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Núcleo de Educação a Distância
UNIVERSIDADE METROPOLITANA DE SANTOS
POLÍTICAS PÚBLICAS
SEMESTRE 4
Créditos e Copyright.
NASCIMENTO, Viviam Ester de Souza.
Políticas Públicas. Viviam Ester de Souza Nascimento. Santos: Núcleo de Educação a Distância da UNIMES, 2015 (Material didático. Curso de Tecnologia em Gestão Pública).
Modo de acesso: www.unimes.br
1. Ensino a distância. 2. Tecnologia em Gestão Pública. 3. Políticas Públicas.
CDD 350 ID 1114
UNIVERSIDADE METROPOLITANA DE SANTOS
FACULDADE DE CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS, COMERCIAIS, CONTÁBEIS E ECONÔMICAS
PLANO DE ENSINO
CURSO: Tecnologia em Gestão Pública
COMPONENTE CURRICULAR: Políticas Públicas*
SEMESTRE: 4º
CARGA HORÁRIA TOTAL: 80 horas
(*) Disciplina que contempla a transversalidade.
EMENTA
Conceitos fundamentais de Políticas Públicas. Processos de formulação, implementação e avaliação. Indicadores de desempenho. Experiências governamentais com políticas públicas: debate e avaliação de casos concretos.
OBJETIVO GERAL:
Apresentar os conhecimentos básicos sobre as políticas públicas, seu ordenamento, aplicação e gestão, bem como desenvolver a habilidade de entender os mecanismos de avaliação e desempenho das políticas públicas, nos diferentes casos da gestão pública.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS:
UNIDADE I – Conceitos básicos
Estudar os conceitos básicos da formação do Estado e do controle das Políticas Públicas.
UNIDADE II – Processos de formulação, implementação e avaliação.
Entender os processos de formulação das Políticas Públicas, assim como suas ferramentas e gestão, a partir dos diagnósticos dos problemas sociais.
UNIDADE III – Indicadores de desempenho
Conhecer os principais indicadores de avaliação das Políticas Públicas, destacando suas metodologias e índices para o melhor monitoramento e provimentos dos serviços públicos.
UNIDADE IV – Experiências governamentais com políticas públicas
Analisar diferentes casos de Políticas Públicas aplicadas nos setores de educação, saúde, habitação entre outros.
CONTEÚDO PROGRAMÁTICO:
· As transformações na Economia Mundial
· Conceito de Estado
· A crise do Estado
· As Reformas do Estado
· As Falhas de Governo
· As políticas públicas e seus tipos
· As áreas do Estado em que as Política Públicas são formadas
· O controle das políticas públicas
· Formulação das Políticas Públicas
· Ciclos da Política Pública
· Planejamento e Gestão das Políticas Públicas
· O Planejamento Estratégico Situacional (PES)
· O Problema Social
· Diagnóstico e Causa de um Problema Social
· Conceituação para a Formulação e Gestão de Políticas Públicas
· Ferramentas de Formulação e Gestão das Políticas Públicas
· Indicadores e Informações para a Gestão Pública
· Monitoramento das Políticas Públicas
· Avaliação das Políticas Públicas
· Os Índices (Monitoramento e Avaliação das Políticas Públicas)
· Características dos Indicadores
· Os Serviços Públicos
· Serviços Públicos e o Poder Concedente.
· Políticas Públicas de Combate à Desigualdade Social
· Políticas Públicas de Inclusão Social
· Políticas Públicas Educacionais
· Políticas Públicas de Saúde
· Políticas Previdenciárias
· Políticas Habitacionais e Urbanas
· Política Pública e o Terceiro Setor
· Meio Ambiente e Políticas Públicas
(*) Conteúdos que contemplam a transversalidade.
Bibliografia Básica:
DIAS, Reinaldo; MATOS, Fernanda. Políticas públicas: princípios, propósitos e processos. São Paulo: Atlas, 2012. 252 p. ISBN 9788522469703. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/books/9788522484478>. Acesso em: 19 fev. 2019.
POLÍTICAS públicas: definições, interlocuções e experiências. Caxias do Sul, RS: EDUCS, 2012; Caxias do Sul, RS: EDUCS, 2012. ISBN 9788570616777. (Pearson-19-02-19)
THOMAS, Janet M.; CALLAN, Scott J. Economia ambiental: aplicações, políticas e teorias. São Paulo: Cengage Learning, 2012. Livro. (1 recurso online). ISBN 9788522109784. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/books/9788522109784>. Acesso em: 19 fev. 2019.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR:
BASSINELLO, Greice. Saúde Coletiva. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2014. (Pearson-19-02-19)
DEMO, Pedro. Política Social, Educação e Cidadania. Campinas, SP: Papirus, 1994. (Pearson-19-02-19)
FONSECA, Dagoberto José. Políticas Públicas e Ações Afirmativas. São Paulo: Selo Negro, 2009. (Pearson-19-02-19)
OLIVEIRA, Fátima Bayma de; KASZNAR, Istvan Karoly. Saúde, Previdência e Assistência Social. Políticas, Públicas Integradas: Desafios e Propostas Estratégicas. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007. (Pearson-19-02-19)
QUEIROZ, Roosevelt Brasil. Formação e gestão de políticas públicas. Curitiba: InterSaberes, 2012. (Pearson-19-02-19)
METODOLOGIA:
A disciplina está dividida em unidades temáticas que serão desenvolvidas por meio de recursos didáticos, como: material em formato de texto, vídeo aulas, fóruns e atividades individuais. O trabalho educativo se dará por sugestão de leitura de textos, indicação de pensadores, de sites, de atividades diversificadas, reflexivas, envolvendo o universo da relação dos estudantes, do professor e do processo ensino/aprendizagem.
AVALIAÇÃO:
A avaliação dos alunos é contínua, considerando-se o conteúdo desenvolvido e apoiado nos trabalhos e exercícios práticos propostos ao longo do curso, como forma de reflexão e aquisição de conhecimento dos conceitos trabalhados na parte teórica e prática e habilidades. Prevê ainda a realização de atividades em momentos específicos como fóruns, chats, tarefas, avaliações a distância e Prova Presencial, de acordo com a Portaria de Avaliação vigente.
Sumário
Aula: 1_As transformações na Economia Mundial 10
Aula: 2_Conceito de Estado 16
Aula: 3_A crise do Estado 21
Aula: 4_As Reformas do Estado 25
Aula: 5_As Falhas de Governo 29
Aula: 6_As políticas públicas e seus tipos 35
Aula: 7_As áreas do Estado em que as Política Públicas são formadas 39
Aula: 8_O controle das políticas públicas 44
Aula: 9_Formulação das Políticas Públicas 49
Aula: 10_Ciclos da Política Pública 59
Aula: 11_Planejamento e Gestão das Políticas Públicas 65
Aula: 12_O Planejamento Estratégico Situacional (PES) 69
Aula: 13_O Problema Social 75
Aula: 14_Diagnóstico e Causa de um Problema Social 79
Aula: 15_Conceituação para a Formulação e Gestão de Políticas Públicas 82
Aula: 16_Ferramentas de Formulação e Gestão das Políticas Públicas 86
Aula: 17_Indicadores e Informações para a Gestão Pública 100
Aula: 18_Monitoramento das Políticas Públicas 103
Aula: 19_Avaliação das Políticas Públicas 109
Aula: 20_Os Índices 116
Aula: 21_Características dos Indicadores 121
Aula: 22_Os Serviços Públicos 125
Aula: 23_Serviços Públicos e o Poder Concedente 129
Aula: 24_Formas de Provimento dos Serviços Públicos 133
Aula: 25_Políticas Públicas de Combate à Desigualdade Social 137
Aula: 26_Políticas Públicas de Inclusão Social 143
Aula: 27_Políticas Públicas Educacionais 149
Aula: 28_Políticas Públicas de Saúde 155
Aula: 29_Políticas Previdenciárias 161
Aula: 30_Políticas Habitacionais e Urbanas 167
Aula: 31_Política Pública e o Terceiro Setor 172
Aula: 32_Meio Ambiente e Políticas Públicas 179
Aula: 1_As transformações na Economia Mundial
Analisando o século XX e tomando como marco temporal a década de 80, podemos observar inúmeras mudanças estruturais que geraram impactos sociais e econômicos, assim como influenciaram o papel do Estado nas sociedades.
Com base nesta perspectiva, vamos analisar as principais transformações tecnológicas, econômicas e sociais que ajudam a entender a estrutura das sociedades modernas e como elas se comportam e pensam, para então, entendermos o conceito de Estado, que passou a ser revisto diante do aumento das demandas sociais e da maior participação das pessoas nas decisões políticas e econômicas.
A Revolução Tecnológica
A Revolução Tecnológica, difundida durante o século XX, proporcionou mudanças significativas nas sociedades, sendo especialmente impulsionada pelo advento da globalização que produziu maior integração entre os países, não somente do ponto devista econômico, mas também tecnológico. Neste processo, as distâncias, as barreiras físicas, econômicas e políticas foram sendo reduzidas, porém, os desafios sociais tornaram-se ainda maiores, visto o vertiginoso crescimento populacional, os impactos ambientais, a ascensão dos países em desenvolvimento (novos atores no cenário econômico político) e a continuidade das diferenças sociais e dos conflitos entre as nações (ZUFFO, 2003).[1]
Ou seja, o mundo tornou-se menos protecionista, mais tecnológico e mais complexo diante dos novos desafios econômicos, políticos e sociais. Por isso, o Estado e a gestão pública passou a sofrer pressões sociais muito maiores que em outros tempos em que a centralização e o protecionismo garantiam maior unidade e estabilidade para determinadas classes políticas mais privilegiadas.
Portanto, neste contexto destacamos a chamada "Revolução da Informação", ou mesmo a "Era da Informação" ("Sociedade da Informação" ou ainda "Nova Economia"). A revolução da informação modificou as formas de pensamento da sociedade e interferiu nos modelos produtivos, na formação da riqueza e na interação entre sociedade e o Estado.
Em outros tempos, a "Revolução Agrícola" colocou a "terra" como o principal fator de produção da riqueza. Depois, a “Revolução Industrial” transformou o “capital físico” como o condutor da produção e acumulação da riqueza (iniciou com a energia a vapor, passando pela eletricidade e depois o petróleo). Nos dias atuais, a “Era da Informação" é a que dita os rumos da produção e da riqueza, baseada na informação e no conhecimento tecnológico, sendo estas em constantes avanços (ZUFFO, 2002).[2]
Segundo Castells (2003)[3], com o advento da internet, as formas de comunicação se transformaram e consequentemente novas relações sociais também surgiram, afetando o modo de interação entre as pessoas, as organizações, as economias e os próprios governos.
Muitas mudanças então surgiram com este cenário movido pela “Tecnologia da Informação”, como no caso das redes sociais, do marketing digital, dos negócios online, das bolsas eletrônicas, dos serviços financeiros via internet, das tecnologias de informação governamentais e tantas outras formas de operações e negócios que envolvem a comunicação, a guarda e controle de informações, impactando sobre a organização social.
As Tendências Econômicas
Considerando o mundo globalizado, em que os mercados são mais competitivos, as tecnologias cada vez mais modernas, o ambiente institucional mais complexo e os governos mais descentralizados, podemos observar as seguintes tendências econômicas:
a) constantes mudanças nos processos produtivos, baseadas em tecnologias que buscam redução de custos dentro de um ambiente de negócios complexo; pois diferentes dimensões devem ser consideradas nos mercados atuais, como: consumidores mais exigentes (sobre a qualidade dos produtos e serviços; sobre a responsabilidade das empresas em relação aos processos produtivos e seus impactos ambientais; sobre as garantias dos direitos dos empregados que trabalham nas empresas; no cumprimento da legislação entre outros);
b) aumento da integração comercial e financeira entre os países. Esta integração foi resultado da globalização e é um processo ainda em curso, abrindo oportunidades de negócios entre os países, mas ao mesmo tempo tornam essas economias e seus governos mais frágeis diante das crises externas (mesmo com toda tecnologia existente). Neste item, observamos o avanço da participação econômica no cenário internacional dos países que compõe o grupo “BRICS” (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul);
c) aumento dos custos relacionados ao uso e controle das tecnologias de informação, afetando o ambiente de negócios externos e internos. Ou seja, novas tecnologias e seus avanços também trazem outros custos para os governos e as organizações que precisam investir em segurança da informação, atualizações tecnológicas e qualificação dos seus funcionários que necessitam acompanhar os avanços tecnológicos para manter as organizações competitivas nos mercados.
