Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Júlia Figueirêdo – DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA PROBLEMA 4: DIAGNÓSTICOS ETIOLÓGICOS DO ABDOME AGUDO: Após a avaliação inicial e a identificação de um quadro de abdome agudo, torna-se necessário identificar sua etiologia de modo a estabelecer condutas específicas. Assim, de acordo com os subtipos supracitados, as principais causas associadas a esses tipos de manifestação clínica, são: ABDOME AGUDO INFLAMATÓRIO: APENDICITE AGUDA: É causada pela obstrução do lúmen apendicular por uma inflamação ou corpo estranho. O paciente normalmente manifesta dor migratória (do epigástrio para fossa ilíaca direita) contínua ou em cólica, acompanhada por febre moderada ou baixa, náuseas ou vômitos. Ao exame, apresenta- se em posição antálgica, com abdome reativo à palpação e presença de sinais de Blumberg e Rovsing. Devem ser solicitados hemograma (espera- se alterações em leucócitos) e uma ultrassonografia de abdome, que deve apresentar aumento no diâmetro apendicular e sinal do alvo (paredes espessas), além de descartar causas ginecológicas na população feminina. Aspectos confirmatórios para apendicite aguda COLECISTITE AGUDA: É a inflamação aguda da vesícula biliar, seja ela de origem bacteriana ou química, representando uma complicação comum da litíase ou colelitíase. O quadro clínico é marcado por dor abdominal em cólica no hipocôndrio direito, que piora com a alimentação, associada a febre alta, náuseas e vômitos. Os achados identificáveis ao exame físico que sugerem esse quadro são sinal de Murphy (interrupção da inspiração em decorrência de dor na palpação do ponto cístico), irritação peritoneal e icterícia. A confirmação diagnóstica, por sua vez, ocorre com a visualização da dilatação ductal na ultrassonografia Principais achados no diagnóstico de colecistite aguda PANCREATITE AGUDA: Esse quadro inflamatório agudo ocorre por meio da ativação enzimática inadequada, havendo grande correlação com a presença de litíase biliar ou histórico de alcoolismo. Normalmente, como apresentações clínicas principais encontram-se dor intensa e difusa no epigástrio, podendo se irradiar para o dorso, náuseas e vômitos de início precoce e bastante volumosos, além de interrupção na eliminação de fezes e flatos, com diminuição de ruídos hidroaéreos. Nos casos graves há grande comprometimento ao estado geral, com aumento da FC e da FR, hipotensão e distensão abdominal. Júlia Figueirêdo – DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA Sinais de peritonite estão presentes. Para o diagnóstico, os sinais de Cullen, com equimoses e hematomas periumbilicais, e de Grey Turner, marcado por manifestações vasculares em flancos, são de grande importância, permitindo a determinação de casos mais graves de pancreatite. Como exames complementares, devem ser solicitados amilase e lipase pancreáticas, que se mantém elevados por muito tempo após a inflamação, porém apresentam bom caráter preditivo para a pancreatite aguda, e a tomografia de abdome (exemplificada no tópico anterior). Confirmação diagnóstica da pancreatite aguda Todos esses parâmetros, sejam eles clínicos, laboratoriais ou de imagem, podem ser utilizados para estratificar a severidade do quadro, classificando o paciente nas escalas de Balthazar ou Apache II. Critérios de gravidade para a pancreatite aguda DIVERTICULITE AGUDA: A diverticulite corresponde a inflamação de um ou mais divertículos (dilatações da mucosa) do cólon. Representação gráfica de divertículos O quadro clínico normalmente cursa com dor (em cólica ou contínua), distensão abdominal, taquicardia discreta e peritonite, evidenciada por dor à percussão e à descompressão brusca. Caso o quadro inflamatório atinja as vias urinárias, podem ser referidos disúria e polaciúria. Podem ser identificadas massas palpáveis e dolorosas, predominantemente na região da Júlia Figueirêdo – DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA fossa ilíaca esquerda. Esse incômodo pode irradiar para o dorso ipsilateral. Para confirmar o diagnóstico, o exame mais recomendado é a tomografia, que possibilita também a identificação de complicações, como abcessos. Critérios para confirmação de diverticulite aguda ABDOME AGUDO OBSTRUTIVO: O quadro clínico do abdome agudo obstrutivo é cariado, porém alguns sintomas típicos podem ser destacados, como dor abdominal súbita acompanhada por náuseas, vômitos e interrupção na eliminação de fezes e flatos. É possível elencar particularidades de cada tipo de obstrução, a saber: Obstrução alta: os vômitos são precoces e a parada da evacuação é tardia, pois o conteúdo do cólon se movimenta normalmente no início do quadro. O mesmo também ocorre com os ruídos hidroaéreos, que se tornam mais intensos e metálicos (peristalse paradoxal) até desaparecerem