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GESTÃO DA SUSTENTABILIDADE AULA 2 Prof.ª Cora Catalina 2 CONVERSA INICIAL O ideário de sustentabilidade tomou conta dos debates nessas últimas décadas. Está sempre presente na mídia e nas conversas entre empresários, tomadores de decisão, governantes, acadêmicos, ativistas e cidadãos de maneira ampla. Poderia se dizer que se trata de uma necessidade quase urgente de reagir aos inúmeros problemas provocados pelos padrões insustentáveis de produção e consumo praticados durante décadas, característicos do capitalismo, modelo do qual fazemos parte até os dias atuais. Nesta segunda aula, apresentamos conceitos do modelo capitalista e seu contexto na globalização. Abordaremos a linha do tempo relacionada às fases de crise industrial e os impactos sociais da Revolução Industrial. Vamos conhecer as teorias de administração que conduzem às diretrizes da RSE, dentre elas, a Teoria dos Stakeholders. Faremos uma breve análise histórica do capitalismo. Nos dois últimos temas, veremos aspectos relacionados à correlação entre desigualdade social e riscos ambientais, bem como ações voltadas ao crescimento e progresso social. O propósito desse conteúdo é disponibilizar conhecimento e estimular a reflexão sobre as formas de produção de mercadorias e bens realizadas até agora, para que você possa implementar a RSE da maneira mais adequada ao negócio, buscando ser a mais justa para a sociedade, cuidando da saúde do planeta. CONTEXTUALIZANDO O crescimento vertiginoso da população e a desigualdade social em níveis alarmantes vêm alertando para o novo paradigma de olhar de maneira holística o mundo e as organizações. Os novos processos de gestão aliam soluções de problemas socioambientais aplicados às estratégias de RSE, prospectando ganhos financeiros, uma vez que a lógica do mercado considera essas ações como valores indiretos remuneráveis. Vídeo Depois de participar desta aula, assista ao documentário Home: o mundo é a nossa casa. Ele retrata de maneira didática e poética os principais fatores que causam a destruição ambiental. São imagens impactantes mostrando a devastação da natureza, a explosão populacional e a influência política das 3 grandes indústrias e o capital. Ao assistir o documentário você terá a oportunidade de consolidar seu conhecimento e se sensibilizar, ainda mais, sobre o assunto. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=7CLB_3TRKfM>. TEMA 1 – CONCEITOS: CAPITALISMO, REVOLUÇÃO INDUSTRIAL Hoje, uma linha de produção de carros está muito distante da fábrica representada por Charles Chaplin em seu filme Tempos modernos, no qual o cineasta faz uma crítica ao modelo de produção do início do século 20. Nas fábricas atuais, em que os robôs são responsáveis por 70% das tarefas relacionadas à fabricação de carros. E as palavras de ordem são eficiência e ergonomia. (Carvalho, 2017) Nesse trecho da reportagem da Quatro Rodas sobre como funciona uma linha de automóveis, o engenheiro que faz a demonstração na fábrica, complementa: “temos uma máquina que alcança lugares de soldagem que seriam impossíveis para humanos. A última etapa, de tapeçaria e mecânica, é a que exige a presença de um funcionário.” (Carvalho, 2017). Esse exemplo de automação na fabricação de automóveis ilustra o funcionamento da produção industrial que, embora com enormes avanços tecnológicos, advém desde antes da Primeira Revolução Industrial. O processo de desenvolvimento industrial começou pelos anos de 1780, na Inglaterra, e se espalhou na Europa e nos Estados Unidos. A Revolução Industrial transformou a capacidade humana principalmente por modificar a natureza na fabricação de bens de consumo. As máquinas foram inventadas para poupar o trabalho humano, aumentando a produtividade e a geração de lucros. Pesquisadores e inventores trabalharam para o desenvolvimento de ferrovias, máquinas a vapor, maquinarias de produção, produção do aço, energia elétrica. Segundo Rodolfo Pena (2018), no sistema capitalista predomina a propriedade privada. O lucro e a acumulação