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Teorias da personalidade - James Fadiman Roberet Frager

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FREDERICK S. PERIS
E A
GESTALT-TERAPIA
F RE DE RI C K S . PERLS
Dentro e fora da lata de 
lixo
Coloco minha criação 
Seja ela viva ou antiquada 
Tristeza ou exaltação. 
Alegria e pesar como eu 
tive
Serão revistos;
Sentindo-me sadio e 
estando louco 
Acolhido ou rejeitado. 
Trastes e caos interrom-
pem-se 
Ao invés da selvagem 
confusão 
Formam uma significativa 
Gestalt 
No final de minha vida 
(Perls. 1969b)
Frederick S. Perls, o criador da Gestalt-terapia. ocupa uma posição um tanto singular 
no contexto deste manual. Ao contrário de Freud, Jung, Adler, James e outros, suas 
contribuições para a psicologia da personalidade ocorrem principalmente na área da 
prática da psicoterapia, mais do que na área da teoria da personalidade. No entanto 
nos últimos anos. a popularidade da Gestalt-terapia e sua utilização numa ampla varie­
dade de outros contextos além dos especificamente terapêuticos, sugerem que vale a 
pena examinar Perls e a visão ''gestáltica" do ser humano; ambos representam uma cor 
rente e uma tendência importante na psicologia da personalidade. De fato, a própria 
falta de uma ênfase estritamente teórica na maioria dos trabalhos posteriores de Perls 
reflete a direção para a qual ele tentava dirigir a Psicologia; Perls estava convencido de 
que uma visão das pessoas e da psicoterapia genuinamente holfstica e produtiva exigiria 
uma substancial desintelectualização, visto que o intelecto ocidental tinha-se tornado, 
em suas palavras "a prostituta da inteligência . . . um substituto pobre e pálido da imedia 
ticidade vivida do sentir e vivenciar" (Perls, 1967, p. 15).
No fim de sua vida, Perls percebeu que não obstante os perigos da superintelectua 
lização, algumas afirmações teóricas de sua abordagem eram necessárias para impedi» 
que suas idéias fossem reduzidas a um coniunto de truques e tentativas de curas psico- 
terapéuticas instantâneas. Perls nunca completou seu último manuscrito iA Abordagem 
Gestáltica. publicado postumamente), mas. mesmo em sua forma incompleta, o livro for­
nece. ao lado de outros trabalhos de menor especificidade teórica, uma base para com­
preender a visão gestáltica da psicologia da personalidade. Embora seja certo que vale a 
pena estrapolar a teoria coerente que fundamenta o trabalho de Perls a fim de compreen­
der melhor o desenvolvimento e a utilidade da Gestalt-terapia. tal esforço não seria capaz 
de captar o carisma, a força e o contágio do estilo próprio e pessoal de Perls-um estilo 
que. tanto nas obras quanto na vida de Perls, contribuiu indubitavelmente para a recente 
popularidade da Gestalt-terapia tanto quanto seus méritos mais teóricos.
H ISTÓ R IA PESSO AL
Frederick S. Perls nasceu em Berlim em 1893, filho de pais judeus de 
classe média baixa. Em sua autobiografia. Dentro e Fora da Lata de Lixo, 
Perls descreve-se como a ovelha negra da família, freqüentemente irritado e 
desdenhoso em relação a seus pais. expulso da escola após ter repetido duas 
vezes a sétima série e envolvido em problemas com autoridades durante toda 
sua adolescência.
Conseguiu, no entanto, terminar seus estudos e recebeu o diploma de 
médico, especializando-se em psiquiatria. Enquanto terminava seu treinamen-
to médico, juntou-se ao exército alemão e serviu como médico na Primeira 
Guerra Mundial. Depois da guerra voltou a Berlim e, entrando na Sociedade 
dos Boémios Berlinenses, começou a formular algumas das idéias filosóficas 
que forneceriam fundamentos para o desenvolvimento da Gestalt-terapia. 
Em 1926, Perls trabalhou com Kurt Goldstein no Instituto de Soldados com 
Lesões Cerebrais e compreendeu, através de seu trabalho com Goldstein, a 
importância de considerar o organismo humano como um todo, ao invés de 
vé-lo como um aglomerado de partes funcionando desordenadamente.
Em 1927 mudou-se para Viena e começou seu treinamento em psicaná-
lise; foi analisado por Wilhelm Reich e supervisionado por várias outras figuras 
importantes do movimento psicanalítico que se iniciava: Karen Homey. 
Otto Fenichel e Helene Deutsch, entre outros.
Em 1933, com a ascensão de Hitler ao poder, Perls partiu para a Holan-
da e depois para a África do Sul, onde fundou o Instituto Sul-Africano de
FREDER ICK S. PERLS E A GESTALT-TERAPIA 127
Psicanálise. Voltou à Alemanha em 1936 para apresentar um trabalho no 
Congresso Psicanalítico e encontrar-se com Sigmund Freud. O encontro foi 
uma grande decepção para Perls; recorda-se de que durou talvez quatro minu-
tos e de que não ofereceu nenhuma oportunidade para explorar as idéias de 
Freud, o que Perls esperava há anos.
Muitos anos depois, Perls rompeu abertamente com o movimento psica-
nalítico e, em 1946, imigrou para os Estados Unidos. Prosseguiu com o desen-
volvimento da Gestalt-terapia e, em 1952, fundou o Instituto Nova-iorquino 
de Gestalt-terapia. Mudou-se para Los Angeles e, então, no início dos anos 
sessenta, para o Instituto Esalen em Big Sur na Califórnia, onde propôs 
workshops, lecionou e passou a ser amplamente conhecido como expoente 
de uma filosofia e de um método de psicoterapia novos e viáveis. Pouco antes 
de sua morte, seu interesse voltou-se para o estabelecimento de um kibbutz 
gestáltico. Morreu em 1970 na ilha de Vancouver, o local da primeira comu-
nidade gestáltica terapêutica.
AN TECED EN TES IN TELEC TU A IS
As principais correntes intelectuais que influenciaram diretamente Perls 
foram a psicanálise (principalmente Freud e Reich), a psicologia da Gestalt 
(Kohler. Wertheimer, Lewin, Goldstein e outros) e o existencialismo e a 
fenomenologia. Perls também incorporou algumas das idéias de J. L. Moreno, 
um psiquiatra que desenvolveu a noção da importância do desempenho de pa-
péis em psicoterapia. De um modo menos explícito, Perls descreve a filosofia 
e a prática do Zen como uma importante influência, particularmente em seus 
últimos trabalhos.
Psicanálise
Freud. O primeiro livro que Perls escreveu, Ego, Hunger and Aggression, 
não pretendia fornecer uma nova teoria da personalidade, mas deveria consti-
tuir uma revisão da teoria psicanalítica. De fato, uma boa parte do trabalho 
de Perls foi dedicado ao desenvolvimento do que considerava uma extensão 
do trabalho de Freud. Mesmo após seu rompimento formal com este último, 
Perls continuou a julgar suas próprias idéias como uma revisão do trabalho 
de Freud e, mais ainda, como uma revisão da psicanálise de acordo com a 
interpretação de muitos da segunda geração psicanalítica. As divergências 
entre Perls e Freud estavam relacionadas principalmente com os métodos de 
tratamento psicoterápico de Freud, mais do que com suas exposições teóri-
cas sobre a importância das motivações inconscientes, a dinâmica da persona-
lidade, padrões de relacionamentos humanos e assim por diante. “Não as des-
cobertas de Freud, mas sua filosofia e técnica, tomaram-se obscuras” (Perls, 
1969b, p. 14).
Na discussão da influência da psicologia da Gestalt sobre Perls, o con-
ceito de organismo humano como um todo foi de grande importância. Perls 
sentia que o trabalho de Freud era basicamente limitado pela falta de ênfase 
numa visão holística do funcionamento do organismo, na qual indivíduo e 
meio são partes de um único campo em constante interação. Esta abordagem 
holística em que cada um dos elementos de expressão do organismo está em 
intima relação com o todo, levou Perls a dar ênfase particular, ao contrário 
de Freud, ao material óbvio mais do que ao profundamente reprimido, como
Meu rom p im en to com os 
freud ianos acon teceu a l-
guns anos mais ta rde (após 
meu e nc on tro com F reu d). 
mas o fan tasm a nunca foi 
com ple tam en te t ra nqü iliz a-
d o . . . T en te i to rn ar a 
psicanálise m eu lar esp iri-
tual, m inha relig ião. . . .S o -
breveio en tão a revela-
ção . . . . Eu m esm o tin ha 
q ue me responsab ilizar pela 
m inha ex istência (Perls, 
1969b, pp. 59 -60, pa rên -
teses acrescen tados).
N enhum de nós, provavel-
m en te com exceção do 
p róprio F reud . co m preen-
d eu a p rem aturidad e em 
ap licar a psicanálise no t ra -
tam e n to . . . . Não a vimos 
com o rea lm en te era: um 
projeto de pesquisa (Perls, 
1969b , p . 142).
128 TEORIAS DA PERSONALIDADE
Se o pacien te vai fechar o 
livro de seus p rob lem as 
passados, deve fechá-lo no 
p resen te . P o rque deve e n -
te nde r que se seus p rob le-
mas passados fossem rea l-
m en te passados, não seriam 
mais p rob lem as e , c er ta -
m en te , não seriam a tuais 
(Perls, 1973 , p. 76 na ed. 
b ras.).
Se a sobrevivência de um 
indiv íduo fo r am eaçada 
po rque seu nível de açú -
car no sangue es tá m uito 
ba ixo , ele p rocurará com i-
da . A sobrevivência de 
S cheherezade foi am eaçada 
pelo S u ltão e para fazer 
f ren te è am eaça ela lhe 
co n tou estó rias d u ran te 
mil e um a no ites. P od er ía-
mos en tão d izer que ela 
tin ha um in stin to co n ta d or 
de estórias? (Perls, 1973 , 
pp. 22-23 na ed. bras.)
elemento crucial para a compreensão e o trabalho com o conflito intrapsí- 
quico. Do mesmo modo, Perls acentuava a importância do exame da situação 
da pessoa no presente, ao invés da investigação de causas passadas como suge-
ria Freud. Perls acreditava que a consciência do como a pessoa se comporta a 
cada momento é mais relevante para a autocompreensão e a capacidade para 
mudança do que uma compreensão do porquê de um determinado compor-
tamento.