gradualmente; Obstrução baixa: há parada precoce na eliminação de fezes e gases, normalmente acompanhada por distensão abdominal relevante. Nesse caso os vômitos são tardios, podendo assumir aspecto fecaloide. A distensão excessiva das alças pode levar a isquemia e perfurações, elevando o risco de inflamações e infecções secundárias. Comparação entre os principais sintomas das apresentações de obstrução intestinal Conforme a localização da obstrução (intestino delgado ou grosso), a distensão abdominal pode apresentar-se de forma central ou em flancos/abdome superior (“emoldurando” o abdome), respectivamente. O diagnóstico desse quadro pode ser inferido a partir de uma anamnese e exame físico bem coletados, porém exames complementares auxiliam a realizar o diagnóstico diferencial e a identificar o ponto de obstrução. Principais achados laboratoriais e de imagem na obstrução intestinal Os principais exames laboratoriais solicitados são: Hemograma: a presença de leucocitose sugere complicações inflamatórias ou perfurativas. É também comum encontrar evidências de desidratação; Glicemia: em pacientes diabéticos, quadros descompensados podem causar obstrução funcional; Júlia Figueirêdo – DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA Função renal: é um “pente fino” para desidratação leve, além de detectar quadros de injúria renal em pacientes com choque hipovolêmico; Eletrólitos: quando há perdas hidroeletrolíticas, a etiologia da obstrução pode ser metabólica ou estar associada a comprometimento vascular; Gasometria arterial: a Dentre os exames de imagem, a radiografia apresenta grande destaque, sendo realizada anto com o paciente em ortostase quanto em decúbito dorsal. A presença de dilatação de alças com nível hidroaéreo intraluminal pode auxiliar a detectar o foco da oclusão. Quando é o jejuno que se dilata, a imagem apresenta padrão típico, denominado empilhamento de moedas. Quadros ileais, por sua vez, não possuem demarcações tão evidentes. Radiografia com empilhamento de moedas Quando há dilatação do cólon, o padrão mais evidente é o de moldura, com delimitação das margens da parede abdominal. Nesses casos, não há ar na ampola retal. A obstrução causada por volvo de sigmoide leva ao aumento da alça de forma similar ao megacólon. Pode ocorrer impactação fecal, que se mostra, ao exame, como imagens em “miolo de pão” no lúmen do intestino. Padrão em miolo de pão associado à dilatação de alça em paciente com volvo A realização de exames contrastados, como o trânsito intestinal e o enema opaco, pode também auxiliar no diagnóstico e no manejo do quadro, principalmente nas obstruções altas parciais. Outros exames para detecção de obstrução intestinal ABDOME AGUDO PERFURATIVO: As principais causas de abdome agudo perfurativo, ou seja, que permitem a comunicação entre o conteúdo viscerale a cavidade abdominal, são: Úlcera péptica perfurada: esse processo promove o extravasamento do conteúdo gastroduodenal, podendo causar peritonite química. Normalmente, essa condição se dá por meio do desequilíbrio entre a secreção gástrica e a barreira de proteção mucosa. Júlia Figueirêdo – DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA A tríade clínica clássica desse quadro é marcada por taquicardia, dor e rigidez abdominal. Divertículos: ainda que a perfuração de um divertículo seja um acontecimento raro, esse é um fenômeno de elevada gravidade, fortemente associado a sepse. Seu surgimento ocorre após mudanças na dieta ou atividade cólica anormal, processos que dificultam o adequado esvaziamento do conteúdo fecal, que pode causar inflamações. O quadro clínico é semelhante ao da diverticulite, já discutido anteriormente. Corpos estranhos: a introdução de corpos estranhos no TGI, seja por via oral ou retal, é um fator potencial para perfurações. Normalmente, o esôfago é o local mais afetado, em decorrência de sua estrutura anatômica e localização, mas qualquer local de estreitamento pode ser alvo dessas lesões, como o piloro e as flexuras intestinais. Nesses quadros a dor é difusa e intensa, normalmente em faixa. Há também náuseas e vômitos volumosos e precoces. De modo geral o diagnóstico do abdome agudo perfurativo é baseado no exame clínico de qualidade e nos exames de imagem, sendo achados laboratoriais pouco específicos, úteis apenas na detecção de inflamações. A radiografia simples é normalmente o primeiro exame a ser realizado, sendo capaz de expor facilmente a presença de peneumoperitônio, sinal evidente de perfurações. Diversas incidências podem ser solicitadas para avaliar acúmulo de ar em pontos distintos, como a ortostase (entre diafragma e fígado) e o decúbito lateral (entre o fígado e a parede abdominal). O decúbito dorsal, no entanto, é um posicionamento capaz de fornecer múltiplos sinais. Sinais da radiografia simples em