de capital se manifestam na forma de bens e dinheiro. Ele afirma que, apesar de ser considerado um sistema econômico, o capitalismo estende-se aos campos político, social, cultural, ético, entre muitos outros. Segundo o trabalho de pesquisa do Grupo de Automação Elétrica em Sistemas Industriais da Universidade de São Paulo, no processo histórico do capitalismo as várias revoluções industriais trouxeram transformações para a https://www.youtube.com/watch?v=7CLB_3TRKfM 4 sociedade e foram impulsionadas por uma ou mais tecnologias. As respectivas épocas das revoluções industriais foram: 1a. Revolução Industrial (1700-1900): Transformação da produção manual para a mecanizada. Surgem as máquinas a vapor, locomotivas; 2a. Revolução Industrial (a partir de 1870): Produção em massa. Surgem tecnologias, eletricidade, fontes de energia fóssil; 3a. Revolução Industrial (após 1930): Conhecimento acessível a todo o planeta. Surgem os computadores, a tv; 4a. Revolução Industrial (em curso séc. XXI): Mudanças profundas em toda a sociedade. Convergência entre o mundo físico, o biológico e o digital. (Gaesi-USP, citado por Comparato, 2011) A inovação de produtos e processos foi a principal estratégia de gestão empresarial, a partir dos anos 1990. O foco na aquisição de máquinas e equipamentos foi considerado a principal atividade promovida pelas empresas para o desenvolvimento tecnológico. No Brasil atual, o foco está na introdução de novos produtos, maior eficiência produtiva e abertura de novos mercados (CNI, 2002). Como consequência da industrialização, diversos fatores de crescimento das nações foram impulsionados, além dos tecnológicos. Veremos, durante esta aula, principalmente, os aspectos sociais, ambientais e políticos. O conceito inicial do capitalismo deriva da obra A riqueza das nações (1776), de Adam Smith. Para ele, o surgimento das indústrias e de novos sistemas de gestão do trabalho humano deveria ser especializado para aumentar o rendimento. Ele, defensor desse sistema, dá o exemplo da Fábrica de Alfinetes para explicar sua teoria. A obra foi considerada fundadora da ciência da economia. Convencionou a divisão social do trabalho classificando-as em: operários; capitalistas e proprietários de terras. “Smith predicava que o mercado se autorregulava através da competição e pela busca dos lucros, gerando acúmulo de capital, o qual, por sua vez, estimulava a produtividade e a riqueza” (Stadler, 2012). A busca do lucro máximo pelo exercício profissional de uma atividade econômica foi denominado “o espírito do capitalismo”, por Max Weber. “Onde tudo se transforma em mercadoria: bens, ofícios públicos, concessões administrativas e até pessoas, como os trabalhadores assalariados ou os consumidores. É uma radical desumanização da vida” (Comparato, 2011). No sistema capitalista, os indivíduos sem posses ou propriedade de bens materiais são humilhados à condição de mercadorias, quando não excluídos da sociedade. Esse sistema vigora até os dias de hoje. 5 É indiscutível que houve um enorme avanço no nível de bem-estar médio dos habitantes do planeta ao logo dos séculos, principalmente a partir da Revolução Industrial, no entanto, muito disso foi conquistado às custas de um uso desordenado dos recursos naturais, principalmente para gerar a energia necessária que sustentou este crescimento econômico. (Almeida, 2013) TEMA 2 – IMPACTOS SOCIAIS DA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL O lançamento do aplicativo Waze, que aconteceu por volta de 2008, trouxe inúmeros benefícios e facilidades para quem dirige, principalmente, nas grandes cidades. De maneira colaborativa, os usuários podem saber a situação do trânsito em tempo real e ainda ter a facilidade de o próprio aplicativo indicar a melhor rota para chegar ao destino final. (Dias, 2018) O Waze é um exemplode como o mundo digital transforma comportamentos sociais”, destaca o engenheiro Elcio Brito da Silva, do Grupo de Automação em TI da USP (Dias, 2018). Esta é considerada a principal característica da Quarta Revolução