As Relações Sociais
Quanto à forma como as sociedades se relacionam e se comportam no cenário atual, podemos identificar as seguintes tendências:
a) riscos associados à “hiperinformação”. Este fenômeno está relacionado ao grande volume de informação que muitas vezes não é bem utilizado pela sociedade. A circulação e acumulação dessas informações nas redes acabam por vezes não gerando o conhecimento esperado, podendo até mesmo promover um retrocesso no processo de aprendizagem das pessoas, visto o distanciamento dos métodos básicos de educação formal. Neste cenário o aprendizado passa pelos computadores, celulares, tablets e outros instrumentos que dificultam o desenvolvimento do hábito da leitura, da interpretação e da reflexão dos textos. Nos dias atuais, em sociedades mais tecnológicas, a velocidade da informação promove um comportamento imediatista, no qual as respostas devem ser rápidas e objetivas e por isso, muito se questiona se hoje a “era da informação” não está se transformando na “era da ignorância” (LASTRES, 2000).[4]
De acordo com Zuffo (2002, p.18)[5]: “Numa cibersociedade, em que o conhecimento e a educação ocupam papel central no processo de desenvolvimento e progresso social, as políticas governamentais de desenvolvimento científico-tecnológico são fundamentais no processo de manutenção da identidade cultural e soberania nacional". Ou seja, necessitamos controlar os efeitos negativos do uso abusivo das tecnologias, pois as sociedades sem conhecimento (ainda que tenham acesso à informação) não desenvolvem sua autonomia e nem participam dos benefícios tecnológicos existentes, mantendo-se como sociedades “alienadas” e “desiguais”.
b) conflitos e intolerância entre os povos que ainda existem, mesmo com a globalização e os avanços tecnológicos. A reorganização socioeconômica do modo de produção do conhecimento multiplicou as possibilidades de uso dos recursos, mesmo assim, a maior parte da produção e distribuição do conhecimento continuou concentrada nos países mais desenvolvidos, não se revertendo na redução das desigualdades sociais. Este se tornou um desafio para os governos e organizações que assumem o papel estratégico no uso do conhecimento, tendo a responsabilidade de convertê-lo em benefícios a todas as sociedades (MACIEL, 2001).[6]
c) problemas com a sustentabilidade do meio ambiente: diversos problemas relacionados ao ordenamento social no contexto atual estão diretamente ligados às condições humanas e ambientais que caracterizam as sociedades atuais, pois os desastres naturais, o aquecimento global e a má distribuição da riqueza acentuou a desigualdade social e a pobreza em diversos países, mesmo com a globalização e todos os avanços tecnológicos. De acordo com Reis, Fadigas e Carvalho (2012, p.7)[7] "a exploração descontrolada dos recursos naturais, no uso de tecnologias de larga escala e no consumo desenfreado" resultam em "aspectos ecologicamente predatórios, socialmente perversos e politicamente injustos". Tais valores, segundo o mesmo autor, propiciam a geração de: "desastres ecológicos; disparidades e desintegração social; falta de perspectivas futuras e marginalização de regiões e indivíduos; além de terrorismo, guerras localizadas, fortalecimento do tráfico de drogas e armas, violência urbana e outros fatores de desagregação humana e degradação ambiental.
Dentro dessa discussão, a reflexão sobre como a sociedade interfere no meio ambiente e impacta sobre a manutenção dos recursos naturais no futuro, tornou-se extremamente importante para um novo modelo de desenvolvimento econômico e social sustentável. Diante desse desafio, a responsabilidade dos governos se intensificou, portanto, devem ser consideradas as dimensões políticas, econômicas, sociais, tecnológicas e ambientais para um modelo de gestão pública integrada e ampla, que envolvam várias camadas e organizações da sociedade, e até mesmo de outros países.
Por fim, reconhece-se então, que a "equidade" é uma condiçãoessencial para um modelo de desenvolvimento sustentável.
[1] ZUFFO, João Antonio. A sociedade e a economia no novo milênio: os empregos e as empresas do turbulento alvorecer do século XXI. São Paulo: Manole, 2003.
[2] ZUFFO. João Antonio. Sociedade e a economia do novo milênio: a tecnologia e a infossociedade. São Paulo: Manole, 2002.
[3] CASTELLS, Manuel. A galáxia da Internet: reflexões sobre a Internet, os negócios e a sociedade. Trad. Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.
[4] LASTRES, Helena Maria Martins. Ciência e tecnologia na era do conhecimento: um óbvio papel? Parcerias Estratégicas. Centro de Gestão Estratégica, n.9, out. 2000.
[5] ZUFFO. João Antonio. Sociedade e a economia do novo milênio: a tecnologia e a infossociedade. São Paulo: Manole, 2002.
[6] MACIEL, Maria Lucia. Hélices, sistemas, ambientes e modelos: os desafios à Sociologia da Inovação. Disponível em: Acesso em: 25/03/2014.
[7] REIS, Lineu Belico; FADIGAS, Eliane A.F.Amaral; CARVALHO, Cláudio Elias. Energia, Recursos Naturais e a Prática do Desenvolvimento Sustentável. 2ª. Edição. São Paulo, 2012.
Aula: 2_Conceito de Estado
Observamos na aula anterior as inúmeras mudanças que afetaram as relações sociais e o papel dos governos, que se depararam com uma crescente demanda por maior qualidade de vida das populações e consequentemente, a necessidade de rever o papel do Estado na economia. A partir dessa perspectiva, vamos nesta aula entender o conceito de "Estado" sob a perspectiva política e social. Lembre-se que na disciplina de Economia e Finanças, o Estado foi analisado como um agente econômico necessário para suprir as falhas de mercado. Portanto, podemos analisar o Estado sob diferentes perspectivas.
O Estado
Tradicionalmente, o conceito de Estado está relacionado à organização política de uma nação, ou seja, a forma como uma nação é comandada. Historicamente, o Estado surgiu como o melhor instrumento de congregação das adversidades do ambiente social, por ser um instrumento de força e cooperação entre os homens (QUEIROZ, 2009).
Do ponto de vista histórico, é a partir do Renascimento[1] que a concepção de Estado se formou. Com o desenvolvimento da classe burguesa mercantil, após o fim do Feudalismo, as cidades se desenvolveram e a formação das monarquias e seus reinados se fortaleceram. Sobre essa passagem histórica, a literatura destaca o pensamento deNicolau Maquiavel (1469 - 1527), conhecido por seu famoso livro intitulado "O príncipe" de 1532. Essa obra é reconhecida por sua importância na construção do conceito de Estado.
O contexto histórico da obra é uma Itália em decadência, fragmentada em pequenos Estados e que estava na iminência de perder sua independência em razão das invasões da Espanha e da França (séculos XV e XVI).
Maquiavel então apresenta em seu livro, as condições necessárias para que um rei torne-se soberano e seja capaz de manter suas conquistas, seu reino e seu poder. Defendia ao governo a lógica da força, mesmo que por meio da violência, o que ficou conhecida por sua famosa expressão: “os fins justificam os meios”. Essas concepções políticas influenciaram as sociedades da época e fortaleceram a concepção do Estado monárquico.
Outros autores importantes também se destacaram na concepção do Estado, como os filósofos ingleses Thomas Hobbes e John Locke, da corrente conhecida como "Contratualistas", que entendiam que o Estado foi criado por meio de um "contrato social".
Thomas Hobbes (1588 - 1679), com sua obra “Leviatã”, publicada em 1651, expressa o pensamento de que os homens, em seu estado de natureza, são iguais. Porém, o egoísmo e o egocentrismo são características humanas inevitáveis e que por isso, a convivência social sempre é conflituosa. Portanto, para Hobbes, existem três causas que provocam a discórdia entre os homens: a competição, a desconfiança e a glória. Por essa razão, os indivíduos necessitam de um "pacto social" que reduza os conflitos e garanta a paz e a segurança. Para que esse pacto se concretize é necessário que todos abram mão da liberdade e dos direitos individuais, transportando ao Estado o poder de garantir a ordem e a segurança. Sem esse contrato, o estado de natureza irá prevalecer e a discórdia e as disputas entre os homens determinarão as relações humanas.
Já John Locke (1632 – 1704), em sua obra “Segundo tratado sobre o governo civil”, publicada em 1681, defende a ideia de que os homens, no estado de natureza, viviam em relativa harmonia e paz. Nesta condição, o homem também é dotado de razão e de sua propriedade (como a vida, a liberdade, os bens móveis e a terra que é um direito de todos e obtido pelo trabalho, o que torna-o uma propriedade privada). A partir daí, o "estado de guerra" se dá quando existe a violação da propriedade privada, sendo, portanto, necessária a criação de um "contrato social" para proteger a propriedade privada e direitos individuais. Para Locke, essa condição levou os homens a se unirem e estabelecerem o “contrato de consentimento” que constitui o Estado Civil, escolhendo a forma de governo e dos poderes legislativos e executivos. Se este ordenamento não for respeitado, o governo pode tornar-se tirânico e como consequência, o estado de guerra retornará.
Observamos que o conceito de Estado se construiu ao longo da história e foi fortemente influenciado pelo pensamento das sociedades em cada momento de seu desenvolvimento. Atualmente, a concepção mais comum é que o Estado se define como um conjunto de instituições que controlam e administram uma nação. Essas instituições englobam não somente o governo, mas também as forças armadas, as instituições públicas e as diferentes esferas governamentais. Além disso, o Estado também representa um "país soberano", com estrutura própria e politicamente organizado, o que deve lhe garantir autonomia e independência em relação às outras nações, não somente do ponto de vista territorial, mas também do ponto de vista político, social e econômico. Assim, temos como Elementos Básicos do Estado: (KENSEN, 1990)[2]
a) Território: base física do Estado. É a base física sobre a qual se fixa o povo e se exerce o poder estatal, sob a ordem jurídica nacional;
b) Povo: associação humana. É o conjunto das pessoas dotadas de capacidade jurídica para exercer os direitos políticos assegurados pela organização estatal. é diferente de população, pois esta se refere ao número de habitantes, incluindo, por exemplo, os estrangeiros, os visitantes temporários, ou seja, é uma estatística. O povo também se difere de “nação”, pois, embora o conceito de nação ser associado ao conceito de povo, contém um sentido político próprio: a nação é o povo que já adquiriu a consciência de si mesmo, como história, cultura e existência (conjunto homogêneo de pessoas que se consideram ligadas entre si por vínculos de “sangue”, idioma, religião, cultura, ideias, objetivos).
Já para o conceito de povo, existe a questão da soberania (Art.1º, parágrafo único, da Constituição Federal, 1988). A soberania é poder político supremo de um povo, porque não está limitado por nenhum outro poder na ordem interna, e é poder político independente, porque na sociedade internacional não tem que acatar as regras que não sejam, voluntariamente, aceitas.
c) Governo: comando por parte de autoridade soberana. É o conjunto do ordenamento jurídico do Estado, que exerce a autoridade e o exercício da administração pública. Deve ser soberano, ou seja, absoluto, indivisível e incontestável no âmbito de validade da ordem jurídica estatal, representada .
No plano interno, o poder soberano não encontra limites jurídicos. Mas parte da doutrina entende que a soberania estatal é restringida por princípios de direito natural, além de limites ideológicos (crenças e valores nacionais) e limites estruturais da sociedade (sistema produtivo, classes sociais). Já no plano internacional, a soberania estatal encontra limites no princípio da coexistência pacífica das soberanias estatais (BERNARDES e Ferreira, 2014).[3]
Portanto, o Estado se constitui soba organização de um conjunto de leis que regulam, normatizam e legitimam o poder de seus representantes. Por isso, as Constituições e todo aparato legal de um país, determina um ambiente institucional no qual são ordenados os papeis, os direitos e os deveres dos agentes e do próprio Estado, reconhecendo então a soberania interna e externa da nação. Portanto, o Estado representa o conjunto de instituições que estruturam e regulam uma população em seu território e a soberania do povo (QUEIROZ, 2009).
[1] Movimento cultural entre os séculos XIII e XVII. Idealizado pela burguesia, iniciou-se na Itália (região de Florença) e seguiu-se para a Alemanha, Inglaterra e Países Baixos. Foi caracterizado também pela expansão marítima (Grandes Navegações), o Absolutismo político e a Reforma religiosa.
[2] Kensen, Hans. Teoria geral do Direito e do Estado. São Paulo: M. Fontes, 1990.
[3] Bernardes, Juliano Teveira; Ferreira, Olavo augusto Vianna Alves. Direito Constitucional. 4ª Edição. Salvador:JUSPODIVM, 2014.
