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1 Psicologia Organizacional Teorias Psicológicas e da Personalidade Patrícia Simões Sena Soares Unidade I APRESENTAÇÃO DO PROFESSOR-AUTOR Professora conteudista: Patrícia Simões Sena Soares Patrícia Simões Sena Soares, 42 anos, casada, paulista, nascida e residente na cidade de Guarulhos, São Paulo. Formada em Psicologia, especialista em Psicologia Clínica e Teoria Psicanalítica e especialista em Gestão de Pessoas. Atualmente, atua como responsável pelos setores de Recrutamento, Seleção, Treinamento e Desenvolvimento de Pessoas. É palestrante de temais comportamentais e sobre saúde emocional. Possui 20 anos de experiência profissional adquirida na clínica psicológica, consultorias nas áreas e seleção, avaliação, treinamento e desenvolvimento de pessoas em empresas como Danone, Tellure Rota do Brasil, Editora Abril, CAE do Brasil e através de palestras ministradas em empresas nacionais e multinacionais. É professora colaboradora dos cursos de pós-graduação da UNIP. SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ........................................................................................................................ 6 INTRODUÇÃO .............................................................................................................................. 8 1. HISTÓRIA DA PSICOLOGIA E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA TEORIA DA PERSONALIDADE 8 1.1. De onde vem as teorias da personalidade? .............................................................................. 9 1.2. Esboço histórico e raízes filosóficas ....................................................................................... 10 1.3. Personalidade ................................................................................................................................. 11 1.4. Traços de Personalidade ............................................................................................................. 12 1.5 É possível mudar nossa personalidade? ................................................................................. 14 2. TEORIA DA PERSONALIDADE NA VISÃO PSICANALÍTICA ............................................. 15 2.1 A PRIMEIRA CONCEPÇÃO DE APARELHO PSÍQUICO PARA FREUD ...................... 15 2.1.1 Consciente .................................................................................................................................... 16 2.1.2 Pré-Consciente ............................................................................................................................. 16 2.1.3 Inconsciente .................................................................................................................................. 16 2.2 PULSÕES ................................................................................................................................... 16 2.3 ENERGIAS ................................................................................................................................. 17 2.4 ESTRUTURA DA PERSONALIDADE SEGUNDO FREUD ............................................... 17 2.4.1 Id 17 2.4.2 Ego 18 2.4.3 Superego........................................................................................................................................ 18 2.5 FASES PSICOSSEXUAIS DO DESENVOLVIMENTO ....................................................... 18 2.5.1 Fase oral ........................................................................................................................................ 19 2.5.2 Fase anal ........................................................................................................................................ 19 2.5.3 Fase Fálica .................................................................................................................................... 20 2.5.4 Período de latência ..................................................................................................................... 21 2.5.5 Fase Genital .................................................................................................................................. 21 2.5.6 Fixação ........................................................................................................................................... 22 2.6 NEUROSE .................................................................................................................................. 22 2.7 MECANISMOS DE DEFESA DE EGO .................................................................................. 23 2.7.1 Projeção ......................................................................................................................................... 24 2.7.3 Racionalização ............................................................................................................................. 24 2.7.4 Negação ......................................................................................................................................... 24 2.7.5 Isolamento ..................................................................................................................................... 25 2.7.6 Deslocamento ............................................................................................................................... 25 2.7.8 Repressão...................................................................................................................................... 25 2.7.9 Regressão...................................................................................................................................... 26 3. A TEORIA DA PERSONALIDADE NA VISÃO DA PSICOLOGIA HUMANISTA ................. 26 Carl Rogers e Abraham Maslow, os fundadores ........................................................................... 26 3.1 BASES DA PSICOLOGIA HUMANISTA ...................................................................................... 27 3.2 TEORIA DA HIERARQUIA DAS NECESSIDADES ................................................................... 27 3.2.1 Necessidades fisiológicas ........................................................................................................ 28 3.2.2 Necessidades de segurança ..................................................................................................... 28 3.2.3 Necessidades sociais ................................................................................................................. 28 3.2.4 Necessidades de estima: ........................................................................................................... 29 3.2.5 Necessidades de auto realização ............................................................................................ 29 3.3 CONCEITOS PRINCIPAIS .............................................................................................................. 30 3.3.1 O campo fenomenológico ......................................................................................................... 30 3.3.2 Self 30 3.3.3 Self Ideal ........................................................................................................................................ 30 3.3.4 Congruência e incongruência .................................................................................................. 30 3.3.5 Tendência à Auto Atualização .................................................................................................. 31 4. TEORIA DA PERSONALIDADE NA VISÃO DA TEORIA COMPORTAMENTAL ................ 31 4.1 Condicionamento Respondente ................................................................................................. 32 4.2 Condicionamento Operante .........................................................................................................32 4.3 Reforçamento .................................................................................................................................. 32 4.4 A teoria comportamental aplicada ao ambiente organizacional ...................................................... 33 4.5 Métodos de Modelagem do Comportamento .................................................................................... 33 Esquemas de Reforço ................................................................................................................................. 34 5. TEORIA PSICODRAMATISTA E A PERSONALIDADE ......................................................... 35 5.1 PRINCIPAIS CONCEITOS ................................................................................................................................ 36 5.1.2 Espontaneidade ........................................................................................................................... 36 5.1.2 Formação da Identidade ............................................................................................................ 36 5.1.3 A matriz de identidade................................................................................................................ 37 5.1.4 Teoria dos Papéis ........................................................................................................................ 38 5.1.4.1 Papéis Psicossomáticos ........................................................................................................ 38 5.1.4.2 Papéis psicodramáticos ou psicológicos .......................................................................... 39 6. AVALIAÇÃO CRÍTICA DAS TEORIAS .................................................................................. 39 7. TRANSTORNOS DE PERSONALIDADE .............................................................................. 