Industrial, que está em curso. É a convergência cada vez mais forte entre: O Digital: com a internet e plataformas digitais; O Físico: com a robótica avançada, impressão 3D; O Biológico: com a tecnologia digital aplicada à genética. Exemplo da quebra de barreiras entre esses três mundos (físico, biológico e digital) são as turbinas da General Eletric (GE), que “percebem” quando irão quebrar e, com isso, sabe-se antecipadamente a necessidade de fazer reparos. (Comparato, 2011) Desde a grande crise financeira mundial de 2008, o sistema capitalista apresenta sintomas de esgotamento. Mundialmente, vem se diminuindo os rendimentos do trabalho assalariado, aumentando os níveis de desemprego e a fome impulsionada por conflitos e mudanças climáticas. Em 2016, a fome afetou 815 milhões de pessoas, 11% da população global (ONU, 2017). A competição de mercado das 200 empresas globais mostra que as receitas de suas vendas ultrapassam um quarto das atividades comerciais do mundo. A Philip Morris opera em 170 países; a indústria de elevadores Otis utiliza o sistema de portas da França, engrenagens da Espanha, sistema eletrônico da Alemanha, motor especial do Japão e a integração dos sistemas é feita nos Estados Unidos. A Nestlé, a Shell, a Bayer e a Toshiba têm consumidores em quase todos os países há décadas. As empresas globais, além de ter uma reputação que não está ao alcance da concorrência de fabricantes locais, possuem vantagens financeiras, de P&D, de produção, logística e marketing (Kotler, 2006). 6 Esse sistema de transnacionalidade das empresas globais promove grandes deslocamentos de empresas, dos antigos países desenvolvidos para os novos países ditos “emergentes”, faz com que uma empresa dominante, com sede em determinado país, estabeleça relações de senhorio e servidão com outras em várias partes do mundo, obrigando as empresas “dominadas” a operar em sistema de “dumping” social e negação dos mais elementares direitos trabalhistas. Trabalho escravo, mão de obra infantil, abusos e assédio têm sido alvo de denúncias permanente (Gonçalves, 2017). Diretrizes da Responsabilidade Social Empresarial (RSE) contemplam esses fatores como parte dos indicadores de gestão, visando acabar com as práticas de abuso e melhorar a transparência nas relações com funcionários, colaboradores e segmentos da cadeia de suprimentos (fabricantes, fornecedores, distribuidores, transportadores). Historicamente, um importante avanço para dirigentes e administradores foi a Teoria das Relações Humanas (1930) do australiano George Elton Mayo. Ele propõe democratizar a administração do trabalho das indústrias, provocando um importante movimento de oposição à Teoria Clássica. Os administradores e dirigentes passam a tratar de forma mais humanizada os trabalhadores. Pela primeira vez, há preocupação com os aspectos emocionais das pessoas e a integração social com trabalhos em grupo. Os avanços das teorias de administração evoluíram no aspecto de incorporar a visão econômica do mercado à sociologia e política da sociedade. Em 1984, Edward Freeman propõe a Teoria dos Stakeholders como um novo direcionamento para a gestão das organizaçoes. Sua preocupação estava em compreender e resolver problemas que fossem além dos interesses exclusivos de sócios e investidores, ampliando para outros públicos que afetam ou são afetados pela empresa. Esse universo de públicos recebeu a nomeclatura de stakeholders, que “são grupos ou indivíduos que podem influenciar ou serem influenciados pelas ações, decisões, políticas, práticas ou objetivos da organização”. Esse conceito passa a oferecer uma nova maneira de pensar a gestão estratégica das organizações, que a direciona para uma forma mais democrática e participativa de implementar a estratégia de negócio. Nos relatos de sustentabilidade e indicadores de RSE, o relacionamento com os stakeholders é utilizado como instrumento de avaliação. 