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CURRÍCULOS DE GEOGRAFIA E OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS Programa de Pós-Graduação EAD UNIASSELVI-PÓS Autores: Francisco Antonio dos Anjos Fabiana Calçada de Lamare Leite CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Ozinil Martins de Souza Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof. Norberto Siegel Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Prof.ª Cristina Danna Steuck Prof.ª Jociane Stolf Revisão de Conteúdo: Prof.ª Elisangela Lenzi Revisão Gramatical: Prof.ª Marcilda Regina da Cunha Rosa Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI 910 A599c Anjos, Francisco Antonio dos. Currículos de Geografia e os Parâmetros Curriculares Nacionais/ Francisco Antonio dos Anjos [e] Fabiana. Calçada de Lamare Leite Centro Universitário Leonardo. da Vinci – Indaial : Grupo UNIASSELVI, 2009.x 71 p. : il. Inclui bibliografia. ISBN 978-85-7830-221-4 1. Geografia – Ensino 2. Didática de Geografia I. Centro Universitário Leonardo da Vinci. II. Núcleo de Ensino a Distância III. Título Copyright © UNIASSELVI 2009 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Francisco Antonio dos Anjos Professor de Geografia, com mestrado em Desenvolvimento Regional e Urbano, doutorado em Gestão Ambiental e pós-doutorado em Geografia Urbana. Foi professor do Ensino Fundamental e do Médio durante 14 anos e, desde 1994, é professor do Ensino Superior em Geografia, Planejamento Urbano e Planejamento do Turismo. Fabiana Calçada de Lamare Leite Graduada em Geografia, pela Universidade Federal Fluminense (UFF), com experiência no ensino a distância no curso de licenciatura em Geografia, tanto em produção de material nas disciplinas Geografia Humana e Geografia e Cultura, como em teleaulas destas disciplinas e das disciplinas Cartografia e Geografia Econômica. Possui mestrado acadêmico em Turismo e Hotelaria, pela Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI), e participa de grupos de pesquisa sobre planejamento urbano. Sumário APRESENTAÇÃO ......................................................................7 CAPÍTuLo 1 o EnSino dE GEoGrAfiA E AS ESCoLAS do PEnSAmEnTo GEoGráfiCo..........................................................9 CAPÍTuLo 2 oS ConCEiToS fundAmEnTAiS dA GEoGrAfiA E oS PCnS ................29 CAPÍTuLo 3 PCnS E PráTiCAS PEdAGóGiCAS dE GEoGrAfiA ..............................51 APRESENTAÇÃO Seja bem-vindo(a) à disciplina Currículos de Geografia e os Parâmetros Curriculares Nacionais! Nesta disciplina, apresentaremos a você a geografia como disciplina de ensino, passando pelo conhecimento da formação do pensamento geográfico. Com isto, você conhecerá os conteúdos da geografia como disciplina de estudo, nas distintas etapas do processo de ensino-aprendizagem do aluno, e aprenderá como trabalhá-los. Assim, no capítulo 1, para compreender a geografia que estudamos hoje e suas formas de abordagem, você estudará sobre a geografia como disciplina de ensino e conhecerá como algumas escolas viam o pensamento geográfico no Brasil. No capítulo 2, você conhecerá os conceitos fundamentais que compõem a nossa ciência. Além disto, aprenderá como trabalhar com tais conceitos de acordo com os conteúdos a serem ensinados em cada etapa do processo de ensino- aprendizagem. Por fim, o capítulo 3! Neste capítulo, você conhecerá algumas atividades que podem ser desenvolvidas em suas aulas para que o conteúdo seja trabalhado da melhor maneira para a assimilação do aluno. Aplicar diferentes práticas no processo de ensino-aprendizagem pode ser uma forma de estimular o interesse do aluno pelo conteúdo. Então, vamos iniciar os estudos! CAPÍTULO 1 o EnSino dE GEoGrAfiA E AS ESCoLAS do PEnSAmEnTo GEoGráfiCo A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Apontar as características do processo da construção do ensino de geografia. 3 Comparar as etapas do ensino de geografia nas diferentes escolas do pensamento geográfico. 10 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS 11 O EnsinO dE GEOGrafia E as EscOlas dO PEnsamEntO GEOGráficO Capítulo 1 ConTExTuALizAção À medida que começamos a estudar uma disciplina, precisamos, também, saber como, o que e de que maneira estudar. Além disto, precisamos saber como, o que e de que maneira ENSINAR. Pensando nisto, este primeiro capítulo busca apontar as características do processo da construção do ensino de geografia. Mas, para chegar a este apontamento, passaremos pela conceituação do ensino de geografia e destacaremos a identificação e a consideração de cada realidade como uma importante fatia da composição do todo. Isto significa afirmar que a interação entre a realidade vivida e a realidade estudada, considerando cada particularidade, é componente fundamental no entendimento da relativização e inserção do conteúdo em cada grupo no processo de ensino-aprendizagem. Discutiremos, ainda, o papel do livro didático e do paradidático em sala, vistos como um dos principais instrumentos utilizados pelos professores em sala de aula. Em continuidade, você se deparará com uma discussão que é o nosso desafio de todos os dias: como tornar as aulas interessantes e despertar, sempre, o interesse do aluno pelo conteúdo a ser transmitido? O primeiro capítulo encerra com as escolas do pensamento geográfico no Brasil, que nos farão entender, a cada momento, as características e posturas do pensamento geográfico as quais se refletem em atitudes, conteúdos e maneiras de ensinar a geografia em sala de aula. GEoGrAfiA E EnSino Antes de você estudar sobre as diferentes escolas do pensamento geográfico, é importante que entenda algumas questões relacionadas ao ensino da geografia. Neste sentido, partimos da ideia de que a geografia é um ramo do conhecimento que possui uma linguagem específica, sendo necessário que o aluno se aproprie não apenas do vocabulário próprio desta ciência, como também seja capaz de realizar uma leitura compreensiva do espaço geográfico. Para a realização de uma leitura crítica do ambiente, torna-se fundamental associar a vivência pessoal aos conceitos específicos. Para a realização de uma leitura crítica do ambiente, torna- se fundamental associar a vivência pessoal aos conceitos específicos. 12 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS Se nós, professores, passássemos a considerar devidamente o saber do aluno (seu espaço real), integrando-o ao saber espacial que a escola deve transmitir-lhe [...], tal atitude poderia trazer profundas e benéficas conseqüências a nossa prática de ensino (VESENTINI et al, 1989, p. 85). Nesta etapa da nossa disciplina, entenderemos, também, quais saberes devem ser considerados no ensino da geografia, como articular à realidade espacial mais próxima e à mais distante, bem como qual o papel do professor e do livro didático no processo de ensino aprendizagem. É isto que veremos a seguir! Você já se perguntou: O que é geografia? Para que estudar geografia? Por meio destes questionamentos, podemos começar a entender a abrangência do conceito da ciência geográfica. Existem muitas definições de geografia. No entanto, a maioria delas apresenta a mesma essência. Se considerarmos que esta ciência estuda as relações entre os homens e a relação destes com a natureza, é necessário que o professor desta disciplina assuma seu compromisso com a sociedade. Castrogiovanni e Goulart (1998, p. 130) demonstram categoricamente que, A Geografia, mais especialmente, enquanto disciplina escolar deve levar o aluno a entender o espaço. Como as sociedades historicamente transformam a base territorial apartir de seus interesses e contradições. Como se apropriam dos elementos da natureza (recursos) que são desigualmente distribuídos. A territorialidade implica localização, orientação e representação dos elementos (dados) sócio-econômicos e naturais. Mas, por que estudar geografia? Callai (1999) aponta três razões: • para conhecer o mundo e obter informações; • para analisar e tentar explicar o espaço produzido pelo homem; • para complementar a formação do cidadão. Ao conhecer o mundo e estudar diversas formas de organização espacial, procuramos compreender as causas que deram origem às formas resultantes das relações entre o homem e a natureza. Desta maneira, você concordará que cabe à geografia, pelos assuntos e conceitos sobre os quais trata, um papel importante na formação do cidadão. 