O início da divergência de Perls com relação à abordagem freudiana 
referia-se à teoria dos instintos e da libido. Quando Perls começou a formular 
sua própria teoria do que Freud denominava instinto, ele sugeriu que um or-
ganismo tem miríades de necessidades que são sentidas quando o equilíbrio 
psicológico e/ou fisiológico deste organismo é perturbado. Assim como há 
milhares de tipos de distúrbios do equilíbrio do organismo, há milhares de 
tipos de instintos que aparecem como meios pelos quais o organismo tenta 
reequilibrar-se.
Na visão de Perls, então, nenhum instinto (por exemplo, sexo ou agres-
são) é “básico” ; todas as necessidades são expressões diretas de instintos do 
organismo. Perls sugeriu que os métodos psicanalíticos de interpretação e as-
sociação livre (em particular da maneira como vinham sendo geralmente usa-
dos, de acordo com Freud) constituíam uma fuga da experiência direta do 
material interpretado e associado e eram, portanto, métodos de auto-explora- 
ção ineficientes e via de regra ineficazes.
A ênfase que Freud dá à importância da resistência é ligeiramente alte-
rada, na abordagem de Perls, para a ênfase na fuga da conscientização de qual-
quer tipo, acentuando-se em particular a forma da fuga, mais do que seu con-
teúdo específico (por exemplo, a questão relevante está ligada ao como estou 
evitando a consciência, e não ao que estou evitando).
Freud descreveu a relação transferenciai (do paciente para o terapeuta) 
como sendo central para a eficiência do processo psicoterápico. Perls concor-
dava quanto à existência do fenômeno da transferência e, de fato, encarava-o 
como um aspecto importante da projeção, um mecanismo neurótico ao qual 
atribuía grande importância. No entanto, ele não considera o trabalho atra-
vés da transferência de importância fundamental para o processo psicoterá-
pico, como o fez Freud.
Perls discordava da colocação de Freud segundo a qual a tarefa terapêu-
tica importante era a de liberação de repressões, após a qual o trabalho e a 
assimilação do material ocorre naturalmente. Perls achava que todo indivíduo, 
pelo simples fato de existir, tem muito material de fácil acesso ao trabalho 
terapêutico; a tarefa importante e difícil é a de assimilação do próprio proces-
so, o mastigar, digerir e integrar de traços, hábitos, atitudes e modelos de com-
portamento previamente introjetados (engolidos inteiros).
Talvez o mais importante seja que Perls e a abordagem gestáltica pro-
gressivamente chegaram a apresentar uma visão de mundo alternativa, uma 
weltanschauung diferente daquela da qual emerge a teoria psicanalítica. Nes-
se contexto, Freud e o racionalismo do século XIX oferecem uma perspecti-
va da natureza humana cuja ênfase é substancialmente diferente da visão mais 
existencial de Perls. Contudo, dada a compreensão desta diferença de visão 
de mundo (que leva aos estilos e características divergentes do trabalho psi-
caalftico e gestáltico), uma grande parte da teoria psicanalítica encontra 
*u correlato no trabalho gestáltico.1
Reich. A outra influência psicanalítica importante sobre Perls foi a de 
um de seus analistas, Wilhelm Reich. Reich desenvolveu a noção de “couraça 
muscular"; ele também acentuou a importância do caráter (ou modos habi-
tuais de reagir) na determinação da maneira pela qual uma pessoa atua. 
Reich sugeriu que o caráter se desenvolve cedo na vida do indivíduo e serve 
como um tipo de couraça contra estímulos externos ou internos considerados 
ameaçadores pelo indivíduo. Essa couraça caracterológica fixa-se fisiologica- 
mente (isto é, couraça muscular) e funciona como resistência ao insight ou 
mudança psicológica.
Pouco depois de sua exposição sobre a importância da couraça muscu-
lar, Reich formulou o conceito de orgon, umá idéia que Perls, assim como 
muitos outros analistas mais ortodoxos, acharam difícil sustentar. O trabalho 
anterior de Reich influenciou fortemente Perls, em particular sua visão do 
corpo em relação à psique.
Psicologia da Gestalt
A teoria da Gestalt foi inicialmente formulada no final do século XIX 
na Alemanha e Áustria. Desenvolveu-se como um protesto contra a tentativa 
de compreender a experiência através de uma análise atomística-análise na 
qual os elementos de uma experiência são reduzidos aos seus componentes 
mais simples, sendo que cada componente é analisado separadamente dos 
outros e em que a experiência é entendida como uma mera soma destes com-
ponentes. A própria noção de “gestalt” contradiz a validade deste tipo de 
análise atomística. Embora não haja nenhum equivalente preciso em portu-
guês para a palavra alemã gestalt, o sentido geral é de uma disposição ou con- 
figuração-uma organização específica de partes que contitui um todo parti-
cular. O princípio mais importante da abordagem gestáltica é o de propor 
que uma análise das partes nunca pode proporcionar uma compreensão do 
todo, uma vez que o todo é definido pelas interações e interdependências 
das partes. As partes de uma gestalt não mantêm sua identidade quando estão 
separadas de sua função e lugar no todo.
Max Wertheimer publicou, em 1912, o trabalho que é geralmente consi-
derado o fundamento da escola gestáltica. Seu trabalho descrevia um experi-
mento executado por Wertheimer e dois de seus colegas-também figuras cen-
trais do movimento gestáltico— Wolfgang Kohler e Kurt Koffka. Este experi-
mento foi planejado para explorar certos aspectos da percepção do movimen- 
lo. Numa sala escura, eles faziam reluzir, em rápida sucessão, dois pontos de
FREDER ICK S. PERLS E A GESTALT-TER API A
1 B revem en te, alguns dos co rrc la tos podem ser en con trad os nos seguin tes pares 
 conceitos gerais: ca tex ia de Freud e figura-fundo de Perls; libido de Freud e exc ita-
rão básica de Perls; associação livre de F reud e c on tinu um de consciência de Perls; cons- 
aéneia (consciousness) de F reud e conscien tização (awareness) de P erls; o e n foque de 
Freud na resistência e o en foque de Perls na fuga da con scien tização ; a com pulsã o à 
repetição de F reud e as situações inacabadas de Perls; a regressão de F re ud e o retrai- 
a e n to (do m eio am b ien te) de Perls; o te rapeu ta que perm ite c encora ja a transferência , 
4e F reud , e o te rap eu ta que é um “ hab ilidoso f rus tra do r" , de Perls; a configu ração neu- 
■otica de defesa c on tra im pu lsos, de F reud , e a form ação rígida da g csta lten , de Perls; a 
projeção transferencial de F reud e a p ro jeção de Perls . . . e assim por d ian te .
Um a gestalt é um fe n ô -
m eno irredu tíve l.É um a 
essência q u e aí está e que 
desaparece se o to d o é frag -
m en tado em seus co m p o-
nen tes (Perls. 1969b, p.63).
130 TEORIAS DA PERSONALIDADE
luz próximos um do outro, variando os intervalos de tempo entre os clarões. 
Descobriram que quando o intervalo entre os clarões era menor que 3/100 
de segundo, eles pareciam simultâneos. Quando o intervalo era de 6/100 de 
segundo, o observador dizia ver o clarão mover-se do primeiro ponto ao 
segundo. Quando o intervalo era de 20/100 de segundo ou mais, os pontos 
de luz foram observados como o eram na realidade: dois clarões de luz separa-
dos. A descoberta crucial do experimento refere-se à percepção de movimento 
quando os clarões estavam separados por aproximadamente 6/100 de segun-
do; o movimento aparente não era função de estímulos isolados, mas depen-
dia das características relacionadas dos estímulos e da sua organização neural 
e perceptiva num único campo.
Os resultados deste experimento levaram a algumas reformulações fun-
damentais no estudo da percepção e, durante as décadas de vinte, trinta e 
quarenta do nosso século, a teoria da Gestalt foi aplicada ao estudo da apren-
dizagem, resolução de problemas, motivação, psicologia social e, até certo 
ponto, à teoria da personalidade. Uma visão gestáltica da teoria da perso-
nalidade foi exposta pelo psicólogo social Kurt Lewin. Lewin descrevia o 
comportamento como função de forças operando no “espaço vital'’ psicoló-
gico de um indivíduo, definido como a configuração total da realidade psi-
cológica deste indivíduo num dado momento.2
A escola gestáltica causou enorme impacto em todo o campo da Psico-
logia; na metade do século XX. a abordagem desta escola tinha-se tornado tão 
intrínseca à corrente central da Psicologia que a noção de um movimento ges- 
táltico por si próprio deixou de existir. Uma contribuição importante dos 
adeptos da Gestalt, como vimos sucintamente, refere-se à exploração da 
maneira como as partes constituem e estão relacionadas com um todo. Além 
disso, a teoria da Gestalt ofereceu algumas sugestões a respeito dos modos 
pelos quais os organismos se adaptam para alcançar sua organização e equilí-
brio ótimos. Um aspecto desta adaptação envolve a forma pela qual um orga-
nismo, num dado campo, torna suas percepções significativas, a maneira pela 
qual distingue figura e fundo. A Figura 5.1 é um exemplo da forma através 
da qual dado estímulo pode ser interpretado como representando coisas 
diferentes, dependendo do que é percebido como figura e como fundo.
Se o branco for visto como figura e o preto como fundo, aparecerá 
um cálice branco; se, por outro lado, o preto for visto como figura e o branco 
como fundo, veremos duas cabeças de perfil. A escola gestáltica estendeu o 
fenômeno representado por esta imagem para descrever a maneira pela qual 
um organismo seleciona o que é de seu interesse num dado momento. Para 
um homem sedento, um copo de água colocado entre seus pratos favoritos 
emerge como figura contra o fundo constituído pela comida; sua percepção 
adapta-se, capacitando-o, assim, a satisfazer suas necessidades. Uma vez satis-
feita a sede, sua percepção do que é figura e do que é fundo provavelmente 
se modificará de acordo com uma mudança nos interesses e necessidades 
dominantes.
2 D uran te a década dc 1950 , o tr abalho de Lewin fo i básico para o desenvolvi-
m en to da terapia de g rupos; um pouco mais ta rde , foi ap licado ao m ov im en to dc grupos 
de en con tro . V eja a d iscussão de Lew in em Irving Y alom , The Theory and Practice o f 
Group Psychoterapy (N ew Y ork , Basic B ooks, 1970).
