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Pró-reitoria de EaD e CCDD 1 Comunicação e Realidade Brasileira Aula 5 Prof.ª Máira Nunes Pró-reitoria de EaD e CCDD 2 Conversa Inicial Estudar o passado sempre nos ajuda a entender o presente. Isso vale também para fatos mais recentes, como os que vamos abordar aqui. As diferentes etapas do regime militar, o movimento das Diretas Já, o período de redemocratização, a Constituição de 1988, os governos que vieram depois dela, a influência das políticas neoliberais do período… tudo isso é fundamental para entendermos o Brasil de hoje, que ainda apresenta resquícios da ditadura em algumas políticas – mais ou menos da mesma forma que ainda há resquícios da época colonial, apesar de estas serem percebidas como menos diretas. Além desses assuntos, que tratamos de maneira cronológica, vamos abordar outras duas questões importantes: a do sertão nordestino e o seu desenvolvimento, e o envolvimento de organizações do governo para solucionar o problema das secas e todos os problemas sociais e políticos que delas decorrem; e também a história dos meios de comunicação no Brasil, com foco nas legislações que os regulamentam, e a disputa de poder entre as emissoras e o governo. Tema 1: O Regime Militar Os anos 1960 começavam com a renúncia do presidente Jânio Quadros. Seu vice, João Goulart – Jango –, dava continuidade a medidas vistas como ameaças para a elite industrial e para setores conservadores, e, exagerando, indicariam a ameaça de um golpe comunista. Jango pretendia fazer reformas de base para reduzir as desigualdades sociais – reforma bancária, eleitoral, educacional e agrária. Diante do receio das elites, foram tomadas estratégias para reduzir o poder de Jango, como a adoção, entre 1961 e 1962, do sistema parlamentarista, que atribuía ao Congresso, dominado por representantes das elites, funções do Poder Executivo. O presidente propôs reformas constitucionais que foram repudiadas, acelerando os processos do golpe. Foi Pró-reitoria de EaD e CCDD 3 no dia 31 de março de 1964 que, diante das tropas de São Paulo e Minas Gerais que saíram às ruas, João Goulart deixou o Brasil. No dia seguinte, o cargo de presidente, considerado vago, foi assumido por um general. Em 9 de abril, a junta militar editou o Ato Institucional n. 1, que outorgava a ela poderes como o de alterar a Constituição Federal. O AI-1 também determinava a eleição indireta para presidente: em 15 de abril de 1964, o general Castello Branco foi eleito presidente pelo Congresso Nacional. Em seu governo, por meio do AI-2, foi instituído o bipartidarismo: os únicos partidos legais eram a Aliança Renovadora Nacional – Arena, alinhada aos militares – e o Movimento Democrático Brasileiro – MDB, que cumpria o papel de oposição, mas controlado. Já logo após o golpe, começaram as perseguições a instituições que apoiavam Jango. A sede da União dos Estudantes Brasileiros foi incendiada, a Universidade de Brasília foi invadida, e foram destruídos materiais do jornal gaúcho Zero Hora, além de ocorrerem invasões a sindicatos. O Departamento de Ordem Política e Social (Dops), fundado na década de 1930, servia para reprimir os “subversivos” por meio de investigação, fichamentos e até tortura e assassinatos. A junta militar também criou o Serviço Nacional de Informações (SNI), para monitorar pessoas e organizações que eram contra o governo. O mandato de Castello Branco acabaria em 31 de janeiro de 1966, com novas eleições e a volta da democracia – o que futuros Atos Institucionais modificaram, protelando cada vez mais a volta da democracia. A princípio, o único a ser eleito indiretamente seria o presidente, mas o AI-3 determinava que os governadores também seriam eleitos dessa maneira, e que os prefeitos das capitais seriam indicados pelos governadores. Em vez de eleições democráticas, o Congresso, em outubro de 1966, elegeu o General Costa e Silva, que assumiu a presidência em março de 1967. Pouco antes de ele assumir, o AI-4 convocou o Congresso para elaborar uma nova Constituição, que foi criticada tanto no meio político como no militar. Diante de manifestações cada vez mais numerosas contra o governo militar, a Pró-reitoria de EaD e CCDD 4 junta militar