aprendizagem, faz-se necessário revisar a velha crença de que estes últimos são consequência direta do primeiro. A ideia essencial da tese construtivista que subjaz ao conceito de aprendizagem significativa é, como já mencionamos, que a aprendizagem que o aluno leva a cabo não pode ser entendida unicamente a partir de uma análise externa e objetiva do que lhe ensinamos e de como lhe ensinamos, mas também é necessário levar em conta, além disso, as interpretações subjetivas que o próprio aluno constrói a este respeito. Daqui a pôr em dúvida a própria possibilidade de ensinar em sentido estrito, a afirmar que o ensino deve renunciar a exercer uma influência direta sobre a aprendizagem dos alunos, a postular que deve limitar-se a pô-los em contato com os conteúdos de aprendizagem para que possam descobrir, inventar ou construir os significados correspondentes, etc., só há um passo, mas é um passo que, ao nosso ver, não se deve dar e que, se é dado, equivale a esvaziar o conceito de aprendizagem significativa da maior parte de sua potencialidade heurística como instrumento de análise e de reflexão psicopedagógica. O erro que se comete ao dar o passo consiste em esquecer que os significados que os alunos constroem no decurso das atividades escolares não UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO E DA APRENDIZAGEM: RESGATANDO SUAS RELAÇÕES 18 são significados quaisquer e, sim, que correspondem a conteúdos que em sua maior parte são, de fato, criações culturais. Com efeito, praticamente todos os conteúdos que a educação escolar tenta veicular - desde os sistemas conceituais e explicativos que configuram as disciplinas acadêmicas tradicionais até os métodos de trabalho, técnicas, habilidades e estratégias cognitivas e, naturalmente, os valores, normas, atitudes, costumes, modos de vida, etc. - são formas culturais que tanto os professores como os alunos já encontraram em boa parte elaborados e definidos antes de iniciar o processo educacional. Aceitar este fato em todas as suas consequências implica, nas palavras de Edwards e Mercer (1987), abandonar uma perspectiva individualista sobre o desenvolvimento do conhecimento e da compreensão e adotar em seu lugar um ponto de vista pedagógico que outorga a prioridade à cultura e à comunicação. Nesta conjuntura, o problema que se coloca, do ponto de vista do ensino e da aprendizagem significativa, é duplo. Por um lado, o aluno constrói significados relativos aos conteúdos escolares, e a própria dinâmica deste processo construtivo dificulta ou impossibilita as tentativas de que sejam transmitidas de uma forma direta e acabada, mas, por outro lado, a natureza cultural dos conteúdos marca a direção na qual o ensino deve orientar, de forma progressiva, a construção de significados. Os significados que o aluno finalmente constrói são, pois, o resultado de uma complexa série de interações nas quais intervêm, no mínimo, três elementos: o próprio aluno, os conteúdos de aprendizagem e o professor. Certamente, o aluno é o responsável final da aprendizagem, na medida em que constrói o seu conhecimento, atribuindo sentido e significado aos conteúdos do ensino, mas é o professor quem determina, com sua atuação, com o seu ensino, que as atividades nas quais o aluno participa possibilitem um maior ou menor grau de amplitude e profundidade dos significados construídos e, sobretudo, quem assume a responsabilidade de orientar esta construção numa determinada direção. Quando se despoja o conceito de aprendizagem significativa de suas conotações mais individualistas e se aceita que a atribuição de sentidos e a construção de significados no âmbito escolar - e muito provavelmente em qualquer outro âmbito da vida humana - são processos fortemente impregnados e orientados pelas formas culturais e que, portanto, têm lugar necessariamente num contexto de relação e de comunicação interpessoal que transcende amplamente a dinâmica interna dos processos de pensamento dos alunos, quando se aceita esta colocação, a tese construtivista aplicada à aprendizagem escolar adquire uma nova dimensão. Com efeito, a construção do conhecimento é, nesta perspectiva, uma construção claramente orientada a compartilhar significados e sentidos, enquanto que o ensino é um conjunto de atividades sistemáticas mediante as quais professor e aluno chegam a compartilhar parcelas progressivamente mais amplas de significados com relação aos conteúdos do currículo escolar. TÓPICO 1 | TIPOS E AMBIENTES DE APRENDIZAGEM 19 É evidente que nesta construção progressiva de significados compartilhados, o professor e o aluno têm papéis nitidamente distintos: o professor conhece em princípio os significados que espera chegar a compartilhar com o aluno ao término do processo educacional, e este conhecimento serve-lhe para planejar o ensinar; o aluno, pelo contrário, desconhece este referente último - para o qual o professor trata de conduzi-lo e, portanto, deve ir acomodando progressivamente os sentidos e os significados que constrói de forma ininterrupta no decorrer das atividades ou tarefas escolares. Em outros termos, o professor guia o processo de construção de conhecimento do aluno, fazendo-lhe participar em tarefas e atividades que lhe permitam construir significados cada vez mais próximos aos que os conteúdos do currículo escolar possuem. O professor é, pois, um guia e um mediador ao mesmo tempo. Estamos muito longe, consequentemente, das concepções de ensino que mencionávamos no começo desta seção. Esta visão do processo ensino/aprendizagem supõe um novo respeito a algumas utilizações habituais do conceito de aprendizagem significativa e coloca novas e apaixonantes questões sobre os mecanismos através dos quais a influência educacional é exercida, isto é, sobre os mecanismos que possibilitam que o professor ensine, que o aluno aprenda e construa o seu próprio conhecimento, e que ambos cheguem a compartilhar, em maior ou menor grau, o significado e o sentido do que fazem. Mas esta problemática, que atualmente congrega os esforços de um bom número de investigadores em psicologia e educação, já excede aos objetivos que havíamos nos fixado. O nosso propósito era simplesmente mostrar que o conceito de aprendizagem significativa é um instrumento útil e valioso para a análise e a reflexão psicopedagógica. No entanto, os argumentos e comentários que fomos indo articulando nas páginas anteriores indicam que, para que possa desempenhar adequadamente este papel, é necessário despojá-lo de muitas das conotações que foram se acumulando de forma sub-reptícia e, ao mesmo tempo, desenvolver outras que até o momento foram escassamente levadas em consideração. Parece- nos de particular importância, de forma concreta, atender tanto ao sentido como ao significado da aprendizagem escolar; renunciar às conotações mais individualistas do processo de construção de significados e sentidos; e, por último, ressituar este processo de construção no contexto de relação interpessoal que é intrínseco ao ato de ensino. FONTE: Disponível em : <http://www.pbh.gov.br/smed/cape/artigos/textos/cesar.htm>. Acesso em 12 jun. 2011. 20 RESUMO DO TÓPICO 1 Neste tópico, você aprendeu que: • O conhecimento é construído socialmente, se mantém e se difunde nos intercâmbios com os outros. • Os indivíduos podem produzir conhecimentos que antes não existiam, dando lugar ao progresso cultural, embasados em conhecimentos prévios. • Recebemos a maioria dos conhecimentos dos outros ou os adquirimos através de nossa atividade nos intercâmbios sociais. • A contribuição da Psicologia da Educação abrange dois aspectos fundamentais: a compreensão do aluno e do processo ensino-aprendizagem. • A aprendizagem como modificação do comportamento e aquisição de hábitos. • A motivação é muito importante para o desenvolvimento