Aula: 3_A crise do Estado
Como foi estudado na aula anterior, ao Estado foi transferido o poder de decidir os rumos de uma nação, de definir planos e ações que conduzam o desenvolvimento econômico e social, coordenando e organizando as instituições nas diferentes esferas governamentais e influenciando as decisões dos agentes econômicos e das organizações civis. Todo esse poder se tornou justificável em razão da necessidade de existir um Estado, pois sem ele, uma nação não conseguiria se manter unificada e organizada.
Segundo Bresser-Pereira (1995, p.8 apud QUEIROZ, 2009, p.27), "o Estado é uma organização burocrática ou aparelho, que se diferencia essencialmente das demais organizações, por que é a única que dispõe de poder extroverso - de um poder político que ultrapassa os seus próprios limites organizacionais".
Mas ao mesmo tempo, a história mostrou que se os resultados esperados não atendessem as expectativas da sociedade, ao Estado também seria atribuída a maior responsabilidade pelo fracasso. Por isso, diante desse cenário, os Estados foram obrigados a mudarem suas formas de atuação e de organização, reformulando os modelos políticos e buscando se adequarem às exigências da população e dos diferentes grupos de interesses na sociedade.
A Crise do Estado Contemporâneo
O Estado liberal que se estruturou ao longo do século XVIII, apoiado no pensamento do liberalismo político e econômico, que se consolidou com o movimento Iluminista, atribuiu ao Estado um papel de mínima participação no ordenamento econômico e social das nações, passando o Estado a ser responsável, essencialmente, pela segurança nacional, arrecadação e diplomacia. Ao mercado e aos agentes privados, a economia deveria se guiar, defendida pelo sistema econômico capitalista. Ou seja, com a decadência das monarquias e a maior independência das nações, o Estado totalitarista é gradualmente substituído pelo Estado liberal, que tornou-se mais adequado aos padrões comerciais e de industrialização que se desenvolveu com a Revolução Industrial e todo o processo de desenvolvimento do capitalismo mercantil e industrial do século XIX.
Porém, após a Primeira Guerra Mundial (1914 - 1918), a Revolução Russa (1917) e a Quebra da Bolsa de Nova Iorque (1929), a década de 30 no século XX foi marcada por um período de grandes mudanças na economias e nas relações sociais. A alta dos níveis de desemprego e a falência de várias empresas abalou as concepções do livre mercado (capitalistas) e revelaram as ineficiências de um sistema econômico desigual e incapaz de sozinho encontrar o equilíbrio econômico. Portanto, sair de uma crise econômica sem a participação do Estado revelou-se impossível naquele momento. Nesse contexto surge então o chamado Estado Intervencionista, defendido pelo pensamento keynesiano (do economista inglês John Maynard Keynes, 1883 - 1946).
Nessa nova concepção, ao Estado se atribuiu um papel complementar à necessidades econômicas e sociais. Ou seja, o Estado necessitava intervir na economia com investimentos e ações governamentais que buscassem reverter o cenário de crise, fosse por meio de estímulo e concessão financeira para obras de infraestrutura, ou até mesmo, atuando diretamente na prestação das atividades econômicas. Além disso, deveria assumir a prestação de serviços sociais fundamentais que atendessem as demanda das classes de menor renda.
Com essa revisão do papel do Estado intervencionista, desenvolve-se o chamado Estado do Bem-Estar Social (Welfare State), que influenciou, especialmente, os países da Europa no pós Segunda Guerra Mundial (1938-1945). As principais características desse modelo é a centralização e regulação estatal, com fornecimento de bens públicos à sociedade. Permite o livre mercado, mas com forte participação do Estado na Economia.
Nos países do Terceiro Mundo, desenvolveu-se o Estado Desenvolvimentista e Protecionista, no qual os governos assumiram a condução dos projetos de desenvolvimento econômico, adotando o financiamento público (muitas vezes em parceria com o capital externo), mas também com defesa dos mercados nacionais (no Brasil, temos o exemplo dos Planos Nacionais de Desenvolvimento impulsionados a partir dos governos de Getúlio Vargas, após 1930, e mantidos pelos governos militares após a década de 60 até a década de 80).
E na Europa Oriental e na Ásia, surgem os Estados Comunistas do Bloco Soviético (influenciado pelo pensamento marxista, de Karl Marx, 1818 - 1853, sendo implantado o sistema econômico socialista, no qual os meios de produção são de controle do Estado). Os principais casos da Revolução Socialista ocorreram: na Rússia, em 1917, com a formação da "União das Repúblicas Socialistas Soviéticas" (URSS); na Alemanha em 1946, com a divisão em Alemanha Oriental (socialista) e Alemanha Ocidental (capitalista); na China em 1949; em Cuba (1959); e na Coréia, em 1948, com a divisão entre a Coréia do Norte (socialista) e a Coréia do Sul (capitalista).
Aos poucos, os Estados intervencionista, Protecionista e Socialista tornaram-se cada vez maiores, se sobrecarregando de tarefas e de gastos públicos. Nesse contexto, a ineficiência na produção de bens e serviços públicos também se intensificou. Tal cenário acabou se agravando a partir da década de 80, com o advento da Revolução Tecnológica e da Globalização, o que conduziu à necessidade de um ajustamento do modelo econômico protecionista e centralizador.
Sob os princípios do liberalismo moderno, muitos países promoveram a abertura econômica, a redução das barreiras comerciais, a desestatização e a maior integração dos mercados externos, além da intensificação das movimentações de capitais (casos típicos do Brasil, da China, da Índia e da Rússia).
Com a globalização é imposto aos Estados uma dupla pressão, pois de um lado aumentou a responsabilidade do Estado em proteger a mão de obra e as empresas nacionais da concorrência externas, e de outro lado, o próprio Estado se deparou com uma sociedade mais exigente e que cobrava maior eficiência das tarefas públicas.
Com esse contexto econômico globalizado, competitivo e tecnológico, a crise do Estado acabou se configurando sob três aspectos fundamentais:
a) crise fiscal: caracterizada pelos crescentes déficits públicos decorrentes do aumento dos gastos dos governos que inviabilizaram a manutenção adequada de políticas públicas, exigindo, muitas vezes, reformas na estrutura de arrecadação e gastos dos governos;
b) crise do modo estatizante de intervenção do Estado: que representa o esgotamento do Estado do Bem-Estar Social e dos países comunistas, exigindo uma redução das estatais na economia; e
c) crise do modelo burocrático de gestão pública: caracterizado pelo questionamento da eficiência do Estado de prover os serviços públicos, seja do ponto de vista financeiro, seja do ponto de vista técnico.
Portanto, o Estado Intervencionista que no início do século XX surgiu como o modelo mais adequado de desenvolvimento econômico e social, acabou tornando-se obsoleto, o que demandou ajustes econduziram às reformas do Estado.
Aula: 4_As Reformas do Estado
Resumidamente, como estudado anteriormente, podemos entender que a partir da década de 70 (e mais ainda na década de 80), os modelos econômicos baseados no Estado Intervencionista, como o Estado do Bem-Estar Social dos países desenvolvidos da Europa, assim como o Estado Socialista do Leste Europeu e o Estado Desenvolvimentista dos regimes militares da América Latina, deixaram de ser eficientes diante das mudanças e desafios econômicos e sociais que caracterizaram o mundo globalizado.
Diante disso, as demandas sociais aumentaram e geraram pressões sobre os governos. Sendo assim, dentro desse cenário mais competitivo, o Estado necessitou se reformar, tendo como um importante exemplo dessas reformas a descentralização pública, caracterizada pelas privatizações (desestatização) e concessões públicas de atividades produtivas ao setor privado.
O processo de reforma do Estado que iniciou-se na década de 70, determinou um estágio de modernização dos governos, que se caracterizou pela "diminuição do papel do Estado na economia" e do "repasse de atribuições e funções" à iniciativa privada em geral (empresas, organizações civis, etc). Como resultado, boa parte de sua produção direta de bens e serviços foi transferida à sociedade (ou estabelecido parcerias público-privado), abrindo espaço para os governos assumirem o papel de "reguladores e fiscalizadores" do mercado e de "indutores" do processo de desenvolvimento por meio de "políticas governamentais compensatórias" para certos grupos sociais de menor renda (QUEIROZ, 2009, p.31).
Esse estágio da reforma (décadas de 70 e 80), em que o aparelho estatal é reduzido (extinção de órgãos, entidades e empresas públicas, redução do funcionalismo público) e os mecanismos de livre mercado são retomados e priorizados, é classificado como reformas de "primeira geração".
Em sua continuidade, a reforma estatal passou para a "segunda geração". Segundo Queiroz (2009, p.32), o que se defende é a "reconstrução do Estado para exercer novas e estratégicas funções". Nesse aspecto, os pensadores defendem que não basta reduzir o papel do estado na economia, mas que o Estado recupere sua capacidade de governar. Segundo Bresser Perreira (2009)[1], a reforma do Estado é um processo de "criação e transformação" de instituições com o intuito de solucionar os problemas de governabilidade e governança, pois esses conceitos correspondem às dimensões política e administrativa do Estado, que são essenciais para sua reforma.
Governabilidade e Reforma Política
O conceito de governabilidade está relacionado à capacidade política do Estado de governar e à legitimidade do Estado perante à sociedade, ou seja, governabilidade depende do apoio que a população de um país atribui ao seus governos. Em países não democrático, ou com governos centralizadores, a legitimidade do Estado é questionável. No Brasil e nos países latinos americanos, em que governos totalitários e militares tomaram o poder e governaram durante décadas, várias crises políticas ocorreram, o que podem ser entendidas como "crises de governabilidade".
No caso das reformas do Estado, demandadas no contexto pós globalização, ocorreram inúmeros avanços nos processos políticos, caracterizados pela democratização dos governos. Ainda assim, o problema da governabilidade não acabou, passando a ser atribuída à necessidade de adequação das instituições políticas estatais ao efetivo interesse público. Assim, podemos entender que a governabilidade nos regimes democráticos depende, essencialmente, da intermediação dos interesses dos governos e da sociedade como um todo.
Além disso, a Reforma do Estado, envolve também o processo de criação de mecanismos de "responsabilização" dos políticos e gestores públicos (accountability) perante os cidadãos (eleitores). Isso representa o dever de prestar contas e assumir responsabilidades sobre os resultados de suas ações, evitando-se, assim, a cultura de "prevalência dos interesses privados sobre o interesse público" (rent-seeking - busca de rendas) (BRESSER-PEREIRA, 1997). [2]
Governança e Reforma Administrativa
A diferença entre governabilidade e governança está no aspecto prático, ou seja, enquanto a governabilidade deriva depende da legitimidade do Estado, a governança se refere à capacidade financeira e administrativa dos governos de tornar efetiva as ações governamentais. Por exemplo, no Brasil da década de 70 e 80, ocorreu uma crise fiscal caracterizada pela poupança pública negativa (déficits nas contas públicas). Tal condição impedia o Estado de desenvolver novas políticas governamentais, contribuindo para a precarização dos serviços públicos, o que representou um problema típico de governança.
Dentro desse contexto, a crise de governança revela outros problemas como a "ineficiência da máquina administrativa", muitas vezes caracterizada pela "rigidez" ou "engessamento" da Administração Pública, que não consegue viabilizar o atendimento das demandas sociais. Por isso, o debate sobre a Reforma Administrativa se fortalece, defendendo-se a necessidade de uma administração mais moderna e eficiente, numa disputa constante entre a "burocracia formal", caracterizada pela centralização da administração pública, e a corrente que defende a "descentralização da administração pública".
Nota-se que esse embate entre as correntes é cíclico. Em determinados momentos, os defensores da modernização do aparelho estatal clamam por reformas que priorizem a descentralização, autonomia e liberdade de operação por parte das organizações públicas. Em outros momentos, o mesmo sistema que apareceu como resposta à ineficiência burocrática acaba propiciando a formação de privilégios corporativistas, favorecimento de grupos, clientelismo e corrupção. Dessa forma, volta ao debate a proposta mais tradicional e centralizadora, defendendo o controle e a probidade administrativa. Portanto, esse debate se mantêm em constante disputa, acompanhando também as reformas do Estado Intervencionista. Neste, ainda prevalece a posição de uma reforma para uma "administração pública gerencial", em substituição ao tradicionalismo burocrático. Conclui-se então, que os objetivos de Reforma do Estado passa, inevitavelmente, pela reforma administrativa.[3]
[1] Bresser-Pereira, Luiz Carlos. Construindo o Estado Republicano. Rio Janeiro: FGV, 2009.
