado à beira do leito no qual uma agulha ou cateter pequeno é introduzido por via transcutânea para extrair líquido ascítico da cavidade peritoneal. Os quadrantes inferiores são os locais mais frequentemente puncionados. Dá-se preferência ao quadrante inferior esquerdo em razão da maior profundidade da ascite e da menor espessura da parede abdominal. A paracentese é um procedimento seguro mesmo em pacientes com coagulopatia; as complicações, incluindo hematoma de parede abdominal, hipotensão, síndrome hepatorrenal e infecção, são raras. Uma vez obtido o líquido ascítico, deve-se examinar seu aspecto macroscópico. A presença de infecção ou de células tumorais resulta em turbidez do líquido. Líquido branco leitoso indica triglicerídeos em níveis > 200 mg/dL (frequentemente > 1.000 mg/dL), a marca registrada da ascite quilosa. A ascite quilosa é causada por rompimento de vasos linfáticos que pode ocorrer em razão de traumatismo, cirrose, tumor, tuberculose ou determinadas malformações congênitas. Líquido marrom-escuro indica concentração elevada de bilirrubina e perfuração do trato biliar. Líquido negro indica necrose pancreática ou melanoma metastático. O líquido ascítico deve ser enviado para dosagem de albumina e das proteínas totais, contagem global e diferencial de células e, se houver suspeita de infecção, bacterioscopia por Gram e cultura, com inoculação em meio de hemocultura à beira do leito para aumentar o índice de positividade. Além disso, o nível sérico de albumina deve ser dosado simultaneamente para permitir o cálculo do gradiente de albumina soro- ascite (GASA). O GASA é útil para distinguir a ascite causada por hipertensão portal daquela sem hipertensão portal. O GASA reflete a pressão dentro dos sinusoides e está correlacionado com o gradiente pressórico venoso hepático. O GASA é calculado subtraindo-se a concentração de albumina no líquido ascítico do nível sérico de albumina, e não se altera com a diurese. O GASA ≥ 1,1 g/dL reflete a presença de hipertensão portal e indica que a ascite é causada por aumento da pressão nos sinusoides hepáticos. De acordo com a lei de Starling, a elevação do GASA reflete a pressão oncótica que contrabalança a pressão porta. Entre as possíveis causas estão cirrose, ascite cardíaca, trombose de veia hepática (síndrome de Budd-Chiari), síndrome da obstrução de sinusoides (doença veno-oclusiva) ou metástase hepática massiva. Um GASA < 1,1 g/dL indica que a ascite não está relacionada com hipertensão portal, como ocorre na peritonite tuberculosa, carcinomatose peritoneal ou ascite pancreática. Para as ascites com elevação do GASA (≥ 1,1), o nível de proteína no líquido ascítico dá novas pistas sobre a etiologia. Níveis de proteína no líquido ascítico ≥ 2,5 g/dL indicam que os sinusoides hepáticos estão normais e permitem a passagem de proteína para o líquido, como ocorre na ascite cardíaca, na fase inicial da Julia Paris Malaco – UCT15 síndrome de Budd-Chiari ou na síndrome de obstrução dos sinusoides. Níveis de proteína no líquido ascítico < 2,5 g/dL indicam que os sinusoides hepáticos foram lesados e cicatrizaram e não permitem mais a passagem de proteína, como ocorre nos casos de cirrose, fase tardia da síndrome de Budd-Chiari ou metástase hepática maciça. O peptídeo natriurético cerebral (BNP) é um hormônio natriurético liberado pelo coração como resultado do aumento de volume e estiramento da parede do ventrículo. A elevação dos níveis de BNP no soro ocorre nos pacientes com insuficiência cardíaca e pode ser usado para identificar a insuficiência cardíaca como causa da ascite com elevação do GASA. Outros exames só estão indicados em circunstâncias clínicas específicas. Quando houver suspeita de peritonite secundária à perfuração de víscera oca, pode-se solicitar a dosagem de glicose e lactato desidrogenase (LDH) no líquido ascítico. Diferentemente do que ocorre com a peritonite bacteriana “espontânea”, uma possível complicação da ascite cirrótica, a peritonite secundária é sugerida pelas presenças no