FREDER ICK S. PERLS E A GESTALT-TERAPIA 131
Figura 5.1 - Um E xem plo do F enôm eno F igura-Fundo .
Embora, por volta de 1940, a teoria da Gestalt já tivesse sido aplicada 
em muitas áreas da Psicologia, foi em grande parte ignorada no exame da 
dinâmica da estrutura da personalidade e do crescimento pessoal. Além do 
mais, ainda não havia nenhuma formulação de princípios da Gestalt específi-
cos para psicoterapia. Assim, é a partir desse ponto que podemos começar a 
ver o papel de Fritz Perls, responsável pela ampliação da teoria da Gestalt a 
fim de incluir a psicoterapia e uma teoria de mudança psicológica.
Existencialismo e Fenomenologia
Perls descreveu a Gestalt-terapia como uma terapia existencial, baseada 
na filosofia existencial e utilizando-se de princípios em geral considerados 
existencialistas e fenomenológicos. Embora a Gestalt-terapia não se tenha 
desenvolvido diretamente a partir de antecedentes fenomenológicos e exis-
tenciais particulares, vários aspectos do trabalho de Perls equiparam-se àqueles 
desenvolvidos em muitas escolas do existencialismo e fenomenologia. A influ-
ência destas escolas foi difusa porém substancial; abaixo estão descritas algu-
mas das principais semelhanças entre o trabalho de Perls e as principais ten-
dências tanto do existencialismo como da fenomenologia.
Em geral, Perls contestava de forma ferrenha a idéia de que se poderia 
abranger o estudo do ser humano através de uma abordagem científico- 
-natural-mecanicista inteiramente racional. A partir dessa premissa, Perls 
associou-se à maioria dos existencialistas insistindo que o mundo vivência! de 
um indivíduo só pode ser compreendido por meio da descrição direta que o 
próprio indivíduo faz de sua situação única. Do mesmo modo, Perls susten-
tou que o encontro do terapeuta com um paciente constitui um encontro 
existencial entre duas pessoas, e não uma variante do clássico relacionamento 
médico-paciente.
T odos os órgãos, os sen ti-
dos, o s m ov im en tos e os 
pensam en tos subord inam - 
-se a esta necessidade em er-
gente e logo m udam sua 
lea ldade e função assim 
que aquela seja sa tisfe ita 
e passe en tão para o fu n -
do. . . . T odas as partes do 
o rganism o identificam-se 
tem pora riam en te com a 
gestalt em ergen te (Perls, 
1969b , p. 115).
132 TEORIAS DA PERSONALIDADE
S in to -m e desesperado a res-
peito deste m anuscrito . T i-
ve um a visão o lhand o para 
um a tapeçaria quase com -
p le tam en te tran çada , mas 
que, po rém , ê incapaz de 
p roduzir a im agem , a ges- 
ta lt to ta l. Exp licações não 
a judam m uito a com pree n-
der. Não posso dar-lhes a 
co m pre ensã o : vocés podem 
pegar o que lhes o fere ço , 
mas será q ue con heço seus 
desejos?. . . A inda estou 
parado e decid ido a passar 
por este impasse. Facilm en-
te me inclino a desistir e a 
largar tudo . Eu não seria 
fenom enó logo se não p u -
desse ver o óbvio , isto ó, 
a experiência de estar a to -
lado. Eu não seria um ges- 
ta l tis ta se não pudesse e n -
trar na experiência de me 
a to lar com a confiança de 
q ue algum a figura em erg i-
rá do fundo caó tico (Perls, 
1969b).
A idéia de que mente e corpo constituem dois aspectos da existência 
diferentes e completamente separados, era uma noção que Perls, junto com a 
maioria dos existencialistas, achava intolerável. De acordo com suas objeções 
a uma cisão mente-corpo, a aplicação que Perls fazia da teoria da Gestalt na 
compreensão da personalidade levou-o a abandonar a idéia da cisão entre 
sujeito e objeto, e, mesmo, a da cisão entre organismo e meio. Ao invés de 
considerar que cada ser humano encontra um mundo que ele experiencia 
como sendo completamente separado de si mesmo, Perls acreditava que as 
pessoas criam e constituem seus próprios mundos; o mundo existe para um 
dado indivíduo como sua própria descoberta do mundo.
O conceito de intencionalidade é básico tanto para o existencialismo e a 
fenomenologia quanto para o trabalho de Perls; a mente ou consciência é 
entendida como intenção e não pode ser compreendida à parte do que é pen-
sado ou pretendido. Os sentidos dos atos psíquicos ou intenções devem ser 
alcançados em seus próprios termos, fenomenologicamente, e em termos de 
sua própria intenção particular. Assim, a crítica existencialista da noção freu-
diana de instintos é semelhante àde Perls, mencionada anteriormente; em 
contraste com a visão de Freud, a libido constitui um ato psíquico, mas não 
é nem mais básico nem mais universal que qualquer outro. Todo ato psíquico 
é intenção, e toda intenção deve ser compreendida em seus próprios termos, e 
não em termos de um ato psíquico mais “básico” .
Dois temas importantes da maior parte do pensamento existencialista 
são a experiência do nada e a preocupação com a morte e o medo. Como vere-
mos ao examinar a visão que Perls tem da estrutura da neurose, esses temas 
também constituem elementos importantes em sua teoria sobre o funciona-
mento psicológico.
O método fenomenológico de compreender através da descrição é bási-
co no pensamento de Perls; todas as ações implicam escolha, todos os crité-
rios de escolha são eles próprios selecionados e explanações causais não são 
suficientes para justificar as escolhas ou ações de alguém. Além disso, a con-
fiança fenomenológica na intuição para o conhecimento das essências asseme-
lha-se à confiança de Perls no que ele chama de inteligência ou sabedoria do 
organismo.
Finalmente, o próprio modo de Perls propor sua abordagem inclui, 
como qualquer descrição de uma abordagem fenomenológica, as característi-
cas fenomenológicas e existenciais descritas acima. Seus livros não são argu-
mentações descrevendo um ponto de vista particular, uma vez que, na estru-
tura fenomenológica, a argumentação perde o sentido a não ser que o leitor, 
fora do contexto de sua própria experiência, decida aceitar as premissas de 
Perls desde o início. O estilo de Perls é imaginativo e pessoal; sua tentativa 
é existencial no sentido em que constitui uma tentativa de propor uma 
teoria do desenvolvimento psicológico que é inseparável do envolvimento 
de Perls com seu próprio desenvolvimento.
CONCEITOS PR IN C IPA IS
O Organismo Como Um Todo
Um conceito fundamental subjacente ao trabalho de Perls tem sua for-
mulação explícita, como vimos, a partir do trabalho dos psicólogos da Ges-
talt. Na teoria de Perls, a noção de organismo como um todo é central-tanto
FREDERICK S. PERLS E A GESTALT-TERAPIA 133
em relação ao funcionamento intra-orgánico quanto à participação do organis-
mo em seu meio para criar um campo único de atividades. No contexto do 
funcionamento intra-orgpnico, Perls insistia em que os seres humanos são 
organismos unificados e em que não há nenhuma diferença entre o tipo de 
atividade física e mental. Perls definia atividade mental simplesmente como 
atividade da pessoa toda que se desenvolve num nível mais baixo de energia 
que a atividade física.
Esta concepção do comportamento humano consistir em níveis de ati-
vidades levou Perls a sugerir que qualquer aspecto do comportamento de um 
indivíduo pode ser considerado como uma manifestação do todo—o ser da 
pessoa. Assim, na terapia, o que o paciente faz-como ele ou ela se movimen-
ta, fala e assim por diante-fornece tanta informação a seu respeito quanto o 
que ele ou ela pensa ou diz.
Além do holismo ao nível intra-orgânico, Perls acentuou a importância 
do fato de considerar o indivíduo como parte perene de um campo mais am-
plo que inclui o organismo e seu meio. Assim como Perls protestava contra a 
noção de divisão corpo/mente, protestava também contra a divisão interno/ 
/externo; considerava que a questão das pessoas serem dirigidas por forças 
internas ou externas não tinha nenhum sentido em si, uma vez que os efeitos 
causais de um são inseparáveis dos efeitos causais do outro. Há, no entanto, 
um limite de contato entre o indivíduo e seu meio; é esse limite que define a 
relação entre eles. Num indivíduo saudável este limite é fluido, sempre permi-
tindo contato e depois afastamento do meio. Contatar constitui a formação 
de uma gestalt; afastar-se representa seu fechamento. Num indivíduo neuró-
tico, as funções de contato e afastamento estão perturbadas, e ele se encontra 
frente a um aglomerado de gestalten que estão de alguma forma inacabadas- 
nem plenamente formadas nem plenamente fechadas.
Perls sugeriu que as pistas para este ritmo de contato e afastamento são 
ditadas por uma hierarquia de necessidades. As necessidades dominantes 
emergem como primeiro plano ou figura contra o fundo da personalidade 
total; a ação efetiva é dirigida para a satisfação de uma necessidade dominan-
te. Os neuróticos são freqüentemente incapazes ou de perceber quais de 
suas necessidades são dominantes ou de definir sua relação com o meio de 
forma a satisfazer tais necessidades. Assim, a neurose acarreta processos dis- 
funcionais de contato e afastamento que causam uma distorção na existência 
do indivíduo enquanto organismo unificado.
Ênfase no Aqui e Agora
A visão holística levou Perls a dar ênfase particular à importância da 
autopercepção presente e imediata que um indivíduo tem de seu meio. Os 
neuróticos são incapazes de viver no presente pois carregam cronicamente 
consigo situações inacabadas (gestalten incompletas) do passado. Sua atenção 
é, pelo menos em parte, absorvida por essas situações e eles não têm nem 
consciência nem energia para lidar plenamente com o presente. Visto que a 
natureza destrutiva destas situações inacabadas aparece no presente, os indi-
víduos neuróticos sentem-se incapazes de viver com sucesso. Assim, a Ges- 
talt-terapia não investiga o passado com a finalidade de procurar traumas 
ou situações inacabadas, mas convida o paciente simplesmente a se concen-
trar para tomar-se consciente de sua experiência presente, pressupondo que os
O organ ism o age e reage a 
seu m eio com m aio r ou 
m enor in tensidade ; à m edi-
da q ue d im inu i a in tensi-
dade . o co m p or ta m e n to 
físico se tr ansfo rm a em 
co m p orta m e n to m en tal. 