[2] Bresser-Pereira, Luiz Carlos Bresser. A reforma do Estado dos Anos 90: Lógica e Mecanismos de Controle. Brasília: Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado, 1997.
[3] PIMENTA, Carlos César. A Reforma Gerencial do Estado Brasileiro no Contexto das Grandes Tendências Mundiais. Revista de Administração Pública. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, v. 32, n. 5, p. 173-199, set./out., 1998.
Aula: 5_As Falhas de Governo
Nas aulas anteriores estudamos como o Estado se formou e como a globalização impactou sobre a reflexão do papel do Estado na economia. Ainda dentro desse debate, reconhece-se que quanto ao ordenamento dos mercados, o Estado deve atuar para regular e minimizar as "falhas de mercado", que decorrem do poder econômico dos mercados concentrados, das externalidades econômicas, dos problemas com o uso dos recursos comuns, a assimetria de informação e a problemática de gerar os bens públicos (estudado na disciplina de Economia e Finanças Públicas).
Agora, complementarmente, vamos analisar as chamadas "falhas de governo" (falhas de Estado), no qual a teoria aponta que na atuação de governos, ainda que dotados de poder regulatório e fiscalizador, existem fatores na estrutura e nas relações públicas que propiciam falhas na execução das ações de Estado. Esses fatores abrem espaço para o oportunismo dos agentes econômicos, o que reduz o cumprimento do papel de equidade dos governos. Para tanto, vamos analisar as principais características de duas correntes teóricas importantes: a Teoria da Escolha Pública e a Teoria da Captura do Estado.
Teoria da Escolha Pública
A Teoria da Escolha Pública foi desenvolvidaa partir da década de 60, com os trabalhos de autores como James McGill Buchanan (1919 - 2013) e Gordon Tullock (1922- 2014)[1]. A base do pensamento dessa teoria é a de que os atores políticos, dentro da estrutura governamental, tomam decisões influenciadas por interesses pessoais, ainda que estejam numa organização pública. Ou seja, "...a opção pública está condicionada pelas preferências, pelos valores e pelos interesses pessoais de quem faz as escolhas em nome da coletividade..." (QUEIROZ, 2009, p. 39). Por isso, se considera muito importante que as instituições públicas implementem mecanismos de controle sobre os atores políticos. Com base nessa análise, vamos apresentar as principais determinantes da atuação dos governos na economia e na sociedade, que ajudam a entender as falhas de governo:
1) Decisões temporais: estas se referem aos conflitos de interesse no curto prazo dos governos e da sociedade no médio e longo prazo, pois muitas vezes os políticos, interessados na manutenção dos seus mandatos, deixam prevalecer interesses eleitoreiros, mesmo que esses afetem a eficiência de projetos de longo prazo. Por exemplo, é muito comum observar que em ano de eleição, os governos tendem a escolherem políticas que não sejam "antipopulares", como "aumento de tarifas", mesmo que essa medida comprometa a viabilidade dos projetos em andamento. Mas depois de eleitos, os governos tendem a implementarem então as medidas de aumento de tarifas, ou cortes de gastos com serviços públicos.
2) Falha de integração entre as programações das esferas de governo: observa-se que as esferas governamental, constituída pela federação (união), estados e municípios, muitas vezes não apresentam um alinhamento sobre os objetivos das políticas públicas de interesse social, pois cada um trabalha com base em seu próprio diagnóstico. Por exemplo, é comum que os problemas sociais de um município, ou estado, não recebe a mesma atenção por todos os governos; ou seja, cada uma das esferas trabalha de modo independente, impedindo assim a "apropriação da sinergia que seria resultante dos esforços cooperativos e articulados no tratamento dos problemas sociais" (QUEIROZ, 2009, p. 40).
3) Conflito entre sustentabilidade econômica ambiental futura e o presente imediato: essa falha também tem relação com decisões temporais, mas tendo como objeto de impacto os elementos relacionados ao meio ambiente e sua sustentabilidade. Considera-se então as decisões políticas de interesse de curto e médio prazo que não se preocupam com os efeitos ambientais e sociais para as gerações futuras. Como exemplo, temos os casos de vultuosos financiamentos públicas para grandes obras que não apresentam efetiva prioridade ou geram benefícios de longo prazo, além de não incorporarem as compensações sobre os impactos ambientais, comprometendo as contas públicas e beneficiando muitas vezes, apenas alguns grupos de interesse.
4) Superposição de ações governamentais: esta falha, comum nos países em desenvolvimento, também tem relação com a falha citada no item dois (falha de integração entre as programações). Neste caso, observa-se o descompasso nas programações entre as diferentes esferas governamentais. O exemplo observado são os programas de políticas públicas articulados por municípios, estados e união, que atuam sobre o mesmo problema, mas sem comunicação entre eles, com isso, ocorrendo uma falta de coordenação dessas programações. Como resultado, acaba ocorrendo um desperdício de recursos públicos que poderiam ser melhor distribuídos, se as ações governamentais fossem mais articuladas.
5) Conflito de representatividade nas decisões de alocação de recursos setoriais: dependendo de como são compostas os representantes das câmaras legislativas (vereadores, deputados estaduais e deputados federais), podemos observar que a representatividade dos políticos muitas vezes acabam sendo centralizados em determinadas regiões, que conseguem junto ao executivo, recursos e benefícios que atendem determinadas populações, enquanto outras, menos representadas, acabam não obtendo atenção dos políticos (tendência das bases políticas "privilegiarem" certas regiões nas decisões de alocação dos recursos, enquanto outras há "falta" de recursos).
6) Uso inapropriado de critério político em certas escolhas: essa falha diz respeito ao problema de gestão que é comum ocorrer nos comandos das organizações públicas (como empresas, agências reguladoras e ministérios por exemplo), quando são definidos os gestores que irão administrar esses órgãos. Isso por que, por serem admitidos com base na indicação política (ainda que sejam sabatinados, ou seja, passam por uma avaliação pessoal), muitas vezes os mesmos não atendem aos critérios técnicos da função. Neste caso, acaba ocorrendo uma má gestão por falta de competência técnica, visto que a escolha foi por critério político, causando prejuízos à administração pública. É por isso que existe uma corrente que defende a aplicação de concurso público para todas as ocupações em organismos governamentais.
7) Atendimento a interesses ilegítimos: considerada uma das principais falhas dos países organizados em estado democrático, pois é comum observarmos os representantes políticos atendendo os interesses de certos grupos da sociedade, com maior poder de influência sobre as decisões de Estado, em detrimento aos interesses da sociedade como um todo. Esses grupos se articulam, de modo democrático, porém, ilegítimo do ponto de visto coletivo. Como exemplo, os recursos aplicados em obras de infraestrutura que geram faturamento para certos grupos empresariais, valorização dos imóveis da região que beneficiam grandes proprietários de terrenos, mas que impactam, negativamente, sobre outras populações ou sobre o meio ambiente.
8) Conflito de interesses corporativos de órgãos do governo e os interesses da sociedade: essa falha é comum no âmbito do uso dos recursos públicos, que acabam sendo utilizados em prol de interesses corporativos dos órgãos que fazem parte dos governos, deixando de serem utilizados para a sociedade. Segundo estudos e levantamentos de organizações civis, a maior parte dos recursos tomados pelos países em desenvolvimento (empréstimos), acabam sendo aplicados em reformas prediais, aquisição de veículos e equipamentos de uso do próprio governo e não em benefício da população. Esse tipo de problema necessita de um maior controle da sociedade sobre como os recursos do governo são utilizados. Por isso, a conscientização e o uso de mecanismos institucionalizados de controle, devem ser incentivados para a correção desse falha de governo.
9) Resistência do sistema institucional governamental aos ajustes requeridos pela realidade socioeconômica: nesse caso, a falha identificada ocorre em razão da dificuldade do Estado de se adequar, de modo dinâmico, às mudanças estruturais na economia das sociedades modernas. É comum observarmos instituições públicas, criadas em outros momentos da história, sendo mantidas sem uma efetiva utilidade para o momento atual. É o caso, por exemplo, de ministérios, subsidiárias estatais e outros organismos públicos que continuam operando e onerando as contas do Estado, sem apresentarem retornos à sociedade como um todo, mas atendendo aos interesses daqueles que se utilizam desses recursos.
Observamos que o conjunto dessas falhas de governo ajudam a entender como a qualidade das políticas públicas são comprometidas na gestão dos governos. Ainda dentro dessa temática, existe mais um problema considerado muito comum nos países em desenvolvimento, e que se refere ao chamado "Captura do Estado" por grupos de interesses ou coalizões distributivas, visando a prática de "rent-seeking". Vamos analisar essa falha principal.
Teoria da Captura do Estado
O chamado rent-seeking (busca de rendas) é entendido como "o comportamento predatório por parte dos indivíduos ou de coalizões distributivas que têm como objetivo extrair parte do excedente social em benefício próprio" (TOLLISON, 1982 apud QUEIROZ, 2009, p.47).
As "coalizões distributivas"são grupos organizados que se articulam junto ao aparelho do Estado para influenciarem as decisões dos governos em prol dos interesses de empresas ou outras organizações. Dessa forma, esses grupos "capturam" os governos, pois conseguem o apoio dos mesmo para obterem vantagens e benefícios em suas operações no mercado. Dessa forma, as externalidades positivas do livre mercado e da competição são neutralizados.
De acordo com vários estudos, o rent-seeking é extremamente prejudicial ao funcionamento dos mercados e geram efeitos perversos ao bem-estar da sociedade, pois se utilizam de recursos econômicos que são escassos, especialmente em países menos desenvolvidos, "transferindo" essas rendas para determinados setores, ao invés de gerá-las de modo competitivo como resultante da produtividade dos processos produtivos no conjunto da sociedade (QUEIROZ, 2009).
Portanto, na busca por vantagens econômicas junto ao Estado, os grupos de interesse se aproveitam dos recursos da sociedade praticando a sonegação de impostos, ganhando licitações por meio de informações privilegiadas, fraudando contratos por meio de superfaturamento, obtendo subsídios ou benefícios fiscais injustificáveis, recebendo vencimentos sobre aposentadorias, licenças e pensões sem terem realizadas as contribuições devidas, entre outras práticas abusivas e corruptas, tendo na maioria dos casos, o apoio e consentimento dos próprios funcionários e gestores públicos (BRESSER-PEREIRA, 1990).[2]
Analisando as falhas de mercado e o problema da captura do Estado, entendemos melhor as dificuldades das instituições democráticas se consolidarem nos países em desenvolvimento. A medida que esses problemas são combatidos e as relações entre Estado e sociedade se tornam transparentes e disciplinados, o processo de democratização evolui e as instituições envolvidas no controle social e na gestão das políticas públicas tornam-se mais eficientes.
[1] Juntos, os autores publicaram em 1962 o livro "The Calculus of Consent: Logical Foundations of Constitutional Democracy", que é considerada a principal obra da Teoria da Escolha Pública.
[2] Bresser-Pereira, Luiz Carlos. Construindo o Estado Republicano. Rio Janeiro: FGV, 2009.
Aula: 6_As políticas públicas e seus tipos
Estudamos até aqui, sobre como o Estado se formou ao longo da história e papel dos governos na sociedade, destacando suas crises, falhas e reformas. Agora vamos passar para o estudo das políticas públicas.
Quando nos referimos às Políticas Públicas, naturalmente nos reportamos ao âmbito governamental, visto que os governos são os responsáveis pela elaboração e execução das políticas públicas. Por isso, podemos entender as políticas públicas na forma "imaterial", quando por exemplo são criados os decretos[1] no exercício legal dos governos; ou na forma de "bens e serviços" oferecidos pelos governos, diretamente à população (QUEIROZ, 2009).
Outra forma de tratar as políticas públicas é por meio dos planos, programas e ações governamentais. Estes, essencialmente, devem utilizar os recursos públicos em prol dos interesses da sociedade, que apontam suas demandas e exigem processos e resultados que resolvam os problemas da população.
Segundo Queiroz (2009), destaca-se que "Políticas Públicas" diferem de "Políticas de Governo", isto por que, as políticas públicas independem do mandato do governo. As políticas de governo se relacionam, mais especificamente, com a plataforma e o programa do governo eleito, enquanto as políticas públicas tem um caráter contínuo, independente e que deverá ser mantido ao longo dos diferentes mandatos governamentais.
Portanto, Políticas Públicas podem ser definidas como o conjunto elaborado de decisões, explícitas ou implícitas, que estabelece as diretrizes para as ações governamentais, com objetivos presentes e futuros, sobre os interesses sócio econômicos de um país, estados ou municípios. Utiliza-se de conteúdos, instrumentos e aspectos institucionais vigentes, com a participação de governos, organismos não governamentais, empresas e outras entidades públicas ou privadas, nacionais, ou até mesmo internacionais.
