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Marcia A. G Molina Tópicos de Redação e Gramática para cursos de Engenharia Marcia A. G Molina Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia Coordenação Editorial: Kátia Ayache Costa Revisão Final: Kátia Ayache Diagramação: André Fonseca Todos os direitos desta edição são reservados à Seleto Editorial Jundiaí - SP seletoeditorial.com.br contato@seletoeditorial.com.br Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Molina, Marcia A. G Tópicos de Redação e Gramática para cursos de Engenharia | Marcia A. G Molina Jundiaí: Seleto Editorial, 2020. 96p. 14x21cm ISBN 978- I. II. III. CDD: Aos meus grandes amores: marido, filhas e netos... Uma língua é um lugar donde se vê o mundo e em que se traçam os limites do nosso pensar e sentir. (Vergílio Ferreira) SUMÁRIO Capítulo 1 Comunicação e Linguagem....................................................13 1. Linguagem e línguas.....................................................13 2. Processos de comunicação.............................................14 3. Elementos da comunicação...........................................14 3.1 Código e mensagem...............................................14 3.2. O referente............................................................14 3.3. O canal de comunicação........................................14 3.4. O esquema da comunicação..................................15 4. As funções da linguagem..........................................15 Capítulo 2 Texto e textualidade................................................................19 1. Coesão...........................................................................22 2. Coerência.......................................................................23 Capítulo 3 As superestruturas textuais....................................................25 (ou tipologias textuais) 25 1. O texto descritivo..........................................................26 3.1.1. Características do texto descritivo......................28 2. O texto narrativo...........................................................32 2.1. Características do texto narrativo..........................34 3. O texto dissertativo.......................................................37 3.1. Características da dissertação................................38 3.2. Dissertação expositiva...........................................38 3.3. Dissertação Argumentativa...................................39 3.4. Organização do texto dissertativo..........................40 4. Injunção........................................................................46 4.1. Características do texto injuntivo..........................46 Capítulo 4 A constituição do texto...........................................................49 1. Relembrando a noção de texto .....................................49 1.1. Texto e textualidade...............................................49 1.2. A Intertextualidade...............................................50 2.1. A paródia...............................................................51 1.2.2. A paráfrase.........................................................53 1.2.3. A estilização.......................................................55 1.2.4. A apropriação.....................................................57 Capítulo 5 Do texto ao gênero.................................................................59 Capítulo 6 Os gêneros das engenharias.....................................................63 1. O relatório técnico.........................................................63 2. Laudo Técnico...............................................................65 3. Projetos Técnicos...........................................................69 Capítulo 7 Tópicos de Língua Portuguesa................................................73 1. Regência verbal.............................................................73 2. Concordância verbal......................................................75 3. Dificuldades ortográficas...............................................79 4. Tópicos a respeito da utilização do sinal indicativo da crase................................................85 Considerações finais................................................................89 Referências............................................................................91 Márcia A. G Molina 11 Nosso objetivo neste trabalho é sintetizar alguns conceitos relevantes de redação e gramática de Língua Portuguesa para auxiliar nossos futuros engenheiros na e para a produção de tex- tos, oferecendo-lhes também uma orientação de como elaborar determinadas superestruturas e gêneros textuais específicos de sua área, pontuando algumas questões de gramática de Língua Portuguesa – aquelas que, normalmente, trazem dúvidas aos que fazem uso do padrão culto. Dessa forma, sublinhamos que esta obra não tem a pretensão de ser qualquer tratado; ao contrário, pressupondo que o aluno universitário já traz da educação básica determinados saberes em relação à redação e gramática, frisaremos aqui apenas os conteú- dos que, ao longo de nossa docência com alunos da área, temos visto ainda apresentarem dúvidas aos estudantes, e somaremos tópicos de redação e forneceremos noções específicas da área técnica a que se destina. O trabalho embasa-se em obras dos mais renomados estudio- sos da Linguística, como Jakobson (s/d) e Vanoye (1998); dos mais importantes estudiosos da Linguística de texto, como Fáve- ro (1999), Kock (1997), Guimarães (2004) e Fiorin (2003); e, em relação à Língua Portuguesa, estudiosos como Bechara (2006) e Lindley e Cintra (2004). Os conteúdos estão assim organizados: inicialmente, discu- tiremos a questão de Língua e Linguagem, depois os elementos da comunicação e, embasados neles, as Funções da Linguagem. Partiremos depois para as noções de texto, textualidade, coesão e coerência, para, em seguida, apresentarmos as superestruturas textuais tradicionalmente reconhecidas: descrição, narração, dis- sertação e injunção. Num outro capítulo, depois de uma revisão de texto e textualidade, apresentaremos a noção de intertextuali- dade, compreendendo a de paródia, paráfrase, estilização e apro- priação, para, então, partirmos para orientações acerca de gênero, Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 12 adentrando nos da engenharia: relatório técnico, relatório de visita, laudo e projeto. Finalmente, forneceremos alguns tópi- cos gramaticais para orientá-los em relação ao padrão culto da Língua Portuguesa, em especial: concordância e regência verbal, ortografia e alguns (poucos) pontos de crase e acentuação. A seleção desses conteúdos deve-se à sua relevância como ponto de partida para os demais textos, embora urja salientarmos que, numa obra simples como a nossa, não temos a pretensão de traçar todas as diretrizes possíveis para o bom desenvolvimento de competência escrita. Pelo contrário, apresentamos aqui, como já falado, apenas um roteiro, um caminho inicial que deverá ser percorrido pelo próprio aluno e desvendado à medida que seu conhecimento sobre a língua e sobre a área for ampliado. Assim, esperamos que este material, desenvolvido a partir de alguns trabalhos anteriormente por nós produzidos, possa con- tribuir para a melhoria da competência escrita de nossos futuros profissionais. Bom trabalho a todos. Profa. Dra. Márcia A.G. Molina 13 CAPÍTULO 1 Comunicação e Linguagem Muitos autores costumam definir comunicação como “transmissão voluntária de informação” (RIEGEL, s/d, p. 21). Como se procede, então, essa transmissão? Claro que por meio da linguagem. Émile Benveniste assevera que a linguagem é um sistema de signos socializados, remeten- do-nos à sua função de comunicação. Vale salientar que, para que exista comunicação, as pessoas envolvidas no processo precisam fazer uso de um código co- mum, quer dizer, devem “falar a mesma língua”. Isso significaque só há comunicação quando um entende o outro. 1. Linguagem e línguas As línguas são, de acordo com Vanoye (1998, p. 21), “casos particulares de um fenômeno geral”, ou seja, a linguagem é o todo, todas as formas de comunicação, e comporta vários códi- gos, como cores, signos, assobios, código morse etc.; já as línguas são um tipo específico de linguagem. Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 14 2. Processos de comunicação A comunicação pressupõe sempre a existência de dois polos (aquele que emite a informação e aquele que a recebe): emissor/ receptor, locutor/alocutário, ouvinte/leitor etc. O veículo utiliza- do para a comunicação pode fazer com que esses papéis sejam intercambiáveis ou não. É importante frisarmos que, para que haja comunicação, deve haver sempre, e pelo menos, dois seres envolvidos fazendo uso dos elementos da comunicação. 3. Elementos da comunicação 3.1 Código e mensagem O emissor e o receptor, como já foi dito, devem dispor do mesmo código, ou seja, do mesmo sistema de signos, a fim de que a informação possa ser recebida e decodificada pelo receptor. Essa informação decodificada é a mensagem. 