Q uando a in tensidade a u -
m en ta , o co m por tam en to 
m en ta l to rna-se c o m p o r ta -
m en to físico (Perls, 1973 , 
p. 28 na ed . bras.).
134 TEORIAS DA PERSONALIDADE
Nada é jam ais rea lm en te re-
p rim ido. T odas as gesta lten 
re levantes estão em erg indo , 
estão na superfíc ie , são ó b -
vias com o a nudez do im -
perador. Seus o lhos e ouv i-
dos té m co nhec im e n to das 
gestalten desde qu e seu 
pensam en to côm puto -ana- 
Iftico não o tenh a cegado 
(Perls . 1969b , p. 272).
A ansiedade nada mais ó 
do que a tensão en tre o 
agora e o depois. . . po r 
ex em plo , se eu p ergun tar: 
"Q u em quer sub ir aqui p a-
ra t ra ba lh ar? " , vocés p ro -
vavelm ente com eçariam ra-
p idam en te a ensaiar. "O 
q ue eu farei lá?" e assim 
por d ian te . É c laro que . 
p rovavelm ente . ficariam 
com m edo fre n te à a ud i-
ência po rq ue deixariam a 
rea lidade segura do agora 
para d ar um sa lto para o 
fu tu ro (Perls, 1969a, p. 
73 na ed . bras.).
fragmentos de situações inacabadas e problemas não resolvidos do passado 
emergirão inevitavelmente como parte desta experiência presente. À medida 
que estas situações inacabadas aparecem, pede-se ao paciente que as represen-
te e experimente de novo, a fim de completá-las e assimilá-las no presente.3
Perls definiu ansiedade como a lacuna, a tensão entre o “agora” e o 
“depois” . A inabilidade das pessoas para tolerar essa tensão, sugeria Perls, 
leva-as a preencher a lacuna com planejamentos, ensaios e tentativas de tor-
nar o futuro seguro. Isto não apenas desvia a energia e a atenção do presente 
(daí criando perpetuamente situações inacabadas), mas também impede o 
tipo de abertura, para o futuro, decorrente do crescimento e da espontanei-
dade.
Além da natureza estritamente terapêutica deste enfoque ligado à cons-
cientização do presente, uma tendência subjacente ao trabalho de Perls é a 
de que viver com a atenção voltada para o presente, ao invés do passado ou 
futuro, é, em si, algo bom que leva ao crescimento psicológico. Aqui vemos 
mais uma vez como o trabalho psicológico de Perls está fortemente baseado 
num contexto filosófico, num tipo de weltanschauung que pressupõe que a 
experiência presente de uma pessoa, num dado momento,é a única expe-
riência presente possível e que a condição para se sentir satisfeito e reali-
zado a cada momento da vida é a simples aceitação sincera desta experiên-
cia presente.4
A Preponderância do Como Sobre o Porquê
Uma conseqüência natural da orientação fenomenológica de Perls e de 
sua abordagem holística é a ênfase na importância da compreensão da expe-
riência de uma maneira descritiva e não causal. Estrutura e função são idên-
ticas; se um indivíduo compreende como ele ou ela faz alguma coisa, esta
3 Em bora cstc en fo que no p resen te seja particu larm e n te ace n tua do no trabalho 
da G esta lt, deriva da noção psicanalítica de que o passado é transferido de fo rm a ne uró -
tica para o p resen te. A ssim , tan to no tra balh o psicanalítico q u a n to no ge st ilt ic o , a 
pessoa te n ta “ com plex ar” , no p resen te , s ituações inacabadas no passado.
4 C om o ap on to u C láudio N aran jo em seu artigo “ P resen t-C en teredness Techn i- 
que , P rescrip tion and Ideal” (em F agan & S hepherd , Gestalt Therapy Now, 1970), cen -
trar-se no presen te é um a a titu d e q ue leva ao desenvo lv im ento psico lóg ico , q ue é cen tra l 
em m uitas p sicologias o rien ta is . B uda, num tre cho de Pali C anon , sugere:
Não volte atrás em coisas que passaram.
E para o fu turo não acalente esperanças desejadas;
O passado fo i deixado para trds por ti,
O estado fu turo ainda não veio.
Mas aquele que com clara visão pode ver
O presente que está aqui e agora
Tal sábio deveria aspirar a atingir
O que nunca se perde ou se abala.
(Fagan & S hepherd , Gestalt Therapy Now, 1970, p. 67 .)
E, na trad ição su fista , O m ar K hayyam sugere :
Nunca antecipe a tristeza de amanhã.
Viva sempre neste paradisíaco Agora-, . .
Levante-se, por que lamentar este transitório mundo dos homens?
Passe toda sua vida em gratidão e alegria.
(The Rubaiyat o f Omar Khayyam, traduz ido p o r R obert G raves
e O m ar A li-Shah, p. 54 .)
FREDER ICK S. PERLS E A GESTALT-TERAPIA 135
pessoa está na posição de compreender a ação em si. Segundo Perls, o deter-
minante causal—o porquê— da ação é irrelevante para qualquer compreensão 
plena da mesma; toda ação tem causas múltiplas, assim como toda causa tem 
causas múltiplas, e as explicações de tais causas nos distanciam mais e mais da 
compreensão do ato em si. Além disso, uma vez que todo elemento da exis-
tência de alguém só pode ser compreendido como parte de uma das várias 
gestalten, não há qualquer possibilidade deste elemento ser compreendido 
como sendo “causado” separadamente de toda a matriz de causas da qual 
participa. Uma relação causal não pode existir entre elementos que formam 
um todo; todo elemento causa e é causado por outros. Assim, na prática da 
Gestalt-terapia, a ênfase está em ampliar constantemente a consciência da 
maneira como a pessoa se comporta, e não em esforçar-se para analisar a 
razão pela qual a pessoa se comporta de tal forma.
Conscientização"
Os três principais conceitos da abordagem de Perls que examinamos 
até agora-o organismo como um todo, a ênfase no aqui e agora, e a prepon-
derância do como sobre o porqué-constituem os fundamentos para enten-
der a conscientização, o ponto central de sua abordagem terapêutica. O pro-
cesso de crescimento, nos termos de Perls, é um processo de expansão das 
áreas de autoconsciência; o fator mais importante que inibe o crescimento 
psicológico é a fuga da conscientização.
Perls acreditava plenamente no que ele chamava de sabedoria do orga-
nismo. Considerava o indivíduo maduro e saudável um indivíduo auto-apoi- 
ado**e auto-regulador. Via o cultivo da autoconscientização como sendo 
dirigido para o reconhecimento da natureza auto-reguladora do organismo 
humano. Segundo a teoria da Gestalt, Perls sugeriu que o princípio da hierar-
quia de necessidades está sempre operando na pessoa. Em outras palavras, a 
necessidade mais urgente, a situação inacabada mais importante, sempre emer-
ge se a pessoa estiver simplesmente consciente da experiência de si mesma a 
todo momento.
Perls desenvolveu a noção de um continuum de consciência como um 
meio de encorajar esta autoconscientização. Manter um continuum de cons-
ciência parece decepcionantemente simples-apenas estar consciente do que 
estamos experienciando a cada instante. No entanto, a maioria das pessoas 
mterrompe o continuum quase de imediato, e esta interrupção em geral é 
causada pela conscientização de algo desagradável. Assim, estabelece-se a 
fuga em relação a pensamentos, expectativas, recordações e associações de 
uma experiência à outra. Nenhuma dessas experiências associadas são de fato 
experienciadas\ são tocadas de leve, em flashes sucessivos, sem que haja assi-
milação do material, sendo que o sujeito deixa a conscientização desagradá-
* N .T.: D ada a d ificu ldade de e nco n tra r equivalen te em P ortuguês da palavra 
«mareness, a do tam o s a no rm a seguida pelos tra du to res de Tornar-se Presente, de Jo hn 
» S tevens (S um m us E d ito ria l L tda ., 1976), que traduzem awareness p o r “ consciência” , 
pc ons cien tiza çáo” ou “ to m ada de consciência", d epend endo do co n te x to em que é 
■ npregada.
* * N .T .: A po iado e a palavra mais p róx im a de supporting, apesar de não ter a 
L a o ta ç ã o de sus ten tação que tem o te rm o inglé*.
Eu acred ito que esta é a 
g rande coisa a ser com -
preend ida: a tomada de 
consciência em s i- e de 
si mesmo—pode ter efeito 
de cura (Perls. 1969a. p. 
34 na ed. b ras.).
136 TEORIAS DA PERSONALIDADE
vel inicial tão fora do contexto quanto o resto do material. Esta fuga de uma 
conscientização contínua, esta auto-interrupção, impede o indivíduo de enca-
rar e trabalhar com a conscientização desagradável. Ele ou ela permanece em-
pacado numa situação inacabada.
Estar consciente é prestar atenção às figuras perpetuamente emergentes 
de sua própria percepção. Evitar a tomada de consciência é enrijecer o livre 
fluir natural do delineamento figura e fundo.
Perls sugeria que para cada indivíduo existem três zonas de consciência: 
consciência de si mesmo, consciência do mundo e consciência do que está 
“entre”-um tipo de zona intermediária da fantasia. Ele considerava o exame 
desta última zona (que impede a conscientização das outras duas) como a 
grande contribuição de Freud. Sugeriu, contudo, que Freud concentrou-se 
tão completamente na compreensão desta zona intermediária que ignorou a 
importância de trabalhar para o desenvolvimento da capacidade de conscien-
tizar-se nas zonas de si mesmo e do mundo. Em contraste, a maior parte da 
abordagem de Perls inclui uma tentativa muito deliberada de ampliar a consci-
entização e obter contato direto consigo e com o mundo.
Q ualquer d istú rb io do 
eq u ilíb r io organ ísm ico 
cons titu i um a gesta lt in -
com ple ta , um a situação i- 
nacabada , fo rça ndo o o rga-
nism o a to rnar-se cria tivo , 
a achar vias e meios de res-
tabelecer este equ il íb r io
E a mais fo rte con figu ra-
ção figura-fundo assum irá 
tem po raria m e n te o c o n tro -
le de tod o o o rgan ism o. Tal 
é a lei básica da auto-regu* 
lação o rganísm ica (Perls, 
1969b , pp. 79 , 92 ).
