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1. INTRODUÇÃO A via vaginal oferece uma alternativa com van- tagens à laparotomia. É tecnicamente simples, de execução mais rápida, exige menos mate- rial cirúrgico, tem um pós-operatório com me- nos dores e internamento mais curto. Esta via é a mais antiga mas também a mais segura. Cada vez mais a cirurgia realizada através de orifícios naturais tem vindo a mostrar as suas vantagens, como demons- tram os desenvolvimentos ocorridos noutras especialidades cirúrgicas. A primeira histerectomia vaginal foi realizada em 1815, na Alemanha, no contexto de um prolapso urogenital. No final do século XIX, a histerectomia vaginal já era considerada um procedimento seguro e com vantagens em relação aos enormes riscos de infecção que ocorriam nas laparotomias nessa época. A maioria dos progressos técnicos em cirurgia vaginal ocorreu na Europa, principalmente em França e na Alemanha. A introdução das técnicas de assepsia em cirurgia, no início do século XX, permitiu re- alizar laparotomias com baixo risco. Foi nos EUA que os procedimentos por laparotomia se desenvolveram. Isto levou ao abandono da via vaginal e à formação de uma geração de cirurgiões sem preparação para a cirur- gia vaginal, que apesar de tudo continuava viva na Europa. Foi apenas após a década de 1930 que a via vaginal foi reabilitada para outros procedi- mentos para além do tratamento do prolap- so e, desde então, tem-se assistido à mudan- ça de paradigma que faz da cirurgia vaginal uma primeira escolha. O desenvolvimento da laparoscopia veio de novo gerar conflitos, criando um grupo de cirurgiões pouco familiarizados com a via vaginal e que disputam o título de cirurgia minimamente invasiva. A cirurgia vaginal responde a todos os crité- rios que definem a cirurgia moderna. A doen- te tem menos complicações e menos graves, menor stress perioperatório, deambula e tem alta mais precocemente, tem uma convales- cença mais curta com retorno rápido à vida activa. Por outro lado, utiliza orifícios naturais, permitindo a ausência de cicatrizes. Neste capítulo vamos falar essencialmente do tratamento da incontinência urinária, da histe- rectomia vaginal sem prolapso e do tratamen- to do prolapso urogenital. Como é impossível tratar estes temas sem abordar alternativas cirúrgicas que utilizam outras vias, vamos também referir estes procedimentos, embora alguns deles pertençam à história da cirurgia, como na cirurgia de correcção da incontinên- cia urinária, onde hoje quase a totalidade das cirurgias são realizadas por via vaginal. 2. TRATAMENTO CIRÚRGICO DA INCONTINÊNCIA URINÁRIA FEMININA 2.1. INTRODUÇÃO A incontinência urinária feminina, definida pela International Continence Society (ICS) como qualquer perda involuntária de urina, 557 Cirurgia por via vaginal Francisco Falcão e Giselda Carvalho 51 Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 558 Capítulo 51 tem uma prevalência, no sexo feminino, de 12,8-46%1. É uma patologia comum e cujo impacto na qualidade de vida é devastador, seja no domínio social, físico, psicológico, profissional ou sexual2-5. Aproximadamente metade das mulheres com incontinência urinária tem incontinên- cia urinária de esforço (IUE), predominante em mulheres de meia-idade6,7. A cirurgia de correcção da IUE é dos procedimentos mais comuns na mulher, sendo que aproximada- mente 4% vão realizar uma cirurgia para a incontinência urinária durante a sua vida8. Avanços recentes nas técnicas cirúrgicas e materiais disponíveis têm vindo a tornar esta cirurgia mais acessível. É uma forma rá- pida de resolver a incontinência urinária e pode ser, de facto, muito bem sucedida na incontinência de esforço. Contudo, a incon- tinência pode decorrer de outros factores, como é o caso da bexiga hiperactiva, e aí a cirurgia pode ser potencialmente preju- dicial e causar complicações transitórias ou permanentes9-12. Embora sendo considera- da uma cirurgia «minimamente invasiva», os cirurgiões deverão definir critérios rigo- rosos para o interesse das doentes, e a de- cisão de realizar uma cirurgia deve ser cui- dadosa e responsável, de forma a melhorar a função13. 2.2. CRITÉRIOS NA SELECÇÃO DAS DOENTES Embora a história clínica seja pouco prediti- va do tipo de incontinência urinária, assume uma importância major na avaliação e no tratamento. A realização de uma anamnese detalhada e uma boa avaliação clínica, in- cluindo teste de esforço, são pré-requisitos. É recomendada a avaliação urodinâmica prévia a qualquer cirurgia que afecte a mic- ção e o armazenamento vesical, de forma a confirmar o diagnóstico presuntivo e excluir as doentes que não devem ser submetidas a cirurgia, por exemplo aquelas com altera- ções do esvaziamento (Quadros 1 e 2). Não existe consenso quanto à necessidade de realizar estudo urodinâmico prévio em todas as doentes com IUE14-16. Não há dúvi- da que a investigação urodinâmica ajuda a estabelecer o diagnóstico de IUE e a excluir a urgência. Contudo, é menos claro que o uso da urodinâmica melhore os resultados glo- bais17-19. Assim, nem sempre é claro o intuito da solicitação do estudo: para se efectuar um diagnóstico correcto, para excluir outros diagnósticos, ajudar na decisão terapêutica, melhorar o resultado após a cirurgia ou au- mentar a satisfação da doente? O estudo urodinâmico pré-operatório deve ser considerado em doentes de idade avan- çada, com história de cirurgia de incontinên- cia prévia, sintomas sugestivos de hiperacti- vidade do detrusor ou disfunção miccional, exame neurológico anormal, elevado resí- duo pós-miccional ou quando o diagnóstico de IUE é duvidoso20. 2.3. INDICAÇÕES A única indicação para a cirurgia da inconti- nência urinária na mulher é a incontinência de esforço. Para ser candidata a cirurgia, a doente deve ter incontinência urinária associada ao esfor- ço que a afecte nas suas actividades diárias e na sua qualidade de vida21,22. O efeito de todas as cirurgias para a incontinên- cia é o aumento da pressão na uretra quando aumenta a pressão da bexiga, tal como du- rante a tosse, espirro ou ao levantar pesos. Por este motivo, todas estas cirurgias causam um certo grau de obstrução. Não é razoável as- sumir que a cirurgia melhore sintomas de ur- gência, cure a imperiosidade miccional ou a incontinência devidas a contracções involun- tárias do detrusor, nem a incontinência devida a fístulas ou doença neurológica. Os sintomas da incontinência são experi- mentados de forma diferente por diferentes mulheres. Algumas mulheres experimentam situações isoladas, transitórias ou reversíveis de incontinência (Quadro 3). Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 559Cirurgia por via vaginal Quadro 1. Guidelines para avaliação inicial da mulher com incontinência urinária – História clínica e avaliação geral – Diário miccional e score de sintomas – Exame físico – Teste de esforço – Sumária de urina e/ou urocultura – Determinação do resíduo pós-miccional • Natureza e duração dos sintomas • Procedimentos cirúrgicos anteriores • História obstétrica • Mobilidade da doente • Status mental • Status de doença • Medicação • Objectivos e expectativas da doente • Condições cirúrgicas da doente • Diário miccional (3-7 dias) • Qualidade de vida • Exame neurológico sagrado • Exame pélvico • Status estrogénico • De preferência com a bexiga cheia • Urocultura apenas para doentescom suspeita de infecções urinárias de repetição • Cateterização com sonda vesical • Avaliação ecográfica Quadro 2. Guidelines para a cirurgia primária da IUE Confirmação da indicação Avaliação prévia – Documentação da IUE – Identificar e orientar causas transitórias de IUE – Demonstrar perda com esforço e confirmar baixo volume residual – Documentar normais hábitos de micção – Documentar exame neurológico normal – Documentar ausência de incontinência prévia ou cirurgia radical – Documentar ausência de gravidez – Aconselhamento da doente relativamente a alternativas terapêuticas Quadro 3. Causas transitórias de incontinência urinária – Delírio – Infecção – Vaginite atrófica – Fármacos – Factores psicológicos – Factores endócrinos – Mobilização reduzida – Obstipação Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 560 Capítulo 51 É recomendado nunca forçar uma cirurgia para a IUE, mas apenas oferecer à doente essa possibilidade, informando das medidas conservadoras possíveis. A idade avançada, obesidade, história de ci- rurgia prévia de incontinência urinária, ure- tra fixa e hiperactividade do detrusor são factores que influenciam negativamente o resultado da cirurgia da IUE e devem ser usados para aconselhamento da doente. São contra-indicações para a cirurgia a pre- sença de hiperactividade pura do detrusor, atonia vesical e bexiga neurogénica. Doen- tes com risco elevado de retenção urinária no pós-operatório e incapazes de efectuar auto-algaliação não são boas candidatas a cirurgia de IUE. 2.4. CRITÉRIOS DA CIRURGIA Ao longo dos anos, várias cirurgias foram desenvolvidas para curar ou, pelo menos, diminuir a IUE23-26. A selecção pré-operatória do tipo de cirurgia indicada é muito importante. Por este mo- tivo, cada cirurgião deve estar familiarizado com vários procedimentos cirúrgicos, esco- lhendo o mais adequado à situação clínica da doente. É da sua responsabilidade não usar procedimentos ultrapassados ou não recomendados (Quadro 4). 