editou, em 13 de dezembro de 1968, o AI-5, o mais conhecido dos Atos Institucionais, que ampliava os poderes presidenciais, permitindo inclusive o fechamento do poder legislativo. Também suspendia os direitos políticos e as garantias institucionais. Por exemplo, o artigo 10º suspendia o recurso de habeas corpus para casos considerados crimes políticos. O AI-5 é considerado marco de início do período mais repressivo da ditadura militar, conhecido como “Anos de chumbo”. Alguns associam esse período com o governo do General Emilio Médici, que assumiu a presidência em outubro de 1969. Ele assume a presidência no meio do “milagre econômico”, período durante o qual o crescimento anual do PIB chegou a 14%, à custa do aumento da dívida externa e de obras faraônicas, como a estrada Transamazônica. Todavia, esse “milagre” não colaborou para a redução da desigualdade social, que inclusive aumentou durante o período. Com exceção do milagre econômico e do tricampeonato de futebol conquistado pela seleção brasileira em 1970, havia pouco a ser comemorado. A censura a artistas, cinemas e jornais estava no auge. Para evitar ideias “subversivas” que questionassem as políticas da ditadura militar, vários cursos universitários foram fechados ou tiveram seus currículos adaptados. Até currículos escolares de educação infantil foram alterados. Qualquer tipo de manifestação e reunião considerada levemente subversiva era reprimido com violência, aproveitando-se da ausência de garantias do AI-5 para fichar, por exemplo, os pais que tentaram habeas corpus para os filhos presos em encontros estudantis – e, se os pais fossem funcionários públicos, perdiam o emprego. Artistas mais famosos tinham de se exilar, assim como os principais líderes da esquerda. Não havia o menor respeito aos Direitos Humanos, ocorrendo vários casos de tortura e assassinatos de presos políticos, suspeitos de serem “subversivos”. Algumas dessas pessoas continuam desaparecidas até hoje. O governo militar chegava a cometer atentados para culpar setores Pró-reitoria de EaD e CCDD 5 subversivos e justificar a ditadura. A censura, o financiamento externo e campanhas ufanistas – como o slogan “Brasil, ame-o ou deixe-o” – colaboravam para esconder os horrores da ditadura, como prisões, tortura, censura etc. A ditadura militar era mostrada nos meios de comunicação como um instrumento de ordem e progresso. Em março de 1974, o General Médici deixa a presidência, e quem assume é o General Ernesto Geisel. O “milagre econômico” estava chegando ao fim, inclusive devido a problemas como a alta do petróleo, ocasionado por uma guerra no Oriente Médio, os juros mais altos da dívida externa, e, mais tarde, a eleição do Presidente estadunidense Jimmy Carter, que não dava apoio irrestrito às ditaduras latino-americanas. A crise econômica afetava as pessoas de maneira geral, e particularmente os escalões mais baixos das forças militares. A estratégia do governo para contornar a crise econômica foi abrandar alguns aspectos da ditadura. O AI-5, porém, continuava valendo, assim como a repressão à subversão. Um momento importante ocorreu quando Geisel expurgou o Ministro do Exército, o General Sílvio Frota, pondo novamente o presidente “acima” dos ministros. Em outubro de 1978, o AI-5 foi revogado. Em 1979, o recém-empossado presidente, João Batista Figueiredo, lança a anistia, que acabava com o bipartidarismo e também revogava as cassações dos cassados pelo regime militar. A anistia também beneficiava os membros do governo acusados de tortura. O governo de Figueiredo foi marcadopela crise econômica mundial, que agravou a situação brasileira, causando uma queda abrupta no PIB. Também houve vários atentados a bomba por parte de militares “linha dura”. No início, visavam bancas de revistas nas quais eram distribuídas publicações de esquerda. Depois houve atentados a políticos e a alguns espaços públicos, sendo o mais conhecido o atentado ao Riocentro, em abril de 1981. O Riocentro era um local de eventos onde acontecia um show em comemoração ao dia do trabalhador; dois militares morreram quando a bomba que Pró-reitoria de EaD e CCDD 6 manipulavam explodiu. A intenção era explodir uma instalação elétrica, causando falta de