13 O EnsinO dE GEOGrafia E as EscOlas dO PEnsamEntO GEOGráficO Capítulo 1 No capítulo 2, você conhecerá os conceitos fundamentais da geografia e suas respectivas orientações de ensino nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). A geografia, ao ser estudada, deve considerar o aluno na sociedade em que vive. Deve, ainda, permitir ao aluno que se perceba como participante do espaço que estuda e perceba que “os fenômenos que ali ocorrem são resultados da vida e do trabalho dos homens e estão inseridos num processo de desenvolvimento.” (CALLAI, 1999, p. 58). Este é o nosso desafio! Temos que fazer a geografia uma disciplina interessante que se relacione com a sociedade e que seja o resultado da interação e integração entre o espaço primitivo e o espaço constantemente transformado pelo homem. O estudo da geografia deve possibilitar aos alunos a compreensão das inter-relações da sociedade com a natureza, como também o entendimento de que as ações individuais ou coletivas trazem consequências tanto para a sociedade quanto para o meio natural. Para fazermos da geografia uma disciplina interessante, temos, primeiramente, que entender a essência do que é o ensino, de como se dá esse processo de ensino-aprendizagem, para, então, desenvolver recursos que despertem o interesse do aluno pela mesma. Segundo Cavalcanti (1998, p. 25), o ensino: [...] é um processo de conhecimento pelo aluno, mediado pelo professor e pela matéria de ensino, no qual devem estar articulados seus componentes fundamentais: objetivos, conteúdos e métodos de ensino. Neste sentido, os objetivos sociais e pedagógicos gerais de ensino e os objetivos específicos da geografia escolar é que orientam a seleção de ensino. No entanto, é o uso de um método de ensino adequado que pode viabilizar os resultados almejados. Se se quer ensinar os alunos a pensarem dialeticamente, importa definir ao mesmo tempo em que conteúdos permitem a eles o exercício desse pensamento e o modo sob o qual esse exercício é viável. Temos que fazer a geografia uma disciplina interessante que se relacione com a sociedade e que seja o resultado da interação e integração entre o espaço primitivo e o espaço constantemente transformado pelo homem. 14 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS Assim, é possível perceber que a articulação entre os objetivos, os conteúdos e os métodos de ensino é fundamental para a constituição de um ensino ideal. Cabe ao professor trabalhar sempre a articulação destes componentes com a sua linguagem em sala de aula. Sobre os conteúdos, ressaltamos que precisam ser trabalhados ponderando uma tríplice função: resgatar o conhecimento produzido cientificamente, reconhecer e valorizar o conhecimento que cada um traz e dar um sentido social para o conhecimento que resulta desta relação (CALLAI, 2001). Haja vista que a escola é um espaço importante da vivência humana e que não pode ser separada da tônica da vida social, devemos fundamentar a nossa prática pedagógica em alguns princípios que garantam e articulem essas interações. Tais princípios devem nortear a prática da sala de aula no mesmo grau de importância e ser complementados, em vista da diversidade de realidades a que se destinam. Você já parou para refletir sobre a influência que a escola exerce sobre a vida social e vice-versa? Por isto, estes dois meios de vivência humana devem agir em conjunto, em tom de complementaridade, bem como somar valores. Neste sentido, faz-se necessária a presença de um professor que realize a mediação entre a teoria e a prática, entre o saber do aluno e a cultura elaborada, e que domine não só os conteúdos, como também as metodologias capazes de desenvolver a capacidade intelectual e o pensamento autônomo e criativo. Sobre isto, Moretti (2001, p. 95) afirma que, “no processo ensino/aprendizagem, a relação aluno é caracterizada como um tipo especial de relação. Essa relação que tem por objetivo básico a aprendizagem é sempre mediada pelo saber”. Há necessidade de um professor dinâmico que valorize a vivência do aluno e que possibilite discussões na sala de aula, promovendo, assim, de maneira interdisciplinar, a articulação dos conteúdos de geografia com os das outras áreas. De acordo com Saviani (1994, p. 81), isto exige, evidentemente, dos educadores um compromisso político que deve se expressar na sua capacidade de ultrapassar aparências e captar distorções, o que é impossível sem o domínio do conteúdo a ser trabalhado e dos métodos e técnicas que possibilitem sua transmissão-assimilação/ apropriação. 15 O EnsinO dE GEOGrafia E as EscOlas dO PEnsamEntO GEOGráficO Capítulo 1 Você, caro(a) pós-graduando(a), já deve ter compreendido que ensinar geografia, além de ser um desafio, é também uma questão contraditória. A geografia, a exemplo da globalização, está sendo chamada para explicar o mundo. A educação, para ter sentido à sociedade, necessariamente, deve possibilitar o seu entendimento no presente. É o entendimento, o desvelamento da sociedade no presente que lhe dá sentido. O presente é colocado aqui como o ‘realizar- se’, o estar se realizando. [...] O presente não descarta a história e não ignora o futuro. (STRAFORINI, 2004, p. 29). O professor precisa estar bem consciente do que é geografia, para que serve e qual a sua função como disciplina escolar. Sua visão de mundo, ou seja, sua postura frente aos eventos da sociedade e a seus alunos implica diretamente no posicionamento em sala de aula. Leia mais sobre a ciência geográfica e o ensino de geografia no livro Geografia, escola e construção do conhecimento, de Lana de Souza Cavalcanti, da Editora Papirus, São Paulo, 1998. A disciplina escolar geografia corresponde ao conjunto de saberes da ciência geográfica (e, no caso, da realidade brasileira, de tantas outras que não têm lugar no Ensino Fundamental e no Médio, como, por exemplo, astronomia, economia, geologia), convertido em conteúdos escolares a partir de uma seleção e de uma organização daqueles conhecimentos e procedimentos tidos como necessários à formação geral do aluno. De acordo com Cavalcanti (1998, p.168), o confronto dos dois tipos de conhecimento – o conhecimento cotidiano (as representações sociais) e o conhecimento científico – ajuda a perceber os encontros e os desencontros entre eles, o que, por sua vez, traz importantes indicações de como trabalhar com os alunos, considerando o conhecimento como parâmetro inicial para a mobilização do educando e para a sua ressignificação no final do processo ensino- aprendizagem. A geografia do Brasil, por exemplo, ministrada em sala de aula, deve abordar o espaço geográfico e a sociedade brasileira e compreender sua dinâmica e organização social como um todo. Isto possibilita o conhecimento das distintas realidades existentes em nosso país, sendo o início para o estudo de realidades específicas, como o caso de Santa Catarina, com a caracterização de sua colonização, as principais atividades industriais e econômicas, entre outros aspectos. No entanto, tais estudos não podem se16 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS esgotar nos limites do estado ou país, pois, se entendemos o planeta Terra como um geossistema, todos os acontecimentos mundiais estão direta ou indiretamente interligados. Este aspecto é importante, pois permite que o aluno associe, por meio de algo que tenha observado ou vivenciado, o real e o abstrato. O material didático e a metodologia de ensino utilizados pelos professores também precisam ser dinâmicos e sempre atualizados. Não queremos entrar no mérito das dificuldades enfrentadas pela maioria dos professores, principalmente nas escolas públicas, no que concerne à infraestrutura e recursos pedagógicos, baixa remuneração, falta de cursos para atualização, ou seja, a existência destas dificuldades não extingue o objetivo maior que é transformar jovens em futuros cidadãos, conscientes e críticos da realidade que os cerca. Este é o desafio. Visite o site Portal do Professor, do Ministério da Educação (http://portaldoprofessor.mec.gov.br). Neste site, você encontrará textos, dicas de novos sites, notícias atualizadas, objetos de aprendizagem para dinamizar suas aulas, dicas de ensino, além de links para acesso a diversas revistas sobre educação. Quanto aos livros didáticos e paradidáticos que, atualmente, são responsáveis por auxiliar os professores no ensino da geografia do Brasil, estes são, muitas vezes, os únicos instrumentos utilizados pelo professor em sala de aula. Por se tratar de um assunto amplo, dinâmico e complexo, existem algumas dificuldades no que diz respeito à associação de materiais paradidáticos ao conteúdo do livro didático. Como o livro didático é o principal instrumento para auxiliar tanto professores quanto alunos no processo de ensino-aprendizagem, tais deficiências precisam ser sanadas. Leia mais sobre a utilização do livro paradidático no texto O livro paradidático em sala de aula: do planejamento ao uso, de Bernardo Mançano Ferandaes. In: CASTROGIOVANNI, Antonio Carlos. Geografia em sala de aula: práticas e reflexões. 2. ed. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1998. p. 149-152. 17 O EnsinO dE GEOGrafia E as EscOlas dO PEnsamEntO GEOGráficO Capítulo 1 O livro didático é, ainda, um dos mais tradicionais recursos impressos do ensino. Em relação ao seu uso, Schäffer, (1998, p. 133) diz que “está associado a uma função social e pedagógica relevante: a construção do conhecimento através do trabalho com texto impresso, o que permite a ampliação deste universo de conhecimento”. Por vivermos numa sociedade em que a maioria das informações é veiculada na forma de textos, o livro didático também segue este formato, sendo, é claro, apenas um dos instrumentos existentes. Sobre a origem do livro didático, Bezerra e Luca (2006, p. 27) destacam que este instrumento enraíza sua tradição no século XIX, em países que exerceram forte preponderância nos primórdios do sistema educacional brasileiro. É conhecida a importância atribuída às coleções de livros didáticos na França da Terceira República, que consagrou o modelo de escola laica, gratuita e obrigatória. Em complemento, Schäffer (1998, p. 134) coloca que “o livro didático tem sido visto, em todos os países, como o instrumento fundamental para a homogeneização [...]