Tipos de Políticas Públicas
Segundo a finalidade em relação à função do Estado na sociedade, as políticas públicas podem ser classificadas nos seguintes tipos (QUEIROZ, 2009):
1) Políticas Estabilizadoras: objetiva estabilizar as condições econômicas do país, agindo de modo a alcançar: a melhoria dos níveis de emprego; a estabilidade de preços com o controle da inflação e das taxas de juros na economia; a manutenção do crescimento econômico com taxas positivas da variação do PIB (Produto Interno Bruto); o aumento da renda per capita (renda média da população); o equilíbrio das contas públicas (alcançar bons níveis de superávit primário, diminuir o endividamento público, etc); entre outras medidas.
Neste caso, os instrumentos utilizados para alcançarem esses objetivos são as políticas de caráter monetário e fiscal. Como estuda na disciplina de Economia e Finanças Públicas, as políticas monetárias compreendem, basicamente, a emissão de moeda e de títulos públicos, o controle dos recolhimentos compulsórios, a gestão das taxas de juros (taxa Selic), etc. Já as políticas fiscais se referem ao sistema de tributação e arrecadação de impostos, mais os gastos públicos em despesas correntes e de capital.
2) Políticas Reguladoras: são as que compreendem as leis e normas estabelecidas pelos governos, com o fim de regular o funcionamento da economia em geral, seja pelo controle dos mercados, das atividades empresariais, dos direitos e deveres dos consumidores, do cumprimento de contratos, entre outros medidas.
Esse tipo de política é muito importante para as economias de mercado, que visam a transferência do Estado de "produtor para regulador", visto a necessidade de se estabelecerem regras claras e garantidas formalmente, gerando assim, a confiança dos agentes econômicos nos programas governamentais. Tal condição é reconhecida como essencial para incentivar investimentos em infraestrutura e melhoria da produção, sendo esses, condições importantes para promover o desenvolvimento econômico.
3) Políticas Alocativas: estas compreendem os programas sociais com fim de distribuir (alocar) os recursos na oferta de bens públicos, atendendo as camadas da sociedade que, normalmente, não dispõe de renda para obter os bens privados de maior valor. Ou seja, são políticas que destinam recursos na produção de bens como saúde pública, educação pública (escola, cultura, artes, eventos), praças públicas, banheiros públicos, segurança pública, etc.
4) Políticas Distributivas: como o próprio nome indica, refere-se às políticas que distribuem a renda nacional. Neste caso, governos aplicam políticas de transferência, no qual a renda obtida com os impostos são destinados à programas sociais que beneficiam as classes sociais de menor renda.
Pode ser executada com a aplicação de maior carga tributária sobre aqueles que detêm maior renda e isenção, ou subsídios para aqueles com menor renda. São exemplos de políticas distributivas as aposentadorias e licenças da previdência social (INSS), o financiamento estudantil como o Fies (Fundo de Financiamento Estudantil) e o Ciência Sem Fronteiras, os subsídios para os pequenos empreendedores e outras formas de financiamento público que subsidiam projetos como de organismos não governamentais, associações e fundações, etc.
5) Políticas Compensatórias: essas políticas também tem fins distributivos, porém, promovem uma transferência de renda de forma mais direta às classes de menor renda, como políticas de salário mínimo, o seguro desemprego, o bolsa família, as cestas básicas e outros auxílios.
Note que, apesar dessa diferenciação, todas as categorias de políticas públicas também estão interligadas, podendo então serem ao mesmo tempo, por exemplo, uma política distributiva e compensatória, ainda uma política alocativa e distributiva, ou ainda uma política reguladora e estabilizadora.
[1] Decreto, em sentido próprio ou estrito, são atos administrativosda competência exclusiva dos chefes do Executivo, destinados a prover situações gerais ou individuais, abstratamente previstas de modo expresso, explicito ou implícito, pela legislação. Comumente, o decreto é normativo e geral, podendo ser específico ou individual. Como ato administrativo, o decreto está sempre em situação inferior à da lei e, por isso mesmo, não a pode contrariar. O decreto geral tem entretanto, alcançado a mesma normatividade da lei, desde que não ultrapasse a alçada regulamentar de que dispõe o Executivo (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 40º Edição. São Paulo: Malheiros, 2014).
Aula: 7_As áreas do Estado em que as Política Públicas são formadas
Vamos agora considerar a estrutura administrativa do Estado brasileiro para identificarmos em que áreas as políticas públicas são formadas, para na próxima unidade, estudarmos o processo de formulação dessas políticas.
Conforme mencionado nas aulas 3 e 4, ao longo da história o Estado passou por inúmeras crises e dificuldades que promoveram as reformas dos governos. No caso do Brasil, destacamos o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, criado em 1995, que é um exemplo típico de reforma na estrutura governamental, que ocorreu em função das pressões das diferentes classes sociais e empresariais que pleiteavam uma máquina pública administrativa mais dinâmica e eficiente do ponto de vista do contexto sócio econômico da época.[1] Destaca-se que esse Plano Diretor representa a estrutura institucional do ordenamento jurídico do Estado democrático de direito brasileiro, pós Constituição de 1988.
O setor em que são formuladas e definidas as leis e as políticas públicas é no Poder Executivo Federal, de administração direta e que se integram à Presidência da República, os Ministérios, o Poder Executivo Estadual ou Municipal, os órgão da administração direta (gabinetes e secretarias).
A definição, formulação e avaliação das políticas públicas são atribuições exclusivas do Estado e sua administração direta. Não podem participar desse processo os órgão da administração indireta, devendo somente executar as políticas públicas formuladas.
Neste contexto, é definido que o Estado está constituído por dois núcleos básicos: o setor burocrático e o setor de infraestrutura, bens e serviços.
Setor Burocrático
No núcleo do setor burocrático são formuladas e avaliadas as políticas públicas, que asseguram a implementação das estabelecidas e os resultados que deverão ser alcançados. Neste, então, são realizadas as funções exclusivas do Estado, que são o de: legislar, tributar, garantir a segurança e estabelecer as políticas públicas (QUEIROZ, 2009, p. 101).
Setor de Infraestrutura, Bens e Serviços
Nesse setor as funções executadas não são exclusivas do Estado. Nele, participam as entidades de administração indireta, que compreendem as autarquias[2], fundações públicas, empresas públicas, sociedades de economia mista e associações públicas. Estas entidades permitem que parte dos funcionários sejam contratados em regime de mercado, não necessitando serem exclusivamente da carreira pública. No quadro 1 são as apresentadas as características comparativas entre os dois setores dos núcleos básicos do Estado:
Quadro 1 - Núcleos Básicos do Estado
SETOR BUROCRÁTICO
SETOR DE INFRAESTRUTURA,
BENS E SERVIÇOS
Atividades
exclusiva do Estado
não exclusivas do Estado
Poder de Estado
necessita
não necessita
Corpo de Pessoal
servidores públicos de carreira pública
profissionais não necessitam ser da carreira pública
Fonte: Queiroz (2009, p.100).
O setor burocrático ainda pode ser dividido em outros dois núcleos: o estratégico e o não estratégico. No quadro 2 estão descritas as comparação entre os dois núcleos, do ponto de vista das atividades, da administração e dos poderes:
Quadro 2 - Núcleo Burocrático do Estado
NÚCLEO ESTRATÉGICO
NÚCLEO
NÃO ESTRATÉGICO
Atividades
define e formula as políticas públicas
executas as políticas públicas
Administração
somente a administração direta
administração direta e indireta
Poderes e Órgãos
Poder legislativo, Poder Judiciário, Ministério Público e parte do Poder Executivo
Órgãos de regulamentação, fiscalização, arrecadação, policiamento, financiamento, agências regulamentadoras e agências executivas.
Fonte: Queiroz (2009, p.101).
Como apresentado no quadro, podemos observar que o núcleo burocrático estratégico compreende os órgãos da administração direta, enquanto o não estratégico é composto de pela administração direta e indireta. Contudo, ambos os núcleos recebem a participação de funcionários de carreira exclusiva do Estado (servidores públicos admitidos por meio de concurso público).
De acordo com o Plano Diretor, as ações do núcleo estratégico tem como propósito efetivar as políticas públicas em prol dos interesses da sociedade. Já no núcleo não estratégico estão incluídas as atividades representadas pelas ações de: regulação, fiscalização, arrecadação de impostos, atividades de polícia, entre outras, em que operam a administração direta e indireta, de modo a auxiliar a execução das políticas públicas.
Encerrada essa parte da disciplina, vamos então passar para a última aula dessa primeira unidade, no qual será tratado o tema do controle das políticas públicas. Bons estudos!
[1] No Brasil, durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, foi aprovado o Plano Diretor da Reforma do Estado, elaborado pelo Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado (aprovado pela Câmara da Reforma do Estado em reunião de 21 de setembro de 1995).
[2] São entidades auxiliares administração pública, de caráter autônomo e descentralizadas que operam com recursos do Estado ou com aqueles gerados por sua atividade, podendo ser de esfera municipal, estadual ou federal. Os exemplos comuns de autarquias são: as agências reguladoras, os institutos de financiamento de pesquisas e as universidades federais.
Aula: 8_O controle das políticas públicas
O exercício do controle das políticas públicas implica que a administração pública atue, rigorosamente, dentro de suas competências e funções estabelecidas pelas normas constitucionais e legais. Os limites do controle devem ser respeitados para que o interesse público seja garantido. Portanto, o controle das políticas públicas é uma forma democrática de manter o equilíbrio entre a atuação do Estado e a sociedade.
O objetivo do controle então é o de assegurar que os órgãos públicos atuem em conformidade com os princípios constitucionais, em especial, o princípio da: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Seguindo esses princípios, o sistema de controle das políticas públicas do Estado permite a garantia dos direitos democráticos dos cidadãos.
O Controle Social das Políticas Públicas
A participação da sociedade e o compromisso do Estado na execução das políticas públicas, estabelece a relação que permite o controle social dessas políticas. Dentro desse abordagem, destaca-se o conceito de "accountabillity". Esta expressão não tem tradução em português e é utilizada para representar a "responsabilização" dos governos pelos seus atos. Ou seja, a avaliação dos resultados das políticas públicas, também é uma função do Estado.
Conforme Przeworski (1996, apud QUEIROZ, 2009, p.104): "A qualidade da intervenção do Estado na economia, depende, em grande medida, da eficácia dos mecanismos que obrigam os governos a prestar contas perante o público". Portanto, o Estado deve se submeter aos princípios de ordem, eficiência administrativa e eficácia dos seus atos para que o sistema de controle de suas atividades sejam criados.
A Constituição Federal Brasileira de 1988 estabeleceu os requerimentos básicos para o controle da sociedade sobre a administração pública, assim, coexistem na administração pública o "Controle Interno", presente na própria estrutura administrativa do Estado (nas diferentes esferas governamentais e seus poderes), e o "Controle Externo" atribuído ao PoderLegislativo e ao Tribunais de Contas.
Controle Interno das Políticas Públicas
O Controle Interno integra a estrutura organizacional da própria administração pública e tem como função básica acompanhar a execução dos atos governamentais, apontando de modo preventivo, ou corretivo, as ações necessárias para sua melhoria. É executado pelos próprios órgãos do aparelho estatal e deve ser um processo integrado, efetuado pela direção e seus funcionários buscando alcançar os seguintes objetivos gerais:
a) executar as operações de maneira ordenada, ética, econômica, eficiente[1] e eficaz[2];
b) Cumprir as obrigações de accountability (as organizações públicas e os indivíduos que as integram tornam-se responsáveis por suas decisões e ações);
c) cumprir as leis e regulamentos (lei orçamentária, tratados internacionais, leis e princípios contábeis, lei de direito civil e de proteção ambiental, regulamentos sobre as receitas fiscais, leis que estabelecem ações de combate à fraude e corrupção, entre outras);
d) salvaguarda de recursos contra prejuízo por desperdício, abuso, má administração, erros, fraudes e irregularidades. A importância da salvaguarda dos recursos no setor público se deve ao fato de que esses recursos envolvem "dinheiro público" e sua utilização é de interesse coletivo. Por isso, devem ser adotados controles internos em cada etapa da administração, desde a aquisição até a disponibilização dos recursos. Outros controles, tais como sobre informações, fontes de documentação e registros contábeis, também são essenciais para a transparência das operações governamentais e esses devem ser preservados.
