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ENDOMETRIOSE

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ENDOMETRIOSE
Aula Sanar Residência.
Conceitos chaves
● Entender a fisiopatologia.
● Lembrar os 6 Ds do quadro clínico.
● Quando e como realizar a investigação.
● Tratamento individualizado.
Definição
Presença de tecido endometrial ectópico, fora da cavidade uterina.
É benigno e hormônio dependente → ESTROGÊNIO (por isso acomete
mulheres em idade reprodutiva).
Tem caráter crônico e PROGRESSIVO.
Endométrio na endometriose: estroma e glândulas endometriais. É
historicamente igual ao do endométrio e responde assim como ele à ação
hormonal. Os sintomas se relacionam com a proliferação, sangramento e
reação inflamatória local do tecido endometrial nos diferentes sítios,
estimulado pelos esteroides ovarianos.
Se o tecido endometrial estiver no miométrio, não é endometriose, e sim
adenomiose.
Epidemiologia
Mulheres na menacme.
Prevalência: 10-15% das mulheres.
Apesar de ser comum, é subdiagnosticada.
Infertilidade → 20-50% das mulheres inférteis possuem endometriose.
Dismenorreia → 50% das mulheres com dismenorreia possuem endometriose.
Dor pélvica crônica → 20-50% das mulheres com DPC possuem endometriose.
A endometriose ainda é muito subdiagnosticada, porque muitas vezes
negligenciamos uma paciente com cólica menstrual!!!
Etiologia
Existem várias teorias da endometriose: não existe consenso e nenhuma
teoria é perfeita.
A principal teoria é a Teoria da Menstruação retrógrada (ou Teoria de
Sampson):
O fluxo menstrual, ao invés de seguir seu caminho até a vagina, faz um fluxo
retrógrado pelas tubas uterinas com células endometriais que se fixam e
crescem em locais ectópicos da pelve → implante peritoneal do endométrio
causado por menstruação retrógrada.
Obs: malformações uterinas e vaginais predispõem ao aumento da
menstruação retrograda.
Mas essa teoria não explica tudo, pois na menstruação, um paciente normal,
além de ter seu fluxo exteriorizado pelo colo e canal vaginal, pode ter “refluxo”
pelas tubas uterinas, caindo na cavidade pélvica. Isso é fisiológico e ocorre
em 90% das mulheres. Se 90% das mulheres têm menstruação retrógrada, por
que só 10% têm endometriose? Então entram as outras teorias:
- Teoria imunológica: as células endometriais que caíram na cavidade
pélvica não conseguem ser eliminadas pelo sistema imunológico da
paciente. Sabe-se que o tecido endometrial que sofre refluxo, em geral,
são eliminados por celulas imunes, como macrofagos, cels NK e
linfócitos, mas nesse caso, ao tentar limpar os locais com células
endometriais por conta do fluxo retrógrado, o sistema imunológico não
“dá conta” e essas células começam a se proliferar, dando início às
lesões.
- Teoria da metaplasia celômica: transformação de tecido peritoneal em
tecido endometrial, gatilhos para isso - fatores genéticos, ambientais,
células de defesa etc. Explicaria lesões em pacientes que ainda não
tiveram a menarca e até lesões em homens (raríssimo)!
- Teoria da disseminação linfática e hematogênica: explicaria lesões
distantes da pelve, como diafragma e pleura.
- Teoria iatrogênica: lesões em cicatrizes pela manipulação do útero e
acabar levando tecido endometrial ex: Pfannenstiel. Isso explicaria
locais de lesão específicas de endometriose.
- Teoria dos restos embrionários ou Mulleriana: remanescentes dos
ductos de Muller se transformariam em focos de tecido endometrial por
resposta a mediadores inflamatórios e ação estrogênica, associada a
falha do sistema imune.
Fisiopatologia
É uma doença crônica e progressiva.