. Nesta perspectiva, passa a ser uma peça da engrenagem da produção e reprodução do sistema.” Mas, como reconhecer um bom livro didático? Quais são as principais características que um bom livro didático deve ter? Para Castrogiovanni e Goulart (1998, p.130), um bom livro didático de geografia deve levar em consideração: • a fidedignidade das informações; • o estímulo à criatividade; • uma correta representação cartográfica; • uma abordagem que valoriza a realidade; • que enfoque o espaço como uma totalidade. Como é muito difícil encontrar um livro didático perfeito, é fundamental que o professor busque alternativas que facilitem a construção do conhecimento pelo aluno e enriqueçam, assim, o processo de ensino-aprendizagem. Exemplo para isto seria, a fim de promover debates sobre as questões atuais e da realidade próxima vivida, abordar os problemas socioambientais e econômicos, como a questão da degradação do meio ambiente, a poluição de rios, a reciclagem do lixo ou as disparidades econômicas e sociais. Todavia, não podemos ignorar a existência das novas mídias e a influência destas na vida dos jovens e adolescentes. É preciso que a geografia aproveite este momento e as utilize para renovar o ensino nas escolas. Um site educacional que apresente temas para o ensino da geografia, dicas para professores, links, 18 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS ferramentas, artigos, entrevistas, enfim, um ambiente aberto para a participação de professores poderá servir de apoio para aqueles que possuem dificuldades em encontrar material paradidático para complementar o conteúdo do livro didático. Procure sempre se atualizar! A Revista Nova Escola é uma boa maneira para começar! Acesse o site: http://revistaescola.abril.com. br/ e leia matérias, notícias, assista a vídeos e conheça algumas novidades do “mundo da educação”. Este desafio desdobra-se em outro, também atual: a renovação no ensino. O professor Nelson Kaercher (1999, p.71) afirmava, no final da década passada, que “o movimento de renovação da Geografia Brasileira já tem mais de quinze anos, mas o seu sopro renovador ainda está distante da maioria das salas aulas”. Callai (1999, p. 42) complementava com a afirmação de que “a disciplina geografia, mesmo nos dias de hoje, na maioria dos casos, continua sendo aquela disciplina descritiva há muito superada nas discussões acadêmicas”. A geografia ainda enumera fatos, informa fenômenos e os lugares em que estes ocorrem, descreve paisagens e regiões. Este ainda parece um desafio não plenamente suplantado. Um outro desafio reside no fato de que as tradicionais propostas educacionais, vistas como antiquadas, harmônicas e homogeneizadas, têm proposto direções bastante renovadoras. Com isto, não podemos mais usar a justificativa do tradicionalismo que está engendrado nas propostas governamentais, pois este fato está cada vez mais distante da realidade. O desafio se coloca em apresentar um ensino renovado por meio de práticas educativas concernentes ao momento atual. É preciso que o professor acredite que é possível e não desista frente às dificuldades. No que diz respeito aos desafios e objetivos da geografia escolar, Straforini (2004, p. 43) coloca que a Geografia assume, assim, papel central na busca de uma outra possibilidade para a existência humana que não esteja centrada na mercadoria; afinal, como ciência das técnicas, ela é capaz de conhecer a condição científica e política das técnicas e, a partir disso, propor um novo uso a elas. 19 O EnsinO dE GEOGrafia E as EscOlas dO PEnsamEntO GEOGráficO Capítulo 1 Atividade de Estudos: 1) Com suas palavras, expresse o que é e para que estudar geografia. ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ 2) Como vimos, o livro didático é um dos instrumentos de ensino mais utilizados pelo professor. Neste sentido, quais as principais características que este instrumento deve apresentar para proporcionar uma base de ensino de qualidade? ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ____________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ Agora que você já relembrou alguns aspectos importantes do processo de ensino-aprendizagem, assim como as características da geografia como disciplina de ensino, entenderemos como aconteceu a construção do pensamento geográfico brasileiro até os dias atuais. AS ESCoLAS do PEnSAmEnTo GEoGráfiCo no BrASiL A geografia pode ser considerada, na sua essência, uma ciência que concebe o espaço como uma construção das sociedades. É possível, por exemplo, reconhecer as marcas deixadas pelas gerações passadas na paisagem, realizadas por meio da força do trabalho e das ferramentas existentes na época, para suprir as necessidades daquele momento. Com o passar do tempo, principalmente pela escrita, o A geografia pode ser considerada, na sua essência, uma ciência que concebe o espaço como uma construção das sociedades. 20 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS conhecimento tem sido passado de geração para geração, fazendo com que as necessidades mudem e exigindo, assim, que as ferramentas de trabalho também evoluam. Com ferramentas mais apropriadas, o poder de transformação da paisagem pelo homem se amplia, acarretando numa metamorfose contínua. Neste sentido, o espaço nos revela as formas como os seres humanos se relacionam entre si e com a natureza a partir do trabalho. Isto, sem esquecer, é claro, que somos parte desta natureza e que humanizamos este espaço conforme nossas necessidades e interesses. Esta constante transformação que ocorre nas sociedades também ocorreu na geografia enquanto ciência moderna e em seu corpo conceitual. Da geografia tradicional até os momentos atuais, muitos paradigmas foram quebrados e novas correntes de pensamento surgiram. No Brasil, influenciado pela escola francesa, Delgado de Carvalho iniciou a implantação do pensamento geográfico no país. Até então, a geografia era uma matéria apenas ensinada no nível secundário, não tendo adquirido o prestígio de cátedra universitária e, desta forma, relegada ao segundo plano. Delgado de Carvalho preocupou-se com o ensino da geografia da época e propôs a distribuição mais precisa e lógica dos conteúdos. A seguir, apresentamos algumas indicações de leitura para aumentar o seu conhecimento sobre o assunto que estamos estudando! • Leia mais no livro Para onde vai o ensino de geografia, de Ariovaldo Umbelino de Oliveira (Org.), Editora Contexto, São Paulo, 1998. • Sobre a passagem da geografia tradicional para a geografia crítica, leia mais no livro O ensino de geografia no século XXI, da Editora Papirus, texto de José Willian Vesentini: REALIDADES E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE GEOGRAFIA NO BRASIL (p. 219-248). • Saiba mais sobre a Escola Francesa no livro Geografia, ciência da sociedade, de Manual Correa de Andrade, páginas 69-74. A geografia brasileira, de caráter científico, passou a existir no país a partir da década de 1930. Surgiu, com isto, a dicotomia entre a ciência acadêmica e a disciplina escolar. Da geografia tradicional até os momentos atuais, muitos paradigmas foram quebrados e novas correntes de pensamento surgiram. 21 O EnsinO dE GEOGrafia E as EscOlas dO PEnsamEntO GEOGráficO Capítulo 1 A geografia, no então denominado ginásio, nada mais era do que a dos livros didáticos (manuais) que, geralmente, expressavam o que havia sido desenvolvido até os meados do século XIX na Europa, ou seja, eram enumerações de nomes de rios, serras, montanhas, cidades, etc. Enquanto isso, na academia, o conceito de região, em sua dimensão territorial, marcava os estudos, sob forte tendência lablachiana, originada do francês Vidal de La Blache . As correntes que dela se desdobraram passaram a ser chamadas de geografia tradicional. É relevante você saber que, entre outros aspectos, Vidal de La Blache preocupava-se com a desigual distribuição da população pela superfície da Terra e que desenvolveu estudos sobre as relações entre o homem e o meio físico. Admitia que este exercia alguma influência sobre o homem e que, por sua vez, dependendo das condições técnicas e do capital que possuísse, o homem também poderia exercer influência sobre o meio. Daí surgiu a expressão POSSIBILISMO. No ensino, a geografia tradicional se traduzia pelo estudo descritivo das paisagens naturais e humanizadas dissociadas do sentido do homem pelo espaço. Os alunos eram orientados a descrever, relacionar os fatos naturais e sociais, fazer analogias entre eles e elaborar suas generalizações ou síntese. A pretensão era ensinar uma geografia neutra. Esse contexto marcou, também, a produção de livros didáticos que se apresentavam como manuais. A partir da década de 1960, no Brasil, a revolução pragmática procurava uma nova forma de interpretar o espaço. Isto porque buscava suas bases na matemática e na estatística, razão pela qual foi conhecida, também, como geografia quantitativa. Esta tendência incentivava a elaboração de diagnósticos sobre um determinado espaço por meio de uma descrição numérica exaustiva sobre as suas características e, ainda, as tendências de evolução dos fenômenos ali existentes. (MORAES, 1995). Nessa fase, os geógrafos, em geral, com deficiente formação matemática e estatística, eram levados a ter uma preocupação com modelos abstratos de conhecimento, fugindo da análise e do conhecimento da realidade que o país atravessava com o regime autoritário do governo brasileiro. 