7 Os parâmetros aplicados para estabelecer relacionamentos são essenciais na definição de diretrizes éticas e de transparência, premissas da RSE. O quadro, apresentado a seguir, orienta sobre as atribuições de cada stakeholder. As informações são baseadas na revisão da literatura publicada pelo autor da teoria, E. Freeman, nos períodos de 2008-2015 (Charotta, 2016). Quadro 1 – Atribuições de cada stakeholder Stakeholders Atribuição Clientes Cada vez mais assumem o papel de consumidores conscientes e cobram informações detalhadas sobre produtos, processos de fabricação, comportamento e idoneidade das marcas. Proprietários Possibilitam à organização ter acesso à sua principal fonte de recursos. Tem poder de controle: majoritários, sobre as decisões da empresa; e minoritários, sem poder de controle sobre as decisões da empresa. Funcionários Participam, implementam e executam as decisões para atingir os objetivos da empresa. Proveem a organização com conhecimentos, habilidades e compromissos. Refletem a cultura e o clima da empresa. Fornecedores Fornecem serviços, insumos e matéria-prima na cadeia de suprimentos da organização (fabricação, estoque, transporte, distribuição, embalagem, descarte de resíduos). Precisam ser capacitados sobre as diretrizes da RSE e Sustentabilidade para garantir coerência nos procedimentos. Governo Criador e mediador dos instrumentos reguladores da organização. Concorrentes Importante instrumento de benchmarking. Entidades/ Sindicatos Influenciadores nas dinâmicas da organização. Essenciais em organizações democráticas. Representa filiados. Comunidade Situada no entorno da empresa, precisa receber benefícios diretos ou indiretos devido aos impactos positivos e negativos gerados pela empresa. Sociedade Monitora o ambiente legal e moral em que a organização opera. Fonte: Adaptado de Charotta, 2016. Leitura complementar Na gestão da RSE, a utilização da ferramenta “Painel de Stakeholders” é amplamente utilizada para estabelecer a política de governança baseada no relacionamento com seus públicos de interesse. Esse instrumento pode trazer contribuições para as empresas e ajudá-las tanto no tratamento de questões específicas quanto na definição de estratégias. Para saber mais, leia o artigo Painel de stakeholders: uma abordagem de engajamento versátil e estruturada. Disponível em: <https://www3.ethos.org.br/cedoc/painel-de-stakeholders-uma- abordagem-de-engajamento-versatil-e-estruturada>. 8 TEMA 3 – ANÁLISE DA INFLUÊNCIA DO CAPITALISMO NA DESIGUALDADE SOCIAL E NA AMPLIAÇÃO DOS RISCOS AMBIENTAIS Nas primeiras décadas do século XX, Henry Ford inaugurou nos Estados Unidos a primeira linha de carros em série. Poucos anos depois, veio a Crise de 1929, considerada a primeira crise do capitalismo. Como consequência, milhões de empresas foram à falência e o desemprego foi massivo. No Brasil, os empresários viram a necessidade de criar nova infraestrutura para o desenvolvimento da indústria pesada e começaram a dar os primeiros passos nessa direção. O início dos anos 2000 foram marcados por uma nova crise global provocada, principalmente, pelo choque nos sistemas comerciais e financeiros. O estudo realizado em 2017 por economistas da organização intergovernamental South Centre, com sede em Genebra, aponta: O colapso avassalador da recessão no Brasil ocorre em um momento de complicações globais sem solução no horizonte. [...] A resposta política do Hemisfério Norte, de restringir gastos dos governos e inundar o mercado com dinheiro a juros baixos ou negativos, falhou ao promover uma recuperação robusta e agravou problemas crônicos globais, como a desigualdade,a insuficiência da demanda e a fragilidade financeira, com “fortes efeitos” desestabilizadores para o Hemisfério Sul. As crises “cíclicas” financeiras recorrentes desde a década de 1990 são apontadas como fatores intrínsecos do sistema capitalista, da vulnerabilidade econômica provocada por investidores e credores estrangeiros. São exemplos o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (Bird), entre outros. São organizações criadas para atender às demandas da globalização e atuam fortemente nos mercados financeiros internos de países emergentes e em