Progressão da doença:
1. Fatores hormonais: dependem de estrogênio - prevalência muito maior
em pacientes na menacme;
2. Fatores genéticos: múltiplos genes. Histórico familiar aumenta a chance
de ter a doença;
3. Fatores imunológicos: células de defesa + citocinas;
4. Fatores ambientais: como nutrição.
Fatores de risco para endometriose:
- Hx familiar;
- Malformações uterinas;
- Menarca precoce;
- Menopausa tardia;
- Infertilidade;
- Alterações anatômicas;
- Baixos índices de massa corporal;
- Raça branca e asiática;
- Consumo de toxinas.
Fatores que aumentam os níveis estrogênicos estão associados ao risco de
endometriose, por exemplo: menarca precoce, menopausa tardia. Isso se deve
à resposta do tecido ectópico ao estrogênio. Assim, situações que diminuem
os níveis estrogênicos, como amenorreia, supressão ovariana e menopausa
diminuem os riscos para endometriose.
Classificação
- Endometriose superficial: acomete apenas o peritônio, "peritoneal";
- Endometriose ovariana: endometrioma
- Endometriose profunda: lesões +5mm de profundidade.
Locais de acometimento
1. LOCAL MAIS COMUM: Ovário.
2. Tuba uterina;
3. Via urinária: bexiga e ureter;
4. Fundo de saco de douglas;
5. SEGUNDO LOCAL MAIS COMUM: Região retrocervical - ligamentos
uterossacros;
6. Retossigmoide;
Quadro clínico
Quando se pensa em QC de endometriose, podemos dividi-lo em 3 situações:
1. Assintomáticas;
2. Dor;
O principal sintoma é a DOR, que pode ser dividida em: dismenorreia,
dor pélvica crônica e dispareunia.
- Dismenorreia: dor intensa durante a menstruação. A
dismenorreia tende a ser progressiva, com aumento de
intensidade ao longo dos anos.
Por que a paciente tem mais dor? Por conta do estímulo hormonal → as
lesões respondem ao estrogênio, dessa forma a resposta inflamatória é
mais intensa no período menstrual.
- Dor pélvica crônica: dor independente do ciclo menstrual por
pelo menos 6 meses. Sua fisiopatologia está relacionada ao
processo inflamatório local, às aderências geradas pela doença e
também a lesões em nervos pélvicos.
- Dispareunia → dor na relação sexual, dispareunia de
profundidade, comum em lesões retrocervicais e ligamentos
útero-sacro.
A dor na endometriose não está necessariamente relacionada à
extensão da doença.]
3. Infertilidade.
Até metade das mulheres com infertilidade podem ter endometriose. E
quais são os motivos pra isso? → As lesões podem levar a aderências,
alterando a anatomia da pelve e até obstruindo as tubas uterinas. Nos
casos de endometriose mais leve, a resposta inflamatória no local da
doença pode levar a alterações da qualidade dos óvulos e da
receptividade endometrial.
Pacientes que chegam com: INFERTILIDADE, DISMENORREIA ou DOR PÉLVICA
CRÔNICA, devemos acender o alerta da possibilidade de ser endometriose!
Outros componentes do quadro clínico:
- Pode apresentar massas anexiais nos casos de endometrioma;
- Sistema urinário;
Locais: bexiga e ureteres.
Muitas pacientes são assintomáticas,mas quando possuem sintomas -
são sintomas cíclicos, como disúria e hematúria.
Quadros graves: hidronefrose/obstrução urinária.
- Sistema digestivo;
Locais: retossigmoide, apêndice cecal, região íleo-cecal.
Geralmente assintomáticas, mas quando tem: disquezia, hematoquezia,
diarreia ou constipação.
Os 6 Ds da endometriose:
1. DISMENORREIA;
2. DOR PÉLVICA CRÔNICA;
3. DISPAREUNIA;
4. “DIFICULDADE PARA ENGRAVIDAR”;
5. DOR/DIFICULDADE PARA URINAR CÍCLICA;
6. DOR/DIFICULDADE PARA EVACUAR CÍCLICA.
Diagnóstico
Suspeita: quadro clínico + exame físico.