41 7.1 Transtorno de Personalidade Paranoide: ................................................................................. 41 7.2 Transtorno de Personalidade Esquizoide ................................................................................ 41 7.3Transtorno de Personalidade Esquizotípica ............................................................................. 41 7.4 Transtorno de Personalidade Borderline ................................................................................. 42 7.5 Transtorno de Personalidade Narcisista .................................................................................. 42 7.6 Transtorno de Personalidade Antissocial ................................................................................ 42 7.7 Transtorno de Personalidade Histriônica ................................................................................. 42 7.8 Transtorno de Personalidade Obsessivo-Compulsiva ......................................................... 42 7.9 Transtorno de Personalidade Esquiva ...................................................................................... 42 7.10 Transtorno de Personalidade Dependente: ........................................................................... 43 REFERÊNCIAS ........................................................................................................................... 43 29 APRESENTAÇÃO Caro aluno, Todos nós buscamos compreender o máximo de coisas possível que ocorrem à nossa volta. Parece-me ser natural buscar respostas para as inúmeras questões da vida, principalmente quando se trata de nossa própria existência. Neste módulo, nossa intenção é responder a algumas perguntas que muitos fazem sobre si mesmos: por que somos como somos? Por que fazemos o que fazemos? Por que sou assim e não assado? O que posso fazer para deixar de ser como sou? No contexto organizacional, isto parece ser importante também. Compreender porque um colaborador age como age e quais são as raízes que sustentam sua personalidade nos dá margem para entender como devemos direcionar nossa gestão. A vida se baseia na interação indivíduo-grupo. Desta forma, tanto uma organização interfere no indivíduo quanto o indivíduo interfere na organização, estabelecendo assim, uma relação mútua. Contudo, apesar de semelhanças aparentes, as pessoas são seres únicos, individuais, diferentes entre si e que tem comportamentos distintos, mesmo em situações parecidas. Como então, compreender isso? Primeiramente, não podemos falar sobre pessoas e seus comportamentos sem lançar mão das ciências do comportamento e neste nosso caso, da Psicologia e suas teorias. Compreender a personalidade das pessoas embasa o profissional para o melhor entendimento do comportamento dessas pessoas dentro das organizações de trabalho e com isso, dá a ele possibilidade de alinhar melhor sua gestão e da organização de forma a obter comportamentos desejáveis e que beneficiem tanto aos próprios colaboradores quanto à própria organização. Espero que este conteúdo seja relevante para sua vida, sua carreira e seu futuro e que este aprendizado seja multiplicado e influencie o seu contexto, seja ele pessoal ou profissional. Então, bom estudo para você! 29 INTRODUÇÃO O campo do estudo da personalidade em psicologia é um dos mais ricos e dos mais polêmicos. De todo modo, embora polêmico, esse campo tem seus dois fundamentos básicos: o campo da personalidade, em psicologia, trata, fundamentalmente, da pessoa como um ser integral e de suas diferenças individuais. Com isso, o que se procura é compreender o comportamento humano através da maneira como cada indivíduo funciona na interação dos diversos aspectos que compõem seu todo, seu jeito complexo de ser. Em psicologia, quando falamos da integralidade da pessoa, estamos nos baseando em uma das mais importantes leis desvendadas pela psicologia da gestalt, aquela que diz que o todo é diferente da soma de suas partes. Tentando dar um exemplo bastante concreto, isso quer dizer que se duas pessoas são generosas, a maneira como a generosidade de cada uma vai se manifestar é diferente, pois cada uma está fundamentado em seus potenciais, em seus limites, em sua história e em suas circunstâncias, em sua complexa totalidade; é por isso que cada uma vai, também, vivenciar de maneira diferente seu comportamento generoso. Por exemplo, um, dando muito, pode, ainda assim, acreditar que o que dá é insuficiente, ao passo que o outro, dando apenas parte do que talvez pudesse dar, pode entender que o que dá é muito mais do que deveria dar. Ainda assim, os dois são generosos. As diversas teorias psicológicas da personalidade nos permitem compreender essas diferenças sem julgá-las, ou seja, nos permitem compreender, de maneira mais complexa e empática, as diferenças individuais. 1. HISTÓRIA DA PSICOLOGIA E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA TEORIA DA PERSONALIDADE A psicologia nem sempre foi considerada ciência. Ela foi um ramo do domínio da filosofia até 1870, quando se desenvolveu como uma disciplina científica independente na Alemanha. Em 1879, em Leipzig, Alemanha, Wilhelm Wundt fundou o primeiro laboratório dedicado exclusivamente à pesquisa psicológica na Alemanha. Outros importantes colaboradores iniciais da psicologia foram Hermann Ebbinghaus (pioneiro no estudo da memória), William James e Ivan Pavlov (que desenvolveu os procedimentos associados ao condicionamento clássico, como veremos quando estudarmos sobre a teoria comportamental. Logo após o desenvolvimento da psicologia experimental, vários tipos de psicologia aplicada apareceram. A psicologia foi sendo estudada em diversos contextos: na educação, com John Dewey na década de 1890; na indústria, com Hugo Münsterberg, em 1890; no direito e em outros campos. Lightner Witmer estabeleceu a primeira clínica psicológica na década de 1890 e criou o termo "psicologia clínica". James Cattell adaptou os métodosantropométricos de Francis Galton para gerar o primeiro programa de testes mentais na década de 1890. Simultaneamente, em Viena, Sigmund Freud desenvolveu uma abordagem independente para o estudo da mente e a chamou de psicanálise, que tem sido influências ainda hoje. 29 O século XX viu a formulação do behaviorismo por John B. Watson, que foi popularizado por B. F. Skinner. As décadas finais do mesmo século viram o surgimento da ciência cognitiva, uma abordagem interdisciplinar para o estudo da mente humana. A ciência cognitiva também considera a mente humana como um assunto para investigação, usando as ferramentas, entre elas a filosofia, linguística e ciências da computação. Para iniciarmos nosso estudo sobre o desenvolvimento da teoria da personalidade faz-se necessário iniciarmos pelos estudiosos clássicos da antiguidade como Hipócrates, Platão e Aristóteles. Vamos então considerar o papel geral que a teoria da personalidade desempenhou no desenvolvimento da psicologia durante o século passado. Outras dezenas de pensadores como Aquino, Auguste Comte, Kierkeggard, Locke, Nietzsche também poderiam ser incluídos na relação de colaboradores pois suas ideias, ainda hoje, tem sido encontradas em muitas formulações conceituais contemporâneas. De Charcot, Freud e Jung vem as mais recentes contribuições para a teoria da personalidade. Eles tinham interesse em determinar a natureza da personalidade e não apenas tratá-la como fator isolado, como fizeram os influentes da tradição Gestáltica. Estavam convencidos de um estudo sobre pequenos fragmentos do comportamento jamais poderiam ser esclarecedores. A psicologia experimental e a teoria da aprendizagem também deram sua contribuição, através de uma pesquisa empírica cuidadosamente controlada que ocasionou um melhor entendimento da natureza da construção da teoria e de como o comportamento pode ser modificado. Outro determinante da construção da teoria da personalidade vem da tradição psicométrica, focada na mensuração e no estudo das diferenças individuais. Por fim, tanto a genética como a fisiologia também se empenharam em identificar e descrever as características da personalidade. Fundamentalmente, a psicologia da personalidade levanta a questão mais crucial do ser humano: quem sou? Quão únicos somos como indivíduos? Qual é a natureza do Eu? Os psicólogos da personalidade respondem a essa pergunta observando como e por que os indivíduos se comportam de maneiras distintas. Concentram-se nos pensamentos, sentimentos e comportamentos das pessoas. Estudar sobre a personalidade não é levantar conceitos não-psicológicos como físicos, religiosos ou químicos. A personalidade é um campo subjetivo e, portanto, deve ser estudado e compreendido a partir das ciências psicológicas. Podemos definir a psicologia da personalidade como o estudo científico dos aspectos psicológicos que tomam as pessoas únicas. Para abranger este assunto, dizemos que a personalidade tem oito aspectos principais que nos ajudam a compreender a natureza complexa do indivíduo. 