desenvolvimento. O estudo da South Centre aponta para a influência exercida pelo sistema: “As políticas propostas pela nova administração nos Estados Unidos tendem a representar um duplo golpe para os países que se tornaram altamente dependentes de mercados externos, capital e corporações transnacionais, advertem os autores do estudo” (Drummond, 2017). Os valores representam um conceito coletivo do que as pessoas consideram desejável, importante e moralmente apropriado para o convívio em sociedade. Citando Durkheim: “o conjunto das crenças e sentimentos comuns à média dos membros de uma sociedade forma um sistema determinado, que tem 9 vida própria”, e que pode ser chamado consciência coletiva ou comum (Comparato, 2011). Os principais valores sustentados pelo sistema capitalista foram basicamente o crescimento econômico e o consumo. Ambos têm sido determinantes para reger normas de comportamento das organizações e da sociedade como um todo. Valores fazem com que as pessoas identifiquem prioridades e orientem atitudes de acordo com o que é importante, suas crenças, hábitos e ideiais de vida. A produção de riquezas é o ponto-chave do sistema capitalista. O lucro, nesse contexto, é a meta da empresa. Como vimos, é o mecanismo econômico que o rege. Esse mecanismo o faz decidir o que, como e para quem produzir: qual produto ou serviço deve ser feito, para qual público e em que quantidade e frequência. Stadler (2012) afirma que: Tudo o que for produzido precisa atender necessidades e satisfazer desejos. Valores preconizados pelas estratégias de marketing. Para alcançar o lucro, maior participação no mercado, lancar novos produtos ou serviços, se diferenciar da concorrência, entre outros. Tudo isso depende da utilização e maximização dos recursos disponíveis: matérias-primas, trabalho etc. (Stadler, 2012) Nosso sistema global de alimentos é responsável por 80% do desmatamento e é a principal causa da perda de espécies e de biodiversidade. O sistema também é responsável por mais de 70% do consumo de água doce. Nesse contexto, dados das Nações Unidas (ONU, 2015) indicam que “o consumo global já é 1,5 maior que a capacidade da Terra de aguentar. Se a população e as tendências de consumo continuarem a crescer, a humanidade precisará do equivalente a dois planetas Terra para sustentar-se em 2030”. Na obra Ética e meio ambiente: construindo as bases para um futuro sustentável, Mario Alencastro (2015) aponta que o controle sobre as forças da natureza apresenta à humanidade um problema cuja solução ultrapassa o escopo da ciência ou da tecnologia. A questão envolve uma reflexão sobre as causas e uma apurada análise em torno da construção de princípios, valores e atitudes que possam mediar os atos humanos relativos ao seu relacionamento com a natureza, temática central de uma emergente visão rumo à ética ambiental. A RSE está diretamente relacionada às expectativas, necessidades da sociedade e à forma de responder pelas consequências de atitudes e impactos causados aos indivíduos ou grupos, bem como ao ecossistema. Os princípios da RSE representam atitudes compromissadas imutáveis, refletem o “caráter” da 10 organização sendo um conjunto de posturas inegociáveis. Valores universais são pilares para a convivência entre cidadãos de todo o mundo. Tomemos por exemplo uma empresa que fabrica veículos. Ela provoca impactos principalmente ambientais e no transporte da sociedade. Assim, ela pode determinar que os valores de posicionamento da marca serão segurança no trânsito e meio ambiente, inseridos na responsabilidade social e sustentabilidade. Os indivíduos passam, mas a consciência coletiva permanece viva e atuante, de geração em geração. O importante é frisar que esse conjunto de ideias, sentimentos, crenças e valores predominantes forma um sistema, que atua na mente de cada um de nós como uma espécie de reator automático, no julgamento de fatos ou pessoas” (Comparato, 2011, p. 252). Na gestão da RSE, os princípios estabelecidos para a RS são seis: transparência; comportamento ético; respeito pelos interesses