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Gleyson de Souza Lima Odontologia – 2020.2 VISÃO GERAL DAS RESPOSTAS CELULARES AOS ESTÍMULOS As células, por serem participantes ativos em seu ambiente, ajustam constantemente sua estrutura e função para se adaptar às demandas de alterações extracelulares e de estresse extracelular; Então, as células se adaptam com o intuito de manter o seu meio intracelular dentro de uma faixa estreita de parâmetros fisiológicos (homeostasia); Quando as células são submetidas a um estresse fisiológico ou a um estímulo patológico, elas podem sofrer uma adaptação, alcançando um novo estado constante (homeostático), preservando sua viabilidade e função; Se a célula é exposta a um estresse, ela consegue se adaptar e gerar um novo estado constante. Porém, se o estresse provocado exceder a capacidade adaptativa da célula ou se for um estresse inerentemente nocivo, essa célula não consegue se adaptar e ocorre uma lesão celular; Se o estresse causador dessa lesão celular estiver dentro de certos limites (se for “leve” e transitório), a lesão celular provocada será reversível e as células retornam a um estado basal estável. Caso o estresse seja grave (intenso, persistente e de início rápido), a lesão celular provocada será irreversível, culminando na morte das células afetadas (por apoptose ou necrose); A morte celular é um dos eventos mais cruciais na evolução de uma doença em qualquer tecido ou órgão, e pode ser causada por vários estímulos, como: isquemia (redução do fluxo sanguíneo), infecções, toxinas, reações imunes e outros; Aqui, neste resumo, serão abordadas as formas como as células se adaptam ao estresse, seja fisiológico ou patológico. ADAPTAÇÕES CELULARES As adaptações são alterações reversíveis em número, tamanho, fenótipo, atividade metabólica ou das funções celulares em resposta a alterações no seu ambiente; Então, as principais respostas adaptativas celulares ao estresse são: a) Hipertrofia (1); b) Hiperplasia (2); c) Atrofia (Hipotrofia e Hipoplasia); d) Metaplasia (3); e) Displasia (4). OBS: As adaptações celulares envolvem: (1) alterações do volume celular; (2) alterações da proliferação celular; (3) alterações da diferenciação celular; (4) alterações da proliferação e diferenciação celular. Adaptações Celulares Gleyson de Souza Lima Odontologia – 2020.2 As adaptações podem ser: a) Adaptações Fisiológicas representam respostas celulares à estimulação normal pelos hormônios ou mediadores químicos endógenos (por exemplo, o aumento da mama e do útero, induzido por hormônios durante a gravidez). b) Adaptações Patológicas são respostas ao estresse que permitem às células modularem sua função e estrutura para escaparem da lesão celular. EXEMPLO DE ADAPTAÇÃO EX1: Um jogador de futebol vai disputar uma partida em um país estrangeiro, de maior altitude, onde o ar é mais rarefeito. Neste caso, a menor quantidade de O2 no ar é um estímulo estressante para o organismo do jogador, fazendo com que seu corpo se esgote mais rapidamente; Então, para contornar tal situação, o organismo aumenta a produção de hemácias, hiperplasia, aumentando a quantidade de oxigênio sendo transportada, fazendo com que a homeostasia perdida seja recuperada. EX2: O miocárdio, quando submetido a uma carga aumentada e persistente, como na hipertensão ou estenose de uma valva, se adapta sofrendo hipertrofia – um aumento do tamanho das células individuais e finalmente de todo o coração – para gerar uma força de contração maior; Se o aumento da demanda cardíaca não for atenuado ou se o miocárdio não for submetido a um fluxo sanguíneo reduzido, as células musculares sofrerão lesão; O miocárdio pode ser lesado de modo reversível se o estresse for leve ou breve ou se a oclusão da artéria seja incompleta, ou pode sofrer lesão irreversível e, consequentemente, a morte celular (infarto) após a oclusão completa e prolongada. HIPERTROFIA A hipertrofia é o aumento dos constituintes estruturais (proteínas estruturais e organelas) e das funções celulares, o que resulta no aumento do volume das células e, consequentemente, dos órgãos afetados; Para que a hipertrofia ocorra, algumas