D INÂM ICA
Crescimento Psicológico
Perls definia a saúde e a maturidade psicológicas como sendo a capaci-
dade de emergir do apoio e da regulação ambientais para um auto-apoio e 
uma auto-regulação. O processo terapêutico representa um esforço na direção 
desta emergência. O elemento crucial no auto-apoio e na auto-regulação é o 
equilíbrio. Uma das proposições básicas da teoria da Gestalt é que todo orga-
nismo possui a capacidade de realizar um equilíbrio ótimo consigo e com seu 
meio. As condições para realizar este equilíbrio envolvem uma conscientiza-
ção desobstruída da hierarquia de necessidades, que descrevemos anterior-
mente.
Uma apreciação plena desta hierarquia de necessidades só pode ser rea-
lizada através da conscientização que envolve todo o organismo,uma vez que 
necessidades são experienciadas por cada parte do organismo e sua hierarquia 
é estabelecida por meio de sua coordenação.
Perls considera o ritmo de contato/fuga com o meio ambiente (que 
mencionamos anteriormente) como o componente principal do equilíbrio or-
gan ísmico. A imaturidade e a neurose implicam uma percepção inapropriada 
do que constitui este ritmo ou uma incapacidade de regular seu equilíbrio.
Indivíduos auto-apoiados e auto-regulados caracterizam-se pelo livre 
fluir e pelo delineamento claro da formação figura-fundo (definição de 
sentido) nas expressões de suas necessidades de contato e retraimento. Tais 
indivíduos reconhecem sua própria capacidade de escolher os meios de sa-
tisfazer necessidades à medida que estas emergem. Têm consciência das 
fronteiras entre eles mesmos e os outros e estão particularmente conscientes 
da distinção entre suas fantasias sobre os outros (ou o ambiente) e o que ex- 
perienciam através do contato direto.
Ao acentuar a natureza do auto-apoio e da auto-regulação do bem-estar 
psicológico, Perls não quer dizer que o indivíduo pode existir, de algum mo-
do, separado de seu meio ambiente. Na verdade, o equilíbrio organísmico su-
põe uma constante interação com o meio. O ponto crucial para Perls é que
FREDER ICKS. P E R LSE AGESTALT-TERAPIA 137
podemos escolher a maneira como nos relacionamos com o meio; somos 
auto-apoiados e auto-regulados quanto ao fato de que reconhecemos nossa 
própria capacidade de determinar como nos apoiamos e regulamos dentro de 
um campo que inclui muito mais do que nós mesmos.
Perls descreve vários modos pelos quais se realiza o crescimento psico-
lógico. O primeiro envolve o completamento de situações ou gestalten inacaba-
das, que já descrevemos pouco atrás. Ele também sugere que a neurose pode 
ser vagamente considerada como um tipo de estrutura em cinco camadas, e 
que o crescimento psicológico (e eventualmente a libertação da neurose) 
ocorre na passagem através destas cinco camadas.
Perls denomina a primeira camada de camada dos clichês ou da exis-
tência dos sinais. Ela inclui todos os sinais de contato: “bom dia**, “oi” , “o 
tempo está bom, não é?’* A segunda camada é a dos papéis ou jogos. É a cama-
da do “como se” em que as pessoas fingem que são aquelas que gostariam de 
ser: o homem de negócios sempre competente, a menininha sempre boniti- 
nha, a pessoa muito importante.
Depois de termos reorganizado essas duas camadas, Perls sugere que 
alcançamos a camada do impasse, também denominada camada da anti-
iexistência ou do evitar fòbico. Aqui experienciamos o vazio, o nada: é o pon-
to em que, para evitarmos o nada, geralmente interrompemos nossa tomada 
de consciência e retrocedemos à camada dos papéis. Se, no entanto, formos 
capazes de manter nossa autoconsciência neste vazio, alcançaremos a morte 
ou camada implosiva. Esta camada aparece como morte ou medo da morte 
pois consiste numa paralisia de forças opostas; experienciando esta camada 
contraimo-nos e comprimimo-nos-implodimos.
No entanto, se pudermos ficar em contato com esta morte, alcançare-
mos a última camada, a explosiva. Perls sugere que a tomada de consciência 
deste nível constitui a emergência da pessoa autêntica, do verdadeiro self, da 
pessoa capaz de experienciar e expressar suas emoções. E Perls adverte:
A gora , não se apavorem com a palavra explosão. A m aio r par te de vocês sabe 
d irigir um carro. E x istem m ilhares de exp losões po r m inu to d e n tro do c ilind ro . 
Isto e d iferen te da v iolenta exp losão do ca ta tô n ico : esta seria com o a exp losão 
num tan que de gasolina. O u tra coisa, um a única exp losão não quer d izer nada. 
As assim cham adas quebras de couraça da teo ria re ich iana tem tão pouca u t ili-
dade q u a n to o insight da psicanálise. As coisas ainda precisam ser trabalhadas 
(Perls , 1969 , p. 85 na ed. bras., com os g rifos acrescentados).
Existem quatro tipos de explosões que o indivíduo pode experienciar 
jo emergir da camada da morte. Existe a explosão em pesar, que envolve o 
irabalho com uma perda ou morte que não tinha sido previamente assimila-
da. Existe a explosão em orgasmo em pessoas sexualmente bloqueadas. E- 
xiste a explosão em raiva quando sua expressão foi reprimida. E, por fim, 
existe a explosão no que Perls chama de joie de vivre-alegria e riso, alegria 
de viver.
A estrutura de nossos papéis é coesiva pois destina-se a absorver e con-
trolar a energia destas explosões. A concepção errónea básica de que essa 
energia precisa ser controlada deriva de nosso medo do vazio e do nada (ter-
ceira camada). Interpretamos a experiência de um vazio como sendo um vazio 
estéril e não um vazio fecundo; Perls sugere que as filosofias orientais, a filo-
138 TEORIAS DA PERSONALIDADE
O in tro je tivo faz com o os 
o u tro s gostariam q ue ele f i-
zesse, o p ro je tivo faz aos 
o u tro s aqu ilo q ue os acusa 
de lhe fazerem , o hom em 
em confluência pa tológ ica 
não sabe quem está fa zen -
do o que a qu em e o refle- 
xo r faz consigo o q ue gos-
taria de fazer aos o u tro s
C om o a in tro jeção se ap re-
senta pe lo uso do p ron om e 
" eu " , quand o o significado 
real é "e le s" ; com o a p ro -
jeção se ap resen ta pelo uso 
dos p ronom es " e le " , "e la" , 
ou "e les " , qua ndo o verda-
deiro significado é " e u " ; 
com o a confluência se 
ap resen ta pelo uso do p ro -
nom e "n ó s " , q ua nd o o sig-
n ificado verdadeiro está em 
questão ; assim a retro fle- 
xão se ap resen ta pelo uso 
do reflexivo eu m esm o" 
(Perls, 1973, p. 54 na ed. 
b ras.).
sofia Zen em particular, têm muito a nos ensinar a respeito da experiência do 
nada, positiva e geradora de vida, e a respeito da importância de permitirmos 
a experiência do nada sem interrompê-la.
Em todas suas descrições de como um indivíduo se desenvolve, Perls 
mantém a idéia de que a mudança não pode ser forçada e que o crescimento 
psicológico é um processo natural e espontâneo.
Obstáculos ao Crescimento
Perls considera a fuga da conscientização e a conseqüente rigidez da 
percepção e do comportamento como os maiores obstáculos ao crescimento 
psicológico. Os neuróticos (aqueles que interrompem seu próprio crescimen-
to) não podem ver claramente suas necessidades e tampouco podem distinguir 
de forma apropriada entre eles e o resto do mundo. Em conseqüência, são in-
capazes de encontrar e manter um equilíbrio adequado entre eles próprios e 
o resto do mundo. A forma que este desequilíbrio geralmente toma é a pessoa 
sentir que os limites sociais e ambientais penetram muito fundo dentro dela 
mesma; a neurose consiste em manobras defensivas destinadas ao equilíbrio e 
proteção contra este mundo invasor.
Perls sugere que existem quatro mecanismos neuróticos básicos-dis- 
túrbios de limites-que impedem o crescimento: introjeção, projeção, con-
fluência e retroflexão. (Na estrutura em cinco camadas da neurose, descrita 
pouco atrás, estes mecanismos de defesa operam basicamente na segunda e 
terceira camadas.)
Introjeção. Introjeção ou “engolir tudo” é o mecanismo pelo qual os in-
divíduos incorporam padrões, atitudes e modos de agir e pensar que não são 
deles próprios e que não assimilam ou digerem o suficiente para tomá-los 
seus. Um dos efeitos prejudiciais da introjeção é que os indivíduos introjetivos 
acham muito difícil distinguir entre o que realmente sentem e o que os ou-
tros querem que eles sintam-ou simplesmente o que os outros sentem. A in-
trojeção também pode constituir uma força desintegradora da personalidade, 
uma vez que quando os conceitos e as atitudes engolidos são incompatíveis 
uns com os outros, os indivíduos introjetivos se tomarão divididos.
Projeção. Outro mecanismo neurótico é a projeção; num certo sentido, 
é o oposto da introjeção. A projeção é a tendência de responsabilizar os ou-
tros pelo que se origina no self. Envolve um repúdio de seus próprios impul-
sos, desejos e comportamentos,colocando fora o que pertence ao self.
Confluência. O terceiro mecanismo neurótico é a confluência (patoló-
gica)5 . Na confluência, os indivíduos não experienciam nenhum limite entre 
eles mesmos e o meio ambiente. A confluência torna impossível um ritmo 
saudável de contato e de fuga, visto que tanto o primeiro quanto o segundo 
pressupõem um outro. Este mecanismo também impossibilita a tolerância das 
diferenças entre as pessoas, uma vez que os indivíduos que experienciam a 
confluência não podem aceitar um senso de limites e, portanto, a diferencia-
ção entre si mesmo e as outras pessoas.
s Perls no ta que a experiência da confluência não é sem pre p a to ló g ica ; no en -
ta n to , fala aqu i da confluência neurótica.