1.1. De onde vem as teorias da personalidade? As teorias não são leis imutáveis. Elas são construídas sobre pressupostos que estão sujeitos à interpretação individual. São fruto da origem pessoal dos autores, de 29 sua filosofia de vida, de suas experiências e de sua forma de enxergar o mundo. Por isto nesta disciplina estudaremos sobre alguns autores e um pouco sobre suas origens e outras características importantes que podem elucidar a teoria de cada um. Talvez um dos erros que alguns dos autores incorreram ao elaborar e disseminar suas teorias tenha sido o de acharem que a sua abordagem é a melhor e a mais correta. Entendo que cada teoria tem uma forma bastante esclarecedora e verdadeira do ponto em que mais se debruçou ao analisar a personalidade. Por exemplo, uma teoria mais interessada nos fenômenos da consciência não explicaria os sonhos ou o conteúdo inconsciente de nosso psiquismo. Muitas teorias, sejam elas da personalidade ou sobre outros temas, tiveram origem na profunda reflexão de pensadores e em sua observação criteriosa e meticulosa. Sigmund Freud, por exemplo, investiu bom tempo de sua vida analisando os próprios sonhos que lhe revelaram a complexidade e o nível de seus conflitos internos. Foi o primeiro a observar o poder das pulsões sexuais reprimidas e associar esta ideia ao desenvolvimento da personalidade, transformando esse conhecimento em uma teoria sobre a psique humana. As teorias da personalidade também surgiram diretamente de investigações empíricas. Por exemplo, se quisermos entender quais são os traços básicos essenciais para a compreensão da personalidade, será necessário coletar informações de diversos indivíduos que apresentassem características e traços semelhantes. Resumidamente, podemos afirmar que o estudo da personalidade é um estudo cientifico de uma parte da psicologia que torna as pessoas únicas. Existem causas subjacentes da dinâmica de cada um, bem como padrão de traços que nos tornam únicos e singulares. Algumas teorias se voltam para o lado quantitativo da psicologia, como os behavioristas, teóricos da aprendizagem social e os teóricos dos traços. Outras se voltam para o lado clínico e qualitativo da psicologia como os humanistas, existencialistas e psicanalistas. As teorias psicodinâmicas tentam entender o comportamento em termos do funcionamento da mente, com ênfase na motivação e no papel da experiência passada. Ela se concentra em analisar os pensamentos do indivíduo sobre as experiências, como eles veem o mundo e seus relacionamentos. 1.2. Esboço histórico e raízes filosóficas O desejo de desvendar os mistérios da personalidade vem de muitos séculos atrás, especificamente do século IV a.C., na Grécia Antiga. Hipócrates, considerado o “pai da medicina”, criou a teoria dos humores corporais. Hipócrates e seus seguidores acreditavam que mente e o corpo eram uma só realidade. Consequentemente, o que acontecia com a mente tinha efeitos no organismo físico e vice-versa. Mais tarde, Galeno, filósofo e médico (129 d.C) complementou estas discussões. Indicou que o 29 desequilíbrio dos humores afetava a forma de ser, de sentir, de pensar e de se comportar. Vamos examinar algumas outras fontes que tiveram grande influência sobre a teoria da personalidade relativamente recentes. Observações clinicas: aqui citamos Charcot, Janet, Freud, Jung e McDougall que se debruçaram sobre os estudos do comportamento a partir de observações dos sintomas e suas reações emocionais. Tradição gestáltica e Willian Stern: interessados em estudar a unidade do comportamento estavam convencidos de que estudar apenas fragmentos da personalidade jamais esclareceriam-na. Psicologia experimental e teoria da aprendizagem: linhas que se preocupam em explicar mais detalhadamente como o comportamento pode ser modificado. Tradição psicométrica: focado na mensuração das diferenças individuais, proporcionando uma maior clareza sobre as dimensões da avaliação através da análise quantitativa dos dados Genética e fisiologia: preocupados em identificar e descrever as características da personalidade. Sobre isto Henry Murray, um psicólogo norte- americano declara: “Nenhum cérebro, nenhuma personalidade.” A teoria de Darwin foi um fator importante no desenvolvimento da psicologia geral e da psicologia da personalidade. Também é verdade que a fisiologia do século XIX teve sua influência sobre os teóricos da personalidade, assim como um efeito acentuado sobre a psicologia geral. No entanto, o principal teor dos fatores que influenciaram esses dois grupos durante os últimos três quartos de século foi perceptivelmente diferente. Enquanto os teóricos da personalidade estavam tirando suas ideias mais importantes principalmente da experiência clínica, os psicólogos experimentais estavam prestando atenção aos achadosdo laboratório experimental. Os nomes Charcot, Freud, Janet, McDougall e Stern estão em primeiro plano no trabalho dos primeiros teóricos da personalidade, mas encontramos Helmholtz, Pavlov, Thorndike, Watson e Wundt em um papel comparável na psicologia experimental. Os experimentalistas derivaram suas inspirações e seus valores das ciências naturais, enquanto os teóricos da personalidade permaneceram mais próximos dos dados clínicos e de suas próprias reconstruções criativas. Um grupo recebeu com satisfação os sentimentos intuitivos e os insights. (Hall, C.S. Lindsey G. 1973). Muitos autores divergiram em diversos pontos. Jung, por exemplo, não concordava com a ênfase à sexualidade que Freud dava em sua teoria, tampouco achava que os determinantes inconscientes da personalidade tinham origem pessoal, mas, segundo ele, originavam-se na ancestralidade. Maslow, como veremos na teoria humanista, acreditava que a psicanálise dava muito foco às neuroses e doenças e decidiram seguir o caminho da psicologia que os levou ao estudo e desenvolvimento do potencial e capacidades existentes em cada ser. 29 1.3. Personalidade A origem da palavra Personalidade é latina, personalitas. Na Grécia antiga, referiam-se às personas, máscaras utilizadas por atores gregos em peças teatrais. Vale destacar que para os gregos a máscara era um elemento importante no teatro, uma vez que os atores usavam máscaras para apresentar expressões diferenciadas e mostrar seu estado de espírito e, ao mesmo tempo, este elemento servia para amplificar a voz no palco. Seguindo o rastro desta palavra, vale lembrar que o termo personagem compartilha a mesma etimologia. Não há uma definição consensual para personalidade no seio da psicologia, até porque muitos autores percebem a personalidade sobre pontos de vista nem sempre convergentes. Apesar disso, podemos considerar que personalidade é um padrão de traços relativamente permanentes e caraterísticas que dão consistência e individualidade à uma pessoa. A personalidade é determinada pela herança genética e pelo ambiente e seus aprendizados. Willian Sheldon, um psicólogo americano, disse que “a personalidade é a organização dinâmica dos aspectos cognitivos, afetivos, conativos, fisiológicos e morfológicos do indivíduo.” A personalidade não corresponde a uma justaposição de peças, mas representa uma organização. Também não se encontra em um local específico. É um processo dinâmico no interior no indivíduo. Para a APA (DSM-IV-TR, 2002, p. 771), a personalidade é constituída por “padrões persistentes de perceber, relacionar-se e pensar sobre o ambiente e sobre si mesmo.” A personalidade pode ser compreendida como um sistema que pode ser percebido e estudado principalmente através do comportamento. Esse sistema tem, essencialmente, duas partes: estrutura e processo, inter-relacionados de forma um tanto quanto complexa. A estrutura da personalidade é o que se repete. São os padrões reincidentes, ou, no dizer de Messick (apud Pervin, 1978, p. 555), “são componentes da organização da personalidade relativamente estáveis, usados para explicar as semelhanças reincidentes e consistências do comportamento ao longo do tempo e através das situações.” É a estrutura que possibilita uma certa previsibilidade na vida de cada pessoa e que possibilita também o autoconhecimento. 1.4. Traços de Personalidade Traços são os elementos que compõem a estrutura da personalidade e contribuem para as diferenças individuais no comportamento. Eles mantêm o comportamento consistente e estável ao longo do tempo e em diferentes situações. Isso quer dizer que pode até ser que tenhamos atitudes diferentes em situações diferentes, mas de um modo geral, nossos traços de personalidade estão presentes, podendo ser controlados ou não, dependendo do ambiente e da circunstância. 29 Alguns desses traços são individuais, outros podem ser compartilhados por um determinado grupo social e há aqueles que são característicos de toda espécie humano. Mas em cada pessoa, os traços se organizam e se manifestam de modo particular. Outra forma de definir a personalidade é considerá-la uma construção psicológica que engloba um arcabouço genético, seu histórico de aprendizagens ao longo da vida e a forma como esses fatores influenciam suas respostas a diferentes ambientes e situações. Numa definição ou noutra, a personalidade é percebida como um conjunto dinâmico, organizado e exclusivo de elementos que influenciam nosso raciocínio, nossa motivação e nosso comportamento em várias situações. Veremos mais pra frente minuciosamente que, se para Freud o ser humano pode ser compreendido como funcionando de maneira semelhante a uma máquina e, se para Skinner o ser humano é determinado pelo ambiente, para a psicologia fenomenológico-existencial-humanista o ser humano é compreendido como um ser relacional, livre e responsável. Se Freud e Skinner concebem o ser humano como hedonista e pouco confiável, a psicologia fenomenológico-existencial-humanista o concebe como potencialmente confiável e buscador de auto realização. Ou seja, se nas duas primeiras grandes áreas da psicologia o ser humano é visto, primariamente, como necessitado de controle externo/social, na terceira força ele é compreendido como capaz de se desenvolver no seu melhor sentido, desde que lhe sejam asseguradas as condições ambientais para tanto. Embora as três grandes áreas da psicologia tenham diferenças, algumas delas profundas, há também semelhanças e aproximações. Por isso, no estudo da personalidade humana, há algumas consonâncias que permitem delinear com maior precisão o terreno da psicologia da personalidade. Ou seja, há fatores imprescindíveis para se estudar a personalidade humana, e eles independem da abordagem