energia, e atribuir os atentados a organizações de esquerda. Em 1982, como parte do plano de abertura política, houve eleições diretas para governador, senador e deputados, o que não acontecia desde os anos 1960. O descontentamento geral com a ditadura militar se fazia visível, e explodiu com a campanha “Diretas Já!”, que caracterizou o final da ditadura. Tema 2: A Redemocratização Em 1983, começou a campanha das Diretas Já, movimento que apoiava uma proposta de emenda constitucional que reinstauraria a eleição direta para o cargo de presidente. Ela era conhecida como Emenda Dante de Oliveira, nome do deputado que a propôs. Começou com uma manifestação em Abreu e Lima, região metropolitana do Recife, em março. Depois, houve um comício em Goiânia e um em Curitiba. Em 27 de novembro de 1983, em São Paulo, aconteceu a primeira manifestação que reunia o Partido dos Trabalhadores (PT), o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), o Partido Democrata Trabalhista (PDT), a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e outras organizações. No começo de 1984, o PMDB, particularmente Ulysses Guimarães, começou a apostar na campanha. Foi organizado um comício para dia 27 de janeiro de 1984, na Praça da Sé, o qual superou as expectativas de público e reuniu milhares de pessoas. Apesar das tentativas de repressão, o movimento tinha apoio de 85% da população. Segundo Boris Fausto (1995, p. 509), o apoio da população mostrava, por um lado, a dificuldade dos partidos para expressar as reivindicações das pessoas e, por outro, a confiança que estas tinham nas eleições diretas para solucionar os problemas do país – sendo que apenas a eleição direta para presidente não solucionaria problemas como inflação, baixos salários e segurança. As Diretas Já tinham apoio não só da população, mas também de muitos Pró-reitoria de EaD e CCDD 7 artistas e políticos. Era comum haver, nos comícios, algum espetáculo, geralmente da cantora Fafá de Belém, cuja interpretação do Hino Nacional durante esses eventos se tornou histórica. No comício de 10 de abril de 1984, ela fez com que o Deputado Dante de Oliveira, autor da emenda, subisse ao palco; ela disse aos policiais que ele era o percussionista da banda. Em 25 de abril de 1984, a emenda foi votada, sob grande pressão popular. O Presidente Figueiredo impôs o estado de emergência em Brasília, que contou com o General Newton Cruz montado em um cavalo branco chicoteando os automóveis que participavam de um “buzinaço” em favor das diretas. Apesar de tudo, a emenda não foi aprovada devido à ausência de quase um quarto dos deputados. Mesmo que tivesse sido aprovada, a aprovação no Senado parecia pouco provável. A disputa agora era no Colégio Eleitoral, formado por membros do Poder Legislativo federal e estadual, que era quem escolheria o sucessor do último presidente militar brasileiro. Apesar disso, entretanto, o movimento das Diretas Já não foi inútil e teve grande influência na política brasileira; várias das lideranças do movimento tiveram posições de destaque na composição da “nova” elite política. Entre os possíveis candidatos do Partido Democrático Social (PDS) – partido sucessor da Arena –, destacava-se Paulo Maluf, amigo do General Costa e Silva, que havia sido nomeado prefeito de São Paulo em 1969, mas que também tinha conquistado bons resultados nas urnas. Com a escolha de Maluf como candidato, outro pré-candidato, Aureliano Chaves, funda o que hoje é o Partido da Frente Liberal e se associa com o PMDB para as eleições. A chapa do PMDB era composta por Tancredo Neves com José Sarney como vice. O PMDB não era favorável a Sarney, que até recentemente tinha sido uma das figuras públicas do PDS e não tinha muito a ver com os ideais de redemocratização defendidos pelo PMDB. Em 15 de janeiro de 1985, Tancredo e Sarney ganharam a eleição por 480 votos a 180. Porém, Tancredo precisou ser internado, e quem subiu a Pró-reitoria de EaD e CCDD 8 rampa do Planalto foi Sarney, em 15 de março de 1985, situação transitória que se tornou definitiva em 21 de abril de 1985, com a morte, por infecção generalizada, de Tancredo. Multidões acompanharam o corpo, mostrando que Tancredo passava uma imagem de honestidade como político, e