22 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS Leia mais sobre o conceito e as características da geografia quantitativa no capítulo IV do livro Por uma geografia nova, de Milton Santos. Uma nova forma de interpretar o espaço foi trazida pela revolução marxista que se apresentou como outro movimento que contestava tanto a geografia tradicional como a pragmática, assumia uma posição crítica diante da realidade social e lutava por uma sociedade mais justa. Esse movimento abriu, para o campo disciplinar, momentos de reflexões sobre a renovação no ensino de geografia o qual ganhou conteúdos políticos que, por sua vez, passaram a ser significativos na formação do cidadão. Para Moraes (1998, p.166), [...] formar o indivíduo crítico implica estimular o aluno questionador dando-lhe não uma explicação pronta do mundo, mas elementos para o próprio questionamento das várias explicações. Formar o cidadão democrático implica investir na sedimentação no aluno do respeito à diferença considerando a pluralidade de visões como um valor em si. Para aprofundar seu conhecimento sobre a etapa da revolução marxista, leia o livro A geografia: isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra, de Yves Lacoste. Outro momento que merece destaque é a geografia crítica. No ensino, esta escola do pensamento geográfico destaca a importância de que o aluno compreenda as diferentes sociedades, como se organizam na prática do seu cotidiano. O espaço é considerado uma totalidade em que as dinâmicas naturais interagem nos fatores econômicos, sociais e políticos. Além disto, a geografia crítica procura avançar, não se limitando aos conteúdos tradicionais e incorporando novos temas ligados às lutas de classes sociais, relação de gênero, ênfase na participação do cidadão, compreensão das desigualdades, das exclusões, dos direitos sociais, das lutas ecológicas e da questão ambiental. Preocupa-se com o desenvolvimento da autonomia, da criatividade e da criticidade do educando que questiona uma sociedade mais justa e igualitária na qual os direitos das minorias sejam preservados. 23 O EnsinO dE GEOGrafia E as EscOlas dO PEnsamEntO GEOGráficO Capítulo 1 No século XX, a geografia quese apresenta busca relacionar as várias abordagens da ciência geográfica. A renovação do ensino de geografia, em termos de distribuição de conteúdos, em todos os níveis escolares, deve ser adaptada aos novos temas, relacionar o que é ensinado à vivência cotidiana dos alunos e buscar soluções frente às dificuldades que produz a acumulação de informação geográfica no processo ensino-aprendizagem. Neste sentido, buscando associar a realidade mundial ao contexto social de cada grupo, Wettstein (1998) nos apresenta alguns temas que devem estar presentes nas discussões e no conteúdo do ensino de geografia nas salas de aula: a) Em geografia política Os temas relacionados à geografia política estão associados, em sua maioria, a posições de poder e domínio que, por sua vez, se relacionam a questões econômicas e sociais. Assim, os temas sugeridos são: • o processo massivo de descolonização; • a subida ao poder pelos movimentos de libertação; • a multiplicação do número de sociedades em processo de revolução e consolidação das mesmas como sistemas de governo estáveis; • o aumento crescente do número de países em desenvolvimento em rápida transformação, principalmente nos aspectos econômico e social; • as tentativas de participação popular de base; • os avanços progressivos na formação de alinhamentos entre países em desenvolvimento. b) Em geografia econômica Assim como os temas sugeridos para discussão relacionados à geografia política, os temas de geografia econômica não deixam de estar próximos a assuntos de cunho político, se concordarmos que o perfil econômico de cada país, em parte, corresponde ao seu poder político frente às realidades mundiais. Sendo assim, são temas sugeridos para debates em sala de aula em geografia econômica: • a crescente nacionalização dos recursos naturais básicos; • a constante superação do prejuízo sobre o esgotamento dos recursos naturais; • a criação de associações de países produtores de matérias-primas, não apenas de combustíveis e de outros produtos extrativos, mas também de 24 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS produtos agrícolas; • a resposta às multinacionais com a criação de empresas multilatinas; • as tentativas de melhor intercâmbio entre os países em desenvolvimento; • o surgimento de novos centros de decisão econômica e financeira em países em desenvolvimento; • as tentativas de colaboração financeira e tecnológica para o desenvolvimento. c) Em geografia social Mais um conjunto de temas que respondem ao cenário mundial e representanm sua diversidade em distintas localidades se discutidos com fundamento e propriedade: • a superação das escalas geográficas limitativas: possibilidade de acesso aos problemas mundiais como se fossem os do próprio país; • a vigência do nacionalismo como prática social, mais do que como prática política ou prática ideológica; • a criação de mecanismos e instituições para o intercâmbio de informações; • a contribuição dos países em desenvolvimento e subdesenvolvidos para a construção de teorias científicas sobre as relações econômicas e sociais. Por fim, aproximando da realidade social, política e econômica brasileira, nós deixamos a você a sugestão de alguns temas que também merecem estar nos assuntos da sala de aula de geografia: • as crises econômicas do sistema capitalista e suas consequências no cenário nacional brasileiro; • o papel dos recursos naturais na economia e a preocupação com a respectiva escassez; • a produção e a utilização de fontes de energia alternativa; • as consequências do aquecimento global; • a vertente cultural da globalização. Como você pode perceber, os temas a serem levados para dentro de sala de aula não se esgotam, pois o mundo, em constante transformação, é uma sala de aula em constante atualização. Cabe a nós, professores, saber fazer destes fatos conteúdo da disciplina de geografia. 25 O EnsinO dE GEOGrafia E as EscOlas dO PEnsamEntO GEOGráficO Capítulo 1 Atividade de Estudos: Agora que você já conheceu algumas sugestões de temas que merecem estar nas aulas de geografia, tanto em um contexto mais abrangente como em uma situação mais específica, este momento se reserva para você sugerir novos temas e explicar o porquê de ser estudado, assim como qual a relação entre o tema e o contexto social em que se insere. ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ALGumAS ConSidErAçõES Neste capítulo, buscamos apresentar a você uma breve conceituação sobre ensino. Além disto, você conheceu este conceito associado às características e ao perfil do ensino de geografia. Desta maneira, ficou mais claro compreender de que maneira os assuntos devem ser trabalhados como conteúdo de sala de aula. Em seguida, apresentamos a você as principais escolas do pensamento geográfico e suas distintas maneiras de interpretar e estudar as ocorrências e as relações estabelecidas na superfície terrestre. Nesse momento, foi possível perceber que, com o passar do tempo e o desenvolvimento de estudos, as maneiras de interpretar os fatos também se alteraram. Por último, ficou registrada a sugestão de alguns temas atuais que merecem ser trabalhados em sala de aula como conteúdos da disciplina geografia. Agora, fica o convite para darmos continuidade aos seus estudos com o conteúdo do capítulo 2. Você conhecerá, neste capítulo, os conceitos fundamentais da geografia, as abordagens e os conteúdos dos Parâmetros Curriculares Nacionais. Vamos lá! 26 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS rEfErênCiAS BEZERRA, Holien Gonçalves; LUCA, Tânia Regina de. Em busca da qualidade – PNLD História. In: SPOSITO, Maria E. B. (Org.). Livros didáticos de geografia e história: avaliação e pesquisa. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2006. p. 27-54. CALLAI, Helena Copetti. A formação do profissional de geografia. Ijuí: UNIJUÍ, 1999. ______. A geografia e a escola: muda a geografia? Muda o ensino? Terra Livre, São Paulo, n. 16, p. 133-152, 1º sem/2001. CASTROGIOVANNI, Antonio Carlos; GOULART, Lígia Beatriz. A questão do Livro didático em geografia: elementos para uma análise. In: CASTROGIOVANNI, Antonio Carlos. Geografia em sala de aula: práticas e reflexões. 2. ed. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1998. p. 129-132. CAVALCANTI, Lana de Souza. Geografia, escola e construção do conhecimento. São Paulo: Papirus, 1998. KAERCHER, Nestor André. Desafios e utopias no ensino de geografia. 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São Paulo: Annablume, 2004. 27 O EnsinO dE GEOGrafia E as EscOlas dO PEnsamEntO GEOGráficO Capítulo 1 VESENTINI. J. W. (Org.) et al. Geografia e ensino: textos críticos. Campinas: Papirus,1989. WETTSTEIN, Gérman. O que se deveria ensinar hoje em geografia. In: OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de (Org.). Para onde vai o ensino de geografia. São Paulo: Contexto, 1998. p. 125-134. CAPÍTULO 2 oS ConCEiToS fundAmEnTAiS dA GEoGrAfiA E oS PCnS A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Descrever os conceitos fundamentais da geografia. 