que se use em psicologia. É importante notar, no entanto, que, se esses fatores são comuns, a maneira de compreender é, muitas vezes, ora divergente, ora complementar, ora coincidente, ora conflitante. De todo modo, qualquer que seja a abordagem em psicologia, a personalidade é compreendida como fundamentada principalmente em cinco critérios: 1) fatores genéticos e hereditários; 2) ambiente 3) aprendizado 4) cultura, geografia e época. Isso quer dizer que, ao estudarmos a personalidade humana ou a personalidade de uma pessoa, devemos levar em conta os fatores genéticos, aquilo que lhe é dado biologicamente e que lhe é inescapável nesse sentido. Devemos levar em conta que a passagem pelo tempo incorre em mudanças, muitas vezes duradouras. Isso afirma os estudos feitos pela neurociência sobre neuroplasticidade cerebral, o que implica que em fluidez e flexibilidade na construção de nossa personalidade. As relações familiares interferem e configuram a maneira de as pessoas se compreenderem e compreenderem o mundo, quer seja pela história familiar herdada, quer seja pela maneira como a família concebe o mundo e as relações entre as pessoas, o que acaba influenciando a maneira como cada membro da família concebe o mundo e se relaciona com ele. Devemos levar em conta que somos configurados 29 pela cultura na qual nascemos e vivemos, assim como somos configurados pela geografia e pela época de nossa existência, de maneira que, por exemplo, nascer numa cidade praiana ou numa cidade serrana pode interferir no nosso modo de estar no mundo. Dentre as muitas possibilidades dentro da psicologia, há ainda mais duas definições de personalidade que, pela abrangência e profundidade, serão úteis para a nossa disciplina. Gordon Allport, um dos mais importantes estudiosos da personalidade humana, defendeu (apud Filloux, 1966, p. 13) que a personalidade é “a organização dinâmica no indivíduo de sistemas psicofísicos que determinam as suas adaptações singulares ao próprio meio.” Outro estudioso do tema foi Jean-Claude Filloux. Para ele a personalidade “éa configuração única assumida no decurso da história de um indivíduo pelo conjunto de sistemas responsáveis pelo seu comportamento.” (1966, p. 13) Dizendo de um modo mais extenso, Filloux (1966, p. 12) afirma que a personalidade 1) é única, própria a um indivíduo, embora este possua traços em comum com os outros; 2) ela não é somente uma soma, um total de funções, mas também uma organização, uma integração; (...); 3) a personalidade é temporal, visto sempre pertencer a um indivíduo que vive historicamente; 4) por fim, não sendo nem estímulo, nem resposta, ela se apresenta como uma variável intermediária, afirmando-se como um estilo através e por meio do comportamento. 1.5 É possível mudar nossa personalidade? Há coisas que podem ser mudadas em nossas características, mas outras não. Estudos mostram que 50% de nossas características dependem de nossa genética e epigenética. Uma parte de nosso conhecimento sobre isso vem de mais de quarenta anos de estudos realizados sobre gêmeos univitelinos. Por exemplo, crianças geneticamente iguais são adotadas após o primeiro mês de vida por famílias diferentes. Separando o efeito da cultura, da aprendizagem e da genética, o que se constatou? Agressividade, interesses, abertura para o novo e uma série de características tinham correlação em torno de 50%. Os outros 50% vem das outras duas pontas do tripé: o que se aprende ao longo da vida, a aprendizagem e o ambiente. Este ambiente pode fazer com que pessoas alterem maneiras de sentir, pensar e agir mesmo tendo uma certa biologia que disponha numa direção. Por exemplo, uma pessoa naturalmente tímida e evitativa, já pode ser observada entre o sétimo e oitavo mês de gestação com estas características, bem como é possível observar como esse bebê, ainda no universo intrauterino, reage às emoções, aos alimentos, como explora esse ambiente. Estudos mostraram que esse padrão tende a permanecer pela vida toda. Dependendo da circunstância em que se cresce, uma pessoa, apesar de tímida pode ser bem sucedida e alcançar seus objetivos, porém fica evidente sua forma de conduzir as coisas, negociar, se relacionar. Isso quer dizer que seus traços de personalidade poderão ser alterados minimamente. Pode ocorrer também o contrário: um tímido que leva uma vida miserável porque não aprendeu a lidar com sua característica mais marcante e praticamente imutável, é possível ter essa característica calibrada, com ajuda da família. Portanto, traços herdados geneticamente que constituem nossa personalidade não podem ser alterados ou podem ser alterados apenas minimamente. 29 2. TEORIA DA PERSONALIDADE NA VISÃO PSICANALÍTICA Sigmund Freud, o fundador da teoria psicanalítica, nasceu em 1856, na região da Morávia que hoje corresponde à parte oriental da República Tcheca. Aos 4 anos, mudou-se com sua família para Áustria onde viveu até 1938 quando migrou para Inglaterra, país onde morreu no ano seguinte. Foi um médico neurologista e sua teoria trouxe um enorme impacto na forma como entendemos a dinâmica da mente humana. Impactou tão profundamente que, para muitos, o século XX passou a ser chamado de “o século freudiano”. Usou pela primeira vez, o termo psicanálise em 1896 para descrever os seus métodos. Suas obras completas compõem-se de 24 volumes e incluem ensaios de sua prática clínica, conferências e monografias. Sua última obra “Esboço de Psicanálise”, foi escrita em 1940. Neste capítulo, vamos falar dos conceitos básicos da teoria da personalidade a partir da visão freudiana. Nossos processos mentais, segundo Freud, ocorrem de uma maneira encadeada, ou seja, nenhum pensamento, sentimento ou lembrança acontece isoladamente, por acaso, como se surgisse do nada. Mesmo que pareça, existem elos ocultos que ligam esses processos mentais a outros que ocorreram antes. De acordo com Freud, a vida mental ocorre de forma contínua, mesmo que as pessoas não estejam conscientes dessa continuidade entre os seus pensamentos e sentimentos. Portanto, o fato de não estarmos conscientes de algo não o torna inexistente ou enfraquecido. 2.1 A PRIMEIRA CONCEPÇÃO DE APARELHO PSÍQUICO PARA FREUD Freud dividiu, primeiramente, a mente humana em três níveis: consciente, pré- consciente e inconsciente. Figura 1: Iceberg para ilustração da primeira tópica de Freud: Consciente, Pré-Consciente e Inconsciente Consciente Pré-Consciente Inconsciente 29 Fonte: Imagem do Iceberg tirada da Internet (2020) 2.1.1 Consciente O consciente é a parte da sua mente que lida com todas as informações das quais você está ciente num dado momento. Agora, por exemplo, seu consciente está ocupado em dedicar atenção a esta leitura e tentar estabelecer relações entre as informações novas e as informações que você já tinha sobre o assunto. Enfim, o consciente agrega as informações às quais você dirige sua atenção de forma intencional, num dado momento. Mas o consciente é apenas a ponta do iceberg, uma pequena parte de sua mente. Outras partes, menos expostas, Freud chamou de pré- consciente e inconsciente. 2.1.2 Pré-Consciente É uma porção do inconsciente que facilmente se torna consciente. Na figura do iceberg, ele seria aquela parte que está imediatamente abaixo do nível da água e que é facilmente acessada. Todas as suas memórias que podem ser lembradas, como o que você comeu no café da manhã ou o conteúdo das aulas de geografia do sexto ano são memorias que se encontram no pré-consciente. O pré-consciente foi concebido como articulado com o consciente e funciona como uma espécie de barreira que seleciona aquilo que pode ou não passar para o consciente. 2.1.3 Inconsciente Imaginem o inconsciente como a parte mais submersa de um iceberg. Lá ocorrem processos mentais que nunca foram conscientes e que não podem ser acessados pelo consciente a não ser em situações excepcionais. É no inconsciente, lugar inacessível, que ficam os elementos instintivos e onde ficam guardadas informações que foram excluídas do consciente e que não podem ser lembradas pois foram reprimidas ou censuradas. Lembranças traumáticas, por exemplo, podem ser enviadas para o inconsciente e permanecerem lá influenciando indiretamente a vida mental do indivíduo, sem jamais serem lembradas novamente. Apesar de não termos clareza sobre o que está no inconsciente, sempre que um pensamento vier à mente e parecer que eles não tem nenhuma relação com os pensamentos ou sentimentos anteriores, na verdade eles estão relacionados. Mas esses elos se encontram no inconsciente, já que não existem descontinuidades na vida mental segundo Freud. No inconsciente também estão os principais determinantes da personalidade, as fontes de energia psíquica, pulsões e instintos. 