2.4.1. COLPOSSUSPENSÃO RETROPÚBICA A colpossuspensão retropúbica está indica- da para a mulher com diagnóstico de IUE e hipermobilidade uretral. Pode ser efectuada por laparotomia ou laparoscopia. No Third International Consultation on Incontinence concluiu-se que a colpossuspensão retro- púbica, particularmente a colpossuspensão de Burch, «pode ser recomendada como um procedimento que é tão efectivo como ou- tros procedimentos para a cirurgia primária ou secundária, com sucesso a longo prazo» no tratamento da IUE. Nenhuma outra cirur- gia de correcção de incontinência demons- trou maior eficácia ou durabilidade que a colpossuspensão de Burch. As técnicas de colpossuspensão retropúbi- ca, embora amplamente descritas e estu- dadas, têm vindo a ser ultrapassadas pelos slings retropúbicos e transobturadores colo- cados na uretra média, dada a sua possibili- dade de realização em ambulatório, a me- nor taxa de complicações, maior rapidez de execução técnica e recuperação da doente e idênticas taxas de cura. Quadro 4. Procedimentos cirúrgicos para incontinência urinária de esforço – Eficácia superior, recomendado – evidência nível 1 • Colpossuspensão retropúbica (colpossuspensão de Burch, procedimento de Marshall- Marchetti-Krantz) • Procedimentos com sling tradicionais • Tension-free vaginal tape (TVT®) – Eficácia inferior, não recomendado – evidência nível 1 • Colporrafia anterior • Procedimentos de suspensão com agulha (p. ex. Pereyra, Raz, Stamey, Gittes) – Eficácia desconhecida – não disponível – evidência nível 1 • Slings tension-free na uretra média que não TVT® • Transobturator tape procedures (TOT®) • Técnicas de ablação por radiofrequência Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 561Cirurgia por via vaginal Acesso ao espaço retropúbico A doente é colocada em posição de litotomia modificada, de forma a permitir uma abor- dagem abdominal e vaginal simultânea. É efectuada algaliação com sonda de Foley (n.o 16) e administrada dose profiláctica de antibioterapia endovenosa. É realizada incisão abdominal vertical, trans- versal ou abordagem laparoscópica para acesso à cavidade abdominal. A colpossus- pensão retropúbica pode ser inteiramente efectuada por abordagem retroperitoneal. Os músculos rectos abdominais são afasta- dos na linha média e a fascia transversalis se- parada da sínfise púbica. O acesso ao espaço retropúbico é conseguido através de dissec- ção manual do cirurgião entre o osso púbico e a face anterior da bexiga. A mão não dominante do cirurgião é colo- cada na vagina para elevar os tecidos para- vaginais, identificar a uretra e o colo vesical. A identificação da junção vesico-uretral (UVJ) pode ser facilitada pela tracção suave da sonda de Foley e palpação do balão. O tecido adiposo é dissecado, através da pare- de anterior da vagina, lateralmente à uretra e à UVJ, para evitar o traumatismo do meca- nismo do esfíncter uretral. O espaço retro- púbico e os tecidos paravaginais são muito vascularizados, pelo que é necessária uma dissecção cuidadosa e suave para evitar he- morragia. Operação de Marshall-Marchetti-Krantz A primeira operação retropúbica para o tratamento da IUE foi descrita em 1949 por Marshall, et al., urologista, e o procedimento foi modificado por Marchetti e Krantz, gine- cologistas27. Após a exposição da uretra e da UVJ, como descrita anteriormente, a mão não dominan- te do cirurgião é colocada na vagina, com os dedos segundo e terceiro colocados em cada lado da uretra para facilitar a elevação da uretra e UVJ. Três pares de suturas não re- absorvíveis são colocadas em cada lado da uretra e suturadas à cartilagem da sínfise pú- bica a nível mediano, ficando a sutura mais proximal na UVJ (Fig. 1). A osteíte púbica é a complicação mais frequente. Colpossuspensão de Burch J. Burch descreveu a sua técnica em 1961. Identificou o ligamento de Cooper (banda espessa de tecido fibroso que se estende ao longo da superfície superior do ramo supe- rior do osso púbico), como ponto de fixação mais consistente para as suturas. Após ter acesso ao espaço retropúbico, a uretra e a UVJ são identificados e a parede anterior da vagina periuretral isolada de toda a gordura, como descrito anteriormen- te. Duas suturas permanentes são colocadas a cada lado da uretra. As suturas devem ser colocadas na espessura da parede anterior da vagina, com a agulha paralela à uretra. A sutura proximal é colocada lateralmente a 2 cm da UVJ e a sutura distal é colocada lateralmente a 2 cm da uretra média. O se- gundo e terceiro da mão colocada na vagi- na são usados para elevar a parede anterior da vagina, a cada lado da uretra, durante a realização das suturas, que devem ser efec- Figura 1. Operação de Marshall-Marchetti-Krantz. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 562 Capítulo 51 tuadas na espessura da parede anterior da vagina, excluindo o epitélio. De cada lado, após efectuadas as suturas, elas atravessam os ligamentos de Cooper, de forma que cada sutura saia acima do ligamento. As su- turas são apertadas para elevar a uretra, até à distância de dois dedos entre a uretra e o osso púbico (Fig. 2). Esta área éextremamente vascularizada, pelo que devem ser evitados vasos visíveis, sempre que possível. Quando ocorre uma hemorragia excessiva, pode ser controlada por pressão directa, sutura, electrocoagu- lação ou clips hemostáticos. Raramente é indicada a colocação de dreno no espaço retropúbico. No pós-operatório é colocado cateter vesical transuretral ou suprapúbico. A taxa de cura da IUE ao fim de um ano é de 85-90%, e aos 5 anos 70% das doentes podem esperar estar continentes. O apare- cimento secundário de prolapso dos órgãos pélvicos, particularmente prolapso apical e da parede posterior da vagina, foi repor- tado em 22,1% das mulheres submetidas a colpossuspensão de Burch, a maioria assin- tomáticas e menos de 5% requerendo cirur- gia reconstrutiva28. As doentes que vão ser submetidas a colpossuspensão retropúbica devem ser avaliadas quanto à existência de defeitos vaginais que quando presentes de- vem ser corrigidos. Alguns autores sugerem a obliteração profiláctica do fundo de saco de Douglas, com plicatura dos ligamentos uterossagrados, para reduzir o risco de pro- lapso subsequente. Colpossuspensão de Burch laparoscópica Os avanços na cirurgia minimamente inva- siva na década de 1990 desenvolveram a colpossuspensão retropúbica laparoscópi- ca, com vantagens desta abordagem rela- tivamente à via aberta que incluem melhor visualização do espaço retropúbico, menor estadia hospitalar, diminuição da dor pós- operatória, recuperação mais rápida e me- lhoria cosmética. As desvantagens incluem uma curva de aprendizagem mais lenta para aquisição das suturas, dificuldade técnica na dissecção retroperitoneal, aumento do tem- po operatório e potencialmente custos mais elevados relacionados com maior tempo operatório e uso de instrumentos cirúrgicos descartáveis. Tal como na via aberta, a doente é colocada em posição de litotomia, com pernas afasta- das, de forma a permitir o acesso vaginal e abdominal. É colocada uma sonda de Foley com três vias, em drenagem livre, com irriga- ção de água destilada ou soro fisiológico. Na abordagem transperitoneal é colocado trocar de 5 ou 10 mm e o laparoscópio na incisão infra-umbilical standard. Duas por- tas adicionais são colocadas lateralmente: um trocar localizado no quadrante inferior direito, lateral aos vasos epigástricos infe- riores direitos, e outro no quadrante inferior esquerdo, lateral aos vasos epigástricos infe- riores esquerdos. Os trocars são colocados lateralmente aos músculos rectos, aproxi- madamente a 3 cm acima da espinha ilíaca antero-superior. O acesso transperitoneal ao espaço retropú- bico inicia-se com a identificação das duas Figura 2. Colpossuspensão de Burch. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 563Cirurgia por via vaginal pregas umbilicais intermédias, que servem como orientadores na dissecção. A bexiga é preenchida com 300 cc de fluido. Após pre- enchimento vesical o peritoneu é aberto 2 cm acima da cúpula vesical entre as pregas umbilicais intermédias. O acesso ao espaço retropúbico é através de dissecção romba e as restantes referências anatómicas são idênticas às descritas para a via aberta. Embora menos comum, alguns preferem o acesso ao espaço retropúbico por aborda- gem extraperitoneal. Para esta abordagem é realizada uma incisão infra-umbilical, com dissecção pré-peritoneal até ao espaço re- tropúbico. Alcançado o espaço retropúbi- co, é realizado um «pneumo Retzius», com insuflação de CO 2 . São colocados os trocars adicionais e todo o restante procedimento é similar ao descrito para a abordagem trans- peritoneal. As suturas com fio 0 ou 2-0 são efectuadas com a ajuda de condutores de agulhas lapa- roscópicos. A realização de nós extracorpó- reos facilita a técnica e permite aplicar maior tensão na sutura. No final do procedimento é realizada cistosco- pia para confirmar a integridade da bexiga. É deixada uma sonda vesical transuretral ou cateter suprapúbico no pós-operatório. 