que, depois da ditadura, havia esperanças de que seu governo desse um jeito nos rumos do Brasil. Sarney começou seu governo respeitando algumas decisões de Tancredo, como o ministério. Ele também restabeleceu as eleições diretas para presidente e legalizou o Partido Comunista Brasileiro (PCB) e o Partido Comunista do Brasil (PCdoB). A censura prévia acabou. A ditadura militar deixou uma situação econômica complicada, com uma inflação muito alta. Sarney tentou paliar esses efeitos com o Plano Cruzado, que instituiu uma nova moeda, aumentou o salário mínimo e congelou os preços. Sarney apelava para que “brasileiras e brasileiros” fiscalizassem e denunciassem os supermercados que aumentassem os preços. Os efeitos do plano duraram pouco, e provocaram desabastecimento e novos planos, como o Cruzado II e o Bresser. Houve eleições diretas estaduais e municipais, com predominância do PMDB. Em fevereiro de 1987, começaram as reuniões da Assembleia Nacional Constituinte. A falta de planejamento fez com que os trabalhos demorassem; eles terminaram em 5 de outubro de 1988, com a promulgação da nova Constituição, vigente até hoje. Segundo Fausto (1995, p. 524), havia um anseio para que a Constituição, além de tratar de direitos dos cidadãos e de instituições, resolvesse problemas que estavam fora do seu alcance. A Constituição de 1988 recebeu críticas por abranger assuntos que supostamente não deveriam ser abordados por uma constituição, mas que foram incluídos para satisfazer demandas de diferentes grupos sociais. A Constituição determinava eleições diretas para presidente a serem realizadas em 1989, quase trinta anos depois da eleição de 1960, que elegeu Jânio Quadros. O ganhador da disputa, que assumiu em 1990, foi Fernando Pró-reitoria de EaD e CCDD 9 Collor, deposto em 1992 e atual senador por Alagoas. Tema 3: Geopolítica da Seca Ao longo de quatro séculos e meio, houve 72 secas no sertão nordestino; uma média de uma seca a cada seis anos. (Carvalho, 2012, p. 49) Otamar de Carvalho (2009, p. 7) cita uma das várias histórias que ele recolheu sobre a seca de 1877-1879, a do fazendeiro Pedro 100, assim apelidado por gostar de que seus rebanhos reunissem 100 animais com as mesmas cores e características. Diante da seca e da morte de seus rebanhos, Pedro 100 e a família partem para Fortaleza com a intenção de escapar da seca. O percurso, de mais de 60 léguas, foi complicado. Eles se alimentavam de raízes de plantas, várias pessoas da família morreram. Em Fortaleza, Pedro 100 compôs um pequeno poema para pedir esmola: “Uma esmola pra Pedro 100, que já teve e hoje não tem; se quiser dá, dê, se não quiser, não faço impém” Como se vê, o problema das secas no sertão nordestino é antigo. Estudadas já no século XIX, as secas nordestinas serviam para traçar uma região – o sertão. Na mesma época, já se procuravam soluções para o problema da seca. O primeiro projeto detransposição do Rio São Francisco, por exemplo, data de 1818, ou propostas de migração em massa para a Amazônia, surgidas até os anos 1940. (Oliveira, 2015b) Como espaço territorial, o Nordeste surgiu em 1942, quando o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) dividiu o Brasil em regiões – na época, a região Nordeste era composta por Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas. A proposta de nacionalismo do Estado Novo implicava a criação de identidades regionais, além de combater as oligarquias Pró-reitoria de EaD e CCDD 10 locais. Nas décadas de 1920 e 1930, autores como Gilberto Freire e romancistas como Raquel de Queirós e Graciliano Ramos colaboravam para a formação de uma identidade nordestina, descrevendo a vida no sertão. (Oliveira 2015b) A construção de narrativas sobre o Nordeste costuma mostrar a região com personagens como cangaceiros e jagunços, e também como um lugar atrasado em desenvolvimento, o que causa o êxodo para o Sudeste, tido como o lugar do desenvolvimento, do progresso. (Oliveira, 2015b) Enquanto no Brasil os primeiros planos de desenvolvimento industrial e de infraestrutura surgiram na década de 1940, o Nordeste só começou, de maneira sistemática, em 1959, com a criação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), o que aconteceu logo depois