3 Interpretar os conceitos fundamentais da geografia de acordo com os PCNs. 30 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS 31 Os COnCeitOs Fundamentais da GeOGraFia e Os PCns Capítulo 2 ConTExTuALizAção No capítulo 1, você conheceu as principais características da geografia como disciplina de ensino, além de ter aprendido a identificar as características deste ensino em diferentes escolas do pensamento geográfico. Com esta base, você já está pronto(a) para encarar o capítulo que iniciamos agora: o capítulo 2! Neste capítulo, inicialmente apresentamos alguns conceitos fundamentais que compõem o ensino de geografia. São eles: ESPAÇO, PAISAGEM, LUGAR, REGIÃO e TERRITÓRIO. Mas, antes de detalhar cada um destes conceitos e mostrar suas aplicações em conteúdos a estarem presentes em sala de aula, torna-se necessário contextualizar a geografia na proposta dos Parâmetros Curriculares Nacionais. Assim, após esta contextualização, você estará pronto(a) para entender plenamente cada um dos conceitos mencionados. Tais conceitos serão trabalhados um por um no contexto exposto e discutidos com base nos Parâmetros Curriculares Nacionais e, em complemento, em definições trabalhadas por autores renomados da nossa área: a geografia. Com certeza, todo este conteúdo ficará bem claro e você levará este conhecimento direto para sua sala de aula! Então, vamos lá! Bem-vindo(a) ao capítulo 2! oS ConCEiToS fundAmEnTAiS dA GEoGrAfiA E oS PCnS Como sabemos, todas as ciências possuem um conjunto de categorias e conceitos que constituem sua fundamentação e que estão relacionados ao seu conhecimento. Por ser uma ciência social, a geografia tem como um de seus objetos de estudo a SOCIEDADE. Sendo assim, para entender a sociedade como objeto de estudo da geografia, faremos o uso das categorias elementares que compõem a nossa disciplina e de seus respectivos conceitos. Como você já deve saber, entre alguns motivos para o aluno estudar geografia está a possibilidade de compreender seu papel no conjunto das relações sociais com a natureza, sejam suas ações individuais ou em grupo, e as possíveis consequências. 32 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS E onde entra o papel do professor? O professor tem necessidade de resolver o compromisso entre o que ensina e o que quer ensinar. Assim, o saber escolar pressupõe, como requisito, a existência de um discurso de referência academicamente fundamentado. É neste sentido que o desenvolvimento de conceitos geográfico nos permite uma sistêmica da realidade social a partir das categorias determinantes. A geografia tem por objetivo estudar as relações entre o processo histórico na formação das sociedades humanas e o funcionamento da natureza por meio da leitura do lugar, do território, a partir de sua paisagem. (BRASIL, 1998, p. 26). No que se refere ao Ensino Fundamental, com base nos Parâmetros Curriculares Nacionais, é importante considerar quais são as categorias da geografia mais adequadas para os alunos em relação a essa etapa da escolaridade e às capacidades que esperamos que eles desenvolvam. Neste sentido, a categoria de ESPAÇO deve ser o objeto central de estudo. Em complemento, as categorias PAISAGEM, LUGAR, REGIÃO e TERRITÓRIO devem ser abordadas como seu desdobramento. Inicialmente, você conhecerá, de maneira resumida, as categorias fundamentais da geografia. Ainda neste capítulo, no próximo momento, detalharemos estas categorias para sua melhor compreensão e interpretação. Sendo assim, são categorias fundamentais da geografia: • ESPAÇO – É onde percebemos a produção humana, nas suas diferentes épocas e atuações. São levados em consideração na formação do espaço: fatores políticos, econômicos, religiosos e culturais. O espaço é dinâmico e não deve ser entendido apenas como um fragmento. • PAISAGEM – É a face de um território ou região ou a representação de um dado momento. São levados em consideração no estudo da paisagem: o relevo, a orientação dos rios e córregos da região, o conjunto de construções humanas, a distribuição da população, o registro das tensões, os sucessos e fracassos da história dos indivíduos e grupos que nela se encontram. O professor tem necessidade de resolver o compromisso entre o que ensina e o que quer ensinar. No Ensino Fundamental, as categorias da geografia mais adequadas para os alunos em relação a essa etapa da escolaridade são: ESPAÇO, PAISAGEM, LUGAR, REGIÃO e TERRITÓRIO. 33 Os COnCeitOs Fundamentais da GeOGraFia e Os PCns Capítulo 2 • LUGAR – É o ponto de referência do indivíduo; é o local em que uma ou várias pessoas se identificam. O lugar pode ser ainda identificado como espaço onde as pessoas têm vínculos afetivos: uma praça onde a pessoa brinca desde menino, a janela de onde vê a rua, o alto de uma colina de onde avista a cidade. • REGIÃO – É a parcela do espaço que revela uma particularidade que a diferencia das demais. Essa particularidade é identificada por um conjunto de fatores, como econômicos, físicos, sociais, entre outros. • TERRITÓRIO – Pode ser considerado um conjunto de paisagens, de lugares, de regiões, uma área delimitada. Compreender o que é território também implica em compreender a complexidade da convivência, nem sempre harmônica, em um mesmo espaço, da diversidade de tendências, ideias, crenças, sistemas de pensamentos e tradições de diferentes grupos sociais, gangues, povos e etnias. Cabe à geografia, a partir destas categorias, compreender os espaços físico e humano como um local unificado e totalizante. Por meio do ensino, professores e alunos poderão entender que o espaço, a paisagem, o lugar, a região e o território são construídos e que os processos resultantes devem ser abordados de forma que possam promover um estudo mais amplo de questões sociais, econômicas, políticas e ambientais. Com estes conceitos, além de você entender melhor a sociedade, você aprenderá mais um pouco sobre o pensamento geográfico. Isto porque cada conceito que você conhecer está inserido em um contexto da construção do pensamento da geografia e não se esgota nessa definição, criando margem para a realização de amplos debates. Antes de você conhecer a fundo cada um dos conceitos fundamentais da geografia e suas respectivas caracterizações, torna-se essencial contextualizar a geografia na proposta dos Parâmetros Curriculares Nacionais. De início, você precisa saber que os Parâmetros Curriculares Nacionais devem servir de apoio às discussões e ao desenvolvimento do projeto educativo de sua escola. Além disto, os PCNs devem estar presentes na reflexão sobre sua prática pedagógica, no planejamento de suas aulas e na análise e seleção de materiais didáticos e de recursos tecnológicos para que possam contribuir para sua formação e atualização profissional. 34 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS A geografia, na proposta dos PCNs (BRASIL, 1998), tem um tratamento específico como área. Isto porque oferece os instrumentos essenciais para a compreensão da realidade social e a intervenção nessa realidade. Assim, por meio dela, podemos compreender como diferentes sociedades interagem com a natureza na construção de seu espaço, as singularidades do lugar em que vivemos, o que o diferencia e o aproxima de outros lugares e, assim, adquirir uma consciência maior dos vínculos afetivos e de identidade que estabelecemos com ele. Também podemosconhecer as múltiplas relações de um lugar com outros lugares, distantes no tempo e no espaço, e perceber as relações do passado com o presente. (BRASIL, 1998, p. 15). É importante que você compreenda cada conceito fundamental que compõe a geografia e dê conta de aplicar sua definição a uma realidade. Isto possibilita seu estudo com maior propriedade e entendimento. Independente da área de estudo, os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997, p. 7-8) indicam, como objetivos do Ensino Fundamental, que os alunos sejam capazes de: • Compreender a cidadania como participação social e política, assim como exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais, adotando, no dia a dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito. • Posicionar-se de maneira crítica, responsável e construtiva nas diferentes situações sociais, utilizando o diálogo como forma de mediar conflitos e de tomar decisões coletivas. • Conhecer características fundamentais do Brasil nas dimensões sociais, materiais e culturais como meio para construir progressivamente a noção de identidade nacional e pessoal e o sentimento de pertinência ao país. • Conhecer e valorizar a pluralidade do patrimônio sociocultural brasileiro, bem como aspectos socioculturais de outros povos e nações, posicionando-se contra qualquer discriminação baseada em diferenças culturais, de classe social, de crenças, de sexo, de etnia ou outras características individuais e sociais. 