líquido ascítico de nível de glicose < 50 mg/dL, LDH acima do nível sérico e crescimento de múltiplos patógenos na cultura. Quando houver suspeita de ascite pancreática, deve-se solicitar a dosagem da amilase no líquido ascítico que caracteristicamente deve estar > 1.000 mg/dL. A citologia pode ser útil para o diagnóstico de carcinomatose peritoneal. No mínimo 50 mL de líquido devem ser obtidos e enviados para processamento imediato. A peritonite tuberculosa característicamente está associada à linfocitose no líquido ascítico, mas pode ser difícil de diagnosticar com paracentese. O esfregaço para bacilo álcool-ácido-resistente tem sensibilidade diagnóstica de apenas 0-3%; a cultura aumenta a sensibilidade para 35- 50%. Em pacientes sem cirrose, níveis elevados de adenosina deaminase no líquido ascítico apresentam sensibilidade > 90% quando se utiliza valor de corte de 30-45 U/L. Quando a causa da ascite não é esclarecida, o padrão-ouro continua sendo laparotomia ou laparoscopia com biópsias peritoneais para exame histológico e cultura. Gradiente de albumina soro-ascite(GASA). Análise do líquido ascético: Além da história e do exame físico, a análise do líquido ascítico é a melhor ferramenta para definição diagnóstica dos casos de ascite. Existe um aforismo médico que recomenda: “Toda ascite de recente começo ou de recente piora deve ser puncionada”. Paracentese Coleta do material para análise; Alívio dos sintomas compreensivos. A paracentese abdominal para análise do líquido ascítico é a forma mais eficiente para confirmar a presença de ascite, diagnosticar sua causa e determinar se o líquido está infectado. Locais de punção Fossas ilíacas Linha mediana do hipogástrico Complicações < 1% O melhor local de punção foi definido em um estudo baseado no ultrassom de abdome. Neste estudo, o quadrante inferior esquerdo se mostrou superior em relação à linha mediana, por ser a parede abdominal mais fina nesse local, e a profundidade do líquido ser maior. Após a observação simples do líquido, devemos enviá-lo para análise em laboratório. Julia Paris Malaco – UCT15 A contagem celular e o gradiente soro-ascite de albumina (GSAA) são testes obrigatórios. Citometria com contagem diferencial → >250 polimorfonucleares = peritonite bacteriana espontânea. Culturas: O gram e a cultura geral do líquido ascítico são indicados se infecção é suspeita. O líquido pode conter um número escasso de células mesoteliais e leucócitos mononucleares. O influxo de neutrófilos sugere infecção, enquanto a presença de células sanguíneas aponta para um possível câncer intra-abdominal disseminado. Gradiente albumina sérica e albumina do liquido ascítico (GASA) → >1,1 = Transudato (causa extraperitoneal – ex- hipertensão portal) <1,1 = Exsudato (causa peritoneal – ex- neoplasia, tuberculose). Hipertensão portal (transudato); Doença do peritônio (exsudato). O líquido geralmente é seroso, apresentando menos de 3 g/dL de proteína (albumina) e um gradiente de albumina entre o soro e a ascite ≥ 1,1 g/dL. Albumina plasmática – Albumina do líquido ascético: O soro deve ser coletado logo antes ou logo depois da coleta do líquido ascítico. Na ascite de longa duração, o vazamento do líquido peritoneal pelos linfáticos transdiafragmáticos pode produzir hidrotórax, mais frequentemente do lado direito. Hemoperitônio – Sangue na cavidade; Pioperitônio – Pus na cavidade. Exames laboratoriais eventuais DHL Glicose Amilase Bilirrubinas Triglicerídeos Citologia oncótica Só devem ser feitos quando não for evidente o diagnóstico de ascite por cirrose hepática. Outros testes devem ser feitos apenas com a suspeita do diagnóstico de determinadas doenças. Hipertensão portal A hipertensão portal é definida como a elevação do gradiente de pressão venosa hepática (GPVH) para >5 mmHg. A hipertensão portal é causada por uma combinação de dois processos hemodinâmicos que ocorrem de forma simultânea: 1. Resistência intra-hepática aumentada à passagem do fluxo sanguíneo pelo fígado em função da cirrose e dos nódulos