exigências devem ser atendidas, são elas: a) O fornecimento de O2 e nutrientes deve suprir o aumento de exigência das células; b) As células devem ter suas organelas e sistemas enzimáticos íntegros, pois células lesadas (degeneradas) não conseguem hipertrofiar-se como as células normais; c) As células cuja atividade depende de estimulação nervosa só podem hipertrofiar se a inervação estiver preservada (miocárdio desnervado, por exemplo, não se hipertrofia ou se hipertrofia pouco). Tecidos e órgãos hipertróficos se tornam aumentados de volume e peso, por conta do aumento de volume das células. Entretanto, a morfologia básica do órgão não muda, mas aumenta o fluxo sanguíneo e de linfa; A hipertrofia é uma forma de adaptação de células e de órgãos frente a: a) Maior exigência de trabalho (aumento da demanda funcional); b) Ação de fatores de crescimento; c) Estimulação hormonal específica. Gleyson de Souza Lima Odontologia – 2020.2 OBS: Células capazes de realizar replicação (divisão) podem gerar uma resposta adaptativa tanto pela Hipertrofia, quanto pela Hiperplasia. Já células que possuem uma capacidade limitada de divisão, a resposta adaptativa ocorre pela Hipertrofia. A hipertrofia, algumas vezes, pode acontecer ao mesmo tempo em que ocorre a hiperplasia (aumento do nº de células); A hipertrofia também é reversível, ou seja, quando o estímulo é cessado, a célula volta ao normal; A hipertrofia pode ser de dois tipos: A) Hipertrofia Fisiológica: ocorre em certos órgãos e em determinadas fases da vida como fenômenos programados; EX: Durante a gravidez, ocorre o aumento fisiológico maciço do útero como consequência da hipertrofia e hiperplasia do músculo liso, que é estimulado pelo estrogênio células musculares estriadas da musculatura esquelética e do coração podem sofrer apenas hipertrofia em resposta ao aumento da demanda pois, no adulto, elas possuem capacidade limitada de divisão. B) Hipertrofia Patológica: não é programada e surge por estímulos variados; EX1: Alguns exemplos de hipertrofia patológica são: a) Hipertrofia da musculatura esquelética em pessoas que realizam grande esforço. b) Hipertrofia da musculatura lisa da parede de órgãos ocos, bexiga. c) Hipertrofia de neurônios. d) Hipertrofia de hepatócitos. EX2: Outro exemplo de hipertrofia patológica é o aumento cardíaco que ocorre com a hipertensão ou doença de valva aórtica. HIPERPLASIA Consiste no aumento do número de células de um órgão ou parte dele, por aumento da proliferação celular; A hiperplasia só acontece em órgãos cujas células possuem capacidade de replicação; Na hiperplasia, assim como na hipertrofia, o órgão afetado fica aumentado de volume e peso, por conta do maior número de células; Para haver hiperplasia são necessárias às mesmas condições descritas para a hipertrofia, como suprimento sanguíneo adequado, integridade morfofuncional das células e inervação preservada; Muitas vezes as células de um órgão podem apresentar ao mesmo tempo hipertrofia e hiperplasia, pois um mesmo estímulo (causa) pode desencadear os dois processos adaptativos; Assim como na hipertrofia, a hiperplasia também é um processo reversível, ou seja, se o estímulo (causa) for eliminado, o número de células retorna ao nível original; OBS: A capacidade de hiperplasia de um tipo celular tem limite. As células hiperplásicas não se multiplicam indefinidamente e conservam seu mecanismo de controle da divisão celular, ou seja, o processo hiperplásicopermanece controlado por mecanismos de controle de regulação. Gleyson de Souza Lima Odontologia – 2020.2 Essas duas propriedades, a de ser um processo reversível e estritamente controlado, são essenciais para diferenciar uma hiperplasia de uma neoplasia, nesta, a proliferação celular é autônoma e independe de um estímulo (os mecanismos de controle do crescimento se tornam desregulados ou ineficazes). Contudo, a hiperplasia patológica constitui um solo fértil para o posterior surgimento do câncer. A hiperplasia, assim como a hipertrofia pode ser fisiológica ou patológica. A) Hiperplasia Fisiológica: os principais tipos são hiperplasia compensatória ou secundária e a hiperplasia