2.2 PULSÕES Freud denominou pulsão ou instinto a “suprema causa de toda atividade” (1940, livro 7, p.21 na ed. bras.). Os instintos ou pulsões são as forças que levam as pessoas a agirem. Todos nós temos pulsões. Elas são pressões ou necessidades que nos dirigem a determinado fim. Toda pulsão tem uma fonte, uma necessidade, uma pressão e um objeto. Para entender melhor, podemos comparar a pulsão com a sede. A sede tem uma fonte que é a necessidade de líquidos para hidratar o corpo. Tem uma finalidade que é a de reduzir esta necessidade até que o organismos esteja satisfeito. A pressão 29 é a quantidade de energia que uma pessoa emprega para satisfazer a sede. Isso depende da intensidade e urgência da sede. O objeto não é a apenas o líquido, mas tudo que alguém faz para satisfazer a sede, por exemplo, levantar-se, ir até o filtro e beber a água. Pulsão é uma necessidade psíquica e ao mesmo tempo orgânica. Está na fronteira entre mental e físico. Existem dois tipos básicos: pulsão de vida e pulsão de morte. Pulsão de vida é tudo o que nos leva a buscar o prazer, à conquista, a realização. Pulsão de morteé a força que nos leva a busca do isolamento, da estagnação e a atos de destruição e morte. Essas forças, mantenedoras da vida e incitadoras da morte, residem em cada um de nós, em conflito permanente e não-resolvido e a maior parte dos nossos pensamento e ações é resultado não de apenas uma dessas forças mas de uma combinação das duas. 2.3 ENERGIAS Tanto a pulsão de vida quanto a pulsão de morte tem fontes de energia distintas. A fonte de energia da pulsão de vida é a libido que vem da palavra latina desejo. A libido é a energia empregada para a manutenção da vida. A pulsão da morte também tem uma fonte de energia específica mas Freud não deu um nome especial. Sempre que você se decida a construir algo ou em um projeto ou a uma realização importante você está empregando uma parte desta libido neste projeto. Enquanto você está empolgando com o trabalho, aquela quantidade de libido empregada torna-se indisponível para outros objetivos. Isso não quer dizer que nada mais importe na sua vida, porque podemos usar diferentes tipos de libidos para diferentes objetivos. Mas, quanto mais interesse uma situação desperta em você significa que maiores níveis de energia estão sendo investidos naquele projeto. Em situações de luto, as pessoas enlutadas perdem o interesse pelas atividades antes prazerosas porque essa libido está sendo investida no processo do luto. 2.4 ESTRUTURA DA PERSONALIDADE SEGUNDO FREUD Freud observou que seus pacientes revelavam inúmeros conflitos e acordos psíquicos. Com o objetivo de tentar organizar este caos, proporcionando algum conforto mental, propôs três componentes básicos estruturais da psique: o id, o ego e o superego. Nossa psique tem como meta principal, preservar ou recuperar um certo nível de equilíbrio interno que lhe permita minimizar o prazer e maximizar o desprazer. Essa tarefa é levada a cabo pelo relacionamento dinâmico entre os três componentes básicos da psique: o id, o ego e o superego. Eles se inter-relacionam e compõe nossa personalidade. 2.4.1 Id Id, em latim, quer dizer, Isto. É a estrutura original, básica e central da personalidade. Por isso é caótico, desorganizado sem forma. Todo o conteúdo do id 29 é inconsciente, ou seja, está compreendido na parte mais profunda de nosso psiquismo, formado por coisas incompatíveis com a civilização moderna. Mas não há como fugir dele pois fomos forçados a herdar tudo isso e a repetir. O inconsciente freudiano é vivo, poderoso, trancado e perigoso. Devido a esta natureza caótica, no id residem desejos contraditórios lado a lado sem que um anule o outro, pois a lógica não se aplica ao id. O id também a fonte de toda energia das pulsões, a pulsão de vida e a pulsão de morte que já vimos. Ele busca a liberação constante de toda energia, toda excitação e toda tensão. É como uma criança mimada que desconsidera os limites da realidade, procurando a autossatisfação de forma irracional e egoísta a todo momento, sem inibições e não tolerando as frustrações 2.4.2 Ego É uma estrutura da personalidade que se desenvolve a partir do id na medida em que o bebê vai tomando consciência de sua própria identidade. Sua função é a de atender e tentar aplacar as exigências do id, preservando a saúde, a segurança e a sanidade da psique. É o mediador entre mundo interno e mundo externo. Se esforça pelo prazer e tenta evitar o desprazer. Mas ele faz isso considerando as limitações e as oportunidades que são postas pela realidade externa, controlando as exigências do id e avaliando quando, como e se elas devem ser satisfeitas. O ego funciona segundo o princípio da realidade, separando o desejo da fantasia, tentando reduzir a tensão e aumentar o prazer. 2.4.3 Superego O superego é uma estrutura que surge a partir do ego e tem como função atuar como um juiz das ações e pensamentos do ego. No superego residem os códigos de conduta aprendidos no convívio social, bem como as inibições e os ideais. O superego age no sentido de proibir ou imitar certas atitudes. A capacidade de auto-observação é uma característica do superego, uma vez que ele age independente das pressões do id por satisfação e das pressões do ego, que também está envolvido na busca pelo prazer. O superego de uma criança, segundo Freud, se desenvolve de acordo com o modelo do superego de seus pais, ou seja, todo o conteúdo que ele abriga é derivado dos julgamentos, valores e tradições defendidos pela família durante a criação e que, desta forma, são transmitidos de geração a geração. O superego contém os ideais nobres pelos quais lutamos. Ele gera sentimentos de orgulho e de amor próprio por conta de nossos bons comportamentos mas também gera sentimentos de culpa e inferioridade pelos comportamentos desaprovados. Às vezes, o superego pode atuar de maneira severa e bem primitiva, com base nos julgamentos “preto-no-branco” em busca da perfeição e a pessoa pode se sentir culpada até mesmo por certos pensamentos, mesmo que eles não tenham provocado nenhuma ação. 2.5 FASES PSICOSSEXUAIS DO DESENVOLVIMENTO 29 Na medida em que vamos crescendo, alteramos nossos desejos e a forma como estes serão satisfeitos. Freud foi duramente criticado quando afirmou que as crianças tem sexualidade. Para Freud sexualidade representa também todo o universo dos afetos existente em cada um de nós. Freud tentou descrever cada fase, explicando as formas de gratificação e as áreas físicas de gratificação. Dizia que quando uma criança amadurece, ela vai desejando coisas diferentes e também vai encontrando formas diferentes de gratificar esses desejos. Há um misto de necessidades fisiológicas, descobertas e fantasias na sexualidade infantil diferentes da sexualidade que existe no adulto. Quando adulta, uma pessoa fixada em determinada fase, prefere satisfazer seus desejos ou necessidades de forma simples ou infantil, ao invés de tentar satisfazê-los de modos mais adultos, o que implicaria em um desenvolvimento normal. Vejamos cada fase: 2.5.1 Fase oral Desde o nascimento até, por volta de aproximadamente dois anos de vida, a zona erógena do bebê é a boca. Por que zona erógena? Porque é a área que concentra a gratificação recebida através da estimulação oral e da sucção. Adicionalmente, ao receber o alimento, o bebê também será confortado e acalentado durante a amamentação. Logo, ele associa o ato da alimentação à redução de sua tensão alimentar e ao ato de prazer gerados pelo contato afetuoso do adulto. Durante esta fase, a criança desenvolve um sentimento de confiança e conforto por meio da estimulação e aos poucos, vai adquirindo autonomia e independência, características essenciais para a maturação na vida adulta. É nesta fase que as pulsões se manifestam nas atividades que geram gratificação oral. A boca é a primeira parte do corpo que o bebê aprenderá a controlar e é para lá que ele dirigirá toda sua libido (seu desejo, sua energia que alimenta quase toda pulsão da vida). Portanto tudo o que o bebê faz com a boca – comer, morder, beber, sugar – gera prazer e satisfação. Ainda que o bebê esteja alimentado, ele desejará sugar ou morder objetos por causa da pulsão. A fome, que é uma necessidade orgânica, já foi satisfeita. Mas a pulsão, que é uma necessidade orgânica e psíquica, nunca será satisfeita. O principal conflito encontrado na fase oral é o processo de desmame. Vemos em adultos, hábitos orais bem desenvolvidos como comer, chupar, mascar, morder, lamber. Ter algum interesse oral na fase adulta é normal. Só podemos encará-lo como patológico se ele for o modo dominante de uma pessoa obter gratificação. Por exemplo, uma pessoa só consegue acalmar-se ou aliviar a ansiedade depois de chupar uma bala. 2.5.2 Fase anal 29 A fase anal ocorre na idade em que a criança geralmente aprende a controlar seus esfíncteres anais e a bexiga, ou seja entre os 2 e 4 anos. O foco principal da libidonesta fase está em controlar movimentos da bexiga e do intestino. A expulsão das fezes pelo ânus gera prazer, mas a criança também pode sentir prazer ao reter as fezes, o que cria uma espécie de conflito. Por um lado, eliminar as fezes é prazeroso, por outro lado existe a necessidade social de controlar essa eliminação até chegar no local adequado. A gratificação encontra-se nos elogios e recompensas que a criança recebe ao controlar a eliminação das fezes e fazer corretamente o uso do banheiro. Então, se por um lado é prazeroso eliminar as fezes, também o é retê-las. Nesta fase a criança pode controlar a eliminação das fezes como forma de obter elogios, por outro lado pode não querer controlar para chamar a atenção. Também pode ser confuso para a criança receber elogios dos pais quando ela faz o uso correto do banheiro, mas consideram o uso do banheiro algo sujo que precisa ser feito de forma discreta. A criança se pergunta como ela pode ser elogiada por eliminar as fezes na hora e no local certos e ao mesmo tempo ver que suas fezes são indesejadas. Nesta fase, o principal conflito reside no treinamento. Se os treinadores, geralmente os pais, são muito rígidos no controle, podem desenvolver adultos extremamente rígidos, obsessivos ou ordenados. Por outro lado, pais que tiveram uma abordagem mais branda no treinamento com seus filhos podem desenvolver crianças mais esbanjadoras ou destrutivas. O treino ao banheiro desperta um interesse natural pela autodescoberta. As crianças compreendem que o controle dos esfíncteres está ligado aos elogios e recompensas que podem obter do ambiente e isso desperta-lhes um sentimento de capacidade e produtividade. 