FREDER ICK S. PERLS E A GESTALT-TERAPIA 139
Retroflexão. O quarto mecanismo neurótico é a retro flexão. Retrofle- 
xão significa literalmente “voltar-se de forma ríspida contra” ; indivíduos re- 
troflexores voltam-se contra si mesmos e. ao invés de dirigir suas energias para 
mudança e manipulação de seu meio ambiente, dirigem essas energias para si 
próprios. Dividem-se e tomam-se sujeito e objeto de todas suas ações; são o 
alvo de seu comportamento.
Perls aponta que estes mecanismos raramente operam isolados um do 
outro, embora as pessoas equilibrem suas tendências neuróticas entre esses 
quatro mecanismos em variadas proporções. A função crucial que todos 
esses mecanismos preenchem é a confusão na discriminação de limites. Dada 
esta confusão de limites, o bem-estar de um indivíduo-defínido como a 
capacidade de ser auto-apoiado e auto-regulado-é seriamente limitado.
A visão de Perls destes quatro mecanismos é básica na maior parte de 
sua abordagem psicoterapêutica. Por exemplo, Perls considerava a introjeção 
como sendo central no que ele chamou de luta entre o dominador (topdog) 
| e o dominado (underdog). O dominador é um pacote de padrões e atitudes 
lintrojetados; Perls sugere que enquanto o dominador (ou, de acordo com 
Freud, o superego) permanece introjetado e não assimilado, as exigências ex-
pressas pelo dominador continuarão a ser irracionais e impostas a partir de 
fora. Perls sugeria que a projeção é crucial na formação e compreensão de 
«onhos. Sob seu ponto de vista, todas as partes de um sonho são projetadas, 
fragmentos desapropriados de nós mesmos. Todo sonho contém pelo menos 
■ma situação inacabada que envolve estas partes projetadas. Trabalhar com o 
»nho é recuperar tais partes e, portanto, completar a gestalt inacabada.
ESTRU TURA
Corpo
Perls considera a cisão mente/corpo da maioria das psicologias como
E
iria e falaciosa. A atividade mental é simplesmente uma atividade que 
>na em nível menos intenso que a atividade física. Assim, nossos corpos 
anifestações diretas de quem somos; Perls sugere que pela simples obser- 
de nossos mais aparentes comportamentos físicos-postura, respiração, 
íentos-podemos aprender muito sobre nós mesmos.
Prefiro trab alhar especia l-
m en te com sonhos. Eu cre-
io que . em sonhos, nós re-
cebem os um a c lara m ensa-
gem ex istencia l do que es-
tá fa ltand o na nossa vida, o 
q ue ev itam os fazer e viver; 
e nós tem os m aterial de so -
b ra para reassimilar e rec u -
perar as partes a lienadas de 
nós m esm os (Perls. 1969a. 
pp. 109-110 na ed. b ras.).
142 TEORIAS DA PERSONALIDADE
A m aio ria das pessoas acha 
q ue exp licação é a m esma 
coisa que com preensão . A í 
ex iste um a g rande d iferen -
ça. C omo agora, eu posso 
exp licar m uita coisa a vo -
cês. Posso dar-lhes um a 
porção de sen tenças que os 
a judarão a c on stru ir um 
m odelo in te lec tu a l de c o -
m o nós funcionam os. T al-
vez alguns de vocés sin tam 
a co incidência destas sen -
tenças e exp licações com a 
sua vida real, e is to ó com -
preensão . Neste m om ento 
posso apenas h ipno tizá-los, 
persuadi-lo s e fazê-los crer 
que estou certo . V océs não 
sabem . Eu estaria apenas 
pregando algum a coisa . V o-
cês não ap re nder iam a par-
ti r de m inhas palavras. A- 
p rend izagem é de sc ob er-
ta. . . . E eu espero poder 
ajudá-los a ap re nder a de s-
cobrirem a lgum a co isa s o -
b re si m esm os (Perls, 
1969a, p. 46 na ed . b ras.).
natureza coloquial e de senso comum da literatura sobre Gestalt-terapia, assim 
como as atitudes de muitos terapeutas da Gestalt, começam a contribuir para 
uma desmistificação da psicoterapia, que muitos consideram bem-vinda.
Como mencionamos no início deste capítulo, o trabalho de Perls con-
centrou-se mais explicitamente em torno da prática da psicoterapia do que 
em uma teoria da personalidade. Não é de surpreender que isto faça com que 
haja certas falhas na tentativa de extrapolar uma teoria coerente de seu traba-
lho. Porém, o fato em si é consistente com sua visão da utilidade da teoria 
enquanto teoria. Se a atitude e a experiência que constituem a abordagem 
gestáltica ajustam-se basicamente às nossas próprias atitudes e experiências, 
ela então nos oferece muito no campo da expansão de nossa própria cons-
ciência.
É claro que existem perigos nesta abordagem aleatória. Alguns deles são 
visíveis em muitas das aplicações usuais da Gestalt-terapia. A abordagem, 
quando aplicada numa situação terapêutica, toma-se facilmente mágica, sim-
plista, redutiva, ou simplesmente uma imitação do estilo pessoal particular de 
Perls.
Um aspecto da Gestalt-terapia que suscitou críticas consideráveis refere- 
-se às implicações da abordagem gestáltica de Perls em termos sociais e políti-
cos. A idéia da capacidade de fazer escolhas, de assumir a responsabilidade pe-
la própria vida, de tomar-se um indivíduo “auto-apoiado e auto-regulado” 
tem como premissa uma relativa liberdade, em termos de restrições sociais, o 
que é certamente inacessível para muitas pessoas. Críticas similares foram fei-
tas a respeito do uso das técnicas gestálticas com indivíduos psicóticos; a 
Gestalt-terapia pressupõe uma substancial capacidade de se responsabilizar 
pelas próprias escolhas, e o próprio Perls questionava a conveniência de se 
usar Gestalt-terapia com psicóticos.
A Gestalt-terapia desenvolveu-se em reação ao que Perls considerava 
uma tendência crescente de rigidez e dogmatismo na Psicologia, particular-
mente na Psicologia Psicanalítica. Uma importante questão avaliativa que de-
ve ser levantada a respeito da abordagem gestáltica (ou de qualquer outra) é a 
seguinte: tendo obtido certa popularidade no pensamento psicológico, com 
que facilidade se instalará nos mesmos tipos de rigidez e dogmatismo contra 
os quais Perls se rebelava? É certo que a facilidade com que a abordagem ges-
táltica é traduzida em séries de truques psicoterapéuticos e em curas psico- 
terapêuticas aparentemente instantâneas não ajuda a mantê-la como um pro-
pósito vital e sério, o que Perls pretendia. No entanto, colocados de lado tais 
problemas na aplicação da abordagem gestáltica, Perls contribuiu de forma 
significativa para uma psicologia holística do organismo humano e para a psi-
cologia da consciência humana.
A T EO R IA EM P R IM E IR A MÀO
Esta é a introdução da Gestalt-Terapia Explicada. É um exemplo direto 
e condensado do modo como Fritz Perls apresentava seu ponto de vista.
Desejo falar sobre o desenvo lvim en to a tu a l da psicologia hu m an ista . Levamos 
b astan te te m p o para desm ascarar to d o o logro freud iano , e agora estam os e n tra n -
do num a fase nova e perigosa. E stam os en tran do na fase das te rap ias “ estim u lan -
FREDERICK S. PERLS E A GESTALT-TERAPIA
te s” *, “ ligando-nos” em cu ra in stan tânea , em consciência senso ria l in stan tâne a . 
Estam os e n tran do na fase dos hom ens charla tães e de pou ca con fiança , que p e n-
sam que se vocés ob tiverem algum a que bra de resistência , es tarão cu rados, sem 
considerar qua lquer necessidade de cre sc im en to , sem considerar o po tencia l real, 
sem considerar o génio inato em tod os vocês. Se isto estiver se to rna nd o m oda,será tão perigoso para a psicologia q u a n to de itar num d ivã du ran te um an o , uma 
década , um século. Pelo m enos, o s danos q ue so frem os com a psicanálise têm po u-
ca influência sobre o pacien te , a não ser po r de ixarem -no cada vez mais m orto . 
I sto não e tão prejudicia l q u an to a co isa super-super-rápida . Os psicanalistas pelo 
m enos t inham boa von tade. Devo d izer que estou m uito p reocu pado com o que 
está acon te cen do a tua lm en te .
Uma das ob jeções que tenh o con tra qualquer pessoa que se diga um gestalt- 
• te rapeu ta é qu an to ao uso da técn ica . U m a técn ica é um tru que . Um tru qu e deve 
ser usado apenas em casos ex trem os. Existem m uitas pessoas c o lec iona ndo t ru -
ques e m ais truq ues, abus ando deles. Estas técn icas, estes in st rum en tos são ba sta n -
te ú te is em sem inários de consciência sensorial ou aleg ria, para dar a idéia de que 
a inda se está vivo, e que o m ito de que o am ericano é um cadáver não é verdade, 
que ele pode estar vivo. Mas, o triste fa to é que esta energetização f reqü en tem e n te 
se to rn a um a perigosa a tiv idade su bstitu tiva , um a ou tra falsa terapia que impede o 
c resc im en to .
A gora, o p rob lem a não é ta n to em relação às “ terapia s es tim u la n tes " , mas em 
relação a toda cu ltu ra am ericana. N ós dem os um giro de cen to e o iten ta g raus, do 
pu ritan ism o e m oralism o a té o hedon ism o .* * De rep en te , tud o tem que ser d iver-
são e p razer, e qualquer envolv im ento sincero , qualquer estar aqui real, é desen co-
rajado .