hormonal; EX: Um exemplo de hiperplasia hormonal é quando ocorre a proliferação do epitélio glandular da mama feminina na puberdade e durante a gravidez. EX: Um exemplo de hiperplasia compensatória (crescimento de tecido residual após a remoção ou perda da porção de um órgão) ocorre quando o fígado é parcialmente removido. A atividade mitótica das células restantes de inicia 12 horas depois, restaurando o fígado ao seu peso normal no período de cerca de 2 semanas; Na hiperplasia compensatória, geralmente ocorre hiperplasia e hipertrofia simultaneamente. B) Hiperplasia Patológica: a causa mais conhecida é a hiperestimulação hormonal, mas também pode ocorrer por fatores de crescimento. EX: Um exemplo de hiperplasia patológica é quando existe uma hiperfunção da hipófise, e todas as glândulas-alvo dos hormônios produzidos em excesso entram em hiperplasia. EX2: Outro exemplo é que em mulheres, o aumento de estrógeno (desregulação) resulta em hiperplasia das mamas ou do endométrio, o que pode aumentar os riscos de câncer nesses órgãos. OBS: As hiperplasias patológicas, por serem acompanhadas de aumento da reprodução celular, são consideradas lesões potencialmente neoplásicas, já que nelas o risco de surgir um tumor é maior do que em tecidos normais. ATROFIA A atrofia compreende a diminuição do volume celular (hipotrofia) e/ou redução da quantidade de células (hipoplasia) de um órgão; Quando um número suficiente de células está envolvido, todo o tecido ou órgão diminui de tamanho, se tornando atrófico; Em alguns casos, dependendo do estímulo, ocorrerá primeiro a hipotrofia e depois a hipoplasia (ex: cadeirantes); OBS: É necessário enfatizar que, embora as células atróficas tenham sua função diminuída, elas não estão mortas. Os mecanismos da atrofia consistem em uma combinação de: A) Síntese proteica diminuída por causa da redução da atividade metabólica da célula; B) Degradação proteica aumentada nas células via ubiquitina-proteossoma; A deficiência de nutrientes e o desuso ativam ligases da ubiquitina, as quais ligam os pequenos peptídeos ubiquitina à proteínas celulares e direcionam essas proteínas para a degradação nos proteossomas. OBS2: Em muitas situações, a atrofia é acompanhada pelo aumento da autofagia, gerando um aumento do número de vacúolos autofágicos. Então, a célula privada de nutrientes digere seus próprios componentes no intuito de encontrar nutrição e sobreviver. Gleyson de Souza Lima Odontologia – 2020.2 A atrofia pode ser causada por: a) Diminuição do suprimento sanguíneo; b) Perda da estimulação hormonal; c) Redução da carga de trabalho; d) Nutrição inadequada; e) Substâncias tóxicas; f) Perda da inervação; g) Inflamações crônicas; h) Compressão; i) Envelhecimento. OBS3: Se ocorrer a perda de células (hipoplasia) em tecidos cujas células são estáveis ou permanentes, a atrofia caracteriza uma lesão irreversível. Mas quando ocorre apenas um hipotrofia, é um processo reversível. OBS4: Em órgãos pares, como nos rins, quando ocorre atrofia em um dos rins, ocorre uma hiperplasia compensatória no outro rim. O contrário não acontece. HIPOTROFIA Consiste na redução da quantidade de componentes estruturais e das funções celulares, resultando na diminuição do volume das células e dos órgãos atingidos; O aumento da degradação de proteínas celulares (em lisossomos e pelo sistema ubiquitina-proteossoma) é o principal mecanismo de hipotrofia; A hipotrofia pode ser de dois tipos: A) Hipotrofia Fisiológica: ocorre na senilidade, quando todos os órgãos e sistemas do organismo reduzem as suas atividades metabólicas não há prejuízo funcional importante. B) Hipotrofia Patológica: a hipotrofia patológica pode ser resultado de (1) inanição. (2) Imobilizados. (3) Compressão. (4) Obstrução vascular. (5) Substâncias tóxicas. (6) Redução ou deficiência de hormônios. (7) Perda de estimulação nervosa. (8) Inflamações crônicas. HIPOPLASIA Consiste na diminuição da população celular de um tecido, de um órgão ou de parte do corpo; A região afetada é menor e menos pesada que o normal, mas conserva o padrão morfológico original; A hipoplasia pode ser de dois tipos: A) Hipoplasia Fisiológica: as hipoplasias fisiológicas mais comuns são a involução do timo a partir da puberdade e a de gônadas no climatério. Na senilidade, ao lado da hipotrofia existe hipoplasia de órgãos, por aumento de apoptose. B) Hipoplasia Patológica: as de maior interesse são as da medula óssea provocadas por agentes tóxicos ou por infecções, resultando na anemia aplásica (hipopláscia) e a hipoplasia de órgãos linfoides na AIDS ou em consequência da destruição de linfócitos por corticoides. As hipoplasias patológicas podem ser reversíveis, exceto as anomalias congênitas. OBS: Muitas vezes, hipoplasia e hipotrofia ocorrem simultaneamente em um órgão. METAPLASIA Consiste na mudança de um tipo de tecido adulto (epitelial ou mesenquimal) em outro tecido da mesma linhagem germinativa alteração da expressão genética (expressão gênica seletiva); Por exemplo, um tipo de epitélio se transforma em outro tipo de epitélio, porém, um epitélio não pode se transformar em tecido mesenquimal; OBS: Quando uma célula é submetida a um estímulo estressante (ou patológico), ela pode mudar sua expressão gênica e se transformar em outro tecido que seja mais adaptado (resistente) a esse estímulo estressante. Gleyson de Souza Lima Odontologia – 2020.2 A metaplasia é também um processo adaptativo, reversível, que surge em resposta a várias agressões, e, como regra geral, o tecido metaplásico é mais resistente a agressões; Em princípio, a metaplasia é causada por uma irritação (estímulo) persistente que leva ao surgimento de um tecido mais resistente; No entanto, o tecido metaplásico pode resultar em menor proteção ao indivíduo: na metaplasia escamosa da árvore brônquica no tabagismo, por exemplo, há um prejuízo na síntese de muco e desaparecimento dos cílios, ambos importantes como defesa do organismo contra infecções; Portanto, a metaplasia epitelial é uma faca de dois gumes. Os exemplos de metaplasia mais comuns são: (1) agressões mecânicas repetidas, como as provocadas por próteses dentárias mal ajustadas no epitélio da gengiva ou da bochecha. (2) Irritação por calor prolongado, como a causada no epitélio oral e do esôfago por alimentos quentes. (3) Irritação química persistente, como acontece com a fumaça do cigarro na mucosa respiratória. (4) Inflamações crônicas, como na mucosa brônquica e gástrica ou no colo do útero; OBS2: A metaplasia é uma transformação controlada por mecanismos de controle de regulação, porém, pode evoluir para uma displasia e, posteriormente, uma neoplasia. Por isso, a metaplasia é uma condição potencialmente maligna. Caso os fatores estressantes sejam eliminados a tempo, uma metaplasia não se tornará uma neoplasia. DISPLASIA Consiste em alterações da proliferação e da diferenciaçãocelulares acompanhadas de redução ou perda de diferenciação das células afetadas; Então, a displasia é considerada um mecanismo adaptativo, mas que envolve perda de diferenciação e do controle da proliferação celular; A atipia mais importante em displasias é a cariomegalia, por alterações no conteúdo de DNA; A displasia, portanto, é um processo mais complexo e com alterações na expressão de genes que regulam a proliferação e a diferenciação das células, razão pela qual muitas displasias são consideradas lesões pré-cancerosas. Quanto mais grave for a displasia, maior o risco de sua evolução para um câncer; OBS1: Muitas vezes, displasias estão associadas a metaplasia ou se originam nela. As displasias mais importantes são as displasias de mucosa, como do colo uterino, de brônquios e gástrica, pois muitas vezes precedem os cânceres que se formam nesses locais; OBS2: A displasia fica entre as adaptações (processos reversíveis) e as neoplasias (processos irreversíveis); Contudo, a displasia é um processo controlado e reversível, onde, a partir do momento que o estímulo estressante for removido, as células retornam ao seu comportamento e morfologias originais. REFERÊNCIAS KUMAR, V. et. al. Robbins patologia básica. 9. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013. FILHO, G. S. Bogliolo patologia. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016.
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