→ Exame físico: dor pélvica à palpação; útero fixo/retrovertido (por conta das
aderências); massa anexial; dor à mobilização do colo; nódulo na região do
ligamento útero-sacro.
Exames de imagem + importantes:
- USG TRANSVAGINAL com preparo intestinal;
Esse USG serve apenas para identificar endometriose no ovário, pois
endometriose não acomete o útero!!!!
- RM abdome e pelve.
Identificar lesões em outros locais, como região retrocervical,
retossigmoide etc.
Atualmente, o USG pélvico e transvaginal com preparo intestinal e a RM com
protocolos especializados são os principais métodos por imagem para
detecção e estadiamento da endometriose.
Nenhum exame é 100% sensível ou 100% específico.
Outros exames:
- Cistoscopia
Queixa urinária, para ver se há acometimento de bexiga.
- Colonoscopia
A colonoscopia fornece imagens apenas da luz intestinal, não
demonstrando implantes adjacentes e na parede do órgão sendo
menos sensível para o dx de endometriose.
Situações comum em que ocorre o dx de endometriose:
- Dismenorreia/ Dor pélvica crônica;
-Infertilidade;
- Exames de “rotina”.
DX definitivo de endometriose:
PADRÃO-OURO: Laparoscopia + biópsia das lesões. MAS, não é indicado para
todas as pacientes, o quadro clínico + algum exame de imagem muitas vezes é
suficiente.
Benefícios da laparoscopia:
- Diagnóstica e terapêutica;
- Magnificação das lesões;
- Melhor acesso abd/pelve;
- Menos invasiva;
- Melhor recuperação;
- Estética.
Para as provas, se perguntarem o procedimento padrão-ouro para o dx de
Endometriose, a resposta será LAPAROSCOPIA COM BIÓPSIA DAS LESÕES.
Endometriose profunda = aquela que acomete ligamentos uterossacros, pto
retovaginal, intestino, ureteres ou bexiga, de forma infiltrativa, com
penetração > 5 mm.
Cor da lesão Descrição
Preta ● Lesões típicas em “pólvora”
● Puntiformes
Vermelhas ● “Chama de vela”
● Excrescência glandulares
● Petéquia peritoneal
● Áreas de hipervascularização
Brancas ● Opacificações brancas
● Aderências subovarianas
● Defeito, falha ou janela
peritoneal
● Lesões amarronzadas, em
“café com leite”
Rosa: útero.
Amarelo: tubas uterinas.
Azul: ovário.
Roxo: ligamento infundíbulo-pélvico.
Verde ti�any: ligamento redondo.
Verde militar: ligamento útero-sacro.
Laranja: espaço reto-vaginal.
Pelve normal.
Pelve com endometriose: tuba uterina dilatada e com sangue, aderências
entre ovário e ligamento retrocervical e retossigmóide.
Apesar de ser uma doença benigna, pode causar mais alterações anatômicas
do que neoplasias malignas.
Exame muito utilizado no passado: CA-125
- Não é e não deve ser utilizado para dx;
- Não é específico;
- Não é sensível;
- Pode estar aumentado em pacientes sem lesões, pacientes com
patologias benignas (adenomiose, cistos benignos de ovários, ascite) e
patologias malignas (CA de ovário, CA de endométrio);
- Pode ser utilizado para seguimento pós-operatório em alguns casos.
Dx diferenciais:
- Doença Inflamatória Pélvica;
- Adenomiose (endometrio infiltra a musculatura do miométrio);
- Tumores ovarianos.
- Cistite intersticial;
- Síndrome do intestino irritável;
- Fibromialgia.
Tratamento
Individualizado e direcionado aos sintomas.
Abordagem multidisciplinar - gastro, nutricionista, psicólogo, educador físico
etc.
● Assintomáticas/Oligossintomáticas
Pacientes assintomáticas e com lesões mínimas podem ter → conduta
expectante, apenas acompanhar.