35 Os COnCeitOs Fundamentais da GeOGraFia e Os PCns Capítulo 2 • Perceber-se integrante, dependente e agente transformador do ambiente, identificando seus elementos e as interações entre eles, contribuindo ativamente para a melhoria do meio ambiente. • Desenvolver o conhecimento ajustado de si mesmo e o sentimento de confiança em suas capacidades afetiva, física, cognitiva, ética, estética, de inter-relação pessoal e de inserção social, para agir com perseverança na busca de conhecimento e no exercício da cidadania. • Conhecer o próprio corpo e dele cuidar, valorizando e adotando hábitos saudáveis como um dos aspectos básicos da qualidade de vida e agindo com responsabilidade em relação à sua saúde e à saúde coletiva. • Utilizar as diferentes linguagens – verbal, musical, matemática, gráfica, plástica e corporal –, como meio para produzir, expressar e comunicar suas idéias, interpretar e usufruir das produções culturais, em contextos públicos e privados, atendendo a diferentes intenções e situações de comunicação. • Saber utilizar diferentes fontes de informação e recursos tecnológicos para adquirir e construir conhecimentos. • Questionar a realidade formulando-se problemas e tratando de resolvê- los, utilizando para isso o pensamento lógico, a criatividade, a intuição, a capacidade de análise crítica, selecionando procedimentos e verificando sua adequação. Pensamos que você já saiba que a geografia é uma área de conhecimento comprometida em tornar o mundo compreensível para os alunos, explicável e passível de transformações. Neste contexto, a geografia assume grande relevância nos Parâmetros Curriculares Nacionais, pois as temáticas com as quais trabalha na atualidade encontram-se permeadas pela busca de um ensino voltado para a conquista da cidadania brasileira. (BRASIL, 1998). De uma maneira bem prática, é importante destacar que os Parâmetros Curriculares Nacionais de geografia propõem um trabalho pedagógico com os seguintes propósitos: “ampliação das capacidades dos alunos do ensino fundamental de observar, conhecer, explicar, comparar e representar as características do lugar em que vivem e de diferentes paisagens e espaços geográficos.” (BRASIL, 1998, p. 15). Para que o trabalho pedagógico seja realizado com êxito, nós, professores, devemos dar subsídio aos alunos para que, ao longo do Ensino Fundamental, construam um conjunto de conhecimentos referentes a conceitos, procedimentos 36 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS e atitudes relacionados à geografia. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998, p. 34-35), esse conjunto de conhecimentos deve permitir que os alunos sejam capazes de: • Conhecer o mundo atual em sua diversidade, favorecendo a compreensão de como as paisagens, os lugares e os territórios se constroem; • Identificar e avaliar as ações dos homens em sociedade e suas conseqüências em diferentes espaços e tempos, de modo que construam referenciais que possibilitem uma participação propositiva e reativa nas questões socioambientais locais; • Conhecer o funcionamento da natureza em suas múltiplas relações, de modo que compreendam o papel das sociedades na construção do território, da paisagem e do lugar; • Compreender a espacialidade e temporalidade dos fenômenos geográficos estudados em suas dinâmicas e interações; • Compreender que as melhorias nas condições de vida, os direitos políticos, os avanços tecnológicos e as transformações socioculturais são conquistas ainda não usufruídas por todos os seres humanos e, dentro de suas possibilidades, empenhar-se em democratizá-las; • Conhecer e saber utilizar procedimentos de pesquisa da Geografia para compreender a paisagem, o território e o lugar, seus processos de construção, identificando suas relações, problemas e contradições; • Orientá-los a compreender a importância das diferentes linguagens na leitura da paisagem, desde as imagens, música e literatura de dados e de documentos de diferentes fontes de informação, de modo que interpretem, analisem e relacionem informações sobre o espaço; • Saber utilizar a linguagem gráfica para obter informações e representar a espacialidade dos fenômenos geográficos; • Valorizar o patrimônio sociocultural e respeitar a sócio-diversidade, reconhecendo-os como direitos dos povos e indivíduos e elementos de fortalecimento da democracia. 37 Os COnCeitOs Fundamentais da GeOGraFia e Os PCns Capítulo 2 Atividade de Estudos: 1) Conforme você estudou, os Parâmetros Curriculares Nacionais indicam os objetivos do Ensino Fundamental, ou seja, o que os alunos devem ser capazes de realizar ao concluí-lo. A seguir, estão dois objetivos listados e você deve explicar cada um deles aproximando-os do conteúdo da geografia como disciplina de ensino: a) Posicionar-se de maneira crítica, responsável e construtiva nas diferentes situações sociais, utilizando o diálogo como forma de mediar conflitos e de tomar decisões coletivas. ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ b) Conhecer características fundamentais do Brasil nas dimensões sociais, materiais e culturais como meio para construir progressivamente a noção de identidade nacional e pessoal e o sentimento de pertinência ao país. ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ Agora, vamos retomar ao assunto apresentado no início deste capítulo e que merece um maior aprofundamento conforme foi dito: os conceitos fundamentais da geografia! Vale lembrar, mais uma vez, que, ao criar situações de aprendizagem que usem o seu cotidiano, o aluno perceberá que a geografia está presente no seu dia-dia. Assim, a partir da vida do aluno, o professor deve contextualizar o que será aplicado e buscar novos métodos de ensino. Reforçamos, desta forma, a postura dialética do professor mediador, estimulando no aluno o interesse e o empenho pelas novas descobertas e construindo em conjuntoo seu aprendizado para que ele viva a geografia como um conhecimento dinâmico presente em sua vida. 38 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS Para um processo de ensino-aprendizagem mais “eficiente”, aproxime o estudo das categorias e conceitos a exemplos que cabem no cotidiano em que o aluno está inserido. Isto facilitará para o aluno a apreensão do conteúdo ensinado. a) Espaço O primeiro conceito fundamental que devemos conhecer é o de ESPAÇO! Esta é a categoria geral, a categoria mais abrangente da geografia. Mas, para que você possa entender melhor esta categoria, nos remeteremos ao nosso dia- a-dia. Você já reparou em quantos momentos do seu dia você utiliza o conceito de espaço? Apostamos que em muitos momentos! Assim como em nossa rotina diária, a categoria espaço também pode ser utilizada na geografia em diversos momentos e maneiras de interpretação. Para você começar a entender, Santos (1997) afirma que o espaço é a acumulação desigual de tempos. Assim, “o espaço na Geografia deve ser considerado uma totalidade dinâmica em que interagem fatores naturais, sociais, econômicos e políticos”. (BRASIL, 1998, p. 27). Assim, por ser entendido como uma totalidade dinâmica, o espaço se transforma ao longo dos tempos históricos, e as pessoas redefinem suas formas de viver e de percebê-lo. Na geografia tradicional, o espaço não era conhecido como um conceito fundamental. No entanto, para Ratzel (apud DUARTE; MATIAS, 2005, p. 192), o espaço “era a base indispensável para a vida do homem”. Era no espaço que o homem constituía suas condições de trabalho. Em relação a esta ligação do homem com seu espaço de vida, Correa (1995) diz que o domínio deste elemento torna-se fundamental para a história e a sobrevivência humanas. A geografia tradicional caracteriza-se pelo conjunto de correntes do pensamento geográfico no período de 1870 a 1950. Foi nesse período que a geografia tornou-se disciplina nas universidades europeias. Por ser entendido como uma totalidade dinâmica, o espaço se transforma ao longo dos tempos históricos, e as pessoas redefinem suas formas de viver e de percebê-lo. 39 Os COnCeitOs Fundamentais da GeOGraFia e Os PCns Capítulo 2 Conforme descrevem os PCNs (BRASIL, 1998), os métodos e as teorias da geografia tradicional tornaram-se insuficientes para apreender a complexidade do espaço. Assim, a descrição – que era adotada como um dos principais métodos – tornou-se insuficiente para explicar tamanha complexidade; “era preciso realizar estudos voltados para a análise das ideologias políticas, econômicas e sociais”. (BRASIL, 1998, p. 21). Assim, a partir dos anos de 1960, surgiu uma tendência crítica à geografia tradicional, sob influência das teorias marxistas. Essa crítica tinha como centro de preocupações as relações entre a sociedade, o trabalho e a natureza na produção e apropriação dos lugares e territórios. Para entender melhor, essa nova perspectiva defendia que não bastava explicar o mundo: era preciso transformá- lo! Vale destacar que, para o aluno, o marxismo contribuiu para a compreensão e explicação do processo de produção do espaço. Um exemplo que pode auxiliar seu entendimento é a compreensão das desigualdades na distribuição da renda e da riqueza em seu espaço de manifestação repleto de contradições. Você deve se lembrar da importância de o aluno compreender as diferentes formas de as sociedades se organizarem para produzirem bens e serviços! Neste sentido, conforme destacam os PCNs (BRASIL, 1998), podemos apontar as seguintes categorias do marxismo como fundamentais para revelar ao aluno condições concretas do seu cotidiano na sociedade: • relações sociais de produção, • modos de produção, • meios de produção, • forças produtivas e • formação social. Porém, o que representou para o ensino essa nova perspectiva de interpretar o espaço? Essa nova perspectiva influenciou uma série de propostas curriculares. No entanto, essas propostas foram centradas basicamente em questões referentes a explicações econômicas e a relações de trabalho que se mostravam, pelo discurso que usavam, inadequadas para os alunos distantes de tal complexidade nessa etapa da escolaridade (BRASIL, 1998, p. 22). 