3.2. O referente Riegel (opus cit., p. 22) assevera que: Os signos do código remetem à realidade tal qual é per- cebida pelo emissor e pelo receptor. O aspecto específico dessa realidade, que é evocada por um signo do código, é o referente desse signo. O universo referencial, exterior ao código, compreende tudo aquilo que pode ser designa- do pelos signos e suas combinações: seres, coisas, estados, acontecimentos, idéias, etc. 3.3. O canal de comunicação É necessário um meio físico para que a mensagem possa ser veiculada para o interlocutor, ao qual damos o nome de canal de Márcia A. G Molina 15 comunicação. São canais de comunicação o ar, um CD, um cabo, um telefone etc. 3.4. O esquema da comunicação A somatória desses elementos resulta no seguinte esquema, que apresenta os elementos indispensáveis para a comunicação: 4. As funções da linguagem A linguagem, de acordo com Jakobson (s/d, p. 122), “tem toda a variedade de suas funções”. Antes, porém, propõe que recorde- mos que o remetente envia uma mensagem a um destinatário. Para que possa ser transmitida, a mensagem requer um contexto (ou referente) apreensível pelo destinatário e que seja verbal ou passível de verbalização, um código comum ao remetente e des- tinatário (parcial ou totalmente) e, finalmente, um contato, ou seja, um canal físico por meio do qual possa ser veiculada. Cada um desses seis elementos encerra funções diferentes na linguagem: Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 16 CONTEXTO 1) Função referencial CANAL 2) Função fática EMISSOR MENSAGEM RECEPTOR 3) Função emotiva 4) Função poética 5) Função conativa CÓDIGO 6) Metalinguagem Apesar de serem seis elementos e, portanto, seis funções da linguagem, normalmente as mensagens comportam mais de uma função, havendo uma predominante, mas não exclusiva. Deve-se ressaltar que a estrutura da mensagem depende des- sa função predominante. Assim, a função referencial (também chamada de denotativa) está centrada no contexto (referente). Tudo o que se refere aos contextos situacionais ou textuais per- tencem a essa função. Ex.: Prefeitura libera a pista expressa da Marginal Pinheiros. (Folha de São Paulo, 16 de janeiro de 2007). Quando a mensagem está centrada no canal, falamos da fun- ção fática. Temos nesse caso tudo o que serve para, numa comu- nicação, estabelecer, manter ou encerrar o contato. Ex.: Alô, alô, responde... Responde... Já quando a mensagem prioriza o emissor, revelando sua per- sonalidade, estamos à frente da função emotiva (ou expressiva). Por exemplo: Márcia A. G Molina 17 Não serei o poeta de um mundo caduco. Também não cantarei o mundo futuro. Estou preso à vida e olho meus companheiros. Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças. Entre eles considero a enorme realidade. O presente é tão grande, não nos afastemos. Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas. (Carlos Drummond de Andrade) A função poética é aquela em que a prioridade está na própria mensagem, colocando em destaque o “lado palpável dos signos” ( Jakobson, opus cit.). Por exemplo: Vozes veladas, veludosas vozes, Volúpias dos violões, vozes veladas, Vagam nos velhos vórtices velozes Dos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas. (Cruz e Souza) Quando ocorre a orientação para o receptor (destinatário) temos a função conativa. Por isso, nessa função é comum obser- vamos o emprego de verbos no modo imperativo e de vocativos e ponto de exclamação. Ex.: Assine uma TV a cabo agora e co- mece a pagar somente depois do Carnaval. Finalmente, quando é dada especial relevância ao código, es- tamos à frente da função metalinguística. Ex.: Quando falamos de funções da linguagem, queremos dizer da possibilidade que tem a língua de, de acordo com a intenção do falante, dar espe- cial destaque a determinados elementos da comunicação. Nesse caso, usamos a língua para explicar a própria língua. Muitas vezes assistimos a um filme que nos mostra uma cena em que a personagem assiste a um filme... Um filme falando de um filme... Metalinguagem. Citamos como exemplo o filme: O jo- Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 18 gador, de 1992. Para saber mais, veja: https://www.youtube.com/ watch?v=WD4yWxOsI0Q. Com o grande desenvolvimento dos meios de comunica- ção, o conceito de funções da linguagem passou a ganhar ou- tra dimensão, chegando às comunicações de massa em mea- dos do século XX. Já para o final desse século, com o grande desenvolvimento da internet, sobretudo com a propagação dos meios de comunicação individual e os computadores de bolso, a comunicação, de acordo com Lévy, amplia-se da relação eu x tu para eu x mundo, eu x para quem e com quem eu puder me comunicar, para quem eu possa enviar textos. 19 CAPÍTULO 2 Texto e textualidade Texto, etimologicamente, quer dizer tecido, ou seja, trata-se de uma trama onde se deve enredar as palavras. Hoje, o Míni Houaiss (2001, p. 508) traz a seguinte definição para o termo: s.m. 1. Conjunto de palavras, frases escritas; 2. Trecho ou fragmento de obra de um autor; 3 qualquer material es- crito destinado a ser falado ou lido em voz alta (...) A Linguística do Discurso procura estudar os textos como “manifestações linguísticas produzidas por indivíduos concretos em situações concretas, sob determinadas condições de produção” (Kock, 1997, p.11), entendendo-os numa situação interacionista. Para que melhor possamos compreendê-los nessa perspecti- va, analisemos as sequências a seguir: Para calar a boca: Rícino Pra lavar a roupa: Omo Para viagem longa: Jato Para difíceis contas: Calculadora Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 20 Para o pneu na lona: Jacaré Para a pantalona: Nesga Para pular a onda: Litoral Para lápis ter ponta: Apontador Para o Pará e o Amazonas: Látex (...) Para Adidas o Conga: Nacional Para o outono a folha: Exclusão (...) Para os dias de folga: Namorado Para o automóvel que capota: Guincho Para fechar uma aposta: Paraninfo Para quem se comporta: Brinde Para a mulher que aborta: Repouso Para saber a resposta: Vide - o – Verso Para escolher a compota: Jundiaí Para a menina que engorda: Hipofagi (...) Para a água lá na poça Para a mesa que vai ser posta Para você o que você gosta Diariamente Ouça a música toda, belíssima, em: https://www.youtube. com/watch?v=OnKp6PvuSyw. Num primeiro momento, temos a impressão de que se trata de um amontoado de frases pouco significativas. Contudo, se a inserirmos em seu contexto, passamos a entendê-la como texto. Para melhor esclarecer, vale dizer que a sequência acima é uma composição de Nando Reis, gravada por Marisa Monte, intitu- lada “Diariamente”, em que o autor relata os fatos do cotidiano de uma pessoa que vivenuma região urbana, possivelmente na cidade de São Paulo. Márcia A. G Molina 21 O mesmo ocorre com a seguinte sequência: Por que você é Flamengo? E meu pai Botafogo? O que significa “Impávido Colosso”? Por que os ossos doem? Enquanto a gente dorme? Por que os dentes caem? Por onde os filhos saem? Por que os dedos murcham? Quando estou no banho? Por que as ruas enchem? Quando está chovendo? Quanto é mil trilhões? Vezes infinito? Well, well, well, Gabriel. (…) Ouça a música toda em: https://www.youtube.com/wat- ch?v=_mBVBV8yX3E. Novamente, se não reconhecermos a sequência, inadvertidamen- te podemos julgá-la um amontado de perguntas sem nexo e, portan- to, um não-texto. Contudo, temos aqui a letra de uma composição que Paula Toler dedicou a seu filho Gabriel, com as perguntas que ele, costumeiramente, quando criança, lhe fazia. A música chama-se “Oito anos” e foi gravada por Adriana Calcanhoto. Agora, prestemos atenção a esse segmento: On peut vivre sans richesse Presque sans le sou Des seigneurs et des princesses Y’en a plus beaucoup Mais vivre sans tendresse On ne le pourrait pas Non, non, non, non On ne le pourrait pas Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 22 A sequência acima só será texto para aqueles que dominam a língua em que foi escrita: francês. Os demais reconhecerão a sequência, mas como não interagem com ela, não conseguindo depreender-lhe um sentido, será um não-texto. Na realidade, tra- ta-se do primeiro verso da letra de canção “Tendresse”, interpre- tada por Marie Laforêt. Ouça-a em: https://www.vagalume.com. br/laforet-marie/la-tendresse-traducao.html. Nesse sentido, como falamos, seguindo os passos de Kock e Travaglia (1990, p. 10), podemos compreender texto como: Uma unidade linguística concreta (perceptível pela visão ou audição), que é tomada pelos usuários da língua (fa- lante, escritor/ouvinte, leitor), em uma situação de intera- ção comunicativa, como uma unidade de sentido e como preenchendo uma função comunicativa reconhecível e reconhecida, independentemente da sua extensão. A respeito da textualidade, esta pode ser compreendida como “aquilo que converte uma sequência linguística em texto” (idem, p. 45), isto é, ser todo, coeso e coerente para seus usuários. Veja- mos agora, brevemente, o que é coesão e coerência. 1. COESÃO Fávero (1999, p. 10) assim define coesão: A coesão, manifestada no nível microtextual, refere-se aos modos como os componentes do universo textual, isto é, as palavras que ouvimos ou vemos, estão ligados entre si dentro de uma sequência. Podemos dizer, portanto, que coesão é o nome com que designamos as estratégias de ligação utilizadas num texto para Márcia A. G Molina 23 torná-lo todo, ou seja, o uso de elementos capazes de estabele- cer elos. Esses elos podem “amarrar” elementos mencionados ante- riormente no texto, ocorrendo então o que os estudiosos cha- mam de anáfora: Ex.: Fiz todos os exercícios indicados pela professora, mas minha amiga Carla não os fez (isto é, não fez os exercícios). Podem também “amarrar” elementos que ainda serão men- cionados no texto, ocorrendo então a chamada catáfora: Ex.: Fui ao mercado e comprei todos os itens de que precisa- va, menos estes: arroz, batata e azeite. Bem utilizar esses elementos auxilia bastante na boa escritura de uma sequência, mas não só isso. Vejamos agora outro elemento responsável pela textualidade, capaz de ajudar na produção textual. 2. COERÊNCIA Coerência diz respeito ao sentido do texto. A coerência (...), manifestada em grande parte macrotex- tualmente, refere-se aos modos como os componentes do universo textual, isto é, os conceitos e as relações subjacentes ao texto de superfície, se unem numa configuração, de ma- neira reciprocamente acessível e relevante. Assim a coerên- cia é o resultado de processos cognitivos operantes entre os usuários e não mero traço dos textos. (Fávero, 1999, p. 10) Então, a seguinte sequência: VENDE-SE Apartamento. 