Lembrando que, após a menopausa, essas lesões tendem a regredir
como resultado da supressão hormonal.
● Sintomáticas
- Dor
O tto pode ser iniciado empiricamente,não é necessário ter a
laparoscopia com biópsia das lesões!
O tto clínico tem o objetivo de inibir a produção de estrogênio (as
lesões dependem dele).
Controle da produção hormonal e melhora do quadro álgico.
Dificilmente o tto clínico faz as lesões regredirem, mas diminui
inflamação e consequentemente a dor.
Medicações:
➔ Contraceptivos combinados (contínuo ou cíclico, há controvérsia
sobre o que seria melhor - deixar um ciclo estendido emendando
a cartela ou com pausa. Na prática, vemos mts ginecologistas
preferindo o ciclo estendido)
Estrogênio + progesterona: diminuir parte da esteroidogênese
ovariana, além de provocar uma decidualização do endométrio;
➔ Progesterona: atua causando decidualização e atrofia dos
implantes endometriais. Pode ter como efeitos colaterais o
sangramento de privação (spotting), ganho de peso, retenção
hídrica. Ex de progestagênio: Dienogeste;
➔ DIU de Levonorgestrel;
➔ Danazol: ação androgênica e inibe a secreção de GnRH e a
esteroidogênese;
➔ Análogos de GnRH (simula uma menopausa): ligam-se aos
receptores de GnRH e acabam por bloquear todo o eixo, levando
a uma menopausa medicamentosa. Por conta dos efeitos
colaterais, deve ser temporário (6 meses);
➔ AINEs + analgésicos nas crises, ex: ibuprofeno, naproxeno e ácido
mefenâmico.
O tto da endometriose deve ter como principal foco a manipulação hormonal
com intenção de produzir pseudogravidez, pseudomenopausa ou anovulação
crônica, criando um ambiente inóspito para o crescimento e desenvolvimento
de implantes endometrióticos, exceto quando presente a queixa de
infertilidade, que é indicação de tto cirúrgico, pois a abordagem clínica não
interfere na fertilidade.
- Tto cirúrgico: indicado quando há falha de tto clínico, ou seja, o quadro
álgico se mantém importante mesmo com as medicações. Idealmente
realizado por LAPAROSCOPIA. O objetivo é tentar ressecar todas as
lesões possíveis, além de coletar material para estudo
anatomopatológico. A excisão da lesão (retirada completa) é melhor que
simples cauterização.
Além da retirada das lesões, liberam-se as aderências pélvicas com o
objetivo de restabelecer a anatomia normal da pelve feminina.
Se há desejo reprodutivo, deve ser conservadora a cirurgia. Lembrando
que a histerectomia não trata a endometriose.
- Infertilidade
Cirurgia VS. Reprodução assistida.
Não há consenso na literatura sobre o que é melhor a se fazer, então
tem-se essas 2 opções de condutas.
Individualizar a conduta. Avaliar reserva ovariana.
Congelamento de óvulos/embriões antes da cirurgia, pois durante a
cirurgia, se existirem lesões próximas aos ovários, pode ocorrer
danificação da reserva ovariana.
Indicações do tto cirúrgico: falha de tto clínico; situações específicas*.
Ideal: laparoscopia → ressecar lesões visíveis → estudo histológico.
*Situações específicas: endometrioma de ovário (tem aspecto
achocolatado); endometriose de íleo (OPERAR pois há risco de
obstrução); endometriose de apêndice cecal (OPERAR pois precisa-se
excluir tumor carcinoide); endometriose de retossigmoide (OPERAR se
houver risco de obstrução ou tto clínico falhar); endometriose de trato
urinário (OPERAR se invadir estruturas urinárias).
Endometriose e CA de ovário: a endometriose parece ser um fator de risco
independente para o câncer de ovário epitelial. O risco de a endometriose
ovariana sofrer uma transformação maligna é de aproximadamente 2% a 3%.

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