Ainda sobre o controle interno, destaca-se a participação da Controladoria Geral da União (CGU)[3], que representou um aprimoramento da estrutura de controle interno do país, desempenhado importante papel na construção da ordem democrática brasileira, tendo entre outras funções a de combate à corrupção, monitoramento das políticas públicas, controle interno, auditoria, promoção da transparência na gestão pública. Além disso, representa um mecanismo de participação e mobilização da sociedade civil, capacitando assim a função de controle social das políticas públicas (LOUREIRO, 2012).[4]
Controle Externo das Políticas Públicas
Com relação ao Controle Externo, este se caracteriza pelo exercício do órgão autônomo e independente da administração pública, sendo suas atribuições indicadas pela Constituição Federal/88. Esse controle é exercido pelo Poder Legislativo, auxiliado pelos Tribunais de Contas, objetivando a verificação da probidade administrativa, da guarda legal e emprego dos recursos públicos e do cumprimento da lei.
Basicamente, os Tribunais de Contas da União, dos Estados e dos Municípios, têm a missão de fiscalizar a contabilidade, as operações financeiras, orçamentárias, operacionais e patrimoniais dos governos, no âmbito da legalidade, legitimidade, economicidade (redução de desperdícios) e razoabilidade dos atos que gerem receita ou despesa pública.
No caso do poder legislativo, este é o principal instrumento de controle externo exercido pela participação popular como agente fiscalizador. Além desse, destaca-se também a atuação do Ministério Público[5] que participa da vigilância da administração pública, tendo como objetivo principal defender o interesse da sociedade, podendo acionar formalmente o poder judiciário quando julgar a ação mais adequada (QUEIROZ, 2009).
Portanto, além dos controles estabelecidos constitucionalmente é muito importante para o exercício do controle social das políticas públicas, a maior participação da sociedade na construção e gestão dessas políticas, pois este é o principal mecanismo dos sistemas democráticos vigentes que permitem a efetiva cobrança dos governantes e o consequente aprimoramento da gestão pública como um todo.
[1] A eficiência significa utilizar o mínimo de recursos no alcance do máximo de resultado, dada uma quantidade/qualidade de recursos públicos empregados.
[2] A eficácia significa alcançar os objetivos pretendidos por determinada atividade.
[3] A CGU é um órgão do Governo Federal, criado durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (Medida Provisória n° 2.143-31 de 02/04/2001), com a denominação inicial de Corregedoria Geral da União). É responsável por atuar junto à presidência da república, no âmbito do Poder Executivo.
[4] LOUREIRO, Maria Rita et al. Do controle interno ao controle Social: a múltipla atuação da CGU na democracia brasileira. Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 17, n. 60, Jan./Jun. 2012.
[5] O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (Art. 127 da CF/1988).
Aula: 9_Formulação das Políticas Públicas
Como visto nas aulas anteriores, a relevâncias das políticas públicas tornou-se recorrente, especialmente nos países em desenvolvimento, visto a maior preocupação com os problemas sociais decorrentes do desemprego, da falta de segurança pública, das desigualdades sociais e exclusão social. Tal condição gerou um aumento da participação do Estado na oferta de bens e serviços públicos essenciais, que garantissem o equilíbrio entre as classes sociais.
Podemos considerar a formação das políticas públicas como um "jogo social" entre atores que interagem em situações formais e informais. São formais aqueles atores que atuam de modo legal, reconhecido pela constituição, como o os partidos políticos, os chefes do poder executivo, os ministros, parlamentares, etc. Os informais são aqueles atores que participam do processo por meio de pressões sociais, mas que muitas vezes são organizados de modo não constitucional, como movimentos sociais, empresas, meios de comunicação, entidades, etc (QUEIROZ, 2009, p.116). Sendo assim, as políticas públicas resultam de trocas complexas entre os atores envolvidos no processo de discussão que ao longo do tempo se consolida, baseado na cooperação e coordenação da formulação e execução da política.
Portanto, as demandas da sociedade são apresentadas aos gestores públicos por meio de seus grupos, organizados em sociedade civis, como sindicatos, entidades de representação empresarial, associação de moradores, associações patronais e organizações não governamentais. Por outro lado, os recursos para atender a demandas sociais são, comumente limitados. Consequentemente, os bens e serviços públicos almejados se tornam motivo de disputas entre os grupos de interesse. Durante a apresentação das reivindicações, os grupos tentam obter apoio de outros grupos, mas também sofrem oposição.
Os conflitos e as disputas não são, necessariamente, algo ruim para a sociedade, pois servem de estímulos à busca de mudanças e melhorias sociais, quando essa condição ocorre dentro de preceitos legais e democráticos. Cabe ao formulador de Políticas Públicas conseguir perceber, compreender e selecionar as diversas demandas.
Depois de entendidas as diversas demandas e expectativas da sociedade, o gestor público deverá definir o que é prioridade para então selecionar quais demandas serão atendidas. Ainda assim, nem todas as demandas terão a resposta dos governos, algumas serão até mesmo parcial (LOPES; AMARAL, 2008).[1]
Ao atuar na direção do interesse público, o governo busca atender as principais demandas sociais, maximizando assim, o bem estar social. Portanto, as Políticas Públicas resultam da "competição entre os diversos grupos ou segmentos da sociedade que buscam defender seus interesses". Esses interesses podem ser de caráter específicos, como obras de pavimentação ou de manutenção de ruas; ou então de caráter geral, como a segurança pública e os investimentos em saúde e educação. É importante que as reivindicações sejam reconhecidas e ganhem força junto às autoridades públicas do Poder Executivo, Legislativo e Judiciário. Caso isso não aconteça, as demanda sociais não serão atendidas, mesmo que sejam essenciais e de relevânciapara a sociedade. É assim que o processo ocorre e o sistema de formulação de políticas públicas funciona.
Os atores das Políticas Públicas
No jogo social, os grupos que integram o sistema político e apresentam as reivindicações, ou executando ações de Políticas Públicas, são denominamos de "atores". Nesse processo existem, basicamente, dois tipos de atores: os "estatais" e os "privados".
Os atores estatais são aqueles que exercem funções públicas no Estado, tendo sido eleitos pela sociedade para um cargo por tempo determinado (os políticos), ou atuando de forma permanente, como os servidores públicos (que operam a burocracia).
Existe importante diferença no modo de agir de cada um desses segmentos. Os políticos são eleitos com base em suas propostas de governo apresentadas para a população durante o período eleitoral e buscam tentar realizá-las, sendo as Políticas Públicas definidas no Poder Legislativo, o que insere nesse processo os parlamentares (vereadores e deputados estaduais e federais).
Já as propostas das Políticas Públicas partem do Poder Executivo e é também que as coloca em prática, cabendo aos servidores públicos (funcionalismo público) indicar as informações necessárias ao processo de tomada de decisão dos políticos, bem como a operacionalização das políticas públicas, tendo como responsabilidade, executar esses processos burocráticos de modo "neutro" (o que muitas vezes não acontece, pois a burocracia é frequentemente utilizada em acordo com os interesses pessoais dos servidores e outros funcionários públicos, dificultando as ações governamentais e beneficiando outras.
Já os atores privados são aqueles que não possuem vínculo direto com a estrutura administrativa do Estado e atuam no "jogo social" como a parte que sinaliza aos governos, a principais reivindicações da sociedade. Fazem parte desse grupo:
a) a imprensa;
b) os centros de pesquisa;
c) os grupos de pressão, os grupos de interesse e os lobbies;
d) as Associações da Sociedade Civil Organizada (SCO);
e) as entidades de representação empresarial;
f) os sindicatos patronais;
g) os sindicatos de trabalhadores;
h) outras entidades representativas da Sociedade Civil Organizada (SCO).
[1] LOPES, Brenner; AMARAL, Jefferson Ney Amaral. Políticas Públicas: conceitos e práticas. Coordenação Ricardo Wahrendorff Caldas. Belo Horizonte: Sebrae, 2008.
Aula:10_Ciclos da Política Pública
Os programas governamentais que compõe as ações de políticas públicas em prol de solucionar problemas sociais, são vistos, basicamente, como um processo, que é, constantemente, monitorado e ajustado para se aperfeiçoar e tornar-se mais eficiente e eficaz, ou seja, que use os recursos de modo inteligente e que se aproxime ao máximo dos objetivos determinados.
No caso brasileiro, está incorporado no modelo de formulação das políticas públicas, a ideia de processo, que é utilizado no método do Planejamento Estratégico Situacional (PES), utilizando instrumentos como o Plano Plurianual (PPA)[1], a Lei de Diretriz Orçamentária (LDO)[2] e a Lei Orçamentária Anual (LOA), funcionando como um ciclo permanente.
O modelo PES substituiu o modelo normativo de planejamento, que durante muitos anos foi o processo utilizado na formulação das políticas públicas em vários países (nas aulas 11 e 12 esses modelos serão estudados). Com as reformas estruturais do Estado nos vários países em desenvolvimento, o modelo de planejamento governamental também foi revisto, sendo o processo contínuo considerada a ideia mais adequada e aceita.
Atualmente, conforme o modelo de planejamento, de orçamento e de gestão utilizado, a divisão dos ciclos das políticas públicas é constituída em quatro estágios básicos, sendo eles: a formulação; a execução; a avaliação; e a reprogramação (figura 1).
Os Ciclos das Políticas Públicas (estágios)
1º Estágio - Formulação: primeiramente, uma política pública é concebida por meio de um processo, mais ou menos democrático e participativo, onde o poder público e a população deliberam sobre os problemas sociais. Como visto anteriormente, é difícil para os atores públicos concentrarem suas atenções e resolverem todos os problemas existentes em uma sociedade, dado que estes são abundantes e os recursos necessários para solucioná-los são escassos. Por isso, é necessário que se estabeleçam os problemas prioritários. O processo de definição da lista de principais problemas de uma sociedade é chamado de "Formação da Agenda". Tal processo envolve tarefas de pesquisa e análise dos problemas em questão, para então serem reconhecidos e definidos os problemas que serão tratados e os que ficarão para outro momento.
O tratamento dos problemas também se encontra no processo orçamentário, devendo seguir, como já destacado, os limites legais definidos pelo Plano Plurianual (PPA). Existem dois importantes elementos que contribuem para que determinado problema se insira na Agenda Governamental, são eles:
a) Indicadores: existência de dados que indiquem as condições numéricas de determinada situação ou problema. Se esses indicadores apresentarem uma situação problemática, ela poderá ser inserida na Agenda Governamental para sofrer interferência do poder público;
b) Feedback das ações governamentais: os resultados obtidos com programas governamentais anteriores (concluídos ou em andamento), apontam as falhas, ou sucesso das medidas adotadas pelos programas. Comparando-os com o antes e depois, essas avaliações de resultado podem incrementar a atenção do poder público. Além disso, os processos institucionais também desempenham um relevante papel na definição da Agenda. A rotina administrativa e as regras do sistema político produzem uma dinâmica que influi na inclusão de determinado tema.
Porém, cabe ressalvarmos que, mesmo que uma questão se insira na Agenda Governamental, isso não significará que ela será considerada prioritária. Isso só ocorre quando diversos fatores se juntam, tais como vontade política, mobilização popular e a percepção de que os custos de não resolver o problema serão maiores que os custos de resolvê-los parcial (LOPES; AMARAL, 2008).[3]
A partir da Agenda, é necessário definir as linhas de ação a serem adotadas para resolver os problemas. Nesse processo, no entanto, serão comuns os embates políticos entre os atores, pois os grupos envolvidos terão diferentes opiniões e interesses sobre as ações em questão. É o momento então, de definir os "objetivos da política", "quais serão os programas desenvolvidos" e "quais metas almejadas" (o que gerará a rejeição de várias propostas de ação).
Além de se preocupar com o posicionamento dos grupos sociais, é necessário que o corpo técnico da administração pública seja ouvido, para se posicionarem em relação aos recursos necessários e disponíveis à ações escolhidas, como: recursos materiais, financeiros, técnicos, pessoais, dentre outros. Assim, o poder público obterá uma série de opiniões que servirão como fonte de ideias, as quais poderão apontar o caminho desejado por cada segmento social, auxiliando na escolha e contribuindo para a legitimidade da mesma.
Outra análise importante se refere aos riscos que cada alternativa traz, desenvolvendo uma forma de compará-las e de medir qual é mais eficaz e eficiente para atender ao objetivo e aos interesses sociais. As escolhas feitas serão expressas em leis, decretos, normas, resoluções, dentre outros atos da administração pública.