das partes interessadas; respeito pelo estado de direito; respeito pelas normas nternacionais de comportamento; e accountability, ou responsabilização. Identificar qual é o perfil da organização de acordo com o negócio, criar valor para o cliente, entregar e sustentar esse valor é umas das atribuições do gestor em ser (Inmetro, 2018). TEMA 4 – DESIGUALDADE SOCIAL VERSUS RISCO AMBIENTAL: MINIMIZAÇÃO DOS RISCOS O ex-presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em discurso na ONU em setembro de 2016, declarou: “um mundo no qual 1% da humanidade controla uma riqueza equivalente à 99% dos demais nunca será estável.” Dados preocupantes foram apresentados durante o Fórum Mundial Social, em 2017, pela ONG britânica Oxfam, que todo ano apresenta em Davos o mapa da desigualdade mundial. Desde 2015, apenas 1% da população global concentrava em mãos mais riqueza que os 99% restantes; ao longo dos próximos 20 anos, 500 pessoas transferirão mais de US$ 2,1 trilhões para seus herdeiros – soma mais alta que o PIB da Índia, que tem 1,2 bilhão de habitantes. A Oxfam aponta que o crescimento da desigualdade social é o caldo de cultura para o aumento da criminalidade, do terrorismo e da insegurança global. E assinala: “há cada vez mais pessoas vivendo com medo do que com esperança”. 11 Embora as políticas sociais tenham retirado milhões de pessoas da miséria e da pobreza nas últimas décadas, ainda hoje uma em cada nove pessoas vai dormir com fome. E a fome, que não tem ideologia, facilmente reduz um homem a um animal feroz (Frei Betto, 2017). No Brasil, cerca de 50 milhões de brasileiros, o equivalente a 25,4% da população, vivem na linha de pobreza e têm renda familiar equivalente a R$ 387,07. Os dados foram divulgados em 15/12/2017 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Outro estudo divulgado pelo Jornal Folha de São Paulo destaca que: um grupo formado por cerca de 1,4 milhão de brasileiros, equivalente a 1% da população, fica com 28% de toda a renda nacional; os 10% mais ricos da população ficam com mais da metade da renda nacional. (IBGE; WID; Extreme and Persistent Inequality: New Evidence for Brazil Combining National Accounts, Surveys and Fiscal, 2001-2015) Na opinião dos especialistas, o único caminho para combater os elevadíssimos índices de desigualdades social, é a transferência de capital dos ricos para os pobres. O maior desafio das organizações é conciliar interesses. Conciliar interesses públicos e privados sobre questões ambientais, sociais, mercadológicas, políticas, econômicas que, na maior parte das vezes, são antagônicos. Isso leva à implementação de mecanismos de controle. Esses sistemas de controle se dão pela estruturação das organizações com base em sistemas normativos. As normativas e a legislação brasileira são estabelecidas em nível municipal, estadual e federal. Num sistema globalizado, o âmbito de aplicação das normas e leis ultrapassam as fronteiras de cada Estado e se aplicam leis internacionais, comuns a diversos países; são as normas internacionais. A exemplo das normativas relacionadas à erradicação da pobreza e do meio ambiente,a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 3, institui erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais. Com base na legislação, surgiram outras normas e certificações que se constituem, cada vez mais, na garantia dos atributos ambientais e socialmente responsáveis divulgados pelas empresas. Para o consumidor, as normativas são uma garantia de estar adquirindo um produto ou serviço de qualidade para si, para o ambiente e respeito às questões sociais. Os stakeholders que se relacionam com a empresa certificada representam a garantia de fazer negócios e ganho de visibilidade mútuo. 