decúbito dorsal A tomografia também é um ótimo método diagnóstico, dada sua elevada sensibilidade e especificidade por quadros perfurativos, possibilitando também a localização precisa da lesão e os possíveis comprometimentos a ela associados. Tomografia evidenciando acúmulo de ar anteriormente ao estômago (ponta de seta) ABDOME AGUDO ISQUÊMICO: O abdome agudo isquêmico ocorre principalmente em áreas com pouca ou nenhuma circulação colateral, portanto vulneráveis a quadros de trombose, embolismo ou isquemia propriamente dita. Principais causas de abdome agudo isquêmico Nessas situações, o fornecimento de oxigênio para os tecidos intestinais é reduzido ou interrompido, o que justifica a Júlia Figueirêdo – DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA necessidade de intervenção imediata, tanto para manter a viabilidade do local afetado, quanto para evitar óbitos. Mecanismo fisiopatológico de lesões isquêmicas (há relativo controle sem danos em isquemias de até 12h) Mais uma vez, o quadro clínico varia conforme o comprometimento vascular, abrangendo desde infartos súbitos até anginas abdominais crônicas. Sangramentos (normalmente em quadros colônicos agudos), náuseas vômitos e alterações do trânsito intestinal também podem estar presentes, sendo o principal sintoma a dor abdominal, normalmente desproporcional aos achados do exame físico. Características da dor abdominal e hipóteses isquêmicas associadas Ao exame físico, a peristalse é inicialmente aumentada de forma a superar a hipóxia, porém, com o avanço do quadro, o timpanismo se eleva e há distensão abdominal. Quando surgem sinais de peritonite e choque, o prognóstico é ruim. O diagnóstico deve ser baseado no exame clínico, sendo os exames de imagem solicitados apenas a pacientes estáveis. Achados laboratoriais são inespecíficos, podendo indicar com maior precisão apenas quadros de necrose. A tomografia abdominal com contraste é o método de primeira escolha na investigação de isquemias, podendo não somente detectar vasos comprometidos, como também descartar causas possíveis de dor abdominal. Principais achados na tomografia de um paciente com abdome agudo isquêmico A angiografia, por sua vez, é o exame padrão-ouro nas isquemias mesentéricas e colônicas, porém nem sempre é realizada, raças a acurácia da tomografia. Esse método também apresenta potencial terapêutico, com injeção direta de vasodilatadores. ABDOME AGUDO HEMORRÁGICO: GRAVIDEZ ECTÓPICA ROTA: A gravidez ectópica tem como fatores de isco principais a realização prévia de cirurgias tubárias, uso de DIU, histórico de gravidez ectópica anterior, tabagismo, fertilização in vitro e endometriose. As tubas uterinas são a região mais afetada, porém não é incomum o desenvolvimento do quadro nos ovários ou na própria cavidade endometrial. Júlia Figueirêdo – DOR ABDOMINAL, DIARREIA, VÔMITO E ICTERÍCIA Comparação entre a gestação uterina e as apresentações da gravidez ectópica Os sintomas desse quadro podem se apresentar com atraso menstrual, volume uterino desproporcional à idade gestacional e dor abdominal súbita e intensa, de início no baixo ventre, mas que pode irradiar para o ombro (achado denominado sinal de Lafond). Apresentações da gravidez típica também podem ser observadas, como sensibilidade mamária, náuseas e polaciúria. A paciente pode apresentar hipotensão, taquicardia e choque hipovolêmico com a ruptura da estrutura afetada. No exame físico, é evidente dor à palpação do abdome, possível sinal de Cullen (descrito anteriormente) e dor aguda ao toque do fundo de saco de Douglas. O diagnóstico conta com a realização da dosagem de β-HCG (confirmação da gravidez) e do hemograma, que possibilita a avaliação do comprometimento hemorrágico e a identificação de irritação peritoneal, causadora de leucocitose. Exames de imagem, como a ultrassonografia, a ressonância magnética e a tomografia também podem ser utilizados na detecção de quadros hemorrágicos agudos, facilitando a identificação do foco da lesão. RUPTURA DE ANEURISMA AÓRTICO: Esse quadro, mais comum em homens maiores de 60 anos, pode ser fruto de complicações da hipertensão, da aterosclerose ou até mesmo da DPOC, podendo também ser precipitado por histórico familiar sugestivo. Representação de um aneurisma de aorta abominal Por vezes, os portadores desse quadro são assintomáticos, sendo o diagnóstico sugerido com a palpação de massa pulsátil, distensão abdominal e dor à palpação. A confirmação, nesses casos, é feita com ultrassonografia ou tomografia. Aneurisma aórtico em tomografia (setas verdes) As primeiras manifestações são descritas como dor abdominal difusa e mal caracterizada, podendo se espalhar para o dorso. Além disso, podem estar presentes náuseas e vômitos. Com a ruptura efetiva do aneurisma, cerca de ¼ dos pacientes apresentam hipotensão.
Compartilhar