2.4.2. PROCEDIMENTOS COM SLINGS PUBOVAGINAIS Os slings pubovaginais ou do colo vesical sofreram um considerável número de modi- ficações desde o seu aparecimento, no início do século XX. Um retalho de material, bioló- gico ou sintético, é colocado sob a uretra ao nível do colo vesical, e os ramos do sling pas- sam atrás da sínfise púbica e fixam-se à fás- cia do músculo recto abdominal ou ao osso púbico, usando uma abordagem combinada abdominal e vaginal. Os slings pubovaginais, tal como a colpos- suspensão retropúbica, foram os procedi- mentos com maior taxa de sucesso na IUE a longo prazo29. Com o desenvolvimento dos slings da uretra média, com menor taxa de complicações, idênticas taxas de sucesso e menos invasivos, esses procedimentos deixaram de constituir o procedimento standard para o tratamento cirúrgico da IUE na mulher. Restituem a continência através de dois me- canismos: restabelecem a posição e suporte da UVJ; providenciam uma base suburetral estável, que resulta num mecanismo de compressão da uretra proximal durante o esforço, resultando num aumento de pres- são de transmissão da uretra em relação à bexiga, durante uma elevação da pressão intra-abdominal. A taxa de sucesso está comprometida em doentes com uretra fixa, contudo em doen- tes com hipermobilidade uretral a taxa de cura objectiva é de 85%30,31. A complicação mais comum dos procedimentos com sling é as disfunções de esvaziamento vesical. Tradicionalmente, foram utilizados slings autólogos de fáscia do músculo recto abdo- minal ou fascia lata, com a desvantagem do tempo operatório ser mais prolongado de- vido à preparação do retalho e do risco de complicações no local dador, nomeadamen- te hematomas e seromas. Também foram utilizados retalhos de mucosa vaginal (ope- ração de Bolonha) com bons resultados. Me- nos usados foram os slings heterólogos que incluem fascia lata de cadáver, dura-máter humana liofilizada, derme acelular humana, derme de porco, mucosa intestinal de porco e pericárdio bovino. Slings na uretra média, sem tensão Retropúbico: tension-free vaginal tape Desde a introdução, em 1996, por Ulmsten, et al., do procedimento de TVT®, este adqui- riu uma popularidade mundial e é, hoje em dia, a cirurgia mais realizada para a correc- ção da IUE23. Esta técnica introduziu novos conceitos: a colocação na uretra média, a colocação sem tensão e o uso de introdutores para passar da região periuretral para a região suprapúbica Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 564 Capítulo 51 os ramos de um sling de malha de polipropi- leno, com auto-fixação aos tecidos, sem ne- cessidade de sutura. Esta técnica minimamente invasiva tem a vantagem de poder ser efectuada em regi- me de ambulatório, com retorno rápido à micção normal e tendo as doentes alta no dia seguinte, sem sonda vesical. A taxa de cura da TVT® é semelhante à da colpossuspensão de Burch e à dos slings tra- dicionais. Está indicada no tratamento pri- mário da IUE com hipermobilidade uretral, mas na nossa experiência tem sido utilizada quando falha a cirurgia de IUE por técnica transobturadora e no tratamento da defici- ência intrínseca do esfíncter com uretra fixa. O mecanismo de acção mais plausível pare- ce ser o mecanismo de kinking transitório da uretra durante o esforço. Estudos ecográfi- cos demonstraram que, durante a manobra de Valsalva e a tosse, ocorre um estrangu-lamento uretral dinâmico após uma TVT®, com a porção suburetral da TVT® a servir de suporte. Em repouso, não existe compressão ou angulação da uretra32,33. Os estudos uro- dinâmicos demonstraram um aumento na pressão de transmissão após uma TVT®, sem alteração na pressão de encerramento máxi- mo da uretra34. A doente é colocada em posição ginecoló- gica, com pernas afastadas e flectidas a 30° sobre o abdómen. É efectuada antibioterapia pré-operatória, em dose única (2 g de cefoxi- tina ev. e 1 g de metronidazol ev.; em doentes alérgicas à penicilina a cefoxitina é substituí- da por 400 mg de ciprofloxacina ev.) e tera- pêutica antitrombótica. É colocada sonda ve- sical e utilizada anestesia local com sedação endovenosa, anestesia regional ou geral. Usando um marcador dermográfico, são efectuadas a cada lado da linha média, 3 cm para cada lado e acima da sínfise púbica, duas incisões com 1 cm. Injecta-se um anes- tésico local, tal como 10 ml de lidocaína a 1- 2%, em cada lado. Uma solução contendo um anestésico local pode ser usada. Se a doente for submetida a raquianestesia ou a sedação, basta utilizar uma solução de adrenalina (diluição de 500 cc de soro fisiológico com 0,2 mg de adre- nalina) que é infiltrada na parede anterior da vagina, a cada lado da uretra, lateralmente, até ao ramo inferior do púbis, para hidrodis- secção e hemostase. A mesma solução deve ser também infiltrada na região retropúbica, descrita anteriormente, usando uma agulha de raquianestesia, que passa por trás do osso púbico até à vagina, a cada lado da uretra, para melhorar a hidrodissecção e prevenir a perfuração vesical. Na vagina é efectuada uma incisão vertical mediana na uretra média, com 1,5 cm, a cer- ca de 1 cm do meato uretral externo. Efectu- ada a incisão uretral, a dissecção é realizada lateralmente com uma tesoura de Metzen- baum de forma a criar um túnel por baixo do ramo púbico inferior, a cada lado da uretra. O kit de TVT® inclui dois trocars curvos co- nectados a uma prótese de polipropileno com 1 × 40 cm revestida por dois invólu- cros de plástico, separadas ao meio para fa- cilitar a sua remoção depois de colocado o sling. Os trocars encaixam num introdutor. Antes da passagem do trocar com a próte- se é efectuado esvaziamento da bexiga e colocado um mandril dentro da sonda de Foley, que é lateralizada em sentido ipsila- teral à introdução do trocar para afastar o colo vesical do trocar e minimizar o risco de lesão. A ponta do trocar é colocada no tú- nel periuretral e direccionada até ao bordo inferior do osso púbico. Nessa altura é efec- tuada uma manobra de 90° e o trocar pro- gride no espaço retropúbico, atravessando a fáscia endopélvica, por trás da sínfise pú- bica, até à incisão suprapúbica homolate- ral marcada, evitando a rotação interna ou externa do trocar (Fig. 3). Após a colocação de cada ramo da prótese, o mandril rígido é removido, instilam-se 200 cc de soro fisio- lógico na bexiga e é realizada cistoscopia para confirmar a ausência de perfuração. A área de maior risco de perfuração é a por- ção anterolateral da cúpula vesical. Confir- Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 565Cirurgia por via vaginal mada a integridade vesical, o introdutor é desconectado do trocar. Este é puxado pela incisão abdominal e é cortada a prótese co- nectada ao trocar. O segundo trocar é então colocado usando a mesma técnica. No caso de perfuração vesi- cal o trocar é retirado, é efectuada drenagem vesical e repetido o procedimento. Quando ocorre perfuração não é necessário alterar os procedimentos pós-operatórios. A tensão da TVT® é ajustada evitando qual- quer compressão da uretra em repouso, ao retirar os invólucros que revestem a prótese. Se o procedimento for realizado com anes- tesia local, é solicitado à doente que tussa repetidamente, após introdução de 300 ml de soro fisiológico na bexiga. O sling pode ser apertado até que apenas um gotejo seja visível no meato uretral externo, durante a tosse. Colocamos uma tesoura de Metzen- baum entre o sling e a uretra para o ajustar sem tensão, minimizando o risco de reten- ção urinária. As incisões abdominais são suturadas com fio absorvível 3-0 ou 4-0 e a incisão vaginal encerrada com fio absorvível 2-0 ou 3-0, em sutura contínua. No pós-operatório é prudente medir um re- síduo pós-miccional antes da alta. A sonda vesical pode ser retirada após 6 h. A TVT® é um dos procedimentos cirúrgicos mais estudados no tratamento da IUE. Os dados actuais sugerem que a eficácia a curto e médio prazo é semelhante à da colpossus- pensão de Burch por via aberta, com taxas de cura entre 63-97%35,36. Embora a lesão da bexiga seja mais frequen- te no grupo das mulheres submetidas a TVT® do que nas submetidas a colpossuspensão de Burch por via aberta (9 vs 3%), a TVT® está associada a menor hemorragia, menor tem- po operatório, menor tempo de internamen- to, retorno mais rápido à vida activa e me- nores perturbações miccionais, implicando menores custos económicos37,38. Os factores que influenciam negativamente o sucesso da TVT® incluem: elevado índice de massa corporal (IMC), sintomas pré-operató- rios de hiperactividade do detrusor e a pre- sença de uretra fixa (ângulo uretral < 30°). A uretra fixa está associada a uma taxa de su- cesso de 50%39,40. A perfuração da bexiga é uma complicação mais associada a esta técnica do que a ou- tras (3-9%), sem contudo deixar sequelas a longo prazo, desde que diagnosticada du- rante a cirurgia. A perfuração da bexiga com o trocar é mínima e extraperitoneal, não re- querendo qualquer intervenção para além da recolocação do trocar41,42. Todas as outras complicações associadas a esta técnica são descritas no quadro 5. Em 4,1% das doentes desenvolvem-se he- matomas no pós-operatório, podendo adop- tar-se uma atitude expectante na maioria43. Quatro a 17% das mulheres sofrem de per- turbações da micção a curto prazo que serão resolvidas ao fim de 6 semanas em 80 dos casos. A retenção urinária que necessita de secção da prótese ocorre em 1-5% das mu- lheres42,44,45. A taxa de erosão ou extrusão da prótese actualmente é baixa, inferior a 1%, Figura 3. TVT® retropúbico. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 566 Capítulo 51 resultado da utilização apenas de slings de polipropileno, monofilamento e à pequena incisão vaginal, com dissecção mínima, que esta técnica requer. Em mulheres assinto- máticas e com pequenas erosões (< 1 cm), a aplicação tópica de estrogénios resulta em reepitelização. Em doentes sintomáticas e com erosões maiores, a excisão cirúrgica da prótese exposta com sutura do epitélio va- ginal está indicada para evitar a infecção e a dor. Transobturador: TOT® – tension-free vaginal tape-obturator Em 2001, Delorme46 descreveu os slings su- buretrais transobturadores. Tal como o TVT®, este é um sling colocado na uretra média, minimamente invasivo, que usa uma próte- se sintética, usando uma abordagem transo- bturadora em vez de retropúbica. Pode ser utilizada uma anestesia geral, re- gional ou local com sedação. A doente é colocada em posição ginecológica, com hi- perflexão das coxas sobre o abdómen, cujo objectivo é colocar o rolo neurovascular obturador em posição superior ao local de introdução do trocar, mais mediano e dis- tando entre eles cerca de 2,5 cm. A administração de antibioterapiapré-ope- ratória é recomendada (idêntica à referida para a TVT®), bem como a profilaxia de aci- dentes tromboembólicos. É colocada sonda de Foley número 16 e deixada em drena- gem livre. A infiltração da parede anterior da vagina com um anestésico local (diluição de 10 cc de lidocaína com adrenalina a 2% em 10 cc de soro fisiológico), a cerca de 1 cm do mea- to uretral externo e lateralmente por trás do ramo isquiopúbico, faz hidrodissecção e he- mostase. É realizada incisão vertical media- na na uretra média, com 1,5 cm, a cerca de 1 cm do meato uretral externo. A cada lado da uretra, efectua-se uma dissecção com tesou- ra de Metzenbaum criando um túnel que vai passar por trás do ramo isquiopúbico, até à membrana obturadora. A colocação da prótese transobturadora pode ser efectuada via inside-out (tension free vaginal tape-obturator [TVT-O®]) ou out- side-in (TOT®), e envolve a passagem cega de um trocar curvo lateral por incisões realiza- das de cada lado nas pregas genitofemorais, à altura do clítoris, depois por trás do ramo isquiopúbico, atravessando o buraco obtu- rador, e por trás da parede anterior da vagi- Quadro 5. Complicações da técnica de TVT® Registo TVT® Áustria N Perfuração vesical Lesão da uretra Perfuração intestinal Hemorragia Hematoma retropúbico Reoperação por hematoma Transfusão sanguínea Erosão da prótese Reoperação por perturbação miccional Infecção urinária Fístula vesicovaginal 5.578 2,7% 0% 0,02% 1,9% 1,1% 0,8% 0,3% 0,7% 1,3% 4,1% 0% Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 567Cirurgia por via vaginal na, até cada lado da uretra média. O ângulo de passagem do trocar desde a incisão na coxa à incisão periuretral é de aproximada- mente 30-40°. Na abordagem outside-in a tunelização pe- riuretral na vagina tem que permitir a inser- ção do segundo dedo contralateral ao tro- car que está a ser introduzido, até ao ramo isquiopúbico. O trocar atravessa então a pele, o tecido celular subcutâneo, o múscu- lo gracilis, o adutor e o obturador externo, a membrana obturadora, o músculo obtura- dor interno e a fáscia endopélvica. A ponta do trocar é conduzida ao longo deste túnel pelo segundo dedo até à incisão subure- tral, evitando-se lesões vesicais e uretrais. O sling é conectado ao trocar e puxado pelo túnel, por trás do ramo isquiopúbico, até à incisão na prega genitofemoral. O sling é então cortado e desconectado do trocar. O mesmo procedimento é efectuado no lado oposto (Fig. 4). O sling é então ajustado, com técnica idên- tica à descrita para a TVT®, devendo ser co- locado sem tensão, seguida da colporrafia com sutura absorvível 3-0 (Fig. 5). O kit de TVT-O® implica uma abordagem in- side-out. Toda a técnica é idêntica à descri- ta para a abordagem outside-in, à excepção da dissecção que não pára a nível do ramo isquiopúbico. Com a TVT-O® a membrana obturadora é perfurada com a ponta da te- soura; é então colocado um guia metálico ao longo do túnel efectuado, que permite a passagem do trocar dentro do guia. As inci- sões na coxa são mais laterais, localizando-se 2 cm acima de uma linha horizontal traçada ao longo do meato uretral e 2 cm para fora da prega genitofemoral (Fig. 6). Figura 4. TOT®: tension free obturator tape. Figura 5. Sling sem tensão. Figura 6. TVT-O®. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 568 Capítulo 51 Ao contrário das técnicas de sling tradicio- nal e da TVT®, o eixo do sling transobturador é mais horizontal ao eixo da uretra e não vertical, provocando menor compressão cir- cunferencial. Esta via de abordagem apresenta algumas vantagens relativamente à TVT®, incluindo menor risco de lesão da bexiga, do intestino e dos grandes vasos, menor tempo opera- tório, curva de aprendizagem mais rápida, menor dor no pós-operatório e redução dos sintomas irritativos da bexiga no pós-ope- ratório46-48. A desvantagem inclui o risco de lesões do compartimento obturador ou da coxa, incluindo hematomas e abcessos49. A laceração da vagina é mais frequente na téc- nica transobturadora (11%). A taxa de cura varia entre 59-97%, embora a taxa de cura em doentes com insuficiên- cia esfincteriana intrínseca seja um pouco inferior (70%), motivo pelo qual não é consi- derado o procedimento cirúrgico ideal para estas doentes48,50. Mini-slings Os mini-slings surgiram com o objectivo de reduzir as complicações operatórias, dimi- nuir o tempo operatório e permitir a sua co- locação fora do bloco operatório, sob anes- tesia local. São implantes inseridos por uma única inci- são vaginal, com uma abordagem idêntica à transobturadora, mas sem passagem das agulhas através da membrana obturadora. A fixação ocorre ao músculo obturador inter- no (tension free vaginal tape-secure [TVT-S®]) ou à membrana obturadora (Miniarc®), par- tindo do pressuposto que, mantendo a fixa- ção com menos material, se reduz o risco de lesão nervosa e vascular. Os mini-slings estão associados a uma maior taxa de persistência de IUE às 6 semanas (odds ratio [OR]: 9,49; intervalo de confiança [IC] 95%: 2,8-32,6) e aos 6 meses (OR: 8,14; IC 95%: 2,7-24,7)51. A taxa de cura nos estudos efectuados até ao momento parece ser infe- rior à descrita para as cirurgias standard da IUE, contudo os estudos incluem séries pe- quenas de doentes e estudos randomizados ainda não foram publicados. Até ao momento são um desenvolvimento da indústria com dados insuficientes para suportar a sua adopção generalizada. 2.4.3. INJECÇÃO TRANSURETRAL – TÉCNICAS DE BULKING PERIURETRAL O uso de técnicas de Bulking uretral com agentes injectáveis para tratamento de IUE reporta ao ano de 1938. O material ideal é biocompatível, não imu- nogénico, hipoalergénico, seguro, pouco dispendioso e capaz de induzir uma reacção mínima dos tecidos. Deverá ser fácil de pre- parar e de injectar, reter as suas característi- cas de Bulking por tempo prolongado sem ser biodegradável e não migrar. Os agentes de Bulking devem ser partículas esféricas uniformes com mais de 110 m de forma a evitar a fagocitose pelos macrófagos e pos- sível migração para locais distantes. A doente ideal para Bulking uretral deve ter hipomobilidade do colo vesical e um me- canismo esfincteriano intrínseco deficien- te, embora alguns autores considerem que qualquer mulher que deseje tratamento conservador da IUE possa ser uma candi- data. Existem outras mulheres que podem beneficiar deste procedimento: mulheres com deficiência esfincteriana intrínseca sem hipomobilidade uretral, comorbilidades importantes, insucesso de cirurgia recente para IUE (não existe contra-indicação ao uso de um agente Bulking 6 semanas após uma cirurgia de correcção de IUE), idade fértil e desejo de ter mais filhos. O aspecto a con- siderar em mulheres jovens é a necessidade de repetição das injecções dos agentes para manutenção do efeito. Os agentes de Bulking não estão indicados em mulheres com hipermobilidade uretral, na presença de infecção urinária aguda, elevados volumes residuais, hiperactividade do detru- sor e capacidade vesical reduzida (< 250 ml). Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 569Cirurgia por via vaginalO local de injecção pode ser periuretral ou transuretral. O método transuretral requer o uso de cis- toscópio (lentes de 0, 12, 25 ou 30°) e uma bainha de trabalho que permita a passagem do cateter de injecção e respectiva agulha. O procedimento começa com a colocação de um anestésico local na uretra (lidocaína gel a 2%). A injecção transuretral inclui os seguin- tes locais de injecção: às 3 e 9 h, às 4, 8 e 12 h, ou às 3, 6, 9 e 12 h. O material é colocado por injecção na submucosa da uretra, 2 cm distal ao colo vesical. A injecção deve ser gradual de forma a provocar uma distensão da muco- sa uretral, sem extravasamento do produto. No procedimento periuretral os locais para injecção do anestésico local (xilocaína) são ao nível da abertura dos canais de Skene, a cada lado da uretra. O cistoscópio com lente 0 é inserido na UVJ e depois retirado para vi- sualizar a uretra proximal. É introduzida pa- ralelamente à uretra uma agulha de raquia- nestesia com uma seringa com lidocaína a 1%. Logo que a agulha atinja a uretra proxi- mal, a seringa é substituída pela seringa com o agente de Bulking, o qual é injectado. A complicação mais comum é a dor. Se ocor- rer extrusão de material este deve ser remo- vido para não provocar sintomas vesicais irritativos recorrentes e infecção. A complicação mais comum no período pós- operatório imediato é a retenção urinária e as disfunções miccionais. As complicações tardias são raras, e incluem abcessos suburetrais e infecções urinárias de repetição. As taxas de cura são de 40%52. 2.5. CRITÉRIOS DE FOLLOW-UP A doente deverá ser avaliada 6-12 semanas após a cirurgia. A fácil acessibilidade da do- ente ao centro que a operou é importante em caso de complicações. O cirurgião deve estar familiarizado com as possíveis complicações e consequências da cirurgia de correcção de incontinência uri- nária de esforço e ser capaz de orientar uma doente que não está completamente satis- feita com a cirurgia. 3. HISTERECTOMIA VAGINAL SEM PROLAPSO 3.1. INTRODUÇÃO A partir da década de 1980 assistiu-se ao aumento da utilização da via vaginal para a realização da histerectomia em doentes sem prolapso urogenital. Inicialmente reservada a doentes com útero não muito aumentado, como na adenomiose ou nos miomas sub- mucosos, tem vindo a utilizar-se cada vez mais em úteros de maiores dimensões. A confirmação das vantagens desta via em relação à laparotomia, aliada ao aumento do número dos ginecologistas treinados em cirurgia vaginal, tem vindo a mudar os para- digmas na escolha da via de acesso. Actualmente, a histerectomia vaginal sem prolapso é cada vez mais uma solução de primeira escolha. Os critérios para se optar por esta via dependem essencialmente da experiência do cirurgião, principalmente no que diz respeito ao tamanho do útero. O fac- tor mais importante para a sua escolha é a acessibilidade ao útero por via vaginal. Uma vagina mais estreita que dois dedos, espe- cialmente no ápex, ou um útero que não desce são os principais factores limitativos. 3.2. TÉCNICA A técnica mais usada actualmente é a descri- ta por Kovac53. A cirurgia começa com uma incisão na mu- cosa vaginal, a nível da reflexão cervico-va- ginal, junto ao início das pregas transversais da vagina (Fig. 7). Alguns autores aconse- lham uma incisão circunferencial contínua, mas há quem defenda haver vantagem em interromper lateralmente a incisão às 3 e 9 h, principalmente quando o colo desce pouco. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 570 Capítulo 51 Se a incisão vaginal posterior for feita cor- rectamente, na reflexão cervico-vaginal, onde se iniciam as pregas vaginais, ficamos perto da inserção dos uterossagrados e do peritoneu do fundo de saco posterior. A abertura da cavidade peritoneal consegue- se fazendo tracção numa pinça colocada no lábio posterior do colo e seccionando os tecidos entre os uterossagrados. Caso a abertura do fundo de saco seja difícil pode prosseguir-se com a secção dos ligamentos cardinais e uterossagrados extraperitone- almente. A secção dos ligamentos uterossagrados é o passo mais importante da histerectomia vaginal sem prolapso, pois vai permitir a descida do útero. A sua laqueação deve ser sempre transfixiva e deve ser sempre deixa- da uma referência. Seguidamente, tracciona-se para baixo o colo e eleva-se a bexiga na linha média, com o auxílio de uma pinça de dissecção. Seccio- na-se o septo supravaginal com tesoura, de modo a expor o espaço vesico-uterino, que é avascular e facilmente dissecado com te- soura. A dissecção romba deste espaço com o auxílio de uma compressa é um erro que aumenta o risco de lesão vesical. Após a dissecção do espaço vesico-uterino chega-se à prega peritoneal anterior, que pode ser aberta sob visão directa. Deve evi- tar-se seccionar esta prega muito perto do útero, o que sucede frequentemente por medo de lesão vesical, pois isso vai fazer com que a dissecção continue retroperito- nealmente, junto ao útero. No caso de dú- vida é melhor adiar a secção do peritoneu anterior para uma fase mais adiantada da histerectomia. Após a secção e laqueação dos ligamentos cardinais e uterossagrados faz-se a laquea- ção da artéria uterina. Nesta altura, o útero desceu francamente. Kovac defende que, a exemplo do que su- cede na histerectomia abdominal, após a laqueação das artérias uterinas não é neces- sário fazer laqueações no ligamento largo, podendo a cirurgia neste ponto progredir para os ângulos uterinos53. As laqueações devem ser realizadas com pinças mais fortes e seguras que as tradicio- nais pinças de Faure, como, por exemplo, as pinças de Heaney. Nesta fase, se o útero for pequeno, desce facilmente, eventualmente com o auxílio de tracção e rotação tornando acessíveis os pedículos anexiais. Caso contrário, há téc- nicas que facilitam a descida de um útero grande. A mais conhecida é o coring, descri- ta por Lash53,54 em 1942, que permite remo- ver a porção interna do útero sem entrar na cavidade endometrial (Fig. 8). Faz-se uma incisão circunferencial no miométrio, para- lela ao eixo do útero e à superfície da sero- sa, enquanto se aplica tracção no colo. Esta incisão inicia-se logo abaixo da reflexão da serosa que reveste a face anterior do corpo, e deve ter-se a certeza que foi laqueada a artéria uterina (Fig. 9). Figura 7. Histerectomia vaginal sem prolapso – Incisão na mucosa vaginal. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 571Cirurgia por via vaginal O coring, se forem respeitadas as regras, sangra muito pouco e permite a descida do útero até serem acessíveis os pedículos anexiais. Outra técnica de morcelação uterina é a he- missecção, que consiste na secção longitudi- nal com bisturi a partir do colo. As valvas são colocadas para proteger a bexiga e o recto. O colo é traccionado por duas pinças colo- cadas às 3 e 9 h, e a incisão é realizada numa linha que liga as 12 e 6 h (Fig. 10). O princípio desta técnica é uma questão simples de mecânica. A força que impede o útero de descer é a resultante das forças apli- cadas nos cornos pelos pedículos anexiais. Quando realizamos a hemissecção, o ângulo formado por estas duas forças aumenta e a sua resultante diminui, tornando possível a descida do útero (Fig. 11). Em alternativa, podem realizar-se miomec- tomias ou ressecções cuneiformes para re- duzir as dimensõesuterinas. Após a descida do útero os pedículos anexiais, ou seja os ligamentos útero-ováricos, redon- dos e a trompa, são laqueados, e é convenien- te colocar uma referência para ajudar à ins- pecção dos ovários e eventual anexectomia. As indicações para realizar a anexectomia profilática por via vaginal são as mesmas que na laparotomia. Estudos realizados por Kovac mostram que um cirurgião experien- te pode realizar este gesto em 94-97% dos casos53. Mais frequentemente, a técnica uti- lizada é a dissecção do ligamento largo no espaço entre o ligamento redondo e o res- tante pedículo anexial, que permite aceder ao espaço retroperitoneal e ao isolamento dos ligamentos infundibulopélvicos, que Figura 9. Coring. Figura 8. Coring. Figura 10. Hemissecção. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 572 Capítulo 51 podem ser laqueados com o auxílio de uma pinça de Heaney curva, ou melhor, de uma pinça desenhada para este passo cirúrgico, como a pinça de Sheth53. A utilização da histerectomia vaginal assisti- da por laparoscopia (LAVH) para a realização da anexectomia ou até outros gestos da his- terectomia é útil quando há dúvidas sobre a existência de aderências ou em casos de en- dometriose, mas as indicações de cada técni- ca dependem da experiência do cirurgião e constituem uma discussão animada e inter- minável onde deve prevalecer o bom senso. O encerramento do peritoneu e a suspensão dos ligamentos redondos são gestos inúteis, e a histerectomia termina com a suspensão da parede posterior aos ligamentos uteros- sagrados, e pelo encerramento da cúpula vaginal. 