2.5.3 Fase Fálica A criança entra na fase fálica por volta dos 4 anos. É nesta fase que começa a descoberta das diferenças entre homens e mulheres. Ela se dá conta de que tem um pênis ou de que lhe falta um. Os genitais passam a concentrar todas as tensões e atenções da criança. Os meninos começam a ter ereções e isso desperta interesse na região genital e, ao se darem conta de que as meninas não tem pênis, os meninos experimentam o que Freud chama de “ansiedade de castração” que é o medo de perder o pênis. Na fase fálica, as crianças começam a sentir ciúmes da atenção que seus pais dão um ao outro ao invés de darem a eles. Os meninos começam a enxergar o pai como um rival, o que levou Freud a chamar esse acontecimento de Complexo de Édipo. Édipo é uma peça teatral de tragédia grega escrita por Sófocles, onde Édipo, rei de Tebas, desconhecendo quem é o seu pai, mata-o e depois casa-se com sua 29 própria mãe. Quando descobre a identidade da pessoa que matou e da mulher com quem casou, Édipo arranca os próprios olhos. O Complexo de Édipo, então, é uma experiência inconsciente onde a criança deseja a mãe somente para si e passa a ter o pai como um rival. Com o tempo, a criança acredita que seu pai também o vê como rival e que, por isso, poderá ser castrado pelo pai e ficar inofensivo, dando origem ao sentimento de castração. O momento da dissolução do complexo se dá quando a criança, tomada pelo medo da castração, passa a identificar-se com seu pai, num belo jogo de “se eu não posso com ele, junto-me a ele”. Segundo Freud, o amor e o temor pelos pais, a ansiedade de castração e o desejo pela mãe são conflitos que nunca poderão ser resolvidos por completo. Então, são recalcados, ou seja, ainda na infância todo esse complexo é descartado para o inconsciente evitando que ele apareça e que a criança pense ou reflita a respeito dele. Reprimir o complexo de Édipo é uma das primeiras tarefas do superego, a estrutura psíquica que já estudamos anteriormente. A menina passa por um processo semelhante. Ela ama a mãe, mas como ela acredita que perdeu o pênis por causa dela, desenvolve-se a inveja do pênis e a raiva pela mãe. Então, seu objeto de desejo e amor passa a ser o pai. Ela fantasia que, se tiver um filho com seu próprio pai compensará seu órgão castrado. Como a menina acredita que já foi castrada ela não tem nada a perder. E isso faz com elas possam permanecer mais tempo na situação edipiana. De qualquer forma, após os 5 anos, o apego as pais costuma ser resolvido, então a maior parte das crianças se volta para o relacionamento com seus amigos, atividades escolares e brincadeiras. A ideia de que uma criança poderia ter desejo pelos pais era muito radical para aquele tempo então, essas ideias foram fortemente refutadas por muitos críticos de Freud. 2.5.4 Período de latência Para Freud, a maioria das crianças modifica seu apego aos pais em algum momento entre os 5 e 12 anos de idade e voltam-se para relações com amigos, esportes, atividades escolares ou outras habilidades. Nessa fase, os desejos sexuais não são atendidos pelo ego e são, com sucesso, reprimidos pelo superego. Depois dessa fase, a sexualidade não avança mais – muitos desejos diminuem de intensidade e são abandonados e até mesmo esquecidos. É aí também que sentimentos como repulsa, vergonha e moralidade começam a florescer. É o marco do desenvolvimento do superego. 2.5.5 Fase Genital É a fase final do desenvolvimento biológico e psicológico. Ocorre com o início da puberdade e é o momento onde a energia libidinal retorna para os órgãos sexuais. Nesta fase, meninos e meninas estão conscientes de suas identidades sexuais distintas e começam a buscar formas de satisfazer suas necessidades eróticas e interpessoais. É na fase genital que o desejo sexual torna-se adulto. Sentimentos 29 edipianos não resolvidos podem retornar e assombrar a vida psíquica de alguns adolescentes sendo responsáveis por parte das turbulências vividas nesta etapa da vida. Na visão de Freud, todas as pessoas que conseguirem progredir nas diferentes fases do desenvolvimento resolvendo os diferentes conflitos de forma satisfatória se tornarão adultos mais psicologicamente saudáveis. 2.5.6 Fixação É o que ocorre quando uma pessoa não consegue avançar normalmente de uma fase pra outra, permanecendo muito envolvida com gratificações simples ou infantis. É o apego permanente da libido a um estágio inicial e mais primitivo de desenvolvimento. Pessoas que comem demais, fumam demais, ou tentam encontrar gratificação oral para lidar com a ansiedade ou situações difíceis podem ter fixação na fase oral, ou seja, sua maturação psicológica pode não ter sido completa. Já as pessoas obcecadas por ordem, parcimônia ou obstinação podem ter sofrido experiências difíceis durante a fase anal, resultando em fixação por limpeza e organização. 2.6 NEUROSE O termo neurose foi criado pelo médico escocês Willian Cullen, em 1769 para se referir a doenças nervosas que geravam distúrbios na personalidade. Outros estudiosos também trabalharam este termo como os franceses Philip Pinel e Jean Martin Charcot. A neurose, para Freud, é um distúrbio psíquico e sua causa se encontra no recalque imperfeito de desejos que foram censurados. Esses desejos que foram aprisionados no inconsciente procuram meios de se manifestar e esses meios podem ser os sintomas neuróticos. Isso acontece porque o ego é incapaz de lidar com esses desejos reprimidos sem sofrer. Então, quando fragmentos desse desejo conseguem driblar o recalque e voltar à consciência, eles precisam ser mascarados. Surge então o sintoma neurótico. Mas, que desejos reprimidos seriam esses? Incialmente, Freud percebeu que seus pacientes neuróticos sempre traziam à tona lembranças de abusos sexuais sofridos na infância, então, ele desenvolveu a chamada teoria da sedução que afirmava que as raízes das neuroses se encontravam em experiências sexuais traumáticas vividas na infância. Na medida em que Freud avançava nas pesquisas, ele descobria que aquelas lembranças eram, na verdade, fantasias. Ou seja, seus pacientes não tinham sido abusados. Eles estavam trazendo novamente à consciênciaseus próprios desejos sexuais infantis que tinham sido recalcados por medo, culpa e vergonha. Por terem sido recalcados, esses desejos apareciam distorcidos ao longo da terapia como se fossem experiências traumáticas nas quais o paciente se via como vítimas de um abuso. 29 É importante voltar a dizer que, para a psicanalise, o termo sexualidade não se refere apenas ao ato sexual mas também ao universo dos afetos. Logo, desejo sexual inclui, além dos prazeres genitais, o desejo de ser amado, de ser reconhecido e o amor fraternal, por exemplo. Vimos que o bebê sente prazer ao ser alimentado e que esse prazer não é de ordem genital. A sexualidade do bebê está relacionado à satisfação da tensão alimentar e ao afeto que ele recebe do adulto durante este ato de satisfação. O registro dessa satisfação que é simultaneamente fisiológica e afetiva está na base da sexualidade humana. Assim, a sexualidade infantil envolve uma gama enorme de sensações, afetos, descobertas e fantasias, por isso um desejo sexual infantil reprimido não é, obrigatoriamente, um desejo relacionado ao ato sexual em si, mas ao universo de anseios muito mais abrangentes. A neurose, então, é resultado de desejos infantis que foram interditados, esquecidos e que, mais tarde, se manifestam através de alguns sintomas. Estes sintomas caracterizam formas diferentes de neuroses, como neurose histérica, neurose obsessiva, neurose fóbica e as neurastenias (quadro que se revela através da perda geral de interesse tanto físico quanto intelectual que eram bastante associados aos sintomas da histéricas então pacientes de Freud. 2.7 MECANISMOS DE DEFESA DE EGO Como vimos, existe uma tensão entre as pulsões que o id deseja realizar e as limitações impostas pela realidade externa. Já que nem todas as demandas do id podem ser satisfeitas, muitos desejos precisam ser adiados por longo tempo ou até mesmo serem frustrados. Outras vezes, as pulsões do id podem ser canalizadas para objetos diferentes do objeto original. Por exemplo, desejos de agressão podem ser canalizados para o boxe ou outro tipo de luta corporal na qual a agressividade será expressa dentro de regras coletivamente aceitas. Isso é possível porque as pulsões apresentam características mutáveis, flexíveis, fluidas e podem ser gratificadas de formas alternativas. Contudo para uma pulsão ser inibida pode ser necessário um gasto de energia muito grande, resultando em cansaço, aborrecimento e um estado emocional doloroso chamado ansiedade. Na ansiedade existe uma sensação de perigo iminente. Para Freud, a ansiedade pode ser resultado de pulsões não realizadas, cuja libido foi contida. Ou ainda consequência de experiências traumáticas. Portanto, na visão de Freud, a ansiedade é resultado do conflito das inclinações do id e da ameaça de punição do superego. Em resumo, o id deseja algo, o superego reprova o desejo e instala-se no ego a desconfortável sensação de medo, como se a punição estivesse prestes a acontecer. Para se livrar desse sentimento doloroso, o ego cria mecanismos de defesa. Esses mecanismos deformam ou negam a própria realidade e, assim, nos defendemos de sentimentos e aspectos da personalidade reprováveis ao superego e 29 que podem ser bastante perturbadores. Quando algo da realidade externa nos amedronta, alguns desses mecanismos também são usados. Veremos alguns desses mecanismos: 2.7.1 Projeção Um desses mecanismos de defesa descritos por Freud é a projeção. Projeção é o ato de atribuir a outra pessoa sentimentos ou características que originalmente são meus. Eu coloco estes aspectos, geralmente inaceitáveis por mim, para o meio externo. No ambiente organizacional e nas relações de trabalho, facilmente percebemos isso. Quando alguém diz que alguém não é confiável, pode estar se referindo a si próprio, sem saber que está. Ou quando diz que seu chefe é autoritário e arrogante, pode estar projetando características próprias no chefe. Aqui não cabe julgar se o outro é ou não é o que está sendo projetado nele, mas a ideia do conceito freudiano é a de que quando consideramos alguém mau, perigoso, pervertido, arrogante, intolerável, mentiroso ou qualquer outro adjetivo desagradável, sem reconhecermos que isso também está presente em nós, é bem provável que estejamos projetando. Pessoas que negam ter um traço específico de personalidade geralmente são mais críticas em relação a este traço quando o veem em outras pessoas. Isso quer dizer que aquele colega de trabalho que é extremamente crítico pode estar usando o mecanismo da projeção. 