da seca de 1958, uma das tantas secas graves na região. Outro fator que estimulou sua criação foi a tentativa de controlar a apropriação por parte de latifundiários – coronéis – dos recursos destinados ao combate à seca. Denúncias de corrupção, funcionários fantasmas e construção de açudes em fazendas dos “coronéis” mostraram que era necessário um controle mais estrito do que o feito pelos órgãos anteriores à Sudene, que atuavam na região desde 1909. (Oliveira, 2015a) Segundo Otamar de Carvalho (2000), a Sudene teve capacidade para realizar estudos sobre a situação do Nordeste, que por sua parte permitiram que ela conseguisse planejar o desenvolvimento dessa região. Um ponto importante da Sudene foi conceber a seca não só como um problema meteorológico, e sim como um problema social. (Carvalho, 2012, p. 56) Segundo Carvalho, há três tipos de seca: a meteorológica – poucas ou nenhuma chuva –, a agrícola – solos secos, o que impede o crescimento das plantas, e a seca hidrológica, que é a diminuição da vazão dos rios e da água armazenada em reservatórios. É a partir desses fatores que surge a seca enquanto problema social. Mais recentemente, a preocupação é com a desertificação dessas Pró-reitoria de EaD e CCDD 11 regiões em virtude de mudanças climáticas globais. (Carvalho, 2012, p. 63) No contexto social, a preocupação é com a população desses lugares, a qual não pode se beneficiar de programas de estímulo ao desenvolvimento pela simples falta de recursos para poder empreender algum tipo de atividade. Um paliativo são os programas de redistribuição de renda, como o Bolsa Família, que garante a sobrevivência dessas pessoas. O impacto social da seca se manifesta de diferentes maneiras. Problemas de saúde pela falta de água e deficiências na alimentação; problemas na educação pela dificuldade de acesso a escolas; problemas econômicos decorrentes da falta de emprego; e problemas ocasionados pela migração dessas pessoas. É importante observar que nas regiões afetadas também há pessoas que têm propriedades de diferentes tamanhos, e cada um vai encarar as dificuldades da seca de diferentes maneiras. (Carvalho, 2012, p. 78) Como ações futuras, Carvalho (2012, p. 97) sugere que o foco não deve estar em combater a seca, e sim em aprender a conviver com ela, ao mesmo tempo em que se tenta resolver os problemas decorrentes dela. Figura 1 – As áreas de incidência de secas no Nordeste Pró-reitoria de EaD e CCDD 12 Fonte: Carvalho, 2012. Tema 4: Neoliberalismo e Globalização Podemos entender por globalização um conjunto de “processos que intensificam cada vez mais a interdependência e as relações sociais a nível mundial” (Giddens, 2005, p. 51). Segundo Giddens, o desenvolvimento de tecnologias da informação e da comunicação que despontaram depois da Segunda Guerra Mundial é fundamental para que os processos da globalização continuem acontecendo. As tecnologias da comunicação servem tanto para grandes empresas, facilitando a logística, a importação de produtos vindos de países com mão de obra mais barata, como para indivíduos, que podem ter acesso a informações e entretenimento disponibilizados em vários países. Mas é evidente que a tecnologia sozinha não fez nada. Houve processos políticos importantes para dar forma ao mundo “globalizado” de hoje. Um dos mais importantes foi o fim da União Soviética. Os países que antes formavam a Pró-reitoria de EaD e CCDD 13 União Soviética, sozinhos, não teriam conseguido sobreviver em uma economia globalizada; uma vez separados da União Soviética entraram no palco mundial, adotaram sistemas políticos e econômicos ocidentais, o que facilitou a integração com outros países. Um fator importante nos processos da globalização são organizações internacionais, que perpassam os limites dos países. Podem ser uniões entre países, como a Organização das Nações Unidas (ONU) ou o Mercado Comum do Sul (Mercosul), organizações como a Organização Internacional de Normalização (Isso), cuja função é documentar padronização e normas técnicas, e Organizações Não Governamentais (ONGs), como Greenpeace, Médicos Sem Fronteiras, Anistia Internacional, da Femme International etc. Outras organizações importantes são as empresas multinacionais, que