3 dorms. 2 sls. coz. Área serv. Moema. R$210.000. Tratar com o proprietário: (33)3333-3333. Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 24 Constituirá texto para quem a entender como um classif icado. Vários são os elementos responsáveis pela coerência. Kock e Travaglia (1990) apontam: I) Conhecimentos: linguístico, de mundo, partilhado, do mundo em que o texto se inscreve; II) Inferências; III) Fatores pragmáticos; IV) Situacionalidade; V) Intencionalidade; VI) Aceitabilidade; VII) Informatividade; VIII) Focalização; IX) Intertextualidade; X) Relevância. Resta-nos, ainda, especificar que os textos se organizam numa hierarquia de tipos e subtipos. Guimarães (2004, p. 16) ensina que, se a intenção se volta fundamentalmente para as estruturas internas do texto, fica estabelecida uma tipologia de acordo com a forma de estruturação, sua supe- restrutura, ou o mundo em que o texto se inscreve. É disso que trataremos a seguir. 25 CAPÍTULO 3 As superestruturas textuais (ou tipologias textuais) A noção de superestrutura, emprestada de Van Dijk1, diz res- peito às estruturas globais que caracterizam alguns tipos de tex- tos, independentemente de seu conteúdo. Dessa forma, relativamente ao aspecto estrutural, podemos inscrever os textos em: descritivos, narrativos e dissertativos. Es- sas superestruturas, como afirma Guimarães (opus cit, p. 65), têm caráter convencional e são conhecidas e reconhecidas pelos fa- lantes da língua, ou seja: Uma superestrutura é um tipo de esquema abstrato que estabelece a ordem global do texto, e que se compõe de uma série de categorias, cujas possibilidades de combina- ção se baseiam em regras convencionais. A autora informa também que, embora haja sempre uma es- trutura dominante, o texto pode apresentar outras. Por exemplo, 1. Strategies of Discourse Comprehension. Nova Iorque: Academic, 1983. Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 26 um texto predominantemente narrativo pode apresentar trechos descritivos. O predominantemente dissertativo pode trazer, em alguns momentos, trechos que caracterizam a narração e/ou a descrição. O importante para um estudante do curso de Letras é saber identificar no todo trechos dessa ou daquela estrutura, cujas características agora apresentamos. 1. O texto descritivo Descrever é caracterizar com detalhes objetos, locais, pessoas e situações, apresentando as características deles percebidas por meio dos cinco sentidos. Como é pelos sentidos que estabelece- mos contato com o mundo à nossa volta, podemos dizer que essa estrutura textual é a mais primeva, constituindo elementos vitais de nossa sensibilidade. Visão, tato, audição, paladar, olfato são os sentidos com que percebemos as coisas do mundo que se traduzem em formas, cores, texturas, cheiros, sonoridades a serem des- cobertas. (Amaral e Antonio, 1991, p. 19) Observemos agora as seguintes sequências: Era um dia abafadiço e aborrecido. A pobre cidade de São Luís do Maranhão parecia entorpecida pelo calor. Quase que se não podia sair à rua: as pedras escaldavam, as vidraças e os lampiões faiscavam ao sol como enor- mes diamantes, as paredes tinham reverberações de prata polida; as folhas das árvores nem se mexiam; as carroças d’água passavam ruidosamente a todo o instante, abalan- do os prédios, e os aguadeiros, em mangas de camisa e pernas arregaçadas, invadiam sem cerimônia as casas para encher as banheiras e os potes. Em certos pontos não se encontrava viva alma na rua; tudo estava concentrado, Márcia A. G Molina 27 adormecido; só os pretos faziam as compras para o jantar ou andavam no ganho. (AZEVEDO, A. O mulato. São Paulo: Ática, 1997) Trem das Cores Caetano Veloso A franja na encosta Cor de laranja Capim rosa chá O mel desses olhos luz Mel de cor ímpar O ouro ainda não bem verde da serra A prata do trem A lua e a estrela Anel de turquesa celestial (Ouça a música toda em: https://www.youtube.com/wat- ch?v=kS1zGVi3Uxs) A primeira sequência, como se podeobservar, é um trecho do romance “O mulato”, de Aluísio Azevedo. Podemos perceber com que precisão o autor descreve a cidade de São Luís do Ma- ranhão. Trechos com sinestesias, como “pedras escaldavam, as vi- draças e os lampiões faiscavam ao sol como enormes diamantes, as paredes tinham reverberações de prata polida”, favorecem não só a leitura, como também a percepção sensorial do texto. O mesmo acontece com a letra da música “Trem das cores”, de Caetano Veloso. Em “O mel desses olhos luz/ E a seda azul do papel/ Que envolve a maçã” temos a impressão de sentir o gosto tanto do mel quanto da maçã, de ver o brilho dos olhos e de sentir a maciez do papel de seda. Um texto descritivo estará bem produzido quando possibi- litar essas sensações; quando o leitor, ao proceder à sua leitura, Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 28 tiver a sensação de estar vendo, presenciando, sentindo o que se está descrevendo. Vejamos, então, pormenorizadamente, o que compreende um texto descritivo. 3.1.1. Características do texto descritivo Leia o seguinte fragmento da obra Iracema, de José de Alencar: Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna e mais longos que seu talhe de palmeira. O favo da jati não era doce como seu sorriso; nem a bau- nilha recendia no bosque como seu hálito perfumado. Mais rápida que a ema selvagem, a morena virgem corria o sertão e as matas do Ipu, onde campeava sua guerreira tribo, da grande nação tabajara. O pé grácil e nu, mal roçando, ali- sava apenas a verde pelúcia que vestia a terra com as primei- ras águas. (ALENCAR, J. Iracema. São Paulo: Ática, 1990) Agora, atente para o seguinte: Iracema saiu do banho; o aljôfar d’água ainda a roreja, como à doce mangaba que corou em manhã de chuva. Enquanto repousa, empluma das penas do gará as flechas de seu arco, e concerta com o sabiá da mata, pousado no galho próximo, o canto agreste. O primeiro fragmento é descritivo e o segundo, narrativo. Como identificar a descrição? O texto descritivo é predominantemente f igurativo, ou seja, construído com termos essencialmente concretos, evocando uma f igura, um efeito de realidade. Márcia A. G Molina 29 Os textos figurativos produzem um efeito de realidade e, por isso, representam o mundo, com seus seres, seus acontecimentos. (Platão e Fiorin, 1997, p. 89) No fragmento 1 temos, como exemplos de termos con- cretos: a morena virgem corria o sertão e as matas do Ipu, onde campeava sua guerreira tribo, da grande nação taba- jara. O pé grácil e nu, mal roçando etc. Outra característica do texto descritivo é que ele não traz mudança de situação. É estático. Representa o mundo num de- terminado momento. É recorte. Além disso, naquela instância em que se efetua a des- crição, vários fatos simultâneos podem ser apresentados. Assim, Iracema, quando apreendida pelo narrador, apre- sentava, simultaneamente, as seguintes características: era virgem, tinha lábios de mel, seus cabelos eram mais negros que a asa da graúna e mais longos que o talhe de palmeira, seu sorriso era doce como o favo da jati, seu hálito era per- fumado, era ainda mais rápida que a ema, etc., etc. Essas características co-ocorriam. Estavam todas pre- sentes na mesma instância, podendo inclusive ser invertidas no texto, como no exemplo: seu sorriso era doce como o favo da jati, seu hálito era perfumado, era ainda mais rápida que a ema; era virgem, tinha lábios de mel; seus cabelos eram mais negros que a asa da graúna e mais longos que o talhe de palmeira (...). Isso porque não existe relação de anterioridade nem de posterioridade no fragmento. Para que se estabeleça a comparação, retomemos o segundo fragmento: Iracema saiu do banho; o aljôfar d’água ainda a roreja, como à doce mangaba que corou em manhã de chuva. Enquanto repousa, empluma das penas do gará as flechas Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 30 de seu arco, e concerta com o sabiá da mata, pousado no galho próximo, o canto agreste. Esse é um fragmento narrativo. Existe nele uma relação de anterioridade e posterioridade: primeiro a índia saiu do banho, depois pôs-se a repousar. A inversão dos fatos prejudicaria a se- quenciação do texto. Podemos perceber, também, em ambos os textos, uma dife- rença no emprego dos tempos verbais: no primeiro predomina o pretérito imperfeito e, no segundo, o pretérito perfeito. Como a simultaneidade é a característica do texto descritivo, os tempos verbais mais empregados são o presente do indicati- vo e o pretérito imperfeito do indicativo. Quanto à organização, podemos afirmar que se deve elaborar o texto descritivo espacialmente, isto é, os elementos devem ser descritos de baixo para cima, da esquerda para direita, de dentro para fora, etc., para que o leitor possa, paulatinamente, ir cons- truindo a imagem daquilo de que se está tratando. Agora, reúna todas as informações dadas anteriormente a respeito do texto descritivo e leia a seguinte poesia de Manuel Bandeira, observando nela os traços da descrição: Segunda canção do beco Teu corpo moreno É da cor da praia. Deve ter o cheiro Da areia da praia. Deve ter o cheiro Que tem ao mormaço A areia da praia. Teu corpo moreno Márcia A. G Molina 31 Deve ter o gosto De fruta de praia. Deve ter o travo, Deve ter a cica Dos cajus da praia. (...) A descrição ocorre em muitos textos técnicos, como os da Engenharia. Observemos: (Acesse na íntegra em: http://www.naganoprodutos.com.br/ novosite/upload/download/1221.pdf ) Temos aqui as características de um motor, cujos dados são citados por meio de uma ordenação espacial. Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 32 2. O texto narrativo De acordo com o Míni Houaiss (2001, p. 364): Narração: s.f. [é] exposição oral ou escrita de um fato. Narrar é, portanto, representar um acontecimento ou uma sé- rie de acontecimentos reais ou fictícios num texto. Humberto Eco, no “Pós-Escrito a O Nome da Rosa”, ensina que: (...) para contar é necessário primeiramente construir um mundo, o mais mobiliado possível, até os últimos porme- nores. Constrói-se um rio, duas margens, e na margem esquerda coloca-se um pescador, e se esse pescador pos- sui um temperamento agressivo e uma folha penal pouco limpa, pronto: pode-se começar a escrever, traduzindo em palavras o que não pode deixar de acontecer. (Eco, 1985, p. 21) Essa citação de Eco, mesmo que indiretamente, permite-nos depreender que são cinco os elementos da narração: narrador, personagens, ações, tempo e espaço. Leia, agora, o texto a seguir, de Marina Colassanti: Nunca descuidando do dever Jamais permitiria que seu marido fosse para o trabalho com a roupa mal passada, não dissessem os colegas que era esposa descuidada. Debruçada sobre a tábua, com o olho vigilante, dava caça às dobras, desfazia pregas, aplai- nando punhos e peitos, afiando o vinco das calças. E a poder de ferro e goma, envolta em vapores, alcançava o ponto máximo de sua arte ao arrancar dos colarinhos liso brilho de celuloide. Márcia A. G Molina 33 Impecável, transitava o marido pelo tempo. Que, em- bora respeitando ternos e camisas, começou sub- -repticiamente a marcar seu avanço na pele e no rosto. Um dia notou a mulher um leve afrouxar- -se das pálpebras. Semanas depois percebeu que, no sorriso, franziam-se fundos os cantos dos olhos. Mas foi só muitos meses mais tarde que a presença de duas fortes pregas descendo dos lados do nariz tornou-se inegável. Sem dizer nada, ela esperou a noite. Tendo fi- nalmente certeza de que o homem dormia o mais pesado dos sonos, pegou um paninho úmido e, silenciosa, ligou o ferro. Observemos que, no texto acima, vislumbramos os seguintes elementos da narração: a) narrador: Onisciente: de 3ª pessoa (“Jamais permitiria que seu marido fosse para o trabalho[...]”) b) personagens: Protagonista: a esposa (“Não dissessem os colegas que era esposa descuidada […]”) Antagonista: omarido (“Impecável, transitava o marido pelo tempo.”) c) ações: “Debruçada sobre a tábua (...) dava caça às dobras (...)” d) tempo: “Jamais permitiria (...)”, “Um dia notou a mulher (...)”, “(...) muitos meses mais tarde (...)” Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 34 e) espaço: Na sua casa, em uma determinada cidade. Além desses elementos, a narração apresenta, diferentemente da descrição, transformação: o marido e a esposa dedicada, de- pois o marido e a revolta... Contundente! 2.1. Características do texto narrativo No texto “Nunca descuidando do dever”, podemos perceber, dentre outras, as seguintes características: a) as camisas amassadas ficavam muito bem passadas: (...) alcançava o ponto máximo de sua arte ao arrancar dos colarinhos liso brilho de celulóide. b) o marido foi adquirindo rugas no rosto: (...) transitava o marido pelo tempo. Que, embora respei- tando ternos e camisas, começou subrepticiamente a marcar seu avanço na pele e no rosto. Mas a transformação mais significativa é a que não está expli- citada, ou seja, ao perceber o rosto enrugado do marido, a esposa, como um autômato, tenciona passá-lo: Tendo finalmente certeza de que o homem dormia o mais pesado dos sonos, pegou um paninho úmido e, silenciosa, ligou o ferro. Além disso, tanto quanto o texto descritivo, o narrativo é fi- gurativo. Lembremo-nos de que esse tipo de texto é construído com palavras concretas cuja função é representar o mundo. Por meio das figuras empregadas podemos depreender o real senti- do do texto. No caso de “Nunca descuidando do dever”, figuras como: Márcia A. G Molina 35 (...) Jamais permitiria que seu marido fosse para o traba- lho com a roupa mal passada, não dissessem os colegas que era esposa descuidada. Debruçada sobre a tábua, com o olho vigilante, dava caça às dobras, desfazia pre- gas (...) (destaques acrescidos) Permitem-nos depreender, subliminarmente, uma crítica às mulheres que, nas décadas de 60 e 70, viviam apenas e tão so- mente para o lar, realizando robotizadamente as atividades do- mésticas. Além da figurativização, na narração a ordenação é tempo- ral. O texto deve ter uma sequenciação para que o leitor possa acompanhar o desenrolar das ações. Assim, vejamos: Jamais permitiria que seu marido fosse para o trabalho com a roupa mal passada, não dissessem os colegas que era esposa descuidada. Debruçada sobre a tábua, com o olho vigilante, dava caça às dobras, desfazia pregas, aplai- nando punhos e peitos (...)Um dia notou a mulher um leve afrouxar-se das pálpebras. Semanas depois percebeu que, no sorriso, franziam-se fundos os cantos dos olhos. (...) Mas foi só muitos meses mais tarde que a presença de duas fortes pregas descendo dos lados do nariz tornou- -se inegável. Sem dizer nada, ela esperou a noite. Tendo finalmente certeza de que o homem dormia o mais pe- sado dos sonos, pegou um paninho úmido e, silenciosa, ligou o ferro. (destaques acrescidos) A ordenação temporal nesse texto ajuda o leitor a ir acompa- nhando as ações da esposa até o inesperado desfecho e, diferen- temente do texto descritivo, a disposição dessas ações não pode ser alterada. Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 36 Como a ordenação temporal é de extrema relevância no texto narrativo, os tempos verbais básicos são os do subsistema do pas- sado: pretérito perfeito, mais-que-perfeito e imperfeito.2 Para finalizar, leia atentamente o texto abaixo, buscando vi- sualizar nele os elementos da narração já discutidos: DESTA ÁGUA NÃO BEBERÁS Carlos Drummond de Andrade - Por que Demétrio não se casa? Era a indagação geral! Demétrio namorava, noivava, não casava. Sete dias antes do casamento, olha aí Demétrio fugindo. As versões eram múltiplas. A noiva é que o despedira. Tiveram uma briga feia. Gênios incompatíveis. Mal secreto. Intrigas. Demétrio continuava a namorar, noivar e não casar. Não lhe faltavam noivas, pois era agradável, tinha status. Quan- to mais se desmanchavam seus projetos de casamento, mais apareciam mulheres dispostas ao desafio, exclamando: - A mim ele não deixa na porta do Mosteiro de São Bento. Deixava. E quanto mais deixava, mais seu prestígio cres- cia. Concluiu-se que era sua maneira de afirmar-se. Então Livaniuska decidiu enfrentá-lo. Noivou com ele e, uma semana antes do casamento, deu-lhe o fora solene. Demétrio quis reagir, explicou à repórter social que ele é que tomara a ìniciativa, mas a mentira foi patente. Liva- niuska foi contratada como atriz por uma emissora de TV e ficou célebre. Daí por diante ela repetiu a carreira de Demétrio, noivan- 2. Geralmente, mas não exclusivamente. Pode-se usar, por exemplo, o presente do indica- tivo, com valor atemporal, instaurando proximidade e verossimilhança ao texto. Márcia A. G Molina 37 do e desmanchando com inúmeros cavalheiros. No fim de cinco anos, Livaniuska e Demétrio casaram-se para sempre, como era fácil de prever mas ninguém previu. O texto narrativo é muito utilizado pelo engenheiro em rela- tórios de visitas técnicas. Veja como exemplo: RELATÓRIO DE VISITA TÈCNICA No dia 25 de agosto de 2020, conforme determinação do departamento de montagem e planejamento, fomos desig- nados a efetuar uma visita técnica, previamente agendada à empresa “MOLINEC” para avaliar os procedimentos dessa na e para o acompanhamento da montagem de seus aparelhos e o planejamento de execução do projeto. No primeiro momento, fomos recebidos pelo gerente do departamento, o senhor José Genuíno Justo, engenheiro de produção; na sequência, fomos encaminhados ao de- partamento (...) Observem o tempo verbal (“fomos”), a sequência temporal (“primeiramente”, “na sequência”) e as transformações (“chega- mos”, “fomos encaminhados”). 3. O texto dissertativo No Míni Houaiss (op. cit., p. 174), encontramos: Dissertação: s.f. 1. Exposição oral ou escrita; 2. Monogra- fia. Ensaio (...) Mas será que, como superestrutura textual, dissertação é só isso? Vamos ver o que dizem alguns estudiosos sobre o assunto. Magalhães (s/d, p. 7) assevera que a dissertação ocorre no pla- no das ideias, do conhecimento, das abstrações. Trata-se de um Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 38 trabalho reflexivo que consiste, de maneira geral, em organizar as ideias numa linha de raciocínio. Assim, ensina o autor, “todas as vezes em que nos valemos da linguagem verbal para expor, defender ou contestar idéias, estaremos utilizando o chamado discurso dissertativo”. Platão e Fiorin (op. cit., p. 252) afirmam que “dissertação é o tipo de texto que analisa, interpreta, explica e avalia os dados da realidade”, e relacionam algumas de suas características, revisa- das a seguir. 3.1. Características da dissertação a) texto temático, ou seja, discute um tema, operando, predo- minantemente, com termos abstratos; b) mudança de situação, tanto quanto a narração; c) ordenação é lógica; d) tempo básico empregado na dissertação: presente do in- dicativo com valor atemporal, embora se admita o uso do preté- rito perfeito e do futuro do presente.3 Importa esclarecer que há autores que inscrevem os textos dissertativos em dois tipos: expositivos e argumentativos. 