2.7.2 Formação Reativa Referem-se a inclinações que uma pessoa tem para um comportamento que ela considera reprovável. Então se adota um comportamento que representa exatamente o oposto daquela inclinação, ou seja, utiliza-se uma máscara social, tanto para convencer os outros quanto para convencer a si mesmo. A formação reativa só é percebida quando ela falha, ou seja, quando a máscara cai. Por exemplo, quando uma pessoa que é extremamente moralista abusa de pessoas indefesas, ou quando um homem conhecido por ser gentil e educado, comete um assassinato. 2.7.3 Racionalização Uma ação inaceitável que foi cometida por alguém é justificada de forma que o ato deixa de ser percebido por inaceitável. A pessoa que usa o mecanismo de defesa da racionalização reconhece o ato reprovável, mas nega sua intenção, como um empresário que aceitou suborno, mas que se justifica dizendo que foi obrigado a aceitá-lo. 2.7.4 Negação 29 Aqui, um evento frustrante ou doloroso ou mesmo um pensamento ou desejo é negado como forma de se proteger psicologicamente da dor. Para se proteger, por exemplo, de um sentimento reprovável como a raiva, a pessoa pode dizer, furiosa, que não está com raiva, embora o sentimento seja evidenciado em seus gestos e expressões. Pode ser manifestado também quando uma pessoa nega que deseja algo que não pode ter ou cuja posse é considerada socialmente reprovável. 2.7.5 Isolamento No isolamento há uma separação entre pensamento e emoção. Neste mecanismo, o conteúdo emocional de uma lembrança ou de um desejo pode ser separado da lembrança ou do desejo propriamente ditos. Por exemplo, quando alguém tem o desejo ou fantasia de agredir seu próprio irmão sem experimentar o conteúdo emocional perturbador que acompanha esse desejo. 2.7.6 Deslocamento Redirecionamos um impulso agressivo para um objeto que não seja ameaçador. Por exemplo, após levar uma bronca do chefe você pode redirecionar sua agressividade gritando com seu cachorro ao chegar em casa. 2.7.7 Sublimação A sublimação consiste na busca de modos socialmente aceitáveis de satisfazer, ao menos parcialmente, as pulsões do id. A pulsão é canalizada para um objeto diferente do original, geralmente um objeto considerado culturalmente superior. Caracteriza-se por apresentar uma inibição do objeto e sua dessexualização. É responsável pela civilização, já que é resultante de pulsões subjacentes que encontram vias aceitáveis para o que é reprimido. Na sublimação, em vez de a pulsão ser enfrentada, ela é orientada para finalidades belas e nobres. Alguém com pulsões agressivas pode ser orientado e se tornar um lutador de boxe, um bom açougueiro ou mesmo um médico cirurgião. De acordo com Freud, a essência da civilização está na capacidade de canalizar as energias sexuais e destrutivas para finalidades nobres como artes, ciência, conquistas, etc. 2.7.8 Repressão É um mecanismo de defesa fundamental e o mais estudado por Freud. No recalque, como também é chamada a repressão, o pensamento, sentimento ou desejo inaceitável é descartado para o inconsciente o que requer um gasto de energia permanente para manter o inaceitável longe da consciência. Este mecanismo censura os traços de memória que nos trouxeram sofrimento anteriores para que eles não fiquem o tempointeiro convivendo conosco em nossa vida desperta. Tenta nos proteger de um sofrimento que já vivemos. Porém este mecanismo falha, por isso sofremos angústia. 29 2.7.9 Regressão Retrocedemos a um tipo de comportamento mais primitivo como forma de evitar a ansiedade. Uma pessoa, por exemplo, que devora um pote de sorvete após uma discussão está regredindo à fase oral do desenvolvimento na qual se sentia mais protegida e feliz. 3. A TEORIA DA PERSONALIDADE NA VISÃO DA PSICOLOGIA HUMANISTA Carl Rogers e Abraham Maslow, os fundadores Carl Rogers nasceu em 8 de janeiro de 1902, na cidade de Oak Park, Illinois. Era filho de evangélicos fundamentalistas. Durante sua infância viveu no isolamento. Era um ótimo aluno, mas apesar do sucesso no colégio, considerava-se solitário e inadaptado. Tinha grande dificuldade de se comunicar com as pessoas e, quando se comunicava era sempre de forma superficial. Quando entrou na Universidade, separou-se da família e, pela primeira vez aproximou-se mais intimamente das pessoas. Resolveu fazer teologia porque queria ser pastor. Após uma viagem à China pode observar seus conceitos religiosos e se tornou mais liberal e independente psicologicamente. Esta viagem lhe proporcionou grande transformação. Juntamente com Rogers, Abraham Maslow, foi também fundador da Teoria Humanista. Maslow criou a Teoria das Necessidades e a Psicologia da Auto Atualização e interessava-se profundamente pelo estudo do crescimento e desenvolvimento pessoais. Servia-se da psicologia como instrumento de promoção de bem-estar social e psicológico. Sua teoria teve fortes bases na teoria psicanalítica, porém acreditava que a psicanálise apresentava um homem sempre desequilibrado e distorcido, patológico. Ele mesmo disse “É como se Freud nos tivesse fornecido a metade doente da Psicologia e nós devêssemos preencher com a outra metade sadia.” (Maslow,1968, p.30 ed. Bras.) 29 No final dos anos 50, Rogers, Maslow e outros psicólogos reuniram-se para discutir o desenvolvimento de uma organização profissional dedicada a uma abordagem mais humanista da psicologia. Os temas centrais desta nova abordagem seriam a auto realização, a criatividade e a individualidade. Em 1961 eles estabeleceram oficialmente a Associação Americana de Psicologia Humanista. Em 1962, Abraham Maslow publicou o livro “Introdução à Psicologia do Ser” em que descreve a psicologia humanista como sendo a “terceira força da psicologia”. As outras duas seriam a psicanálise e o behaviorismo. Não devemos tratar essas escolas como sendo concorrentes, pois cada uma delas tem contribuído para a nossa compreensão da mente e do comportamento humano. 3.1 BASES DA PSICOLOGIA HUMANISTA A psicologia humanista salienta o crescimento, a liberdade pessoal, a automotivação e a auto realização. Surgiu na década de 1950 como uma reação à psicanálise e ao behaviorismo que, na época, dominavam a psicologia. A Psicanálise estava focada em compreender o comportamento a partir das motivações inconscientes enquanto o behaviorismo estudava os processos de condicionamento que produzem o comportamento. Os pensadores humanistas acreditavam que, tanto a psicanálise quanto o behaviorismo eram demasiadamente pessimistas quer focando o mais trágico das emoções quer não levando em conta o papel das escolhas pessoais. A Psicologia Humanista foca no potencial de cada indivíduo e em sua capacidade de crescimento e auto realização. A crença fundamental é que as pessoas são naturalmente boas e que os problemas mentais e sociais, resultam de desvios dessa tendência natural. Os autores sugerem que as pessoas estão motivadas a seguir coisas que as ajudarão a alcançar todo o seu potencial como seres humanos. Essa necessidade de realização e crescimento pessoal é o motivador chave de todo comportamento. As pessoas estão sempre em busca de novas formas de crescer, tornarem-se melhores e aprender coisas novas. 3.2 TEORIA DA HIERARQUIA DAS NECESSIDADES As chamadas teorias das necessidades partem do princípio de que os motivos do comportamento humano residem no próprio indivíduo: sua motivação para agir e se comportar deriva de forças que existem dentro dele. Algumas dessas necessidades são conscientes, enquanto outras não. A teoria de Maslow é a teoria mais conhecida e se baseia na chamada hierarquia de necessidades humanas. Segundo Maslow, as necessidades humanas estão organizadas em graus de influência do comportamento. Na base da pirâmide encontram-se as necessidades biológicas e recorrentes - necessidades primárias -, enquanto no topo estão as mais sofisticadas e intelectualizadas - as necessidades secundárias. A Figura abaixo dá uma ideia desse arranjo hierárquico. 29 Figura 1: Pirâmide da Hierarquia das Necessidades de Maslow Fonte: a autora (2020) 3.2.1 Necessidades fisiológicas Neste nível estão todas as necessidades humanas mais primárias e instintuais. São inatas como a necessidade de alimentação (fome e sede), de sono e repouso (cansaço), de abrigo (contra o frio ou calor), ou desejo sexual (reprodução da espécie). Estas necessidades exigem satisfação constante a fim de garantir a sobrevivência do indivíduo. Orientam a vida humana desde o momento do nascimento em uma busca contínua e constante da satisfação dessas necessidades inadiáveis. Controlam todo o comportamento do recém-nascido e predominam no adulto sobre todas as demais necessidades humanas, até que sejam satisfeitas. São, portanto, as necessidades relacionadas com a própria subsistência e existência do indivíduo. Sua principal característica é a urgência: quando alguma dessas necessidades não está satisfeita, ela domina a direção do comportamento da pessoa, levando-a a satisfazê-la a qualquer custo. 