4. CIRURGIA DO PROLAPSO UROGENITAL 4.1. INTRODUÇÃO O tecido conjuntivo que suporta os órgãos pélvicos é colectivamente referido como «fáscia endopélvica». A fáscia é uma rede contínua de tecido conjuntivo que envolve e suporta bexiga, vagina e recto55. A fáscia parietal, que cobre os elevadores do ânus, é uma camada densa e organiza- da de colagénio que suporta os músculos esqueléticos. A fáscia visceral que envolve os órgãos pél- vicos é um tecido conjuntivo laxo, desor- ganizado, composto por fibras musculares lisas, colagénio tipo III e elastina, por onde passam vasos e nervos, que permitem gran- des alterações de volume, como sucede na repleção vesical. Na fáscia endopélvica há estruturas identifi- cadas como o arco tendinoso da fáscia pél- vica, os ligamentos cardinais e os uterossa- grados, que não são estruturas distintas mas sim condensações de tecido conjuntivo. O arco tendinoso da fáscia pélvica vai fun- dir-se com uma condensação da fáscia dos elevadores do ânus, suportando lateral- mente as paredes anterior e posterior da vagina56. Defeitos nestas estruturas resultam em cis- tocelo ou rectocelo. As técnicas cirúrgicas convencionais do tratamento do prolapso fundamentam-se na sua reparação. Os ligamentos cardinais e os uterossagrados fornecem suporte apical ao colo do útero e ao terço superior da vagina. Os defeitos nes- tas estruturas resultam em prolapso apical, uterino ou da cúpula vaginal55. Figura 11. Forças mecânicas da hemissecção do útero. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 573Cirurgia por via vaginal Os ligamentos cardinais e os uterossagrados constituem o nível I de suporte de DeLancey, o arco tendinoso da fáscia pélvica o nível II e o nível III é obtido pela fusão dos folhetos anteriores e posteriores da fáscia endopélvi- ca anteriormente com a sínfise púbica e pos- teriormente com o corpo perineal57. A integridade e função do músculo elevador do ânus têm um papel crítico na integridade do pavimento pélvico. Os factores que favorecem o aparecimen- to do prolapso e incontinência urinária são idade, paridade, particularmente o parto vaginal, obesidade e raça55. Sabe-se que as mulheres que têm prolapso têm alterações qualitativas e quantitativas do colagénio. 4.2. COLPOCELO ANTERIOR Quando o folheto anterior da fáscia endo- pélvica está danificado surge o prolapso do compartimento anterior, colpocelo anterior ou cistocelo58. Corresponde a cerca de 33,8% dos prolapsos dos órgãos pélvicos. A ICS define prolapso do compartimento anterior como uma descida da parede anterior da vagina em que a UVJ ou qualquer região proximal fica a menos de 3 cm acima do plano himenial. Se a ruptura se localiza na região central sur- ge um cistocelo por defeito central, com per- da das pregas da mucosa, mantendo-se bem marcados os sulcos laterais da vagina. Se o defeito está na fixação lateral ao arco tendinoso (nível II de suporte de DeLancey), estes sulcos desaparecem, mas são preser- vadas as pregas da mucosa. É o defeito para- vaginal ou lateral. Foram também descritos defeitos transver- sos, resultantes da separação da fáscia do anel pericervical e do complexo ligamentar dos cardinais e uterossagrados (nível I de suporte de DeLancey). Resulta num colpo- celo volumoso com um colo vesical bem sustentado, com pregas apagadas, e que pode ser difícil de distinguir de um defeito central59. Outro tipo de defeito transverso é distal e re- sulta da separação da fáscia da sua inserção no diafragma urogenital/perineal (nível III de suporte de DeLancey) perto da sínfise púbi- ca e apresenta-se como uma projecção para fora do meato uretral59. 4.2.1. COLPORRAFIA ANTERIOR POR PLICATURA DA FÁSCIA No caso de um cistocelo por defeito central, a reparação convencional inicia-se colocan- do pinças de Allis na linha média58,59. Alguns cirurgiões fazem a infiltração sub- mucosa com soro fisiológico com adrenalina para facilitar a dissecção e evitar a hemorra- gia. Pessoalmente utilizamos uma diluição de 500 cc de soro fisiológico com 0,2 mg de adrenalina, que é suficiente para uma boa hemostase e minimiza os riscos de efeitos secundários sistémicos. Realiza-se uma incisão central do ápex até cerca de 1 cm abaixo do meato uretral. A dis- secção pode ser feita separando o epitélio da camada muscular/adventícia, que assim fica junto à bexiga e vai ser submetida a plicatura com pontos separados de material reabsor- vível, ou entre a totalidade da espessura da mucosa vaginal e a bexiga. Neste último caso, esta fáscia pode ser posteriormente separada do epitélio vaginal e usada para reparar o de- feito central, sobrepondo-se à contralateral. A dissecção pode ser realizada com tesoura ou bisturi, devendo ser evitada a dissecção cega com compressa. Embora haja cirurgiões que param a dissecção perto da linha média, esta geralmente prossegue até ao ramo is- quiopúbico. Deve ser evitada uma dissecção lateral muito agressiva que comprometa o suporte da vagina criando um defeito para- vaginal que não existia previamente. Frequentemente, realiza-se uma sutura em bolsa de tabaco ou a plicatura da bexiga (Fig. 12). Isto não acrescenta qualquer solidez à reparação. A qualidade da reparação deve- se à fáscia com a plicatura ou sobreposição ao folheto contralateral. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 574 Capítulo 51 Faz-se uma colpectomia do excesso de mu- cosa vaginal e encerra-se com uma sutura contínua com um fio reabsorvível. A colporrafia anterior com plicatura da fáscia mostrou, em estudos randomizados,taxas de recorrência de cerca de 40%60. Se existir incontinência urinária associada, é preferível realizar um sling retropúbico ou transobturador de malha de polipropileno no final do procedimento, pois os resultados desta técnica são significativamente melho- res que os da cirurgia convencional. 4.2.2. REPARAÇÃO PARAVAGINAL DO CISTOCELO Este defeito envolve a rotura da ligação en- tre a fáscia do sulco lateral da parede ante- rior da vagina e o arco tendinoso (Fig. 13). A dissecção para correcção de um defei- to paravaginal começa onde se termina na reparação do defeito central, no ramo isquiopúbico. Acede-se ao espaço para- vesical expondo os músculos elevador do ânus e obturador interno de modo a re- ferenciar-se a espinha isquiática e o arco tendinoso, que se estende daí até ao ramo isquiopúbico59,60. A reparação convencional por via vaginal consiste na colocação de quatro a seis pon- tos de sutura de material não reabsorvível no arco tendinoso entre um ponto a 1,5 cm da espinha isquiática até ao ramo isquiopú- bico. Cada um destes pontos passa pela pa- rede vaginal no sulco lateral da parede an- terior, tendo-se o cuidado de não suturar a espessura total da mucosa vaginal. Os pon- tos devem ser apertados apenas no final da Figura 13. Defeito paravaginal do cistocelo. Figura 12. Colporrafia anterior por plicatura da fáscia. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 575Cirurgia por via vaginal reparação em cada lado, pois, caso contrá- rio, a exposição fica muito dificultada. Esta reparação pode ser realizada por lapa- rotomia ou por laparoscopia, onde o aces- so ao arco tendinoso e ao bordo lateral da vagina se faz através da abertura do espaço de Retzius. Os resultados da reparação paravaginal por laparotomia ou por via vaginal são desco- nhecidos. Há estudos que mostram excelen- tes resultados com recorrências que variam dos 0-24%, mas trata-se de técnicas que exigem alguma destreza cirúrgica, e não há estudos randomizados comparativos entre as duas técnicas, nem com a colporrafia an- terior convencional60,61. 4.2.3. REPARAÇÃO DOS DEFEITOS TRANSVERSOS Alguns autores consideram o defeito transverso proximal, ou seja, a separação da fáscia do anel pericervical, a forma mais frequente de cistocelo (Fig. 14). Como já foi dito, apresenta-se como um colpocelo volumoso com um colo vesical bem sus- tentado, com pregas apagadas, e que é difícil de distinguir de um defeito central. Estes autores defendem que não existe o denominado defeito central, havendo apenas defeitos laterais e transversais. Nestes, a identificação, após dissecção, do bordo proximal da fáscia vai permitir a sua sutura com pontos separados de fio não absorvível ao anel pericervical. O defeito distal, ou seja, a separação da fáscia da sua inserção no diafragma urogenital-perineal perto da sínfise púbica, é mais rara, apre- senta-se como uma projecção para fora do meato uretral e pode igualmente ser ob- jecto de uma reparação directa do defei- to. Os defensores da cirurgia de reparação dos defeitos transversos defendem que a plicatura na linha média é uma técnica sem base anatómica que se limita a escon- der os defeitos da fáscia sem realmente os tratar58,59. 