2º Estágio - Execução: Depois da formulação o próximo estágio é o da execução, ou seja, o momento onde o planejamento e a escolha pública são transformados em atos. O corpo administrativo é o responsável pela execução da política. Cabe a eles a chamada ação direta, ou seja, a aplicação, o controle e o monitoramento das medidas definidas. Durante esse período, a política pode sofrer modificações drásticas dependendo da postura do corpo administrativo.
Convencionalmente, existem dois modelos de implementação das Políticas Públicas, o de "cima para baixo" e o de "baixo para cima". O primeiro, é o de aplicação descendente,ou seja, do governo para a população, representando um modelo centralizado, com a participação de poucos atores e funcionários na implementação da política pública (concepção hierárquica da administração pública). Já o segundo modelo, de baixo para cima tem uma aplicação ascendente, ou seja, da população para o governo. É caracterizado pela descentralização, pois considera maior participação dos beneficiários e atores envolvidos (perspectiva participativa).
3º Estágio - Avaliação: A avaliação é um elemento crucial para as Políticas Públicas. Ainda que esteja indicada como a terceira fase do ciclo da política pública, a avaliação pode ser feita em todos os momentos do ciclo, contribuindo para o controle e a obtenção dos resultados. Além disso, a avaliação também é considerada uma fonte de aprendizado, que permite ao gestor público reconhecer ações produzem melhores resultados. Portanto, a avaliação permite à administração pública:
a) gerar informações úteis para futuras políticas públicas;
b) prestar contas das ações;
c) justificar as ações e explicar as decisões;
d) corrigir e prevenir falhas;
e) identificar o nível de eficiência dos resultados produzidos;
f) identificar as barreiras que impedem o sucesso de um programa;
g) promover o diálogo entre os vários atores individuais e coletivos envolvidos;
h) fomentar a coordenação e a cooperação entre os atores envolvidos.
De maneira geral, o processo de avaliação de uma política leva em conta seus efeitos e as funções cumpridas pela política. Além disso, busca determinar sua relevância, analisar a eficiência, eficácia e sustentabilidade das ações desenvolvidas, bem como servir de aprendizado para os atores públicos.
4º Estágio - Reprogramação: essa etapa é a que completa o ciclo da política pública, mas que ao mesmo tempo, impulsiona novas revisões para a formulação das políticas, mantendo o ciclo em movimento. Tem como base as tarefas de ajustes e correções por parte dos atores, promovendo o aperfeiçoamento para o alcance dos objetivos propostos. Neste estágio é primordial a análise dos indicadores e do feedback dos resultados atingidos, além de uma avaliação técnica, consistente e objetiva da política, de modo que o poder público e a sociedade entendam a efetividade e os benefícios dessas políticas, podendo as mesmas serem incrementadas, mantidas ou até mesmo, interrompidas para abrir espaço a novas políticas públicas, e assim, sucessivamente.
[1] De acordo com a Constituição Federal de 1988 (Art. 165), o PPA é o instrumento responsável por declarar as escolhas do governo e da sociedade, indicando os meios para a implantação das políticas públicas, além de orientar taticamente, a ação do Estado para consecução dos objetivos pretendidos.
[2] A LDO, de acordo com o parágrafo 2º do art. 165 da CF/88, tem como principal finalidade orientar a elaboração dos orçamentos fiscais e da seguridade social e de investimento do Poder Público, as empresas públicas e autarquias. Busca sintonizar a Lei Orçamentária Anual (LOA) com as diretrizes, objetivos e metas da administração pública, estabelecidas no Plano Plurianual.
[3] LOPES, Brenner; AMARAL, Jefferson Ney Amaral. Políticas Públicas: conceitos e práticas. Coordenação Ricardo Wahrendorff Caldas. Belo Horizonte: Sebrae, 2008.
Aula: 10_Ciclos da Política Pública
Os programas governamentais que compõe as ações de políticas públicas em prol de solucionar problemas sociais, são vistos, basicamente, como um processo, que é, constantemente, monitorado e ajustado para se aperfeiçoar e tornar-se mais eficiente e eficaz, ou seja, que use os recursos de modo inteligente e que se aproxime ao máximo dos objetivos determinados.
No caso brasileiro, está incorporado no modelo de formulação das políticas públicas, a ideia de processo, que é utilizado no método do Planejamento Estratégico Situacional (PES), utilizando instrumentos como o Plano Plurianual (PPA)[1], a Lei de Diretriz Orçamentária (LDO)[2] e a Lei Orçamentária Anual (LOA), funcionando como um ciclo permanente.
O modelo PES substituiu o modelo normativo de planejamento, que durante muitos anos foi o processo utilizado na formulação das políticas públicas em vários países (nas aulas 11 e 12 esses modelos serão estudados). Com as reformas estruturais do Estado nos vários países em desenvolvimento, o modelo de planejamento governamental também foi revisto, sendo o processo contínuo considerada a ideia mais adequada e aceita.
Atualmente, conforme o modelo de planejamento, de orçamento e de gestão utilizado, a divisão dos ciclos das políticas públicas é constituída em quatro estágios básicos, sendo eles: a formulação; a execução; a avaliação; e a reprogramação (figura 1).
Os Ciclos das Políticas Públicas (estágios)
1º Estágio - Formulação: primeiramente, uma política pública é concebida por meio de um processo, mais ou menos democrático e participativo, onde o poder público e a população deliberam sobre os problemas sociais. Como visto anteriormente, é difícil para os atores públicos concentrarem suas atenções e resolverem todos os problemas existentes em uma sociedade, dado que estes são abundantes e os recursos necessários para solucioná-los são escassos. Por isso, é necessário que se estabeleçam os problemas prioritários. O processo de definição da lista de principais problemas de uma sociedade é chamado de "Formação da Agenda". Tal processo envolve tarefas de pesquisa e análise dos problemas em questão, para então serem reconhecidos e definidos os problemas que serão tratados e os que ficarão para outro momento.
O tratamento dos problemas também se encontra no processo orçamentário, devendo seguir, como já destacado, os limites legais definidos pelo Plano Plurianual (PPA). Existem dois importantes elementos que contribuem para que determinado problema se insira na Agenda Governamental, são eles:
a) Indicadores: existência de dados que indiquem as condições numéricas de determinada situação ou problema. Se esses indicadores apresentarem uma situação problemática, ela poderá ser inserida na Agenda Governamental para sofrer interferência do poder público;
b) Feedback das ações governamentais: os resultados obtidos com programas governamentais anteriores (concluídos ou em andamento), apontam as falhas, ou sucesso das medidas adotadas pelos programas. Comparando-os com o antes e depois, essas avaliações de resultado podem incrementar a atenção do poder público. Além disso, os processos institucionais também desempenham um relevante papel na definição da Agenda. A rotina administrativa e as regras do sistema político produzem uma dinâmica que influi na inclusão de determinado tema.
Porém, cabe ressalvarmos que, mesmo que uma questão se insira na Agenda Governamental, isso não significará que ela será considerada prioritária. Isso só ocorre quando diversos fatores se juntam, tais como vontade política, mobilização popular e a percepção de que os custos de não resolver o problema serão maiores que os custos de resolvê-los parcial (LOPES; AMARAL, 2008).[3]
A partir da Agenda, é necessário definir as linhas de ação a serem adotadas para resolver os problemas. Nesse processo, no entanto, serão comuns os embates políticos entre os atores, pois os grupos envolvidos terão diferentes opiniões e interesses sobre as ações em questão. É o momento então, de definir os "objetivos da política", "quais serão os programas desenvolvidos" e "quais metas almejadas" (o que gerará a rejeição de várias propostas de ação).
Além de se preocupar com o posicionamento dos grupos sociais, é necessário que o corpo técnico da administração pública seja ouvido, para se posicionarem em relação aos recursos necessários e disponíveis à ações escolhidas, como: recursos materiais, financeiros, técnicos, pessoais, dentre outros. Assim, o poder público obterá uma série de opiniões que servirão como fonte de ideias, as quais poderão apontar o caminho desejado por cada segmento social, auxiliando na escolha e contribuindo para a legitimidade da mesma.
Outra análise importantese refere aos riscos que cada alternativa traz, desenvolvendo uma forma de compará-las e de medir qual é mais eficaz e eficiente para atender ao objetivo e aos interesses sociais. As escolhas feitas serão expressas em leis, decretos, normas, resoluções, dentre outros atos da administração pública.
2º Estágio - Execução: Depois da formulação o próximo estágio é o da execução, ou seja, o momento onde o planejamento e a escolha pública são transformados em atos. O corpo administrativo é o responsável pela execução da política. Cabe a eles a chamada ação direta, ou seja, a aplicação, o controle e o monitoramento das medidas definidas. Durante esse período, a política pode sofrer modificações drásticas dependendo da postura do corpo administrativo.
Convencionalmente, existem dois modelos de implementação das Políticas Públicas, o de "cima para baixo" e o de "baixo para cima". O primeiro, é o de aplicação descendente, ou seja, do governo para a população, representando um modelo centralizado, com a participação de poucos atores e funcionários na implementação da política pública (concepção hierárquica da administração pública). Já o segundo modelo, de baixo para cima tem uma aplicação ascendente, ou seja, da população para o governo. É caracterizado pela descentralização, pois considera maior participação dos beneficiários e atores envolvidos (perspectiva participativa).
3º Estágio - Avaliação: A avaliação é um elemento crucial para as Políticas Públicas. Ainda que esteja indicada como a terceira fase do ciclo da política pública, a avaliação pode ser feita em todos os momentos do ciclo, contribuindo para o controle e a obtenção dos resultados. Além disso, a avaliação também é considerada uma fonte de aprendizado, que permite ao gestor público reconhecer ações produzem melhores resultados. Portanto, a avaliação permite à administração pública:
a) gerar informações úteis para futuras políticas públicas;
b) prestar contas das ações;
c) justificar as ações e explicar as decisões;
d) corrigir e prevenir falhas;
e) identificar o nível de eficiência dos resultados produzidos;
f) identificar as barreiras que impedem o sucesso de um programa;
g) promover o diálogo entre os vários atores individuais e coletivos envolvidos;
h) fomentar a coordenação e a cooperação entre os atores envolvidos.
De maneira geral, o processo de avaliação de uma política leva em conta seus efeitos e as funções cumpridas pela política. Além disso, busca determinar sua relevância, analisar a eficiência, eficácia e sustentabilidade das ações desenvolvidas, bem como servir de aprendizado para os atores públicos.
4º Estágio - Reprogramação: essa etapa é a que completa o ciclo da política pública, mas que ao mesmo tempo, impulsiona novas revisões para a formulação das políticas, mantendo o ciclo em movimento. Tem como base as tarefas de ajustes e correções por parte dos atores, promovendo o aperfeiçoamento para o alcance dos objetivos propostos. Neste estágio é primordial a análise dos indicadores e do feedback dos resultados atingidos, além de uma avaliação técnica, consistente e objetiva da política, de modo que o poder público e a sociedade entendam a efetividade e os benefícios dessas políticas, podendo as mesmas serem incrementadas, mantidas ou até mesmo, interrompidas para abrir espaço a novas políticas públicas, e assim, sucessivamente.
[1] De acordo com a Constituição Federal de 1988 (Art. 165), o PPA é o instrumento responsável por declarar as escolhas do governo e da sociedade, indicando os meios para a implantação das políticas públicas, além de orientar taticamente, a ação do Estado para consecução dos objetivos pretendidos.
[2] A LDO, de acordo com o parágrafo 2º do art. 165 da CF/88, tem como principal finalidade orientar a elaboração dos orçamentos fiscais e da seguridade social e de investimento do Poder Público, as empresas públicas e autarquias. Busca sintonizar a Lei Orçamentária Anual (LOA) com as diretrizes, objetivos e metas da administração pública, estabelecidas no Plano Plurianual.
[3] LOPES, Brenner; AMARAL, Jefferson Ney Amaral. Políticas Públicas: conceitos e práticas. Coordenação Ricardo Wahrendorff Caldas. Belo Horizonte: Sebrae, 2008.
Aula: 11_Planejamento e Gestão das Políticas Públicas
Historicamente, o planejamento governamental tornou-se, inicialmente, uma prática comum nos países socialistas do Sec.XX e, posteriormente, os governos dos países capitalista também passaram a adotar esse instrumento, visto a necessidade da maior participação do Estado na economia (pós Depressão de 30). Nos países da América Latina, o planejamento governamental foi exatamente influenciado pelo sucesso das experiências dos países soviéticos, pela recuperação dos Estados Unidos na década de 30, e pelo modelo de reconstrução dos países europeus no pós Grandes Guerras Mundiais.