Mil flores de plástico
Não fazem um deserto florescer
Mil rostos vazios
Não podem uma sala ivzia preencher
Na G esta lt-te rap ia tr abalham os p or algo mais. E stam os aqu i para p rom over o 
p rocesso de cresc im en to e desenvolver o po tencia l hum ano . N ós não falam os de 
alegria in stan tâ nea , de consciência sensoria l in stan tâne a , de cu ra in stan tânea . O 
processo de cresc im en to é um p rocesso dem orad o . N ão podem o s apenas esta lar o s 
dedos e d izer: “ V enha, vam os ser felizes! V am os lá!” Se você qu iser, pode conse-
guir is to com LSD. ace lerando tu d o , m as isso não tem nada a ver com o tra balho 
sincero da abordagem psiqu iátrica que eu cham o G es ta lt-te rap ia . Na terap ia , não 
tem os apenas que superar o d esem penho de papéis. T em os tam bém que p reencher 
os bu racos da personalidade , para to rná-la novam en te in te i ra e com ple ta . E ou tra 
vez, da m esm a fo rm a que an te s, isto não pode ser fe ito p o r m eio de “ terap ias es-
tim u lan tes” . Na G esta lt-te rapia tem os um a form a m elhor, mas que não é nenhum 
ata lho m ág ico . Você não precisa se de ita r num divã ou ficar “ z end o ” du ra n te vin-
te ou t rin ta anos, mas tem que se em penhar na te rap ia ; e crescer leva te m po .
Os “ cond ic ionadores” tam bém partem de um falso p ressupo sto . Sua prem issa 
básica de que o c om p orta m en to é “ lei” não passa de um am o n to ad o de m en tiras, 
ou seja, nós a prendem os a respirar, a com er, ap rendem o s a andar. “ A vida nada 
mais é do que as cond ições nas quais ela tem o rigem .” Se, na reorgan ização beha- 
viorista do nosso c om po rtam en to , ob tiverm os um a m od ifica ção em term os de 
um a m aio r au to -aceitação , e jogarm os fora todos os papéis sociais a rtific iais que 
ap re ndem os, en tão es tou do lado dos behavio ristas. O em p cci lh o parece ser a a n -
* N .T .: “ E stim ulan tes” - tuming-onners. Tum-on: exp ressão em gíria am erica- 
, que se refere ao estado cm que se fica após ingerir algum a droga (m aconha, estim u- 
ites. a luc inógenos e tc .). Em g íria b rasileira co r responder ia a expressões c om o “ ficar 
í p d o ” , ‘ ‘de b ara to ” , “ m u ito do id o ” e tc . U ma vez que , cm Português, estas expressões 
t f o m enos d ifun d id as en tre o púb lico em geral, conservam os a a lte rnativa m ais fo rm al: 
im ulantes.
* Hedonismo: crença no fa to de o p razer ser o p rinc ipa l bem do hom em .
144 TEORIAS DA PERSONALIDADE
siedade . Sem pre a ansiedade. Ê c laro que se fica ansioso se é prec iso ap render um a 
nova form a de c om p or ta m en to , e os psiqu ia tras têm m edo da ansiedade. E les não 
sabem o que è ansiedade . A ansiedade é a ex citação , o élan vital que carregam os 
conosco , e que se to rna estagnado se estam os incertos qu an to ao papel que deve-
m os desem penhar. Se não sabem os se vam os receber ap lausos ou vaias, nós hesita -
m os; e n tã o o co ra ção com eça a d isparar, e tod a a excitação não consegue flu ir p a -
ra a a tiv idade , e tem os “ m edo de pa lco” . Assim, a fórm ula da ansiedade é m uito 
sim ples: a ansiedade é o vácuo e n tre o agora e o depois. Se você estiver no agora 
não pode estar ansioso, po rque a e xcitação flui im ed ia tam en te em a tiv idade es-
pon tânea . Se você estiver no agora, você será criativo , inven tivo . Se seus sent idos 
estiverem p reparad os, e seus o lhos e ouv idos ab erto s, com o em toda criança pe-
q uen a , você achará a solução.
U m a liberação para a es pon taneidade , para a ace itaçã o da personalidade to ta l - 
sim , sim, sim. A p seudo-espon taneidade dos estim u lan te s à m edida que se to rnam 
h e d o n is ta s-a pe n as o “ vam os fazer a lgum a coisa, vamos to m a r LSD , vamos ter 
alegria in sta n tân ea , consciência sensoria l in stan tâ ne a” -não. Assim , en tre o Cila 
do cond ic ion am e n to e o Caribdis das terap ias estim u lan tes existe alguma coisa: 
uma pessoa que é real, uma pessoa que se assum e.
C om o vocês sabem , ex iste um a rebelião nos E stados U nidos. N ós descobrim os 
que p ro duz ir co isas, viver para coisas e tro car coisas não é o sen tido fundam en ta l 
da vida. D escobrim os que o sen tido da vida é que ela deve ser vivida e não com er-
c ializada , c oncei tuada e res trita a um m odelo de sistem as. A cham os que a m an ip u-
lação e o co n tro le não co nstituem a alegria fundam en ta l de viver.
Mas devem os tam bém com preende r que a té agora tem os apenas um a rebelião . 
A inda não tem o s um a revolução . A inda fa lta m uita co isa. E x iste um a d ispu ta en -
tre o fascism o e o hum an ism o. Neste m om ento , parece-m e que a d ispu ta está q u a -
se perd ida para os fascistas. E q ue os selvagens hedon istas, os estim u lan tes não- 
-realistas e ap ressados nada têm a ver com o hum anism o. É um p ro te sto , um a re-
beldia qu e é b oa com o tal, mas que não rep resen ta um ob je tivo. Eu ten ho tid o 
m uito c o n ta to com jovens da nossa geração que estão desesperados. Eles vêem
o m ilita rism o e a bom b a a tôm ica po r trás de tu do . Eles querem ob ter algum a coi-
sa da vida. Q uerem to rnar-se reais e existir. Se ex iste algum a chance de in ter rom -
per a ascensão e queda dos Estados U n idos, cabe à nossa juve n tu de ap roveitá-la, 
e cabe a você a po iar essa juven tude . Para conseguir isto existe apenas um ca m inho : 
to rnar-se real, a p re nde r a assum ir um a posição, desenvolver seu c en tro , com pree n-
der a base d o existencia lism o: um a rosa é uma rosa é um a rosa. Eu sou o que sou, 
e neste m om en to não posso ser d iferen te do que sou. É isto que tra ta este livro. 
D ou-lhes a o ração da G es ta lt, talvez com o um a d ire triz . A o ração da G esta lt-te ra- 
pia é :
Eu faço minhas coisas, vocé faz as suas
Não estou neste mundo para viver de acordo com suas expectativas 
E você não está neste mundo para viver de acordo com as minhas.
Você ê você, e eu sou eu
E se por acaso nos encontramos, è lindo
Se não. nada há a fazer.
(Perls , 1976 , pp. 1 3 -1 7 .)
EXERC ÍC IO S 
Continuum de Consciência
Ao discutir o conceito de Perls de conscientização,mencionamos seu 
uso de continuum de consciência como um meio de encorajar a autoconsciên-
cia ou consciência de si. Paradoxalmente, o continuum de consciência é um 
exercício que requer uma imensa disciplina em sua prática, embora tenha co-
mo objetivo o desenvolvimento da espontaneidade. A noção subjacente ao 
continuum de consciência é que a espontaneidade e a autoconsciência depen-
FREDER ICK S. PERLS E A GESTALT* TERAPIA 145
dem de uma real compreensão do significado das palavras “como”e “agora” . 
Trabalha sobre o princípio gestáltico de que, dada a capacidade do indivíduo 
de manter uma consciência contínua de sua própria experiência, a situação 
inacabada mais importante (a necessidade dominante) sempre emergirá para 
ser trabalhada.
As instruções são simples: apenas tenha consciência, a cada segundo, do 
que você está experienciando-cowo você experiencia sua existência agora. 
Observe o progresso de sua consciência. Quando é que você se interrompe 
com planos, ensaios, fantasias, recordações? Você avalia ao invés de permitir 
a pura conscientização? Como é a disciplina da conscientização? Preste aten-
ção especial aos modos pelos quais você sabota seus próprios esforços em 
sustentar a conscientização; são esses os modos pelos quais vocé via de regra 
se impede de contatar plenamente com o mundo e com sua própria experiên-
cia.
Vocé também pode tentar prolongar e ficar em contato com o momen-
to em que vocé quer evitar a conscientização contínua. Você pode sentir o 
que está evitando? Emerge uma situação em que vocé se sente incompleto?
A tentativa, neste exercício, é intensificar sua capacidade de experien- 
ciar, desenvolvendo a capacidade para a experiência plena do que é. A suposi-
ção é de que, prestando atenção à nossa experiência, a cada momento, pode-
mos nos aproveitar do que necessitamos para viver uma vida plenamente sa-
tisfatória e significativa.
Trabalho com Sonhos
Perls sugere que sonhos são mensagens existenciais que podem nos aju-
dar a compreender quais as situações inacabadas que carregamos conosco, o 
que nos falta em nossas vidas, o que evitamos fazer e como evitamos e nos 
desapropriamos de partes nossas. Ele descreve as oportunidades de crescimen-
to através do trabalho com sonhos desta forma:
Em G esta lt-te rapia nós não in te rp re tam os sonhos. Fazem os com eles algo m ui-
to mais in teressan te. E em vez de analisar e co n tar o son ho , nós querem os trazê-lo 
de volta a vida. E o je i to de trazé-lo à vida é reviver o sonho com o se ele estivesse 
o co r ren do agora. Em vez de co n ta r o sonho com o um a estó ria d o passado , encene- 
-o no p resen te , de m odo q ue ele se to rne parte de você , de m odo que você rea l-
m en te se envolva.
Se vocé com p reender o qu e pode fazer com os sonhos, poderá fazer m nita co i-
sa po r você m esm o, sozinho. Pegue um velho sonho ou fragm en to de sonh o , não 
im po rta . E nq uan to vocé a inda se lem bra de le , ele a inda está vivo e é acessível, e 
a inda con tém um a situação inacabada , não assim ilada. Q uando trab alham os com 
sonhos, gera lm ente pegam os apenas um pedaço do sonho , p o rque se pode tira r 
m u ito de cada pedacinho .
Assim, se vocé qu iser tr abalhar soz inho , eu sugiro que você escreva o sonho e 
faça um a lista de todos os de ta lhes. Ponha cada pessoa, cada co isa, cada sensação, 
c trabalh e com elas para se tornar cada um a delas. Envolva-se, e p ro cure rea lm en te 
transfo rm ar-se em cada um dos d iferen tes itens. Torne-se m esm o esta co is a- se ja 
lá o q ue fo r -torne-se a co isa . Use sua magia. Transform e-se naquele sapo fe io , ou 
no que lá e s tiv e r -a coisa m o rta , a coisa viva, o de m ô nio , e pare de pensar. C ada 
pedacinh o é um a peça de um quebra-cabeças, e , ju n to s, to d os os pedacinhos fo r -
m arão um to d o m aior , mais fo rte , mais feliz , um a personalidade m ais com ple ta-
m en te real.