regenerativos; 2. Fluxo sanguíneo esplâncnico aumentado secundário à vasodilatação dentro do leito vascular esplâncnico. A hipertensão portal é diretamente responsável pelas duas principais complicações da cirrose, a hemorragia por varizes e a ascite. A hemorragia por varizes é um problema imediato e ameaçador com taxa de mortalidade associada de 20 a 30% a cada episódio de sangramento. O sistema venoso portal drena normalmente o sangue proveniente do estômago, dos intestinos, do baço, do pâncreas e da vesícula biliar, com a veia portal sendo formada pela confluência das veias mesentérica superior e esplênica. O sangue desoxigenado proveniente do intestino delgado drena para dentro da veia mesentérica superior junto. Com o sangue proveniente da cabeça do pâncreas, do cólon ascendente e de parte do cólon transverso. Inversamente, a veia esplênica drena o baço e o pâncreas e se conecta com a veia mesentérica inferior, que traz sangue proveniente dos cólons transverso e descendente assim como dos dois terços superiores do reto. Assim sendo, a veia portal recebe normalmente sangue proveniente de quase todo o trato GI. Na cirrose, a hipertensão portal resulta tanto do aumento da resistência do fluxo portal quanto da elevação do influxo venoso portal. O mecanismo inicial é o aumento da resistência vascular sinusoidal secundária para Julia Paris Malaco – UCT15 1. Deposição de tecido fibroso e subsequente compressão pelos nódulos regenerativos (componente fixo) que poderia, teoricamente, ser elegível para tratamento com agentes antifibróticos e, eventualmente, ser melhorada com a resolução do processo etiológico subjacente; 2. Vasoconstrição ativa (componente funcional), que responde à ação de drogas vasodilatadoras como o nitroprussiato, e é causada pela deficiência de óxido nítrico (NO), bem como pela atividade aumentada dos vasoconstritores. Inicialmente, no processo hipertensivo portal, o baço cresce e sequestra plaquetas e outras células sanguíneas, o que leva ao desenvolvimento de hiperesplenismo. Além disso, os vasos que normalmente drenam para o sistema portal, como a veia gástrica esquerda, revertem seu fluxo e, assim, ocorre um desvio do sangue do sistema portal para a circulação sistêmica. Essas vias colaterais portossistêmicas são insuficientes para descomprimir o sistema venoso portal e oferecem resistência adicional ao fluxo portal. À medida que os colaterais se desenvolvem, um aumento no fluxo sanguíneo portal, que resulta da vasodilatação esplâncnica, mantém o estado hipertensivo. A vasodilatação arteriolar esplâncnica, por sua vez, é secundária ao aumento na produção de NO. Assim, o paradoxo na hipertensão portal é que a deficiência de NO na vasculatura intra-hepática desencadeia vasoconstrição e resistência aumentada, enquanto a superprodução de NO na circulação extra-hepática leva à vasodilatação e ao fluxo portal aumentado. Além da vasodilatação esplâncnica, existe a vasodilatação sistêmica, que, por causar decréscimo no volume arterial efetivo, desencadeia a ativação do sistema neuro- humoral (sistema renina-angiotensina- aldosterona), retenção de sódio, expansão do volume de plasma e o desenvolvimento de um estado circulatório hiperdinâmico. Esse estado circulatório hiperdinâmico mantém a hipertensão portal, levando à formação e ao crescimento de varizes e desempenha um papel importante no desenvolvimento de todas as complicações da cirrose. Quadro clínico As três complicações principais da hipertensão portal são varizes gastroesofágicas com hemorragia, ascite e hiperesplenismo. Desse modo, os pacientes podem apresentar-se com hemorragia digestiva alta que, ao exame endoscópico, demonstra ser decorrente de varizes esofágicas ou gástricas; ascite com edema periférico; ou baço aumentado de volume com redução associada das plaquetas e dos leucócitos nos exames laboratoriais de rotina. Varizes esofágicas: A hipertensão portal é uma complicação de evolução progressiva da cirrose hepática, sua consequência direta é a formação de varizes