3.2. Dissertação expositiva É aquela cujo propósito é discorrer sobre o assunto num sen- tido meramente informativo. Assim, pode-se dissertar sobre a pena de morte, a juventude brasileira etc., sem que haja posicio- namento sobre o tema. A importância de Música Popular Brasileira A importância da Música Popular Brasileira no cenário de nossa cultura é inegável. Pode-se constatar que a MPB, além de 3. Também aqui se trata de tempos básicos, mas não exclusivos. Márcia A. G Molina 39 sua relevância como manifestação estética tradutora de nossas múltiplas identidades culturais, apresenta-se como uma das mais poderosas formas de preservação da memória coletiva e como um espaço social privilegiado para as leituras e interpretações do Brasil. (Dicionário CravoAlbim de MPB - http://www.dicio- nariompb.com.br/default.asp) 3.3. Dissertação Argumentativa Diferentemente da anterior, na dissertação argumentativa re- vela-se reflexões sobre o assunto, a fim de persuadir o receptor que, acompanhando a linha de raciocínio do que é exposto, veri- fica se o raciocínio verbalizado é correto e, nesse sentido, passível ou não de aceitação. Uma escolha contra a mulher O aborto é frequentemente apresentado como um pro- blema de “direito das mulheres”. É visto como algo dese- jável para as mulheres, e como um benefício ao qual elas deveriam ter tanto acesso quanto possível. Na verdade, ser “pró-vida” é visto como sendo “contra os direitos da mulher”. Se você às vezes pensa desta forma, examine os fatos apresentados aqui. Verá que, na verdade, o aborto prejudica a mulher, ignora os seus direitos, e as abusa e degrada. Qualquer um que se preocupa com a mulher fará bem em conhecer estes fatos. Estudos de mulheres que fizeram aborto, (veja, por exem- plo, o livro do Dr. David Reardon, Aborted Women, Si- lent No More), mostram que o aborto não é uma ques- tão de dar à mulher uma “escolha”. É, tragicamente, uma situação em que as mulheres sentiram que não tinham NENHUMA ESCOLHA, sentiram que ninguém se importava com elas e com seu bebê, dando-lhes alternati- Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 40 va alguma a não ser o aborto. A mulher sente-se rejeitada, confusa, com medo, sozinha, incapaz de lidar com a gra- videz - e, no meio disto tudo, a sociedade diz-lhe, “Nós eliminaremos o seu problema eliminando o seu bebê. Faça um aborto. É seguro, fácil, e uma solução legal”. O fato é que embora o aborto seja legal (nos Estados Unidos), ele NÃO é seguro e fácil, nem respeita a mulher. (http://www.comciencia.br/especial/drogas/drogas01.htm) Podemos perceber que, por exemplo, no trecho “na verdade, o aborto prejudica a mulher, ignora os seus direitos, e as abusa e degrada” está expressa a opinião do autor e, para que ela seja mesmo aceita, passa ele a relacionar os motivos que o fazem pen- sar assim. Em ambos os tipos de dissertação, importa atentar para sua organização, como veremos a seguir. 3.4. Organização do texto dissertativo Como esse tipo de texto deve apresentar uma organização lógica, deve-se expor com bastante clareza: a) o assunto; b) a delimitação do assunto; c) o objetivo; d) o tópico-frasal; e) o desenvolvimento; f ) a conclusão. Como já falamos anteriormente, a dissertação é um texto te- mático, portanto deve-se discutir um tema. Para que o autor do texto não se perca em informações redundantes ou desnecessá- rias, é importante que proceda à delimitação dele. Por exemplo: Márcia A. G Molina 41 Dissertação Tema: NAMORO Possíveis delimitações do tema: - Namoro na adolescência; - Namoro na melhor idade; - Namoro na escola; Escolhida uma delimitação, deve-se propor um obje- tivo para que não ocorra fuga ao tema. Se resolvêssemos escrever sobre Namoro na escola, poderíamos estabelecer como objetivo, por exemplo, mostrar ao leitor que, como a escola é o espaço onde os jovens mais se encontram e se relacionam, é normal e saudável que ali comecem sua vida afetiva. O tópico frasal é aquele sobre o qual incide a essência da informação. Na delimitação acima, poderíamos estabe- lecer um possível tópico-frasal: É na adolescência que se começa a conhecer o mundo, a fazer amigos, a descobrir as verdades, e a escola é um dos ambientes mais propícios para isso. Então, nada mais comum que ali ocorram flertes, o f icar e até mesmo namoros. Tendo em mente tanto a delimitação quanto os objeti- vos, bem como o tópico frasal, cabe ao autor, então, elabo- rar seu texto dissertativo. Se o seu desejo for produzir um texto argumentativo, esses argumentos podem ser apresen- tados de diferentes maneiras. Seguindo Platão e Fiorin (op. cit., pp. 286/288), relacionamos quatro delas: a) argumento de autoridade: citam-se autores ou pessoas de prestígio que tenham reconhecido domínio sobre aquele saber. No caso da delimitação acima (Namoro na escola), poderíamos ci- tar, por exemplo, o psicanalista Içami Tiba, autor de várias obras que tratam da adolescência. Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 42 b) argumento baseado no consenso: neste caso, valer-nos- -íamos de opiniões já aceitas pela maioria da população. c) argumento baseado em provas concretas: poderíamos, no caso de nossa proposta, fazer uso, por exemplo, de pesquisas que comprovassem que a maioria dos jovens namora na escola e que tal fato tem auxiliado seu desenvolvimento emocional. d) argumento por percurso histórico: no caso do tema dado, poderíamos citar como eram, por exemplo, os namoros no século XIX, e caminhar mostrando as mudanças por que passaram ao longo dos séculos. Para que possamos entender melhor, leiamos Magalhães (s/d, pp. 16/17), que assim exemplifica o texto dissertativo: Muitas normas, antes apenas do âmbito da Moral, passa- ram ao campo do Direito pelo fato de o legislador, num momento dado, julgar conveniente atribuir-lhes força coercitiva, impondo uma sanção para sua desobediência. Assim, por exemplo, no passado era altamente meritório o fato de o patrão socorrer seu empregado acidentado. Mas a desobediência a essa regra de moral não provoca- va qualquer sanção por parte do Estado. Este, entretanto, observando a conveniência de se impor ao patrão a obri- gação de socorrer seu serviçal infortunado, criou a nor- ma de Direito, impondo como obrigação jurídica aquilo que não passava de mero dever moral. Outro exemplo: no passado agia com humanidade o patrão que, antes de despedir seu empregado, lhe dava um prazo para procurar nova colocação, e ao romper o contrato de trabalho lhe oferecia uma indenização pelos anos de serviços presta- dos. Talvez isso constituísse um dever moral ditado pela preocupação de justiça. Mas o descumprimento de tal Márcia A. G Molina 43 dever não provocava qualquer sanção por parte do Esta- do. Parecendo ao legislador conveniente transformar tal preceito de Moral em regra de Direito, impõe ao patrão o dever de dar aviso prévio e de prestar indenização ao em- pregado despedido. O descumprimento de tal obrigação, hoje, provoca uma sanção por parte do Estado. A regra de Moral transformou-se em regra de Direito. (RODRI- GUES, S. Direito Civil. in: MAGALHÃES, R. Técnicas de Redação: a recepção e a produção de texto. São Paulo: Editora do Brasil, s/d) Neste texto temos, portanto: ASSUNTO: Direito; DELIMITAÇÃO: Direito e moral; OBJETIVO: Mostrar que muitas normas morais se trans- formaram em normas jurídicas por razão de conveniência social; TÓPICO-FRASAL: “Muitas normas, antes apenas do âm- bito da Moral, passaram ao campo do Direito pelo fato de o legislador, num momento dado, julgar conveniente atribuir-lhes força coercitiva, impondo uma sanção para sua desobediência”. DESENVOLVIMENTO (Argumentos baseados em pro- vas concretas): 1. O socorro patronal obrigatório ao empregado acidentado; 2. A obrigação jurídica de dar aviso prévio e de prestar inde- nização ao empregado despedido. CONCLUSÃO: “A regra de Moral transformou-se em regra de Direito.” Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 44 Além disso, podemos perceber que o texto dissertativo tem algumas características que lhe são peculiares. Vejamos quais são. Inicialmente, como pudemos perceber, trata-se de um texto temático, ou seja, o nosso exemplo discute uma questão jurídica, operando predominantemente com termos abstratos: Muitas normas, antes apenas do âmbito da Moral, pas- saram ao campo do Direito pelo fato de o legislador, num momento dado, julgar conveniente atribuir-lhes força coercitiva, impondo uma sanção para sua desobediência. Assim, por exemplo, no passado era altamente meritório o fato de o patrão socorrer seu empregado acidentado. (destaques acrescidos) Mostra, tanto quanto a narração, mudança de situação: no caso do texto acima, o autor apontapara fatos que passaram de atitudes morais para deveres impostos pelo Direito: (...) Este, entretanto, observando a conveniência de se im- por ao patrão a obrigação de socorrer seu serviçal infortu- nado, criou a norma de Direito, impondo como obrigação jurídica aquilo que não passava de mero dever moral. (...) (...) O descumprimento de tal obrigação, hoje, provoca uma sanção por parte do Estado. A regra de Moral trans- formou-se em regra de Direito. Sua ordenação é lógica. Como já apontado, há no texto um tópico frasal, o desenvolvimento e a conclusão. Os tempos verbais empregados nessa dissertação são: preté- rito perfeito e imperfeito do indicativo, quando o autor remete o leitor ao passado, e o presente, quando aponta para o resultado da ação pretérita: Márcia A. G Molina 45 (...) Outro exemplo: no passado agia com humanidade o patrão que, antes de despedir seu empregado, lhe dava um prazo para procurar nova colocação, e ao romper o contrato de trabalho lhe oferecia uma indenização pelos anos de serviços prestados. Talvez isso constituísse um dever moral ditado pela preocupação de justiça. Mas o descumprimento de tal dever não provocava qualquer sanção por parte do Estado. Parecendo ao legislador con- veniente transformar tal preceito de Moral em regra de Direito, impõe ao patrão o dever de dar aviso prévio e de prestar indenização ao empregado despedido. O descum- primento de tal obrigação, hoje, provoca uma sanção por parte do Estado. A regra de Moral transformou-se em regra de Direito. (destaques acrescidos) Para finalizar, vejamos um exemplo de texto dissertativo que trata da reciclagem de vidros: RECICLAGEM DE VIDRO Não podemos dizer ao certo quando o vidro foi criado, mas sua revelação é atribuída aos fenícios que, casual- mente o descobriram há cerca de quatro mil anos, quando faziam as fogueiras na praia. O que se sabe com certeza é que os sírios, fenícios e babilônios já utilizavam o vidro desde 7.000 a.C. E por se