4.2.4. REPARAÇÃO DO PROLAPSO DO COMPARTIMENTO ANTERIOR COM PRÓTESES A utilização de material de prótese para re- paração do prolapso é uma ideia atractiva, particularmente no prolapso do comparti- mento anterior. No entanto, exceptuando a sua utilização na sacropexia para tratamento do prolapso apical, apenas recentemente o uso de próteses tem ganho popularidade, pois só agora surgiram materiais que podem ser usados com bons resultados a longo pra- zo, sem uma alta taxa de complicações62. O material de prótese classifica-se, segundo a origem, em biológico e sintético63. Os biológicos podem ser alo- ou xeno-en- xertos. Os de origem humana são fáscia, normalmente fascia lata, e derivados da derme humana. O seu uso tem diminuído pelo medo de transmissão de doenças, como as veiculadas por priões, e pelo facto da sua qualidade ser pouco uniforme. Os de origem animal são derivados do pericárdio bovino, da submucosa do intestino delga- do porcino e da derme porcina (Pelvicol® e Pelvisoft®). Teoricamente, estes materiais seriam invadidos por neovasos e integra- dos nos tecidos adjacentes, constituindo uma neofáscia63,64. Isso não se confirmou, pois não se integram nos tecidos vizinhos Figura 14. Defeito transverso proximal. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 576 Capítulo 51 mas sim encapsulam-se, favorecendo a retracção, endurecendo e alterando a ana- tomia vaginal. Além disso, a degradação e reabsorção destes materiais podem levar a recorrência tardia do prolapso64. Os materiais sintéticos classificam-se em rea- bsorvíveis e não reabsorvíveis63. Os reabsor- víveis são as redes de malha de ácido poligli- cólico. Este material é muito bem tolerado, tem excelentes resultados imediatos com poucas complicações, mas a esperança que o processo inflamatório que acompanha a reabsorção contribuísse para a formação de tecido fibroso, ou seja uma neofáscia, não se confirmou, sendo a recorrência uma regra65. Os não reabsorvíveis são variados, multi ou monofilamentos63. Neste momento é con- sensual que não se devem usar redes com material polifilamento e que a rede ideal é de polipropileno, monofilamento de ma- lha larga e de baixa relação peso/superfície (baixa gramagem) (Fig. 15). Esta opção veio diminuir as complicações, particularmente a erosão e a infecção. Algumas firmas comercializam materiais compostos (polipropileno/colagénio e po- lipropileno/ácido poliglicólico) acreditando assim diminuir o risco de complicações, no- meadamente a erosão e a retracção. Inicialmente estas próteses eram colocadas sem fixação, como reforço de uma cirurgia convencional, mas cedo se demonstrou que a fixação tension-free obtinha melhores resultados. Também no início, a fixação era feita por sutura da prótese aos arcos tendi- nosos, como é feito na reparação paravagi- nal clássica, mas a fixação por via transob- turadora, aproveitando a experiência obti- da com a cirurgia da incontinência urinária, veio simplificar a cirurgia, sendo actual- mente comercializados kits de malhas pré- cortadas com os respectivos instrumentos descartáveis de colocação, que são cada vez mais populares (Figs. 16 e 17). Figura 16. Prótese do compartimento anterior. Figura 17. Prótese do compartimento anterior. Figura 15. Malha de polipropileno para colocação no compartimento anterior. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 577Cirurgia por via vaginal A utilização de próteses biológicas ou de rede de polipropileno sem fixação têm altas taxas de insucesso, mas as redes de malha de polipropileno, fixas tension-free por via transobturadora, parecem mostrar taxas de sucesso de 90-100%66. 4.3. DEFEITOS APICAIS O prolapso apical, do útero ou da cúpula vaginal, surge quando é comprometido o suporte fornecido pelos ligamentos cardi- nais e uterossagrados (nível I de suporte de DeLancey). Os procedimentos cirúrgicos destinados a corrigir este problema podemser divididos em três grupos: os que usam tecidos nativos de suporte, os que usam material de próte- se, e os procedimentos obliterativos que en- cerram o lúmen vaginal67. Devemos também falar das cirurgias por prolapso que envolvem também o útero, que são a histerectomia vaginal e a operação de Manchester. A escolha destes procedimentos depende da experiência do cirurgião e dos resultados de cada técnica. O problema é que não há estudos prospectivos, excepto na compa- ração entre a sacropexia por laparotomia e a fixação ao ligamento sacroespinhoso por via vaginal (operação de Richter), em que a primeira mostrou vantagens, com menor re- corrência e dispareunia68. A técnica mais usada a nível mundial para tratar o prolapso da cúpula vaginal é a sa- cropexia, mas está em crescendo a utilização da fixação por via vaginal aos ligamentos sacroespinhosos com a utilização de prótese de malha de polipropileno colocada por via transnadegueira. 4.3.1. HISTERECTOMIA VAGINAL E OPERAÇÃO DE MANCHESTER A histerectomia vaginal é a operação mais frequentemente realizada em todo o mundo para tratamento do prolapso apical. É iróni- co, pois esta operação por si só não contribui para o tratamento do prolapso apical, embo- ra possa ser associada a gestos que tratam o prolapso, como a operação de McCall ou a fixação ao ligamento sacroespinhoso. A técnica é idêntica à da histerectomia vaginal sem prolapso. A sua popularidade vem do facto de eliminar o colo do útero e de associar a colpoplastia anterior e posterior, o que vai melhorar dra- maticamente os sintomas, embora frequen- temente se venha a complicar tardiamente com um prolapso da cúpula. Estas vantagens, ou seja, a eliminação do colo e a associação com as colpoplastias, podem ser obtidas com a operação de Man- chester. Esta técnica foi descrita pela primei- ra vez em 1888 por A. Donald, que trabalha- va em Inglaterra, em Manchester. Consistia na associação da amputação cervical com a colpoplastia anterior e a colpoperineoplas- tia. Foi modificada posteriormente por um dos seus discípulos, E. Fothergill, que esta- beleceu a técnica tal como hoje é aceite69. Os princípios desta técnica são: — Amputação da porção vaginal do colo uterino. — Ressecção e reaproximação dos ligamen- tos cardinais à frente do coto cervical para elevar o útero e deslocar posterior- mente o colo do útero. — Colporrafia anterior e colpoperineoplastia. — Plastia do coto cervical com pontos de Sturmdorf. Inicialmente, era realizada sistematicamente uma dilatação e curetagem uterina. Hoje em dia, a ecografia endovaginal torna este gesto supérfluo, embora a dilatação do endocolo vá facilitar a execução dos pontos de Stur- mdorf no tratamento do coto cervical. É feita uma incisão circular no colo a nível da reflexão cervico-vaginal como normal- mente se faz na histerectomia vaginal. Uma incisão longitudinal une o ponto suburetral a esta incisão circular para realizar a colpo- plastia anterior. A bexiga é descolada até ao istmo e laqueiam-se os pilares da bexiga. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 578 Capítulo 51 Laqueiam-se os ligamentos de Mackenrodt. Faz-se a amputação cervical e o coto cer- vical, após a reaproximação dos ligamen- tos cardinais à frente deste, é coberto com mucosa vaginal com pontos de Sturmdorf, como é feito na conização a frio. Faz-se uma colpoplastia anterior convencional e termi- na-se com uma colpoperineoplastia. 4.3.2. TÉCNICAS QUE UTILIZAM OS TECIDOS NATIVOS DE SUPORTE As técnicas mais importantes são a culdo- plastia de McCall e a fixação ao ligamento sacrospinhoso (operação de Richter). Culdoplastia de McCall McCall publicou esta técnica em 1957. Ge- ralmente é utilizada no contexto de uma histerectomia vaginal para promover o su- porte apical67. São colocadas três suturas de material não absorvível nos ligamentos uterossagrados, envolvendo também o peritoneu posterior, sendo a primeira colocada 2 cm acima da la- queação dos uterossagrados e distando 1-2 cm entre eles. Duas outras suturas de mate- rial reabsorvível são colocadas para suspen- der os uterossagrados à parede posterior da vagina (Fig. 18). Várias variantes desta técnica são descritas, mas todas partilham uma complicação que, apesar de rara, tem limitado a generalização desta técnica. É a lesão do ureter que ocorre em 0,24-3% dos casos67. Esta complicação pode ser evitada com a utilização de cistos- copia peroperatória, com a verificação da integridade ureteral. A injecção endovenosa de um corante que é rapidamente eliminado pelo rim, índigo carmim, é aconselhada pela maioria dos autores, mas este corante não está comercializado em Portugal. Fixação ao ligamento sacrospinhoso (operação de Richter) Foi descrita pela primeira vez em 1951, por Amreich e Richter, e fixa a cúpula vaginal uni ou bilateralmente aos ligamentos sacroespi- nhosos por um ou dois pontos de material não absorvível67. A descrição inicial faz a fixação ao ligamento sacroespinhoso direito para evitar o risco de lesão rectal. Após a abertura da parede posterior da va- gina, a dissecção progride pelo espaço para- rectal até se identificar a espinha isquiática e, mais medianamente, o ligamento sacro- espinhoso (Fig. 19). Um ou dois pontos de sutura de material não reabsorvível são co- locados, sob visão directa, no ligamento, 2 cm para dentro da espinha isquiática, para evitar a artéria e o nervo pudendos que pas- sam por trás desta. Estes são seguidamente ancorados na cúpula vaginal, tendo o cui- dado de não atravessar toda a espessura da mucosa vaginal. A taxa de sucesso varia entre 65-97%, mas a comparação com a sacropexia mostra maior taxa de recidiva e mais dispareunia68. 