3.2.2 Necessidades de segurança Este é o segundo nível das necessidades humanas e levam a pessoa a proteger-se de qualquer perigo, seja ele real, imaginário, físico ou abstrato. Refere-se à busca por proteção contra ameaças ou privações. Tendem a surgir no com- portamento humano quando as necessidades fisiológicas estão relativamente satisfeitas. Estão intimamente relacionadas com a sobrevivência da pessoa. As necessidades de segurança têm grande importância, uma vez que na vida organizacional as pessoas têm uma relação de dependência com a organização e onde muitas ações gerenciais ou as decisões inconsistentes e incoerentes destas podem provocar incerteza ou insegurança nas pessoas quanto a sua permanência no trabalho. 3.2.3 Necessidades sociais Estas necessidades estão relacionadas com a vida social do indivíduo. São as necessidades de associação, de participação, de aceitação por parte dos colegas, o sentimento de pertencimento, de troca de amizade, de afeto e de amor. Surgem no 29 comportamento quando as necessidades primárias se encontram relativamente satisfeitas. A frustração dessas necessidades conduz geralmente à falta de adaptação social e à solidão. A necessidade de dar e receber afeto é uma importante ativadora do comportamento humano quando se utiliza a administração participativa. 3.2.4 Necessidades de estima: São as necessidades relacionadas com a auto avaliação e a autoestima da pessoa. Envolvem a auto apreciação, a autoconfiança, a necessidade de aprovação social, de reconhecimento social, de status, prestígio, reputação e consideração. A satisfação dessas necessidades conduz a sentimentos de autoconfiança, valor, força, prestígio, poder, capacidade e utilidade. Sua frustração pode produzir sentimentos de inferioridade, fraqueza, dependência e desamparo, os quais, por sua vez, podem levar ao desânimo ou atividades compensatórias. 3.2.5 Necessidades de auto realização São as necessidades humanas mais elevadas e que se encontram no topo da hierarquia. São as necessidades que levam cada pessoa a tentar realizar seu própriopotencial e se desenvolver continuamente ao longo de toda a vida. Essa tendência expressa-se por meio do impulso da pessoa em tornar-se mais do que é e de vir a ser tudo o que pode ser. As necessidades de auto realização estão relacionadas com autonomia, independência, autocontrole, competência e plena realização daquilo que cada pessoa tem de potencial e de virtual, da utilização plena dos talentos individuais. Enquanto as quatro necessidades anteriores podem ser satisfeitas por recompensas externas (extrínsecas) à pessoa e que têm uma realidade concreta (como comida, dinheiro, amizades, elogios de outras pessoas), as necessidades de auto realização somente podem ser satisfeitas por recompensas que são dadas intrinsecamente pelas pessoas a si próprias (como o sentimento de realização) e que não são observáveis nem controláveis por outros. Por outro lado, as demais necessidades, enquanto satisfeitas, não motivam o comportamento; a necessidade de auto realização pode ser insaciável, no sentido de que quanto mais a pessoa obtém recompensas que a satisfaçam, mais importante ela se torna e mais ainda a pessoa desejará satisfazê-la. Não importa quão satisfeita a pessoa esteja, pois ela quererá sempre mais. Resumindo, a teoria da hierarquia das necessidades humanas aponta que apenas as necessidades não satisfeitas podem influenciar o comportamento, dirigindo o indivíduo para objetivos individuais. Ao nascer as necessidades fisiológicas buscam satisfação prioritária e a partir de uma certa idade, o indivíduo ingressa em uma longa trajetória de aprendizagem de novos padrões de necessidades. Surgem as necessidades de segurança, voltadas para a proteção contra o perigo, contra as ameaças e contra a privação. As necessidades fisiológicas e as de segurança constituem as necessidades primárias do indivíduo, voltadas para sua conservação pessoal. À medida que o indivíduo passa a controlar suas necessidades fisiológicas e de segurança, gradativamente as necessidades sociais, de estima e de auto realização. Porém, quando o indivíduo alcança a satisfação das necessidades sociais, surgem as necessidades de auto realização. 29 As necessidades mais elevadas não somente surgem à medida que as mais baixas vão sendo satisfeitas, mas predominam as mais baixas de acordo com a hierarquia das necessidades. O comportamento do indivíduo é influenciado por um grande número de necessidades concomitantes, porém as necessidades mais elevadas têm uma ativação predominante em relação às necessidades mais baixas. A abordagem de Maslow - embora genérica – representa um valioso modelo de atuação sobre o comportamento das pessoas e para a gestão de pessoas. 3.3 CONCEITOS PRINCIPAIS 3.3.1 O campo fenomenológico Há um campo único de experiência para cada indivíduo que Rogers designou de campo de experiência ou campo fenomenológico. Nele está tudo o que ocorre com o ser humano e que é consciente. Estão inclusas suas percepções, sensações e impactos que a pessoa não toma consciência, mas poderia caso tivesse prestado atenção a esses estímulos. É seu mundo pessoal que pode ou não corresponder à realidade objetiva. 3.3.2 Self Neste campo de experiência encontra-se o Self. O Self consiste num processo constante de transformações à medida que as situações vão mudando. É o processo contínuo de reconhecimento. Rogers também chama o Self de autoconceito, que é a visão que uma pessoa tem de si mesma, baseada em suas experiências, motivações e expectativas. 3.3.3 Self Ideal Self ideal é um conjunto de características que as pessoas desejariam usar para descrever a si mesmas e referem-se à tudo aquilo que uma pessoa quer vir a ser. Está em constante redefinição por ser móvel e variável. A lacuna entre o self (como eu me vejo) e o self ideal pode ser um indicador de desconforto e ansiedade. Quanto maior a disparidade entre os dois, maiores poderão ser as dificuldades neuróticas Quando o indivíduo se aceita como é e não como deveria ser está caminhando rumo à saúde mental. 3.3.4 Congruência e incongruência 29 Congruência se relaciona com as semelhanças existentes entre a experiência do indivíduo e a sua tomada de consciência sobre ela. Quanto maior a semelhança entre o que você expressa (comunicação), o que você vivencia (experiência) e o que você percebe (tomada de consciência), maior é o grau de congruência existente. Já a incongruência é a discrepância que existe entre a expressão e a tomada de consciência. Neste caso, a pessoa não expressa o que realmente está sentindo, soando como falso ou mentiroso, sem autenticidade. Ela pode ser sentida como tensão, ansiedade ou confusão interna. Não saber onde estamos, que horas são ou quem somos revela um alto grau de incongruência. A incongruência pode ser percebida quando uma pessoa não sabe o que quer, não acredita ser capaz de algo ou mesmo de tomar decisões. 3.3.5 Tendência à Auto Atualização Segundo a teoria humanista, a auto atualização é um impulso que move toda a vida humana. Seria capacidade de expandir-se, desenvolver-se, amadurecer e se expressar autonomamente. É a força que nos leva em busca da competência e da capacidade. Significa experimentar de modo pleno, intenso e desinteressado, com plena concentração e total absorção. Segundo Maslow, a auto atualização é também um processo de fazer cada escolha que tomamos na vida, uma opção para o nosso próprio crescimento. É aprender a sintonizar-se com sua própria natureza íntima. É decidir sozinho se gosta de algo ou não, independente das opiniões alheias. 4. TEORIA DA PERSONALIDADE NA VISÃO DA TEORIA COMPORTAMENTAL Skinner, o criador da teoria comportamental, nasceu em 1904 na Pensilvânia. Filho de advogado, tinha um verdadeiro fascínio pelas invenções mecânicas. Durante o período do colegial, era um aluno regular, mas na universidade tornou-se um aluno estudioso e exemplar. Ele mesmo confessa que, durante o período da faculdade não tinha encontros e só lia livros de Psicologia e Filosofia. Quando recebeu o PHD, trabalhou na Faculdade de Medicina de Harvard, onde fazia pesquisas com o sistema nervoso de animais. No ano de 1936, foi professor da Universidade de Minessota, onde lecionou Psicologia Experimental e Introdução à Psicologia. Nesta faculdade formou importantes behavioristas. As teorias de Skinner sobre a personalidade tem sido alvo de elogios e críticas. Defensor da personalidade como uma coleção de padrões de comportamentos, Skinner julga que não existe o “eu” em um comportamento observável. A personalidade para os behavioristas, portanto, não tem um lugar definido na análise científica do comportamento. 29 Skinner iniciou suas teorias com animais. Com estes, ele usou reforçadores como alimentos, água e choques elétricos. 4.1 Condicionamento Respondente Equivale ao reflexo. Ocorre quando o organismo responde de maneira automática a um determinado estímulo, como por exemplo: nossa pupila contrai-se ou dilata-se dependendo da quantidade de luz que chega até ela; seu corpo transpira quando a temperatura externa aumenta; seu coração acelera diante de uma situação de perigo. Ivan Pavlov, um estudioso do comportamento que realizou seu trabalho mais importante em 1927, descobriu que o comportamento pode ser condicionado. Em um de seus experimentos, considerado clássico, Pavlov uniu um estímulo neutro, no caso uma campainha, com a chegada de um alimento. Geralmente, quando vê a comida, o cão saliva. Pavlov demonstrou que após ser exposto ao estímulo da comida e ao mesmo tempo ao estímulo da campainha, o cão passava a salivar toda vez que a campainha tocava, mesmo sem que a comida estivesse presente. Assim como este cão, também podemos ser condicionados a salivar quando entramos num restaurante ou ouvimos alguém nos chamando para o jantar. O condicionamento respondente pode ser facilmente aprendido e manifestado;
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