esofágicas, com risco de hemorragia digestiva alta e sangramento. O sangramento por varizes esofágicas é uma complicação potencialmente letal da cirrose, principalmente em pacientes que apresentam outras complicações clínicas da cirrose como icterícia ou episódios prévios de hemorragia varicosa. Varizes gastroesofágicas são uma consequência direta da hipertensão portal que na cirrose é uma consequência tanto do aumento da resistência ao fluxo portal quanto do aumento do influxode sangue venoso portal. Ocorre um aumento da resistência estrutural, que ocorre pela distorção da arquitetura hepática por fibrose e regeneração nodular e também por conta do aumento do tônus vascular devido à disfunção endotelial e diminuição da biodisponibilidade do óxido nítrico. Quando o gradiente de pressão portal aumenta acima de certo limiar, podem ocorrer shunts de comunicação entre as circulações portal e sistêmica. Esse processo é modulado por fatores angiogênicos concomitantemente com a formação de colaterais portossistêmicos, portal- venoso, aumentos de influxo de sangue como resultado da vasodilatação esplâncnica e aumento do débito cardíaco levando à formação de varizes. O crescimento das varizes é influenciado pelo aumento de pressão e fluxo da circulação portal, pois com esses aumentos elas crescem e aumentam o seu risco de ruptura. A formação de varizes esofágicas leva à descompressão do sistema porta, transportando o sangue para a circulação sistêmica, o gradiente venoso portal normal é de 1 a 5 mmHg, quando o gradiente de pressão venosa portal ultrapassa 10 mmHg pode ocorrer a formação de varizes esofágicas. Julia Paris Malaco – UCT15 Hemorragia digestiva A hemorragia digestiva engloba qualquer sangramento que ocorra no trato gastrointestinal. É classificada entre hemorragia digestiva alta e hemorragia digestiva baixa conforme a sua localização em relação ao ligamento de Treitz Hemorragia digestiva alta Quando os locais do sangramento são o esôfago, o estômago ou o duodeno. A hemorragia digestiva alta inclui a presença de sangue já digerido pelo estômago, o que, normalmente, deixa as fezes mais escuras e com um cheiro intenso. Os sintomas da hemorragia digestiva alta incluem: Vômito com sangue ou coágulos de sangue; Fezes pretas, pegajosas e muito mal cheirosas; Cerca de 20% dos casos estão associadas a hipertensão portal e > 90% são por ruptura das varizes esofagogástricas. Em < 5%, a gastropatia hipertensiva portal é a causa. A hemorragia digestiva alta (HDA) é definida como um sangramento decorrente de uma lesão proximal ao ligamento de Treitz, envolvendo o esôfago, estômago ou duodeno. Causas mais comuns: As lesões agudas erosivas da mucosa gastroduodenal Doença ulcerosa péptica Também se observa sangramento secundário à rotura de varizes gastroesofágicas. A esofagite erosiva, a lesão de Mallory-Weiss (laceração hemorrágica da transição esofagogástrica induzida por esforços de vômito), a gastropatia congestiva, ectasia vascular antral e a lesão de Dieulafoi (exulceratio simplex) são responsáveis por menos de 10% das causas de HDA Causas: Úlcera gástrica; Úlcera duodenal; Varizes esofagogástricas; Câncer no esôfago, estômago ou duodeno; Perfuração do esôfago, estômago ou duodeno. A hemorragia do trato gastrintestinal superior pode ser leve ou grave, mas sempre deve ser considerada um sinal que merece investigação meticulosa. O sangramento é a complicação grave mais comum de úlcera péptica, hipertensão porta e gastrite, e esses quadros considerados em conjunto respondem pela maioria dos episódios de sangramento de úlcera do trato gastrintestinal superior na população média de pacientes hospitalizados. Hemorragia digestiva baixa Quando o sangramento ocorre no intestino delgado, grosso ou reto. Geralmente, os sintomas da hemorragia digestiva baixa incluem a presença de sangue vivo nas fezes. Os sintomas da hemorragia digestiva baixa podem ser: Fezes pretas, pegajosas e muito mal cheirosas; Sangue vermelho vivo nas fezes Causas: Hemorróidas; Fissura anal; Pólipo