4.3.3. TÉCNICAS QUE UTILIZAM MATERIAL DE PRÓTESE No tratamento do prolapso apical utiliza-se material de prótese na sacropexia e na fixa- ção da cúpula vaginal aos ligamentos sacro- espinhosos.Figura 18. Culdoplastia de McCall. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 579Cirurgia por via vaginal Sacropexia A sacropexia foi descrita pela primeira vez em 1957. Como não se trata de cirurgia va- ginal, a sua descrição não caberia neste ca- pítulo. Seja como for, é impossível falar do tratamento do prolapso urogenital sem falar desta técnica. É a única técnica de tratamento do prolap- so com próteses cuja utilização se apoia em evidências de nível 1, sendo actualmente a técnica mais frequentemente usada no tra- tamento do prolapso apical. Geralmente é realizada por laparotomia, embora possa ser feita por laparoscopia. Consiste na suspensão da cúpula vaginal a L5 ou ao sacro (S1-S2) por duas próteses de malha de polipropileno suturadas à parede anterior e posterior da vagina67. Após exposição da cúpula vaginal com o au- xílio, por exemplo, de uma vela número 35, disseca-se o espaço vesicovaginal expondo, pelo menos, cerca de 3 cm de parede ante- rior da vagina. Seguidamente, expõe-se a parede posterior da vagina entrando no espaço rectovaginal e dissecando aí o mais possível em direcção do corpo perineal, pois é vantajoso colocar material de prótese entre o recto e a vagina. O espaço pré-sagrado é dissecado até expor o ligamento pré-vertebral, geralmente em L5 ou S1, onde são colocadas duas suturas de fio não absorvível, tendo o cuidado de evitar lesar a artéria sagrada média cuja he- morragia é difícil de controlar.Após afastar a sigmoide e identificado o ure- ter direito, abre-se o peritoneu parietal pél- vico do promontório até à parede posterior da bexiga, o que nem sempre é conseguido sem alguma hemorragia. Nesta altura, se ne- cessário, procede-se a uma culdoplastia. As duas próteses são fixas às paredes anterior e posterior da vagina por intermédio de sutu- ras de fio não absorvíveis. A prótese posterior pode estender-se pelo septo rectovaginal até o mais perto possível do corpo perineal. Só então são passados pelas próteses os pontos de sutura pré-sagrados que vão sus- pender, sem tensão, a cúpula vaginal. As próteses são peritonizadas para evitar o seu contacto directo com as ansas intestinais. A taxa de êxito ronda os 80-100%. A compli- cação mais importante é a erosão vaginal, que ocorre em 3-4% dos casos, principal- mente em doentes submetidas simultanea- mente a histerectomia. A sacropexia pode ser utilizada em doentes nas quais se conserva o útero, sendo assim uma técnica de histeropexia. Fixação apical aos ligamentos sacroespinhosos com prótese A fixação do útero ou da cúpula vaginal aos ligamentos sacroespinhosos por via vaginal com a utilização de prótese de malha de po- lipropileno62 é uma evolução da operação de Richter que já foi descrita neste capítulo. A técnica de acesso aos ligamentos sacro- espinhosos já foi descrita. Após abertura da parede posterior da vagina, eventualmente com o auxílio da infiltração da mucosa vagi- nal com soro com adrenalina, disseca-se o espaço para-rectal até se identificar a espi- nha isquiática e o ligamento sacroespinhoso. Uma agulha desenhada para o efeito é colo- cada por via transnadegueira atravessando o Figura 19. Ligamento sacroespinhoso. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 580 Capítulo 51 ligamento a 2 cm da espinha isquiática para evitar lesar o nervo e artéria pudendos, que passam atrás da espinha. A prótese fixa-se à face posterior do istmo ou à cúpula vaginal e exterioriza-se nas zo- nas nadegueiras com o auxílio das agulhas (Figs. 20-22). A sua tracção vai corrigir o prolapso apical. Com a mesma prótese, nes- se caso com um desenho que lhe permite estender-se entre a vagina e o recto, pode também ser corrigido o rectocelo. É impor- tante lembrar que estas redes devem ser co- locadas sem tensão. A grande vantagem desta técnica em relação à sacropexia é a sua simplicidade, rapidez de execução e melhor pós-operatório. 4.3.4. PROCEDIMENTOS OBLITERATIVOS As técnicas mais usadas são a colpocleisis pela técnica de Le Fort, a colpocleisis total e a colpoplastia convencional agressiva. Colpocleisis (Le Fort) L. Le Fort publicou esta técnica em 187770. É reservada a doentes idosas, sem vida sexu- al activa e com comorbilidades que tornem atractiva uma técnica simples e rápida. Inicialmente foram descritas algumas recor- rências, prevenidas pela realização sistemá- tica de uma perineorrafia e de plicatura dos elevadores do ânus que entretanto se asso- ciou à técnica. Uma taxa elevada (25%) de incontinência uri- nária de novo foi explicada por incontinência urinária de esforço mascarada pelo prolapso, que não era diagnosticada no pré-operatório, e por uma dissecção agressiva da face ante- rior da vagina distalmente à UVJ, que alterava a dinâmica uretral. Para evitar essa complica- ção, actualmente, a dissecção é feita a partir de 2 cm da UVJ, poupando a zona mais distal da mucosa da parede anterior da vagina. Nesta operação, marcam-se com lápis der- mográfico dois rectângulos de mucosa va- ginal nas paredes anterior e posterior. Se o colo do útero está presente, o bordo proxi- mal deve distar 0,5 cm da reflexão cervico- Figura 21. Prótese dos compartimentos apical e pos- terior. Figura 20. Malha de polipropileno para correcção do prolapso apical e posterior. Figura 22. Prótese dos compartimentos apical e pos- terior. Se m o c o n se n ti m en to p ré vi o p o r es cr it o d o e d it o r, n ão s e p o d e re p ro d u zi r n em f o to co p ia r n en h u m a p ar te d es ta p u b lic aç ão © P er m an ye r Po rt u g al 2 01 0 581Cirurgia por via vaginal vaginal. Na cúpula vaginal deve distar 1 cm desta. Lateralmente, devem deixar-se 2 cm entre o rectângulo anterior e posterior. Distalmente, os limites são: na parede ante- rior 2 cm proximalmente à UVJ, e na parede posterior 2 cm para dentro do anel himenial. A mucosa desses dois rectângulos de mucosa vaginal das paredes anterior e posterior pode ser infiltrada com soro com adrenalina, o que facilita a dissecção e diminui a hemorragia. A dissecção deve poupar a fáscia, excisando apenas o epitélio vaginal, mantendo a dis- secção num plano avascular. Os bordos dos rectângulos anterior e poste- rior são suturados com sutura reabsorvível, deixando dois canais laterais para drenagem de secreções ou sangue provenientes do útero. A cirurgia termina com uma perineor- rafia com miorrafia dos elevadores do ânus. Colpocleisis total e colpoplastia convencional agressiva Quando a doente não tem útero ou se de- cide efectuar histerectomia vaginal, não há necessidade de deixar os dois canais laterais, que obtemos com a técnica de Le Fort. As opções são a agressividade na execução das colpoplastias após a histerectomia va- ginal estreitando o lúmen vaginal ou a col- pocleisis total18. Normalmente, em ambos os casos, segue-se uma perineorrafia com miorrafia dos elevadores do ânus. Na colpocleisis total faz-se a excisão comple- ta da mucosa vaginal. Respeita-se anterior- mente a mucosa nos 2 cm proximais à UVJ, e posteriormente os 2 cm proximais ao anel himenial, como na técnica de Le Fort. Geralmente, divide-se a vagina em quatro quadrantes e infiltra-se a mucosa com soro com adrenalina para facilitar a dissecção. 5. DEFEITOS DO COMPARTIMENTO POSTERIOR Os defeitos do compartimento posterior po- dem ser: — Rectocelo: é uma hérnia da parede an- terior do recto, que faz protrusão para o lúmen vaginal. Parece haver aqui um de- feito central na fáscia rectovaginal. — Elitrocelo: corresponde a herniação de intestino delgado, que se deve à separa- ção da fáscia do complexo dos ligamen- tos uterossagrados-cardinais, que faz com que o peritoneu e a vagina entrem directamente em contacto. — Hipermobilidade perineal: deve-se à de- sinserção da fáscia rectovaginal do corpo perineal. 5.1. COLPORRAFIA POSTERIOR Descrita desde o século XIX, foi desenvolvida inicialmente para reparar lacerações obsté- tricas antigas. Normalmente, a cirurgia inicia-se com uma incisão cutânea na pele do períneo na região da fúrcula. Pode ser horizontal, triangular ou em forma de losango. Se houver necessida- de de fazer uma perineoplastia, faz-se uma incisão em forma de losango. A mucosa vaginal é aberta longitudinalmen- te ao longo da linha média, e a mucosa é dis- secada da fáscia. Uma plicatura da fáscia é efectuada com fio reabsorvível com sutura contínua ou em pontos separados. Faz-se colpectomia da mucosa redundante e encerra-se a muco- sa com sutura contínua de fio reabsorvível (Fig. 23). A plicatura dos músculos elevadores do ânus, que era realizada sistematicamente, causa dispareunia e, por isso, a maioria dos autores actualmente não a aconselham nas mulheres com vida sexual activa. Se for necessária uma perineoplastia, os músculos superficiais do períneo e os bul- bocavernosos são aproximados com suturas absorvíveis e a pele do períneo encerrada com pontos separados. A taxa de cura é de 76-96%, ou seja, bastan- te melhor que prolapso do compartimento anterior71. Se m o c
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