tratar de um material muito utilizado desde á antiguidade, você sabia que existe tam- bém a reciclagem de vidro? Se ainda não, nesse post ire- mos te explicar tudo sobre o assunto! No Brasil, a primeira fábrica foi construída no século XVII, em Pernambuco, por artesãos. Produzindo inicial- mente janelas, copos e frascos. Mas foi a partir do século XX, que as fábricas de vidro brasileiras começaram a se automatizar e processar em escala industrial o que então Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 46 era feito de modo artesanal e individual. Você sabia? (...) (Para ler a íntegra, acesse: https://www.psdovidro.com. br/descubra-tudo-sobre-a-reciclagem-de-vidro/) 4. INJUNÇÃO O texto injuntivo é aquele que instrui, normatiza ou orienta o leitor sobre determinado assunto. É o texto utilizado, por exem- plo, em manuais de funcionamento de aparelhos, como o celular. Vejamos um exemplo: (https://silo.tips/download/manual-de-funcionamento-8) 4.1. Características do texto injuntivo Como este tipo de texto presta-se a instruir, normatizar e orientar, tem, então, as seguintes características: - Instrui o leitor acerca de um procedimento (Leia com atenção...) Márcia A. G Molina 47 - Conduz o leitor a proceder de um determinado modo (Não tombe...) - Utiliza linguagem objetiva e simples (Nunca molhe seu equipamento...) - Utiliza predominantemente verbos no infinitivo, imperativo ou presente do indicativo com indeterminação do sujeito (Tom- be, tome, não molhe, não desligue) Pelo exposto, fica bastante claro que o texto injuntivo é bas- tante utilizado por profissionais de áreas técnicas, como as dos engenheiros. 49 CAPÍTULO 4 A constituição do texto 1. Relembrando a noção de texto 1.1. Texto e textualidade Como vimos, texto, etimologicamente, quer dizer tecido, ou seja, trata-se de uma trama onde se deve enredar as palavras. Já a Linguística do Discurso procura estudar os textos como “manifestações linguísticas produzidas por indivíduos concretos em situações concretas, sob determinadas condições de produção” (Kock, 1997, p. 11), entendendo-os numa situação interacionista. Para Val (1999, p. 3), texto (escrito ou falado) é a “unidade linguística comunicativa básica”, utilizado pelos falantes de uma língua para se comunicarem, e será bem compreendido quando comportar três aspectos fundamentais: o pragmático (atuação in- formacional e comunicativa), o semântico-conceitual (relaciona- do à compreensão, à cognição, portanto, da coerência) e o formal (de sua organização, ou seja, de sua coesão). Assim, texto pode ser compreendido como uma unidade de sentido que depende de uma série de fatores, ligados tanto à coe- rência quanto à coesão. Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 50 Por outro lado, discurso é mais abrangente e, de acordo com a Análise do Discurso de Linha Francesa, ele é entendido como “o espaço em que emergem as significações” (Brandão, s/d, p. 35). Mas o que comporta essa significação? Inicialmente, temos de entender que o discurso de que tratamos se faz na e pela língua, ou seja, as significações serão observadas em sua formação dis- cursiva, somadas às suas condições de produção, e norteadas pela sua formação ideológica. Dessa forma, a noção de discurso pode ser vista como múlti- pla e analisá-lo é, de acordo com Foucault (1986, p. 187), “fazer desaparecer e reaparecer as contradições é mostrar o jogo que jo- gam entre si; é manifestar como pode exprimi-las, dar-lhes corpo, ou emprestar-lhes uma fugidia aparência”. Isso quer dizer que analisar um discurso é buscar esses elementos de dispersão, os diversos discursos que comporta, os textos que com ele dialogam. E há várias maneiras de os textos conversarem entre si e com os discursos, como veremos a seguir. 1.2. A Intertextualidade De acordo com Kristeva (1974, p. 64) “todo texto se constrói como um mosaico de citações. Todo texto é absorção e transfor- mação de um outro texto”, ou seja, como falou Bakhtin (1922), nenhum discurso é neutro, pois é sempre formado por outros que lhe foram anteriores no tempo, produzido por um sujeito descentrado, assumindo diferentes vozes sociais, que o tornam um sujeito histórico e ideológico. Fiorin (2003, p.32) ensina que: “A intertextualidade é o pro- cesso de incorporação de um texto em outro, seja para reproduzir o sentido incorporado, seja para transformá-lo.” Brandão (op. cit., p. 76) aponta dois tipos de intertextualida- de: uma interna, na qual um “discurso se define por sua relação com o discurso do mesmo campo, podendo divergir ou apresen- Márcia A. G Molina 51 tar enunciados semanticamente vizinhos aos que autoriza sua formação discursiva”; e uma externa, “na qual o discurso define uma certa relação com outros campos”. Kock (1986, p. 39) também aponta a possibilidade de se ob- servar a intertextualidade de duas maneiras: em sentido amplo, que ocorre implicitamente, ou seja, a identificação dos textos em diálogo é conseguida por meio de atenta observação por parte do leitor, porque o novo texto mantém alguns aspectos, tanto formais quanto de sentido, dos originais; em sentido estrito, que pode aparecer tanto implicitamente – por meio da divulgação de sua ideologia e retórica – quanto explicitamente – por meio da revelação direta do texto do qual se origina. Paulino, Walty e Cury (1997) indicam oito possibilidades de a intertextualidade se revelar, quais sejam, por meio de epígrafe, citação, referência, alusão, paráfrase, paródia, pastiche e tradução. Esses autores entendem a sociedade como uma grande rede in- tertextual, e dão ao espaço cultural um lugar de relevância, pois cada produção dialoga necessariamente com outras. Fiorin (2003) e Sant’Anna (1988) apontam diferentes ma- neiras de a intertextualidade ocorrer. O primeiro identifica três processos: a citação, alusão e estilização; o segundo, quatro: a pa- ródia, paráfrase, estilização e apropriação. Como é a proposta de Sant’Anna que mais atente aos nossospropósitos, estudá-la-emos de maneira particularizada a seguir. 2.1. A paródia Fávero (2003, p. 49) vai à etimologia para conceituar o termo: Paródia significa canto paralelo (de para = ao lado de e ode = canto), incorporando a idéia de uma canção, cantada ao lado de outra, como uma espécie de contracanto. Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 52 Sant’Anna (op. cit., p. 31) completa, asseverando que ela tem uma função catártica, funcionando como contraponto aos momentos de muita dramaticidade. Além disso, o texto pari- dístico faz uma reapresentação “daquilo que havia sido recal- cado. Uma nova e diferente maneira de ler o convencional. É um processo de liberação do discurso. Uma tomada de cons- ciência crítica”. Parodia-se um texto para negá-lo, já que a linguagem nesse tipo de produção é dupla: as vozes que dialogam nos dois dis- cursos se cruzam tanto horizontal (produtor x receptor), quanto verticalmente (texto x contexto) (Fávero, 1999, p. 53). Vejamos um exemplo: TEXTO FONTE Stop A vida parou Ou será o automóvel? (Carlos Drummond de Andrade) Paródia (Ode paralelo – normalmente com ironia com sar- casmo) Stop A comida acabou Ou será que a lombriga dentro da tua barriga comeu tudo? O dialogismo entre os textos é inquestionável, revelando também a característica primordial da paródia: temos aqui can- tos paralelos que, ao mesmo tempo em que fazem com que nossa memória textual retome o original, seu lado humorístico faz com que eles nunca se encontrem, como imagens invertidas num es- pelho (Sant’Anna, op. cit.). Márcia A. G Molina 53 Num texto acadêmico, podemos fazer uso da paródia, quando, especialmente, partindo de um texto original, inauguramos um ou- tro paradigma, uma evolução do primeiro, numa oposição, numa crítica tecida com humor e ironia, expondo sua contra-ideologia. Exemplo: “Salários têm melhores reajustes em 10 anos” Balanço divulgado pelo Dieese (Departamento Intersin- dical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos) mos- tra que, em 2005, 72% dos reajustes salariais foram maio- res do que a inflação, melhor desempenho já constatado. (adaptado da página: www.pt.org.br) “Eles conseguem fazer com que seus salários tenham me- lhores reajustes em 10 anos” Balanço divulgado pelo Dieese (Departamento de Infâ- mias, Enrolação e Embute Sem Escrúpulos) mostra que, em 2005, 72% dos reajustes salariais dos políticos foram maiores do que a inflação, maior roubalheira e sem-ver- gonhice já constatada. Como se pôde perceber, embora os dois textos mantenham um diálogo entre si, a paródia subverte o sentido do primeiro, retoma-o para negá-lo, para ironizá-lo, caminhando ao seu lado como se fosse sua imagem invertida. Diferente é a paráfrase, como veremos a seguir. 