intestinal; Doença de Crohn; Diverticulose; Câncer no intestino; Perfuração do intestino; Endometriose intestinal. Hematêmese ou melena está presente, exceto quando a taxa de perda sanguínea for mínima. A hematêmese com sangue vermelho-vivo ou escuro indica que a origem é proximal ao ligamento de Treitz; isso é mais comum nos sangramentos com origem no estômago ou no esôfago. Em geral, a hematêmese denota lesão de sangramento mais rápido, e alta porcentagem dos pacientes que vomita sangue requer cirurgia. O vômito em borra de café significa sangue que se manteve por tempo suficiente no estômago para que a hemoglobina fosse convertida a meta- hemoglobina. A maioria dos pacientes com melena (evacuação de fezes negras como piche) tem sangramento no trato gastrintestinal superior, mas é possível haver melena por sangue entrando no sistema em qualquer ponto desde a boca até o ceco. A conversão de sangue vivo para negro depende mais do tempo de permanência no intestino do que do sítio de origem. A cor negra da melena provavelmente é causada pela hematina, produto da oxidação da heme por enzimas intestinais e bacterianas. Pode-se produzir melena com volumes de sangue de apenas 50 ou 100 mL no estômago. Quando 1 L de sangue foi instilado no intestino proximal de indivíduos em laboratório, a melena persistiu por 3 a 5 dias, o que mostra que a mudança no aspecto das fezes é um indicador pouco fiel do momento em que o sangramento cessa após um episódio de hemorragia. Julia Paris Malaco – UCT15 Define-se hematoquezia como eliminação de sangue vivo pelo reto. Sangue vivo retal pode ser causado por sangramento no colo, no reto ou no ânus. Entretanto, se o trânsito intestinal for acelerado durante sangramento brusco no intestino proximal, o sangue vivo pode ser eliminado inalterado nas fezes. Manifestações clínicas: hematêmese (vômito de sangue ou material semelhante a borra de café) ou melena (fezes escuras, pretas). Por vezes, no entanto, a hematoquezia (passagem de sangue ou coágulo pelo reto) pode ser a única manifestação de úlcera hemorrágica, e cerca de 15% de todos os pacientes que apresentam hematoquezia têm uma fonte GI superior. Causa mais comum: úlcera péptica. Outras causas são varizes esofagianas ou gástricas e esofagite erosiva. Outras condições clínicas tais como lacerações de Mallory-Weiss, ectasias vasculares, estômago de melancia, tumores e lesão de Dieulafoy ocorrem menos frequentemente do que a úlcera gástrica. Deve-se suspeitar de sangramento da úlcera péptica em pacientes que tomam ácido acetilsalicílico diariamente ou medicamentos anti- inflamatórios não esteroides (AINEs). É importante examinar a pele para verificar a presença de petéquias, púrpura, angiomas aracneiformes e eritema palmar, e o abdome para verificar a presença de ascite, hepatomegalia ou esplenomegalia, que podem indicar hipertensão portal. Sensibilidade ou massa podem indicar tumor intra-abdominal. A baixa contagem de plaquetas sugere doença hepática crônica, diluição, reação ao medicamento ou distúrbio hematológico. No sangramento GI superior, o nível de ureia sanguínea normalmente aumenta mais do que o nível de creatinina devido à incrementação da absorção intestinal de ureia após a quebra das proteínas do sangue. No entanto, este fenômeno pode ser enganoso no quadro de insuficiência renal ou trânsito intestinal rápido. Tratamento clínico Ácido acetilsalicílico e outros AINEs devem ser descontinuados em pacientes com úlceras pépticas hemorrágicas, a menos que haja contraindicação para tal (p. ex., profilaxia secundária para acidente vascular cerebral). Os inibidores da bomba de prótons são o eixo do tratamento clínico para a hemostasia e cicatrização de lesões pépticas. A supressão de ácidos pode promover agregação plaquetária e formação de coágulo e, ainda, reduzir o risco de ressangramento. Inibidores da bomba de prótons intravenosos em altas doses (bólus, seguido de infusão contínua [como pantoprazol, 80 mg, seguido
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