12 Na gestão da Sustentabilidade e Responsabilidade Social, as normas são de uso voluntário, isto é, não são obrigatórias por lei. Funciona a ética da responsabilidade. Certificações voluntárias são aquelas em que a empresa define se deve ou não certificar o seu produto de acordo com o disposto em uma norma técnica, com base em benefícios que identifiquem o que essa certificação pode trazer ao seu negócio. Os principais benefícios da aplicação de normas e certificações são: a. Tornar a fabricação e o fornecimento de produtos e serviços mais eficientes. b. Facilitar o comércio mais justo entre países. c. Fornecer aos governos uma base técnica para saúde, segurança e legislação ambiental. d. Atender à reivindicação da sociedade. Outros benefícios são avaliação da conformidade, o compartilhamento dos avanços tecnológicos, inovação, boas práticas de gestão e melhoria da imagem perante a sociedade. Quadro 2 – Avaliação de conformidade Norma Ano Tema ISO 26000 ABNT-NBR ISO 26000 2010 – Genebra, Suíça 2010 – São Paulo, BR Diretrizes sobre responsabilidade social corporativa SA 8000 1997 – 1.a edição 2014 – 2.a edição Responsabilidade Social e stakeholders internos – cadeia de suprimentos ABNT-NBR 16001 2004 – 1.a edição 2012 – 2.a edição Responsabilidade social sistema da gestão TEMA 5 – CRESCIMENTO ECONÔMICO E PROGRESSO SOCIAL RECONSIDERADOS: O DOMÍNIO DA POLÍTICA Em 2010, o governo brasileiro, ao lançar para consulta pública o Plano de Ação para Produção e Consumo Sustentáveis, anunciou ser fundamental atuar em duas frentes: a produção mais limpa e o consumo mais responsável. “[...] sem isso, é impossível progredir rumo a uma economia de baixo carbono, rumo a uma economia mais sustentável”, declarou a Ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira.” 13 Segundo analistas do Instituto Ethos de Responsabilidade Social: O tema da produção e consumo sustentáveis ganha a cada dia maior relevância no cenário nacional e internacional. Iniciativas consideráveis podem ser observadas nos últimos 10 anos tanto por parte do setor público quanto do setor privado que buscam praticar uma economia mais limpa, observando critérios de conservação ambiental, e de diminuição dos Gases de Efeito Estufa (GEE). (Teixeira, 2010). Na área ambiental, o Brasil tem desenvolvido importantes políticas de proteção ambiental e instrumentos legais, dentre eles, a Lei Nacional de Recursos Hídricos (1998); a Política Nacional de Educação Ambiental (1999) e o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (2002). Em 2009, a Política Nacional sobre Mudança do Clima e a Política Nacional de Resíduos Sólidos (2010) forneceu diretrizes para orientar as ações das empresas e indústrias para o desenvolvimento sustentável. Inserido nas diretrizes globais propostas pela ONU, em 2010, o governo brasileiro elaborou o Plano de ação para produção e consumo sustentáveis (PPCS). O conceito de Produção e Consumo Sustentáveis (PCS) resultou da prática de profissionais atuantes na área e de políticas ambientais de Produção mais Limpa (P+L) (Brasil, 2010). “As seis prioridades apontadas no documento são: Educação para o consumo sustentável; Compras públicas sustentáveis; Agenda ambiental na Administração Pública; Aumento da reciclagem de resíduos sólidos; Varejo sustentável; Construções sustentáveis” (Portal Brasil, 2014). É importante refletir a respeito da ideia equivocada de culpar governos e indústrias por todos os problemas relacionados ao atual colapso climático e poluição mundial. Há tendência de esquecer que não são as empresas de petróleo que dirigem os carros, pois são os próprios consumidores, responsáveis pelas escolhas de consumo. Um exemplo, sob a ótica de consumidor, é a do motorista que avalia os custos de seu carro levando em conta preço do combustível, estacionamento, gasto de manutenção, pedágio e pagamento de taxas do veículo. No entanto, nunca atribui qualquer valor ao fato de que seu veículo emite gases de efeito estufa. Isso ocorre porque esse valor nunca lhe é cobrado. Os consumidores avaliam os gastos com base em fatores de precificação do mercado porque os custos aplicados ao uso ou impactos provocados aos recursos naturais não são precificados. Fernando Meneguin (2012) afirma: 14 se forem adequadamente quantificados e internalizados os custos ambientais dos empreendimentos, não há margem para a dicotomia entre