1.2.2. A paráfrase O dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001, p. 2127) traz as seguintes conceituações para o termo: Paráfrase: (1)sf. interpretação ou tradução em que o autor procura seguir mais o sentido do texto que letra: metáfra- Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 54 se; (2) interpretação, explicação ou nova apresentação de um texto que visa torná-lo mais inteligível ou que sugere novo enfoque para o seu sentido. (...) Sant’Anna (op. cit., p. 17) afirma que o termo para-phrasis (que já no grego significava continuidade ou repetição de uma sentença) pode ser considerada, grosso modo, uma reafirmação, por meio de outras palavras, do mesmo sentido de uma obra escrita, ou seja, pode-se considerar a paráfrase a tradução ou a transcrição de um texto primitivo. Nesse sentido, Derrida (2002, p. 62) ensina que o tradutor deve resgatar, absolver, resolver o texto original e quando “cria” é como um pintor que “copia” seu “modelo”. Benjamin (1996, p. 108) disse que a natureza engendra semelhanças, bastando, para entender isso, pensar-se na mímica. Portanto, diferentemente da paródia, a paráfrase é a frase pa- ralela, ou seja, uma releitura do original. Se na primeira temos a ruptura, a crítica sutil, na segunda ficamos à frente de uma relei- tura, de uma reprodução. Para que possamos compreendê-la melhor, vejamos o exem- plo, tomando como base o mesmo texto do poeta Drummond: Paráfrase (Texto paralelo) Stop A vida parou Ou será que foi a Covid-19? Ao longo de nossa vida acadêmica e profissional, fazemos fre- quentemente uso da paráfrase. André (1988, p. 11) ensina que: a) Podemos reproduzir, com outras palavras, o mesmo pensa- mento do texto, seguindo a ordem do discurso original; b) Podemos reproduzir o texto, com outras palavras, mas bus- cando esclarecer, para os leitores de outro nível (nesse caso, por- Márcia A. G Molina 55 tanto, motivada pelos objetivos), ou vocábulos ou expressões que julgamos importante elucidar; c) Podemos, ao reproduzir o texto, ampliar as informações sobre ele, seu autor, a obra, o estilo etc., na medida em que essas informa- ções sejam cabíveis e relevantes para sua melhor compreensão; d) Podemos, finalmente, fazer um decalque, ou seja, seguindo a estrutura do texto original, substituir a ideia inicial por outra que com ela esteja associada. Utiliza-se a paráfrase com muita frequência em textos acadê- micos. Da mesma forma, o engenheiro utiliza-a quando produz um artigo de divulgação científica ou faz uma apresentação pú- blica, porque, ao fazer referência a um nome de autoridade do texto, imprime a mesma autoridade a seu texto. 1.2.3. A estilização A palavra estilização deriva de estilo, que, de acordo com Houaiss (op. cit., p. 1254) significa “o modo pelo qual um indi- víduo usa os recursos da língua para expressar, verbalmente ou por escrito, pensamentos, sentimentos, ou para fazer declarações, pronunciamentos, etc.” Sant’Anna (op. cit.) define estilização como uma forma de tomar aquele estilo de outrem, estabelecendo um desvio tolerável, produzindo um meio do caminho entre a paródia e a paráfrase. Para Fiorin (op. cit): A estilização é a reprodução do conjunto dos procedi- mentos do “discurso de outrem”, isto é, do estilo de ou- trem. Estilos devem ser entendidos aqui como o conjun- to das recorrências formais tanto no plano da expressão quanto no plano do conteúdo (manifestado, é claro) que produzem um efeito de sentido de individualização (De- nis Bertrand, 1985, p. 412) Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 56 Esclarece ainda Fiorin que a estilização pode ser polêmica ou contratual. Entende-se que estilização, em sentido estrito, pode ser uma forma de alusão, já que, ao citar, temos uma menção ao discurso de outrem de maneira indireta, ou seja, por meio da utilização do estilo do texto de origem. Vejamos a estilização criada a partir daquele mesmo texto- -fonte de Drummond: STOP A COMIDA ACABOU... Ou será que... Que elementos no texto acima indicam-nos tratar-se de uma estilização? Ao aludir ao texto do Drummond, foram mantidos em alguns momentos a mesma construção sintática do texto de origem. Ex. Texto fonte: Texto estilizado: STOP STOP A vida parou A comida acabou (Sujeito + Verbo Intransitivo) Ou será que... (Coordenada subordinada) Márcia A. G Molina 57 Além disso, é mantido o presente do indicativo e, quanto ao léxico, observamos que o texto estilizado insere o cotidiano no esquema da nostalgia. 1.2.4. A apropriação Sant’Anna (op. cit) ensina que essa forma de intertexto é bas- tante recente na crítica literária e chegou à literatura por meio das artes plásticas, especialmente pelas experiências dadaístas. Também conhecida como Assemplage (reunião, agrupamento), é muito próxima da colagem, ou seja, trata-se da reunião de mate- riais diversos para a composição de algo. Essa técnica é, de acordo com o autor, antiquíssima, pois usa de um artifício muito conhecido na elaboração artística: o des- locamento que, por meio do desvio, provoca um estranhamento. A apropriação pode serde dois tipos: a) de primeiro grau: quando é o próprio objeto que entra em cena; b) de segundo grau: quando ele é representado, traduzido para um outro código. Vejamos o exemplo, partindo daquele mesmo texto fonte citado: O quê? Acabou? Ah... que fome... Nossa, que doença! Paráfrase Paródia Estilização Apropriação (Conjunto das similaridades) (Conjunto das dife- renças) De toda forma, importa apontar que todos os tipos de texto se organizam em gêneros, e sobre isso é que se tratará na sequência. 59 CAPÍTULO 5 Do texto ao gênero O termo “gênero”, na acepção linguística, pode-se afirmar de forma ampla, ter sido cunhada, ou pelo menos, ressuscitada por Bakhtin. Diz o autor: O emprego da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos) concretos e únicos, proferidos pelos in- tegrantes desse ou daquele campo da atividade humana. Esses enunciados refletem as condições específicas e as finalidades de cada referido campo não só por seu con- teúdo (temático) e pelo estilo da linguagem, ou seja, pela seleção dos recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua mas, acima de tudo, por sua construção compo- sicional.[...] Evidentemente, cada enunciado particular é individual, mas cada campo de utilização da língua elabo- ra seu tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais denominamos gêneros do discurso (BAKHTIN, 2003, p. 261-262) Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 60 Ou seja, para esse autor TODOS os enunciados de uma lín- gua organizam-se num gênero, perceptíveis por meio de três ca- racterísticas: estrutura, estilo e conteúdo. Assim, pode-se dizer que, em: (http://bartaquine-bonstempos.blogspot.com/2012/06/propa- gandas-antigas-1950.html) Assim, podemos dizer que temos aqui o gênero PROPA- GANDA, porque: a) Quanto ao estilo: temos a imagem e a linguagem referen- cial com a intenção de influenciar o leitor; b) Quanto à estrutura: temos linguagem verbal e não-verbal; c) Quanto ao conteúdo: há a referência a um produto, mos- trando, por meio da figura, os benefícios de quem o utiliza (me- nina saudável e feliz). Márcia A. G Molina 61 Já em: Resumo: Este trabalho tem como objetivo rever nosso passado gramatical, descrevendo as categorias gramati- cais elencadas e definidas por Dionísio de Trácia e Apo- lônio Díscolo, gramáticos que se baseiam nos conheci- mentos de Aristóteles, observando as relações existentes entre suas propostas. Além disso, pretende-se descrever a organização da gramática de Jerônimo Soare Barbosa, atendo-se também à seção que versa sobre as partes do discurso. Dessa forma, estar-se-á realizando um percur- so evolutivo nos estudos gramaticais, partindo-se de sua origem, no grego, até chegar aos estudos da língua portu- guesa. O trabalho que hoje se oferece ancora-se nos pres- supostos da História das Ideias Linguísticas, entendendo ideia linguística como todo saber construído em torno de uma determinada língua, num dado momento, como pro- duto quer de uma reflexão metalinguística, quer de uma atividade metalinguística não explícita (Auroux, 1989). Vemos que se trata de um RESUMO de um artigo acadêmico. Na engenharia, há alguns gêneros recorrentes de que fazem uso os engenheiros. Deles trataremos na sequência. 63 CAPÍTULO 6 Os gêneros das engenharias São vários os gêneros de que se valem os engenheiros durante seu exercício profissional. Trataremos daqueles que se julga sejam os mais recorrentes: relatório técnico, laudo e projeto. Vamos lá. 1. O relatório técnico Pode-se definir relatório como um documento que reúne um conjunto de informações observadas ou coletadas a partir da ob- servação ou de constatações realizadas durante uma visita técni- ca, inspeções, desenvolvimento de projetos ou até mesmo de uma aula ou apresentação em congressos. Para padronizar a apresentação de relatórios, algumas em- presas já disponibilizam para seus colaboradores o seu modelo, muitas vezes feito on-line. Outras têm formulários específicos, como o abaixo: Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 64 (https://segurancadotrabalhonwn.com/relatorio-de-se- guranca-download/) Contudo, com o objetivo de padronizar a elaboração desses relatórios, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABN- T)1, propõe que ele seja realizado seguindo-se determinados ele- mentos: Parte externa: - Capa - Lombada Parte externa – elementos pré-textuais: - Folha de rosto (obrigatório) - Resumo na língua vernácula (obrigatório) - Lista de ilustrações (opcional) - Lista de tabelas (opcional) - Lista de abreviaturas e siglas (opcional) - Lista de símbolos (opcional) - Sumário (obrigatório) 1.http://www.abnt.org.br/assinatura-de-normas-tecnicas Márcia A. G Molina 65 Parte interna – elementos textuais: - Introdução (obrigatório) - Desenvolvimento (obrigatório) - Considerações finais (obrigatório) Elementos Pós-Textuais - Referências (obrigatório) - Glossário (opcional) - Apêndice (opcional) - Anexo (opcional) - Índice (opcional) - Formulário de identificação (opcional) Nas conclusões, podem ser inseridas RECOMENDAÇÕES. Por exemplo, o engenheiro civil faz uma visita técnica a uma construção em andamento e observa que nem todos os colabo- radores estão utilizando os equipamentos de segurança. É muito recomendado que isso seja apontado pelo engenheiro, visto que, na ocorrência de um acidente, está documentado que o fato foi visto e alertado, não acham? Outro fato importante é: DOCUMENTE, FOTOGRA- FE... Quanto mais minucioso o relatório, melhor ele estará. 