começaram a se expandir logo depois da Segunda Guerra Mundial. Várias dessas empresas, que por sua parte contêm outras empresas, têm lucros superiores aos de muitos países, tornando-se atores sociais fortes, com influência na política dos países. Durante os anos 1950 e 1960, por exemplo, a empresa estadunidense United Fruit apoiou golpes de estado em vários países da América Central, já que governos de esquerda impediriam atividades que beneficiariam a empresa, como preservação de florestas e exigência de direitos trabalhistas. A globalização é um conceito fundamental para o neoliberalismo. Com mais países abrindo seus mercados e adotando políticas econômicas neoliberais, as empresas terão mais liberdade para entrar em novos mercados, fabricar seus produtos onde mais lhes convier, e vendê-los nos lugares que paguem melhor – as que tenham condições para esse tipo de operações, claro. As políticas ideais para o neoliberalismo implicam governos que não impeçam práticas comerciais. Nesse contexto, o discurso da globalização como algo positivo para a economia é benéfico para grandes empresas. O geógrafo brasileiro Milton Santos falava da globalização de três maneiras: como “fábula”, que é o jeito Pró-reitoria de EaD e CCDD 14 que nos vendem a ideia; como “perversidade”, que seria o que realmente acontece, e como “possibilidade”, que seria uma globalização benéfica para pessoas, e não somente para as empresas multinacionais. Mesmo tendo como referência a experiência de outros países da América Latina, e antes dos governos Thatcher e Reagan nos Estados Unidos e na Inglaterra, o Brasil foi o último país latino-americano a implantar um projeto neoliberal. Essa “demora” se deu por vários fatores, dentre as quais se destacam os conflitos entre interesses de diferentes partes do capital, assim como a oposição de atores sociais como sindicatos. (Filgueiras, 2006, p. 180- 181) O governo de Fernando Collor de Melo teria adaptado ao Brasil uma visão desestatizante que já era tendência no resto do mundo, além de ter adotado um discurso de renovação do modelo de estado brasileiro. (Alves, 2005, p. 1) Dentro de políticas neoliberais, uma das primeiras medidas do governo Collor foi a reduçãode impostos de importação, o que aumentou a oferta de produtos e consequentemente a estabilização dos preços de algumas mercadorias. Ele também incentivou investimentos externos, mediante incentivos fiscais para a implantação de fábricas. Além disso, acabou com o monopólio da Petrobras na exploração de petróleo. Outra medida de caráter neoliberal do governo Collor foi a privatização de empresas estatais. O argumento defendia que seriam lugares propícios à corrupção e ao desperdício de dinheiro público. Teoricamente, o dinheiro da privatização deveria ter servido para diminuir a dívida pública, mas não foi suficiente. Outra crítica dizia que o dinheiro emprestado aos compradores das empresas estatais foi emprestado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), ou seja, o governo emprestou dinheiro a empresas privadas para que comprassem, a juros baixos, as próprias empresas do governo. O governo Collor se caracterizou também por alguns planos de combate Pró-reitoria de EaD e CCDD 15 à hiperinflação, que não foram bem-sucedidos. Foi necessário um plano mais amplo, implantado sob o governo de Itamar Franco – vice-presidente que assumiu em 1992 depois do impeachment de Collor. Chamado de Plano Real, que implantou a moeda que usamos até hoje, teve por características: Desindexação da economia. A ideia era parar de reajustar preços usando valores antigos de inflação. Equilíbrio fiscal. Foram reduzidos gastos e investimento da máquina pública, houve aumento de imposto e exoneração de funcionários públicos. Privatizações. A mera emissão de moeda, sem respaldo de novos patrimônios, causa a desvalorização do dinheiro e, consequentemente, inflação. Isso acontecia quando o governo precisava investir em empresas estatais. Por isso, a privatização de empresas, como parte do Plano Real, foi bem-vista. Contingenciamento. A ideia era manter o câmbio estável, por meio da valorização artificial do Real. A ideia era aumentar as importações para estimular a concorrência e a produção