Em seguida , pegue cada um destes d iferen tes itens, personagens e partes, e 
faça com que eles se en con trem . Escreva um ro te iro . Q u ando digo “ escreva um ro -
te iro " quero d izer faça com que as p artes opo stas m an tenha m um d iá logo , e você
146 TEORIAS DA PERSONALIDADE
descobrirá (especia lm en te se pegar os op osto s certo s) que eles sem pre acabam b r i-
gando en tre si. T odas as d iferen te s p a ne s , de q ualquer p ar te do sonho , são você 
m esm o, um a p ro jeção de você, e se ex istem lados incon sisten tes, lados c o n tra d itó -
rio s, e você os u tiliza para se co m baterem m u tua m en te , você tem sem pre o e te rno 
jogo d o co nf lito , o jogo da a u to to rtu ra . À m ed ida que o p rocesso de en co n tro se 
desenvolve, há um apren d izado m útu o a té chegarm os a um a com preensão e a p re -
ciação das diferenças, a té chegarm os à unidade e integ ração das forças opostas. 
E n tã o , a guerra civil te rá te rm ina do , e as energ ias estarão p ron tas para as ba ta lhas 
com o m undo .
C ada bo cad inho de tra balho que você Fizer significará um pouco de assim ilação 
de algo. Em p r in c ip io , você pode passar po r to d a a c u ra -v a m o s cham á-la de cura 
ou m a tu ra ç ão -s e tiver fe ito esta ún ica coisa com um sonh o . T udo está a í . Os so -
nhos se m od ificam , m udam de fo rm a, mas qu ando você com eça deste je i to , vo -
cê descobre que cada vez aparecem mais sonhos e q ue a m ensagem ex istencia l se 
to m a cada vez mais clara.
De agora em d ian te , p o rta n to , eu gostaria de co locar a ên fase sobre o trabalho 
com sonhos. N ós encon tram os tud o que prec isam os no so nh o , na periferia do so -
nh o , no am bien te do sonho . A d ificu ldade ex istencia l, a pa rte da personalidade 
que está fa lta ndo , tu do está a í. É um a espécie de a taque cen tra l , bem no m eio da 
sua não-ex istência .
O sonho é um a excelen te opo rtu n ida de de descobrir os fu ros da personalida-
de . E les aparecem com o vazios, espaços em b ranc o , e q u an do se chega à viz inhan-
ça de ta is bu racos, fica-se confuso o u nervoso. Há um a experiência apav oran te , a 
expecta tiv a : “ Se eu m e ap rox im ar haverá um a ca tástro fe . E u serei nada". Eu já 
falei um pou co sobre a filosofia do nada . Este é o im passe, q uand o você evita , 
qua nd o você vira fób ico . De rep en te você fica com sono , ou se lem bra de alguma 
coisa m uito im po rtan te que precisa fazer. Assim , se você trabalhar com sonhos é 
m elhor tra balh ar ju n to com o u tra pessoa , que pode indicar q ua nd o você está evi-
tand o . C o m preender o sonho significa perceber q uan do você está ev itando o ó b -
vio. O ún ico perigo é qu e esta o u tra pessoa poderia vir m u ito dep ressa cm seu so -
co rro , e lhe d izer o q ue está se passando de n tro de você, em vez de lhe dar a c han -
ce de descobrir po r si só.
E se você descobre o significado , cada vez que se iden tifica com um pedacinho 
do sonho , cada vez que você transfo rm a um isso em eu, você aum e n ta a sua v ita -
lidade e o seu potencial.
(Perls , 1976 , pp. 1 0 1 -1 0 3 .)
Exemplo de Trabalho com Sonho
L inda: Eu sonhei que estou o lhando . . . um lago. . . que e stá secando, e no m eio 
há um a pequena ilha, e um c ircu lo d e . . . bo tos. . . são com o bo tos , só que 
podem ficar cm pé; en tão são com o b o tos que são com o pessoas, e estão 
num circu lo , um a espécie de cerim ón ia re ligiosa; e é m uito triste. . . eu me 
sin to triste p o rq u e eles conseguem resp irar, eles estão dançan do em to rn o 
do c ircu lo , m as a água , o e lem en to de les, está secando . E n tão , é com o 
m orrer. . . com o ver um a raça de gen te , um a raça de cria tu ras, m orrendo. 
E a m aioria são fêm eas, mas a lguns tem um pequ eno ó rgão m ascu lino ,en tã o há alguns m achos, m as eles não vão viver o su fic ien te para se rep ro -
duzir, e o seu e lem en to está secando . E um deles está sen tad o aqu i ao meu 
lado e eu esto u fa lando com este bo to , e ele tem esp inhos na barriga, 
um a espécie de po rco -esp inho , e os esp inhos não parecem fazer parte 
de le . Eu acho q ue há um a coisa boa nessa água secando , eu penso. . . bem, 
pe lo m enos qu and o a água secar, no fund o p rovavelm en te haverá a lgum 
tes ouro , p o rq ue no fund o do lago deve haver coisas que c a íram , com o 
m oedas ou coisas assim ; m as eu o lho com cu idado e tu do que consigo 
en co n trar é um a p laca de carro velha. . . Este é o sonho .
FRED ER ICKS . PERLS E AGESTALT-TERAPIA 147
F r itz : Po r favor, seja a placa de carro .
L : Eu sou um a placa de carro velha, jogada no fundo do lago. E u não sirvo 
para nada po rqu e não te nh o v a lo r-m e s m o que eu não este ja estra gad a- 
eu já es tou vencida , e en tão não posso ser usada com o placa de c a r r o . . . 
e eu estou sim plesm ente jogada num m onte de lixo. F oi isto que eu fiz 
com um a placa de carro , joguei-a num m o nte de lixo.
F : Bem, e com o você se sente com relação a isto?
L: (B aix inho .) N ão gosto . N ão gosto de ser um a placa de carro . . . é inú til.
F : Fale sob re isto . F o i um sonho tão com pr ido a té você chegar a enc on trar 
a p laca ; estou cer to q ue ela deve te r m u ita im portância .
L : (S uspiros.) In ú til. V encida. . . . A utilidade de um a placa de carro é pe r-
m itir. . . dar perm issão para um c a r r o . . . e eu não dou perm issão a nin -
guém po rque estou vencida. . . . Na C alifó rn ia , eles só co lam . . . a gente 
com pra um ró tu lo . . . e gruda no carro , em cim a da placa velha. (Pálida 
ten ta t iva de hum or .) E n tão talvez a lguém pudesse m e co locar no car ro , 
e g rudar o ró tu lo em m im . não sei. . . .*
F : M uito bem . A gora seja o lago.
L: E u sou um lago. . . eu estou secando , e desap arecendo , sendo absorvido 
pela t e r r a . . . (com um toqu e de su rp resa) morrendo. . . . Mas. q uan do eu 
penetro na te r ra , viro parte dela . . . e n tã o talvez eu m olhe a área que es-
tá em vo lta , e n tã o . . . m esm o no lago, m esm o no m eu leito , podem cres-
cer flo res (suspiros). . . . Pode crescer um a vida nova. . . de mim (cho -
ra). . . .
F : V ocê cap tou a m ensagem ex istencial?
L: Siin. (T riste , mas com conv icção .) E u posso p in tar. . . eu posso criar. . . 
eu posso criar beleza . E u não posso mais rep rod uz ir, eu sou com o o 
b o to . . . mas eu. . . eu estou . . . eu. . . c on tinu o qu eren do d izer que eu 
sou alimento. . . e u . . . com o a água se t o r n a . . . eu m olho a te rra , e dou 
vida. . . coisas q ue crescem , a á g u a . . . p recisam ta n to da te r ra qu a n to da 
água, e o . . . e o ar e o so l, m as assim com o a água do lago, eu posso 
p artic ipar em algum a coisa, e p roduzir. . . a lim en tar.
F : Veja o co n tras te : Na superfíc ie você acha algo a r t if ic ia l-u m a placa de 
carro , você a rt i fic ia l -m a s qua ndo você chega m ais fun d o , você descobre 
que a m o rte a pare n te do lago , na verdade, é f e rt i l id a d e . . . .
L : E eu não prec iso de um a placa , de perm issão, de um a licença para. . .
F : (D elicadeza.) A n atu reza não precisa de um a placa para crescer. V ocê 
não será inú til, se conseguir criar o rgan ism icam en tc , o q ue significa, se 
você se envolver.
L : E eu não prec iso de licença para ser cria tiva. . . . O brigada.
(Perls , 1976 , pp. 1 1 6 -1 1 8 .)
B IBL IO G R A F IA COMENTADA 
fe ris , F rederick S.. 1947 . Ego, Hunger and Aggression. N ew Y ork : R andom H ousc. É o 
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da F orm a.
I 1973 . A Abordagem Gestáltica; Testemunha Ocular da Terapia. Rio de Ja neiro ,
Z ahar E d ito res, 1977. Os ú ltim os m anuscrito s de P erls, pub licados em c on jun to 
e pos tum am e nte . A Abordagem Gestáltica o ferece um a exposição teó rica excelen -
te e de agradável leitu ra da G csta lt-te rap ia , en qu an to que Testemunha Ocular da 
Terapia inclui os reg istros de um a série de filmes de sessões te rap êu ticas, que 
Perls p lanejou para usar com o m ateria l de ensino.
* N .T .: A ten ta tiva de hum or se refere a um trocad ilho intraduzível. Em inglês, o 
K> to stick qu er d izer en fiar, co locar, apegar; sticker c algo que se coloca , um ró tu lo 
úvo, p o r exem plo ; mas tam bém quer d izer algo qu e se en fia , que se co loca de n tro . A 
fatse assum e en tão um dup lo sen tid o , com um a con o ta ção n itidam en te sexual, mas que 
■fo se faz p resen te na trad uçã o .
148 TEORIAS DA PERSONALIDADE
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um pouco a fastado da posição de Peris; N aranjo exp lo ra p articu larm en te o uso de 
técn icas supressivas e expressivas na G esta lt-te rap ia .
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