40 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS Na década de 1970, o conceito de espaço apareceu como um conceito-chave da geografia, e uma das maiores preocupações compreendia a identificação das categorias de análise do espaço. Em resumo, os geógrafos desse período definiam espaço como o local de reprodução das relações sociais de produção. Por isso, você deve estar entendendo que não há uma generalização de características que compõem este conceito, pois cada realidade, cada local de reprodução da sociedade se configura em um conjunto de características únicas que compõem aquele determinado espaço. Desta maneira, devemos fazer com que os nossos alunos entendam o espaço em que vivem: o somatório e a relação entre os distintos fatores econômicos, sociais e políticos que organizam cada realidade vivida! Milton Santos foi um geógrafo que marcou o pensamento dessa época e definiu ainda, quatro categorias para analisar o espaço: forma, função, estrutura e processo. Leia mais sobre as quatro categorias de análise do espaço propostas por Milton Santos em: SANTOS, Milton. Espaço e método. São Paulo: Nobel, 1985. Em um momento seguinte, já mais próximo aos dias atuais, a categoria do espaço ganhou um entendimento a mais ao aceitar, em sua conceituação, a presença do espaço abstrato, centrado a partir da experiência. Um dos principais autores para esta perspectiva, Tuan (1983), apresenta como exemplo desse pensamento o espaço pessoal, o espaço mítico, entre outros que respondem ao sentimento e à imaginação das necessidades humanas essenciais. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998), na geografia, falar do imaginário significa procurar compreender os espaços subjetivos, ou seja, tentar entender os mapas mentais que as pessoas constroem para se orientarem no mundo. É fundamental esclarecer que o conceito de imaginário, para efeito de nosso estudo, está relacionado ao conceito de representações. Milton Santos foi um geógrafo que marcou o pensamento definiu ainda, quatro categorias para analisar o espaço: forma, função, estrutura e processo. 41 Os COnCeitOs Fundamentais da GeOGraFia e Os PCns Capítulo 2 Assim, ao trabalhar com o imaginário no estudo do espaço, facilitamos a interlocução com o aluno e compreendemos o significado que as diferentes paisagens, lugares e coisas têm para ele. Em resumo, uma das características que os PCNs de geografia buscam para definir o corpo de conteúdos é a tendência conceitual de explicar para compreender. Como você pode perceber, a conceituação desta categoria realmente não se esgota! Busque novas referências para dar continuidade a este estudo, porque, agora, partiremos para entender a conceituação de outra categoria fundamental da geografia: a PAISAGEM. Atividade de Estudos: 1) Como vocês acabaram de estudar, com o passar do tempo e o registro de novas teorias, o conceito de representações passou a pertencer à categoria de ESPAÇO. Para exercitar, gostaríamos que você registrasse no papel a representação do ambiente em que vive. Pode ser o bairro, a rua, a cidade. O importante é “tirar” do imaginário e representar as relações conforme você as interpreta. ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ b) Paisagem Ao apresentara categoria paisagem, cabe destacar que todas as categorias fundamentais da geografia encontram-se relacionadas entre si e que seu pleno entendimento pode ser realizado por essa relação entre suas definições. Como exemplo, você aprendeu que, para Santos (1997), o espaço é a acumulação desigual de tempos. O mesmo autor, ao referir-se à paisagem, diz que esta é o resultado desta acumulação, o que reforça o caráter de complementaridade entre os conceitos sobre os quais estamos estudando! 42 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS Assim como a categoria espaço, a paisagem também sofreu alterações em seu entendimento conceitual. No ensino, a paisagem estava presente nos estudos somente da descrição, dissociada de sua representação para o homem no espaço. Em relação aos procedimentos didáticos adotados, estes promoviam, principalmente, a descrição e a memorização dos elementos que compõem as paisagens como dimensão de observação; “os alunos eram orientados a descrever, relacionar os fatos naturais e sociais, fazer analogias entre eles e elaborar suas generalizações ou sínteses.” (BRASIL, 1998, p. 22). Desta maneira, percebemos que a pretensão era ensinar uma geografia neutra, a geografia tradicional, pois as explicações sobre a paisagem deveriam estar livres de qualquer forma de compreensão ou subjetividade que confundisse ou influenciasse o observador. Com as novas correntes do pensamento geográfico e a presença da abordagem relacional, o objetivo da geografia de estudar as relações entre o processo histórico na formação das sociedades humanas e o funcionamento da natureza passou, a partir de sua paisagem, pela leitura do lugar, do território. Assim, na busca dessa abordagem relacional, trabalha com diferentes noções espaciais e temporais, bem como com os fenômenos sociais, culturais e naturais característicos de cada paisagem, para permitir uma compreensão processual e dinâmica de sua constituição, para identificar e relacionar aquilo que, na paisagem, representa as heranças das sucessivas relações no tempo entre a sociedade e a natureza em sua interação. (BRASIL, 1998, p. 26). Para você estudar, então, a paisagem e, consequentemente, ensinar a aprender o que entendeu por paisagem, deve sempre se lembrar de que a paisagem é o aspecto formal originado do produto da sociedade em um momento de sua organização. (CARLOS, 1979). Esta categoria tem um caráter específico para a geografia! De acordo com os PCNs, a paisagem é uma unidade visível do território que possui identidade visual; é caracterizada por fatores de ordem social, cultural e natural, bem como contém espaços e tempos distintos. (BRASIL, 1998). A paisagem é o velho no novo e o novo no velho! A paisagem é o aspecto formal originado do produto da sociedade em um momento de sua organização. (CARLOS, 1979). 43 Os COnCeitOs Fundamentais da GeOGraFia e Os PCns Capítulo 2 Santos (1988), de uma maneira mais clara, define a paisagem como tudo aquilo que nós vemos, o que a nossa visão é capaz de alcançar. Ao falarmos da paisagem de uma cidade, por exemplo, estaremos nos referindo ao seu relevo, a sua rede hidrográfica, as suas vias pavimentadas, às construções, à distribuição de sua população e suas marcas, entre outros aspectos. Nessa paisagem, está expressa a história de uma sociedade, o acúmulo de suas marcas ao longo do tempo. Será que você consegue perceber o caráter particular de uma resposta para a definição de uma determinada paisagem? A paisagem é sempre heterogênea e se configura por acréscimos e substituições. (SANTOS, 1988). Além disto, cada vez que a sociedade passa por mudanças, sejam estruturais ou conjunturais, em ritmo e intensidade variados, a paisagem se transforma para adaptar-se a essas novas necessidades. Neste sentido, a análise da paisagem deve focar as dinâmicas de suas transformações, e não apenas a descrição e o estudo de uma realidade aparentemente estática. Conforme destacam os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998), para o trabalho em sala de aula, a análise da paisagem requer a compreensão da dinâmica entre os processos sociais, físicos e biológicos inseridos em distintos contextos. A preocupação básica é “abranger os modos de produzir, de existir e de perceber os diferentes lugares e territórios como os fenômenos que constituem essas paisagens e interagem com a vida que os anima”. (BRASIL, 1998, p. 27). Assim, torna-se imprescindível observar e tentar explicar o que permaneceu ou foi alterado em determinada paisagem, isto é, os elementos do passado e do presente que ali convivem. Para você entender e refletir! Espaço e paisagem são conceitos distintos: PAISAGEM é a materialização de um dado momento da sociedade, e o ESPAÇO resulta da relação entre a sociedade e a paisagem. 