nacionais. Políticas monetárias restritivas. A taxa de juros aumentou não apenas para financiar os gastos públicos excedentes, mas também para esfriar a economia mediante a redução da oferta de crédito. O sucesso do Plano Real levou à eleição de um dos seus idealizadores, Fernando Henrique Cardoso, que foi Ministro da Fazenda no governo Itamar. O governo FHC deu continuidade às políticas do Plano Real, e as políticas econômicas, no geral, foram continuadas também no governo Lula. Tema 5: Meios de Comunicação no Brasil A legislação brasileira sobre telecomunicações se caracteriza por ter sido bastante desordenada, misturando vários tipos de dispositivos jurídicos – resoluções federais, decretos, disposições constitucionais, leis – que foram implementados conforme acontecia alguma mudança nas tecnologias ou em Pró-reitoria de EaD e CCDD 16 alguma questão política. Essa bagunça continuou até a década de 1960. (Martins, 2007, p. 305) A primeira regulamentação brasileira relacionada às telecomunicações data de 1860, quando o Decreto Imperial n. 2.614 estabeleceu a organização e a exploração dos telégrafos elétricos, surgidos 23 anos antes nos Estados Unidos e na Inglaterra. O telefone chegou ao Brasil um ano depois do registro da patente, que aconteceu em 1876. Em 1879, houve a primeira autorização para a exploração privada da telefonia. Então, as cidades com telefones eram a capital brasileira, Rio de Janeiro, e Niterói. Em 1881, o governo federal reservou para si a decisão sobre as concessões. Em 1921, a exploração dos serviços de telefonia se tornou exclusividade de empresas brasileiras. (Martins, 2007, p. 307) Em 7 de setembro de 1922, por ocasião do centenário da Independência e durante a inauguração da Feira-Exposição mundial, aconteceu a primeira transmissão de rádio no Brasil. No ano seguinte, foi fundada a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, a primeira emissora de rádio do Brasil. Em 1924, um decreto regulamenta a “diffusão radio-telephonica”, que determina que as licenças só seriam outorgadas a sociedades nacionais, e para a difusão de conteúdos “educativos, científicos, artísticos e de benefício público”. Anúncios comerciais e políticos dependiam de autorização do governo. Na década de 1930, surgem as primeiras rádios comerciais. O decreto de 1924 se mostra como exemplo de como seriam as políticas com relação às telecomunicações nas quatro décadas seguintes: priorização do capital e do conteúdo nacionais, e controle do governo, para que isso fosse cumprido e também no controle das concessões. Em 1931 e 1932, Getúlio Vargas lançou dois decretos sobre telecomunicações. O primeiro se caracterizou por definir os serviços que seriam regulados, incluindo, com 20 anos de antecedência, a “radiotelevisão”. O segundo decreto, além de detalhar o primeiro, regulamentava impostos, duração de anúncios comerciais e determinava que as concessões precisariam Pró-reitoria de EaD e CCDD 17 ser renovadas a cada dez anos. O decreto de 1932 também propunha a criação de uma rede nacional de estações, que transmitiria um programa chamado “Hora do Brasil”, transmitido pela primeira vez em 1935, e até hoje no ar, com o nome de “A Voz do Brasil”. Em 18 de setembro de 1950, foi inaugurada a TV Tupi, de São Paulo, de propriedade do então mais importante empresário da imprensa brasileira, Assis Chateaubriand. Entre as primeiras estrelas da televisão estava Hebe Camargo, que chegou a acompanhar o desembarque dos equipamentos no porto de Santos. Durante os anos 1950, também foram criadas a TV Record – de São Paulo, em 1953 –, a TV Rio – 1955 –, além da expansão da TV Tupi para várias capitais. No final da década de 1950, já funcionavam dez emissoras de televisão. (Fernandes, 2013, p. 4) Em 1961, o presidente Jânio Quadros lança um decreto com várias regras para a produção televisiva, limitando os intervalos comerciais, impondo uma cota de produções nacionais, bem como a exigência de que programas não adequados para crianças fossem transmitidos depois das 22 horas, entre outras regras. Nos anos seguintes, houve várias disputas entre os representantes dos radiodifusores e os presidentes Jânio Quadros e João Goulart. As empresas de rádio e televisão vinham