crescimento econômico e sustentabilidade, isto é, se determinado projeto for lucrativo após a incorporação dos custos associados aos prejuízos ambientais que acarreta, ele pode ser implementado. Isso é sustentável. Objetivando o desenvolvimento sustentável, para considerar os custos dos recursos naturais e prevenir a escassez futura, são necessárias novas políticas de intervenção fiscal, mudança nos subsídios nocivos, aplicação de instrumentos para corrigir falhas de mercado, intervenção e fiscalização do poder público. Além disso, é preciso que haja investimentos públicos de incentivo à inovação e educação para a ética ambiental. As crises que pontuam a longa história do capitalismo são também descritas como erros de política. Combinar os limites planetários e sociais cria uma nova perspectiva para o desenvolvimento sustentável. Enquanto defensores dos direitos humanos trabalham para garantir o direito de cada pessoa ao essencial à vida, economistas ecológicos enfatizam a necessidade de situar a economia global. Há muitas interações dinâmicas e complexas ao longo e entre os múltiplos limites. Há o Piso Social dos Direitos Humanos, que envolve acesso a água, comida, saúde, educação, igualdades de gênero e social, energia, trabalho, voz. Ainda, há o Teto Ambiental dos Limites Planetários, que engloba mudanças climáticas, água potável, poluição química, acidificação dos oceanos, acúmulo de aerossóis na atmosfera, destruição da camada de ozônio, perda de biodiversidade, alterações no uso dos solos. Entre o piso e o teto há um espaço representado em forma de diagrama, na figura a seguir, que é trabalhar para “o espaço justo e seguro para a humanidade”, e ao mesmo tempo, realizar ações para o “desenvolvimento econômico inclusivo e sustentável” (Rockström, citado por Assadourian; Prugh, 2013, grifo nosso). Figura 1 – Teto e piso 15 Fonte: Rockström, citado por Assadourian; Prugh, 2013. TROCANDO IDEIAS Que tal utilizar o diagrama de Rockström para analisar sua cidade ou o bairro em que mora? Quais seriam as necessidades e potencialidades no Piso Social e Teto Ambiental? NA PRÁTICA Nesta aula, tivemos a oportunidade de conhecer a Teoria dos Stakeholders, uma diretriz amplamente utilizada na gestão da RSE. A atividade proposta é pesquisar quais questões são avaliadas sobre stakeholders nos indicadores de sustentabilidade. Passos para resolver: 1. Pesquisar: GRI-G4 Global Reporting Iniciative; Diretrizes do Instituto Ethos; Pacto Global ONU; 2. Identificar o que é avaliado sobre stakeholders; 3. Fazer a correlação com a sua vivência profissional/sua realidade. A síntese de uma resolução: 1. Pesquisar na internet; 2. Selecionar os indicadores nos relatórios de Sustentabilidade; 3. Buscar falhas e acertosna comunicação elaborando suas próprias conclusões. FINALIZANDO Esta aula foi direcionada para os aspectos conceituais e históricos do modelo capitalista e seus impactos no mercado industrial. Apresentamos os precursores do capitalismo e datas mais relevantes na história. Em uma linha do tempo, observamos os períodos em que aconteceram as revoluções industriais. 16 Para aplicabilidade na RSE, abordamos as diretrizes que devem ser consideradas no planejamento estratégico da empresa: o conceito de stakeholders, a segmentação dos públicos e a teoria de E. Freeman. Ainda, nos debruçamos sobre dados e números que demonstram a influência e consequências dos padrões de consumo adotados desde que o modelo capitalismo foi implantado no mundo. Observamos o impacto também das crises globais. Destaca-se a importância de assistir ao documentário Home, cujo link está disponível na seção Contextualizando, pois ele ampliará sua percepção sobre os assuntos tratados nesta aula. 17 REFERÊNCIAS ALENCASTRO, M. Ética e meio ambiente: construindo as bases para um futuro sustentável. Curitiba: InterSaberes, 2015. ALMEIDA, F. L. Sustentabilidade e capitalismo. Disponível em: <http://www.administradores.com.br/artigos/negocios/sustentabilidade-e- capitalismo/73242/>. 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