44 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS c) Lugar A terceira categoria fundamental da geografia que você conhecerá agora é LUGAR. Conhecendo esta categoria, você também conhecerá seu conceito em distintos momentos do pensamento geográfico e seu papel no ensino da nossa disciplina! Inicialmente, na geografia tradicional, as categorias lugar e região eram vistas como dimensão objetiva que resultava da interação entre o homem e a natureza. Mas, atualmente, estas categorias estão sendo vistas (e estudadas) em uma nova dimensão. Assim, o lugar deixou de ser simplesmente o espaço em que ocorrem interações entre o homem e a natureza para incorporar as representações simbólicas que constroem juntamente com a materialidade dos lugares e com as quais também interagem. (BRASIL, 1998, p. 19). Outra vez Santos (1997) nos auxilia a entender o conceito de lugar ao afirmar que cada lugar é, à sua maneira, o mundo. Assim, o lugar pode ser entendido como um local determinado de um complexo de relações, como uma localidade onde se encontram concentradas combinações de variáveis sociais. Leia mais sobre o estudo e a interpretação da categoria lugar e seus desdobramentos em O lugar no/do mundo, de Ana Fani A. Carlos. São Paulo, Hucitec, 1996. É importante que você saiba que a categoria lugar está relacionada à categoria paisagem, pois o sentimento de pertencer a um território e a sua paisagem significa fazer deles o seu lugar de vida e estabelecer uma identidade com eles. De certa forma, podemos afirmar que o lugar possui identidade! Neste contexto, a categoria lugar traduz os espaços com os quais as pessoas têm vínculos afetivos: uma praça onde se brinca desde criança, a janela de onde se vê a rua, o alto de uma colina de onde se avista a cidade. O lugar é onde estão as referências pessoais e o sistema de valores que direcionam as diferentes formas de perceber e constituir a paisagem e o espaço geográfico. É por intermédio dos lugares que se dá a comunicação entre homem e mundo. (BRASIL, 1998, p. 19). O lugar pode ser entendido como um local determinado de um complexo de relações, como uma localidade onde se encontram concentradas combinações de variáveis sociais. 45 Os COnCeitOs Fundamentais da GeOGraFia e Os PCns Capítulo 2 Assim, o lugar é o universo em que o aluno vive! Seja ele grande ou pequeno, é onde nossos alunos se sentem “em casa”. d) Região O conceito de região, em sua dimensão territorial, por muito tempo, marcou os estudos de geografia. Fazer geografia era “explicar a diversidade regional do mundo como território, com a pretensão de encontrar alguns princípios gerais que explicassem sua diversidade regional.” (BRASIL, 1998, p. 20). Por algum período, o conceito de região parecia estar esquecido. No entanto, neste momento atual em que a globalização é um assunto presente, reaparece um forte interesse em estudar as regiões, entendidas como os lugares que mantêm uma interação solidária na busca de autonomia e identidade. Para esclarecer um pouco mais, Gomes (1995) afirmaque a região pode ser compreendida como o território ocupado, com uma organização do espaço desenvolvida determinando um modo de vida. Assim, podemos entender que a região é o lugar ao qual pertencemos, o lugar estruturado. Vidal de La Blache, com outros estudiosos da época, denominaram região como uma unidade de análise geográfica, um dado da realidade que exprimia a forma de os homens se organizarem no espaço. Assim, a nossa função seria descrever, explicar e delimitar esse recorte espacial. Leia mais sobre o conceito de região no texto O conceito de região e sua discussão, de Paulo César de Castro Gomes, no livro Geografia: conceitos e temas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1995. p. 49-76. A noção de região é bastante complexa. Por isso, refletiremos sobre alguns assuntos relacionados a este conceito! Vale a pena estender esta discussão a seus alunos em sala de aula! • Atualmente, a realidade aparece cada vez mais como homogênea, anulando aparentemente, as diferenças. Estas diferenças emergem da homogeneidade como manifestações de regionalismo político, cultural e religioso. Gomes (1995) afirma que a região pode ser compreendida como o território ocupado, com uma organização do espaço desenvolvida determinando um modo de vida. 46 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS • Devido à proximidade da noção de região com a de planejamento, há uma desmontagem dos planos de desenvolvimento regional enfraquecendo a noção de região. • A multiplicidade de estudos regionais banaliza o estudo do conceito. • A discussão a respeito da noção de região coloca a questão da unidade geográfica. e) Território Em uma aproximação entre as categorias, podemos afirmar que a categoria paisagem possui uma relação estreita com a categoria território (que veremos ainda neste capítulo). Pode, até mesmo, ser considerada como o conjunto de paisagens. É algo criado pelos homens; é uma forma de apropriação da natureza. Inicialmente, esta categoria estava presente nos estudos biológicos do final do século XVIII. Nesse momento, o território era definido como uma área onde uma espécie desempenhava todas as funções vitais para o seu desenvolvimento. Assim, o território era entendido como “o domínio que os animais e as plantas têm sobre porções da superfície terrestre.” (BRASIL, 1998, p. 27). Vamos ver como dois importantes estudiosos da geografia entendiam o conceito de território? Augusto Comte, por meio de estudos comportamentais, incorporou a categoria território aos estudos da sociedade. Ratzel (apud DUARTE; MATIAS, 2005) definiu o território como uma apropriação do espaço. Neste sentido, o território, para as sociedades humanas, seria representado pela identificação de posse em determinada parcela do espaço. Souza (1995) considera o território como um espaço definido e delimitado a partir de relações de poder. Na geografia política, o território surge como o espaço concreto em si, composto por suas características naturais, construído e apropriado por um grupo social. Nesta área, o território pode ser entendido, também, como um conceito político base para explicar fenômenos geográficos relacionados à organização da sociedade e suas interações com as paisagens. O território, para as sociedades humanas, seria representado pela identificação de posse em determinada parcela do espaço. 47 Os COnCeitOs Fundamentais da GeOGraFia e Os PCns Capítulo 2 O território é uma categoria fundamental quando estudamos a sua conceitualização ligada à formação econômica e social de uma nação. Neste sentido, é o trabalho que qualifica o território como produto do trabalho social. (BRASIL, 1998, p. 27-28) É importante você saber que tão relevante quanto compreender a categoria de território é compreender a complexidade de convivência em um mesmo espaço! Na realidade brasileira, por exemplo, o sentimento de pertinência ao território nacional envolve a compreensão da diversidade das culturas que aqui convivem e que, mais do que nunca, buscam o reconhecimento de suas especificidades. (BRASIL, 1998). Assim, conforme destaca Souza (1995), ocupação do território gera raízes e identidade. Desta forma, um grupo não pode ser entendido sem o território que ocupa, pois sua identidade sociocultural está associada às características do “concreto” no qual está instalado. Albagli (2004) vai mais além e detalha que a formação, a dinâmica e a diferenciação dos territórios estão vinculadas a uma variedade de dimensões, como: • Dimensão física: suas características geológicas e recursos naturais e aquelas resultantes dos usos e práticas dos atores sociais. • Dimensão econômica: formas de organização espacial dos processos sociais de produção, de consumo e de comercialização. • Dimensão simbólica: conjunto específico de relações culturais e afetivas entre um grupo e lugares particulares. • Dimensão sociopolítica: meio para interações sociais e relações de dominação e poder. Nos Parâmetros Curriculares Nacionais, você encontra uma dica fundamental para nós, professores de geografia: a importância da diferenciação entre o conceito de território e territorialidade! Vamos entender essa diferença? Conforme você acabou de estudar, o território refere-se a um campo específico de estudo da geografia. Ele é representado 48 CurrÍCuLoS dE GEoGrAfiA E oS PArâmETroS CurriCuLArES nACionAiS por um sistema de objetos fixos e móveis, como, por exemplo, o sistema viário urbano representando o fixo e o conjunto dos transportes como os móveis. Ambos constituem uma unidade indissolúvel, mas que não se confundem. Outro exemplo pode ser a unidade formada pela moradia com a população. No limite mais abstrato, o da indústria e do fluxo de trabalhadores. (BRASIL, 1998, p. 28). Quanto ao conceito de territorialidade, podemos afirmar que complementa o conceito de território. Isto porque representa a condição necessária para a existência da sociedade como um todo, um sistema de comportamento. Assim, o conceito de territorialidade refere-se “às relações entre um indivíduo ou grupo social e seu meio de referência, manifestando-se nas várias escalas geográficas [...] e expressando um sentimento de pertencimento e um modo de agir no âmbito de um dado espaço geográfico.” (ALBAGLI, 2004, p.28). Atividade de Estudos: Agora que você conheceu os conceitos fundamentais da geografia, apresente a diferenciação entre REGIÃO e TERRITÓRIO. ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ALGumAS ConSidErAçõES Neste capítulo, buscamos aproximar você dos conceitos fundamentais que compõem a geografia e contextualizá-los nos Parâmetros Curriculares Nacionais. Assim, você será capaz de trabalhar de maneira adequada cada um dos conceitos aprendidos nas situações e temáticas apresentadas em sala de aula. 49 Os COnCeitOs Fundamentais da GeOGraFia e Os PCns Capítulo 2 Além disto, buscamos mostrar, mais uma vez, a importância de aproximar os conceitos da realidade por meio de exemplos que ilustram a teoria e facilitam a compreensão de cada um dos conceitos trabalhados. Isto tudo sempre acompanhado de dicas de leitura para aprofundar ainda mais seus estudos. Com isto, você adquiriu mais bagagem de conhecimento
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