desde 1953 tentando aprovar uma regulamentação que atendesse aos interesses. No final de 1962, o Código Brasileiro de Telecomunicação foi aprovado, sem os vetos do presidente João Goulart. (Martins, 2007, p. 313-325) O interesse, evidentemente, era atender aos interesses dos concessionários – as emissoras –, e não a democratização das comunicações. (Fernandes, 2013, p. 4) Durante a ditadura militar, destacam-se as colaborações entre os canais de televisão, interessados em manter suas concessões, e o governo, interessado em difundir os fatos de seu interesse. Marina Fernandes (2013, p. 4-5) narra a situação da Rede Globo de televisão. A concessão foi feita em 1957, mas o canal só foi inaugurado em 1965. Pouco antes do início das transmissões, a emissora faz um acordo – ilegal – com a estadunidense Time- Pró-reitoria de EaD e CCDD 18 Life, que investiu dinheiro na emissora brasileira e providenciou treinamento e equipamento, o que permitiu que a Rede Globo se destacasse dentre as outras emissoras. Um marco da parceria entre a Rede Globo e a ditadura é o Jornal Nacional, que estreou em 1969, e foi o primeiro programa a utilizar a infraestrutura inaugurada dois anos antes pela ditadura. O governo lançou crédito para a compra de televisores, e também fez altos investimentos em publicidade. Mesmo depois da Constituição de 1988, fica claro que o interesse da legislação sobre telecomunicações é o de favorecer as emissoras, não impedindo monopólios de informação. (Fernandes, 2013, p. 8-9) Outro problema é o interesse de políticosdonos de radiodifusoras, que as usam para fins políticos. O prazo de 15 anos para uma concessão e a dificuldade de cancelar uma concessão também são apontados por Fernandes como problemáticos. Fernandes ainda ressalta as tentativas feitas para uma regulação mais democrática da radiodifusão, como a Lei Geral de Telecomunicação e a proposta de criação da Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinav), que foram engavetadas por pressão das radiodifusoras. Na Prática Vamos fazer algumas entrevistas? Aproveite que o que estudamos aqui aconteceu recentemente, e peça a outras pessoas que contem o que viveram na época. Pergunte aos seus pais, avôs, tios. Como eles perceberam os acontecimentos naquela época? Quais são as opiniões deles sobre o período da ditadura? Que outros pontos de vista sobre o período eles conhecem? Do que eles mais se lembram sobre o cotidiano da época? De quais fatos eles ficaram sabendo na época, e de quais fatos eles ficaram sabendo depois? Pró-reitoria de EaD e CCDD 19 Síntese DITADURA MILITAR 1964 a 1985 Sem eleições diretas Repressão, censura Milagre econômico NEOLIBERALISMO Tendência mundial: abertura de economia Privatizações Redução de gastos públicos Plano Real e fim da hiperinflação TELECOMUNICAÇÕES NO BRASIL Histórico Influência do estado Influência das radiodifusoras na legislação GEOGRAFIA DA SECA Seca como problema histórico Seca como definição da região Nordeste Problemas sociais, políticos e econômicos como consequência REDEMOCRATIZAÇÃO 1985-1989 Volta das eleições diretas para presidente Constituição de 1988 Fim da censura Hiperinflação, consequências econômicas de empréstimos feitos durante a ditadura. Pró-reitoria de EaD e CCDD 20 Referências ALVES, G. B. Discurso, reforma do Estado e ideologia neoliberal no governo Collor. In: Seminário de Estudos em Análise do Discurso, 2., 2005: Porto Alegre. Anais… Porto Alegre: UFRGS, 2005. Disponível em: <http://anaisdosead.com.br/2SEAD/SIMPOSIOS/GustavoBiasoliAlves.pdf>. Acesso em: 28 jun. 2016. CARVALHO, O. de. As Secas e seus Impactos. In: CGEE/ANA. A questão da água no Nordeste. Brasília: CGEE, 2012. p. 57-112. Disponível em: <http://www.geoeconomica.com.br/pdf/Otamar_Agua%20Nordeste.pdf>. Acesso em: 28 jun. 2016. CARVALHO, O. de. O Soerguimento do DNOCS. Revista ConViver Nordeste, n. 6. Fortaleza, 2009. Disponível em: <http://www.geoeconomica.com.br/pdf/Otamar_DNOCS.pdf>. Acesso em: 28 jun. 2016. ______. Sudene 40 anos: a herança. UOL, 2000. Disponível em: <http://www2.uol.com.br/JC/cadernosdonordeste/ne2710_2.htm>. Acesso em: 28 jun. 2016. FERNANDES, M. R. Regulação da televisão no Brasil. 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