2. LAUDO TÉCNICO De acordo com o site Manual de Perícias (https://www.manual- depericias.com.br/), o Direito reconhece como meios de prova a oral e a material: confissão, depoimentos das partes, documentos, presunções e indícios, testemunhas e exames periciais (laudos). O laudo é o relato do técnico ou especialista designado para avaliar determinada situação que estava dentro de seus conheci- mentos. Como já falado, é um dos meios de prova utilizados pelo juiz para proferir a sentença, embora no direito penal brasileiro o Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 66 juiz não esteja adstrito ao laudo, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo integral ou parcialmente. Quem realiza um laudo é um Perito, que é a pessoa que suprirá o juiz das noções que ele humanamente não consegue ter, realizando a elaboração de um laudo pericial, o qual é o resultado do conhecimento técnico sobre o assunto de uma lide judicial. De acordo com o site Portal Educação (https://www.portale- ducacao.com.br/conteudo/artigos/direito/elaboracao-do-laudo- -pericial/36312), o laudo tem, em sua estrutura: - Cabeçalho: identificação da Vara perante a qual está trami- tando a ação, o tipo de ação e o número do processo; - Introdução: identificação do perito (nome, número de regis- tro profissional, empresa etc.), espécie de perícia a que se refere o laudo, data e local onde a diligência foi efetuada, mencionando o dia e a hora do seu início e término, e os nomes das pessoas que assistiram ao trabalho; - Visão do Conjunto: contém dados da firma ou estabeleci- mento comercial, atividades etc.; - Documentos e livros examinados; - Comentários Periciais ou Conclusão: contém a resposta aos quesitos e encerramento. Para a realização, consolidação e certificação dos trabalhos periciais, são aplicadas técnicas comuns a todas as espécies de perícia, como: - Exame: análise de materiais (livros e documentos e/ou qual- quer outro elemento constitutivo da matéria); - Vistoria: diligência propriamente dita, objetivando a veri- ficação e a constatação de situação, coisa ou fato a ser periciado; - Indagação: obtenção de testemunho de conhecedores do objeto da perícia, ou seja, daqueles que têm ou deveriam ter co- nhecimento dos fatos ou atos concernentes à matéria periciada; - Investigação: pesquisa que busca trazer ao laudo o que está oculto por quaisquer circunstâncias;Márcia A. G Molina 67 - Arbitramento: determinação de valores (procedimentos es- tatísticos – média, mediana, desvio padrão) ou solução de con- trovérsia por critério técnico; - Avaliação: ato de determinar valor de coisas, bens, direitos, obrigações, despesas e receitas; - Certificação: resumidamente, a preparação e a redação do laudo pericial são de exclusiva responsabilidade do perito, que adotará um padrão próprio, e deve conter: - identificação do processo e das partes; - síntese do objeto da perícia; - procedimentos e métodos adotados para os trabalhos periciais; - identificação das diligências realizadas; - transcrição dos quesitos formulados na forma explícita; - respostas aos quesitos de forma clara, objetiva, concisa e completa, inserindo-se, se necessário, fotos, depoimentos etc.; - conclusão; - apresentação de alternativas e sugestões, condicionadas às teses apresentadas pelas partes, de forma a não representar a opi- nião pessoal do perito. Há inúmeros tipos de laudos, dependendo da área daeenge- nharia. Citam-se, como exemplos: Na engenharia civil: - Vistoria de vizinhança - Laudo de ruído - Avaliação de imóveis - Vistoria de obra - Laudo de reforma - Recebimento de imóvel - Laudo de Impermeabilização Na engenharia da computação: - Propriedade intelectual - Cópia de softwares perda de arquivos Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 68 - Autenticidade bancária - Invasão de sistemas - Transferências eletrônicas - Componentes faltantes - Conteúdo oculto em disco - Bloqueio de dados Assim como o relatório técnico, quanto mais minucioso for o Laudo, melhor ele será. Veja um modelo de laudo: (https://www.researchgate.net/figure/Figura-3-Laudos-tecnicos-quanto- -a-materia-prima-utilizada-Relatorio-de-ensaios_fig3_294728203) Para visualização de mais tipos de laudos, confira: https://www.google. com/search?q=laudos+tecnicos&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=2ah- UKEwjn4735u77rAhWCILkGHU86BgUQ_AUoAXoECA0QAw&bi- w=1366&bih=657#imgrc=c8ciNPPJRX_mRM Márcia A. G Molina 69 3. Projetos Técnicos Antes de mais nada, é importante destacar que a elaboração de projetos deve seguir as NBRs (Normas Brasileiras), aprovadas pela ABNT, praticamente em todas as áreas da engenharia. Na Civil, por exemplo, a NBR 16636, normatiza a elaboração de projetos urbanísticos e arquitetônicos. Essa NBR preconiza que esses tipos de projetos são consti- tuídos por 3 (três) partes: na primeira, apresenta-se um glossário com termos técnicos, descrevendo as atividades e ambientes, in- cluindo instrumentos de trabalho; na segunda, apresentam-se as etapas do projeto e, na última, - parte 1 – diretrizes e terminologia: é, praticamente, um glossário contendo os termos amplos e descreve desde atividades e ambientes até instrumentos do trabalho; - parte 2 – projeto arquitetônico: mais detalhada que a pri- meira, aponta as etapas do projeto arquitetônico; - parte 3 – projeto urbanístico: a última parte prevista segue a mesma linha e contém as diretrizes a serem seguidas para que o projeto seja realizado. Já na Produção, por exemplo, há o modelo PRODIP, desen- volvido inicialmente pelo NEDIO (Núcleo de Desenvolvimento Integrado de Produtos), para máquinas agrícolas (ROMANO, 2003), que compreende as seguintes etapas: (in: http://emc5302.ogliari.prof.ufsc.br/artigo/modelo-prodip) Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 70 Assim, para quem for desenvolver um produto nesta área, esse é um importante elemento norteador. Vejamos, agora, um modelo de projeto da estrutura de uma casa, realizado pelo Engenheiro Civil Pedro Ricardo Barbosa Chapon: (in: http://galeriadeprojetos.altoqi.com.br/galeria/projeto-estrutural-residencial-2/) Obviamente que, acompanhando a imagem do projeto, segue a Proposta. Nela deve constar: Nome do engenheiro responsável.. Data. Local a ser desenvolvido o projeto. Prazos. Materiais. Orçamento. Por esses exemplos, vê-se logo quão complexa é a elabora- ção de projetos na engenharia, uma vez que, dependendo da área e da finalidade, há um tipo específico de trabalho a ser Márcia A. G Molina 71 realizado. De toda forma, se o engenheiro não souber escre- ver, não interagir com seu interlocutor, o desenvolvimento do trabalho poderá ser prejudicado. Hoje inúmeras empresas existem exatamente para dar conta dessa demanda, utilizando, inclusive, impressoras 3D e designers gráficos. O que importa frisar é que, em muitas áreas, tal elaboração é orientada pelas NBRs e, portanto, antes do início de qualquer trabalho desse tipo, tais normas devem ser consultadas. 73 CAPÍTULO 7 Tópicos de Língua Portuguesa Este não é um Curso de Língua Portuguesa, mas de Redação, mais especificamente para engenheiros, portanto daremos ape- nas algumas orientações em relação à Língua Portuguesa para que melhor embasem os textos de vocês. Selecionamos alguns tópicos de regência verbal, concordância verbal e ortografia que costumam “confundir” algumas pessoas. Vamos lá, então... 1. Regência verbal Regência é a relação de dependência entre dois termos, ou, em outras palavras, a relação de subordinação entre duas pala- vras. A palavra ou oração que governa ou rege as outras é cha- mada regente ou subordinante; os termos ou oração que dela dependem são os regidos ou subordinados: Aspiro o perfume da flor. (cheirar) Aspiro a uma vida melhor. (desejar) Muitos verbos exigem uma palavra para integrar-lhes seu sig- Tópicos de Redação e Gramática para Cursos de Engenharia 74 nificado: são os verbos transitivos, que regem os objetos, prepo- sicionados ou não. Não raros são os casos de palavras com dupla ou tripla re- gência. Assim temos, por exemplo, “assistir a um filme”, que é diferente de “assistir o enfermo” e, ainda, de “assisto na rua tal” (de morar). A seguir, veremos alguns verbos e suas regências, atentando para os casos em que, havendo mudança de termo regente x termo re- gido, ocorre alteração no sentido da frase, ou para aqueles cujo uso tem apresentado muita variação em relação ao padrão culto. - Regência de alguns verbos a - Chegar e ir: devem ser introduzidos pela preposição a Vou ao dentista. Cheguei a Belo Horizonte. Assim, lembramos que no padrão culto é: Cheguei a casa cansada. b – Morar e residir: normalmente vêm introduzidos pela pre- posição em. Ele mora em São Paulo. Maria reside em Santa Catarina. c- Namorar: é verbo transitivo direto, portanto não se deve usar com preposição: A professora namora o aluno. d- Obedecer e desobedecer: exigem a preposição a. As crianças obedecem aos pais. O aluno desobedeceu ao professor. e- Simpatizar e antipatizar: exigem a preposição com. Simpatizo com Lúcio. Márcia A. G Molina 75 Antipatizo com meu professor de História. Observação: esses verbos não são pronominais, portanto não pertencem ao padrão culto aquelas orações em que aparecem acompanhados de pronome oblíquo. Simpatizo-me com Lúcio. Antipatizo-me com meu professor de História. f- Preferir: exige dois complementos, sendo que um se usa sem preposição e o outro com a preposição a. Prefiro dançar a fazer ginástica. Observação: de acordo com o padrão culto, não se deve usar esse verbo reforçado pelas expressões ou palavras antes, mais, muito mais, mil vezes mais etc. Aspirar: a- no sentido de cheirar, sorver, é transitivo direto, portanto usa-se sem preposição. Aspirou o ar puro da manhã. b- no sentido de almejar, pretender, é transitivo indireto, por- tanto exige a preposição a. Ela aspirava ao cargo de chefia. 2. Concordância verbal Cegalla (1970) ensina que concordância é o nome que se dá a fenômeno gramatical “que consiste no fato de o vocábulo de- terminante se adaptar ao gênero, número ou pessoa do vocábulo determinado”, com o fim de buscar-se pela harmonia da frase. Isto quer dizer que algumas palavras, expressões ou mesmo orações, quando estabelecem relação de dependência entre si, devem demonstrar a que elementos estão ligadas, buscando aco- modação, que
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