Segundo Queiroz (2009, p.120): "Existe uma relação direta entre as políticas públicas e a atividade de planejamento governamental, uma vez que este responde à necessidade de implementação das políticas públicas". Assim, podemos entender o planejamento como um "sistema de métodos e de procedimentos" que permitem a construção de cenários que auxiliam na tomada de decisões por parte dos governos.
Essas cenários esquematizam e antecipam a representação de situações problemas, guiando os agentes públicos em suas políticas e ações governamentais. Esse sistema de métodos e procedimentos se baseiam no "tratamento de dados e informações" que geram conhecimento e experiências que auxiliam na racionalização dos processos decisórios, tornando-os mais precisos e eficientes (instrumento auxiliar). Portanto, o planejamento e a gestão são elementos inseparáveis, pois ambos utilizam como instrumentos as teorias, os métodos e as técnicas na tomada de decisões, e estas, necessitam de um gerenciamento equilibrado entre o sistema e a realidade social em que atuam.
A racionalidade do planejamento e da gestão das políticas públicas, que implica na agregação ao componente político, do componente técnico e científico, gerador de coerência e consistência do plano, é considerada a melhor explicação para entender o planejamento como uma prática socialmente aceitável, especialmente em países com ideologias democráticas. Ao mesmo tempo, o bom senso e a intuição também são elementos importantes na gestão estratégica, o que gera competência ao tomadores de decisão (QUEIROZ, 2009).
A seguir, apresentaremos um detalhamento do chamado Planejamento Normativo, que foi mencionado na aula 10 sobre os Ciclos das Políticas Públicas. Além desse modelo, na aula 12, continuaremos estudando o planejamento com destaque ao Planejamento Estratégico Situacional (PES), que é o modelo mais utilizado nos dias atuais.
O Planejamento Normativo
O planejamento governamental normativo, também conhecido como planejamento tradicional, foi um modelo que se desenvolveu, principalmente, nos países socialistas e de alto nível de intervenção estatal. Tinha como base um planejamento econômico e social tecnicamente construído sob instrumentos matemáticos e quantitativos de elaboração.
No planejamento normativo, o processo segue, basicamente, as seguintes etapas: diagnóstico da realidade; definição dos objetivos pretendidos; e o estabelecimento das metas a serem alcançadas. Realizadas todas essas etapas, espera-se que os objetivos do programa sejam alcançados (MATUS, 1993 apud QUEIROZ, 2009).
Segundo Matus (1997)[1], idealizador do PES e crítico do planejamento normativo, a visão tradicional do planejamento assume que quem planeja tenha a total governabilidade sobre o processo, ou seja, tenha conhecimento e controle completos sobre as variáveis envolvidas no problema. Sendo assim, quanto mais simples a descrição do problema for, maior será seu conhecimento e controle. Com base nessas concepções, entende-se que as ações dos atores sociais envolvidos no processo são previsível. Porém, essa abordagem do planejamento normativo, baseado em um modelo fechado, foi muito criticada, e a ela foram atribuídasos seguintes elementos determinantes:
a) O sujeito e o objeto planejado são independentes: o sujeito é o Estado e o objeto é a realidade econômica social (são independentes e o Estado controla o objeto a partir do seu diagnóstico);
b) Existe apenas uma verdade para diagnosticar: o Estado deve diagnosticar a realidade para conhecê-la, buscando uma única verdade (objetiva e científica;
c) O objeto é previsível: considera-se que os agentes econômicos são sujeitos com comportamentos previsíveis;
d) O poder não é escasso: o Estado planeja e detêm o poder (somente os recursos econômicos são escassos);
e) Não existem incertezas: o planejamento é baseado em leis estáveis (aspectos econômicos e sociais são estáticos);
f) Os planos são bem estruturados e as soluções são sempre conhecidas: o plano refere-se a um conjunto de objetivos próprios e os resultados esperados são conhecidos, assim como os meios de alcançá-los, sem uma reflexão e avaliação dos mesmos.
Portanto então concluir que o planejamento normativo foi mais adaptável em países de poder central, no qual a realidade da época se comportava de modo relativamente passivo. No Brasil, identificamos que esse modelo foi mais efetivo no período de 1930 a 1970, quando os governos ditatoriais e militares prevaleceram. Mas com o processo de democratização e descentralização estatal, as relações sociais e de governos tornaram-se mais complexas e por isso, o planejamento normativo tornou-se obsoleto.
[1] MATUS, Carlos. Política, planejamento e governo. Brasília: IPEA, 1997.
Aula: 12_O Planejamento Estratégico Situacional (PES)
Foi o economista e pesquisador chileno Carlos Matus (1931 - 1998)[1] que desenvolveu a proposta do método conhecido como “Planejamento Estratégico Situacional”, o "PES".
Diante das críticas às limitações do planejamento normativo (tradicional), Matus desenvolveu então uma metodologia diferente, que buscava acompanhar a reforma estatal e o momento histórico que era marcado pela crise do Estado intervencionista, que já ocorria nos países desenvolvidos e no mundo socialista.
No Brasil, essas mudanças tornaram-se mais evidentes a partir da década de 90, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, tendo no Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado de 1995 (PDRAE), uma forma materializada da mudança no comportamento do Estado, como citado na aula 7. Segundo o governo da época, os anos 80 e início dos anos 90 foi marcado por uma crise do Estado, pois este haveria se distanciado de suas funções básicas e assumido um papel de "Estado-empresário, burocrático e excessivamente controlador". Como resultado os serviços públicos se deterioraram, a crise fiscal foi agravada e a inflação tornou-se incontrolável (PONTES,2013).[2]
O PES
O PES tem como principal abordagem o conceito de "jogo social". Este representa a situação em que os atores sociais se defrontam e as ações de um afetam os outros, representando uma situação de complexidade das relações de governo. Assim, cada um entende seu problema de uma forma diferente e contraditória, gerando uma dificuldade inicial de fazer o planejamento governamental atender os interesses de todos. Portanto, podemos classificar o PES como uma metodologia "situacional" e que rejeita o "determinismo", pois trata de realidades dinâmicas e imprevisíveis.
Por isso, o PES é um modelo que permite a reformulação constante do planejamento segundo as circunstâncias sociais, pois o método não prevê situações plenas e definitivas, mas sim, situações inconstantes. Além disso, entende-se que o plano deva ser alinhado aos interesses públicos definidos nos objetivos do planejamento.
Ainda segundo Matus (1997), o PES apresenta as seguintes características:
a) Subjetividade humana: é incorporado no planejamento a participação dos atores de modo a entender e identificar a realidade que conduzirá os objetivos do plano;
b) Pressuposto do futuro indeterminado: o planejamento considera o ambiente complexo e incerto, por isso, valoriza as atividades de "previsão, correção e aprendizado", em vez de predições;
c) Estratégia: a construção do método inclui a viabilidade das estratégias, de modo a criar condições para superação das restrições do processo;
d) Improvisação: considerada de modo limitado ao processo de construção e execução do plano.
Além disso, classificam-se os seguintes princípios do PES (MATUS, 1997 apud QUEIROZ, 2009, p.130-131):
a) Planeja quem governa e governa quem realmente planeja: esse pressuposto representa que no PES, os técnicos de planejamento devem trabalhar em conjunto com os governantes, assessorando e apoiando em todas as fases do processo, dirimindo assim, conflitos entre os mesmos;
b) Não tem um caráter determinístico: como o jogo social não é possível prever todas as ocorrências, no PES os objetivos e as metas não são rígidos, permitindo mais flexibilidade em relação às incertezas;
c) O plano deverá considerar sempre a existência do outro: neste caso, são consideradas as reações dos agentes no jogo social, que sempre será influenciado por interesses, crenças e valores;
d) É necessário mecanismos que garantam a implementação do programa: o monitoramento é permanente ao longo da execução do plano, mantendo e buscando os objetivos propostos;
e) Para funcionar, o programa necessita de um efetivo sistema de cobrança e de prestação de contas: as responsabilidades dos atores devem ser bem claras e definidas, assim, o desempenho do processo torna-se mais eficiente e objetivo.
O PES e o Planejamento Normativo
De acordo com Matus (1997), o ambiente do gestor de políticas públicas é constituído da seguinte relação triangular (figura 1):
Neste modelo, três macrovariáveis constituem um sistema triangular interdependentes entre si, são elas: projeto de governo (P), capacidade de governo (C) e governabilidade do sistema (G).
No ambiente do gestor de políticas públicas o "projeto de governo" representa as políticas, ações e programas que foram propostos para determinados objetivos, sendo essa uma capacidade de governo (C) relacionada à habilidade de conduzir o processo social com técnicas e métodos que considerem não apenas o projeto de governo, mas também a "governabilidade" do sistema. Segundo Pontes (2013, p. 76): "este vértice do triangulo (G) é o diferencial entre o método normativo e o objeto de estudo do PES. Pois, governabilidade é a relação entre forças sociais que o ator que planeja controla e as que ele não controla no processo de governo". Sendo assim, "quanto mais variáveis decisivas ele controle, maior é a sua liberdade de ação e maior é para ele a governabilidade do sistema".
Agora, para concluir essa aula, vamos analisar o quadro 1 que apresenta uma comparação entre o planejamento normativo e o PES, destacando os principais aspectos que determinam os programas governamentais:
Quadro 1 - Comparativo dos modelos de Planejamento Governamental
Planejamento Normativo
Planejamento Situacional
Objeto do programa governamental
Realidade passiva (controle do objeto por parte do ator que planeja)
Realidade ativa (ação e reação a cada do objeto do programa - como um jogo com complexo e inesperado)
Diagnóstico que explica a realidade
Diagnóstico único e cenário futuro projetado
"Situação" ao invés de diagnóstico (cada situação é analisada e avaliada pelos atores que planejam e executam o plano)
Modo de conceber o programa
O planejamento é prescritivo (quem planeja determina as estratégias e os demais atores a assimilam de modo passivo e determinístico)
O programa é corrigido a cada movimento de execução buscando se aproximar dos objetivos propostos
Variável política
Pouco relevante para o planejamento normativo (conflitos entre aspectos técnicos e políticos)
A variável política faz parte de processos mais democráticos, sem reconhecer conflitos com aspectos técnicos (o planejamento é um instrumento de suporte às decisões políticas)
Atores envolvidos no programa
Sem definição clara dos papeis dos atores envolvidos e nem dos seus interessesDefinição clara dos papeis dos atores e interesses incorporados nas estratégias do programa
Fonte: Queiroz (2009, p.133)
Portanto, podemos entender e reconhecer que o modelo de planejamento situacional é mais dinâmico e adaptativo que o modelo normativo, sendo ainda mais ajustado às economias em que os processos políticos são participativos e os atores do jogo social atuam de modo mais abrangente e descentralizado, sendo essas, condições importantes para países mais globalizados e democráticos.
[1] Foi um pesquisador dedicado a estudar sobre planejamento governamental, tendo uma longa experiência em administração pública, pois foi Ministro da Economia no Chile (1965 a 1970). Manteve uma relação próxima com o Brasil, no qual ministrou muitos cursos sobre o PES, pois o país foi um dos primeiros a se interessar pelo método (MATUS, 1997 apud PONTES, 2013).
[2] PONTES, Jorge Marques. Elaboração e Gestão de Políticas Públicas: O Diferencial do Planejamento Estratégico Situacional – PES. Revista Diálogos Interdisciplinares, vol. 2, n°2, 2013.
Aula: 13_O Problema Social
A ideia de problema social se apresenta como algo muito comum no cotidiano da sociedade. Problema é, naturalmente, percebido pelas pessoas e este se mostra sempre presente nas relações humanas. Porém, a noção de "problema social" é algo mais complexo e abrangente, pois os problemas são, normalmente, percebidos de maneiras diferentes entre as pessoas, e suas soluções nem sempre atendem os interesses de todos os envolvidos com o problema, devido às diferentes motivações e objetivos pretendidos.
Segundo Pontes (2013, p.138): "Cada problema social é definido de acordo com o ponto de vista das pessoas que o estão formulando e uma mesma realidade pode ter leituras diferentes, dependendo de como situa o observador ou o formulador em relação ao problema". Por exemplo, a falta de áreas de lazer para a comunidade periféricas de uma região. Isso se apresenta como um problema para as famílias dessas localidades, porém, não afeta os moradores de regiões mais centralizadas próximas de clubes, shoppings e outras áreas de lazer. O mesmo acontece com problemas de mobilidade urbana, com áreas de risco de desabamento, com falta de água entre outros problemas que atingem certos grupos sociais, mas não afetam diretamente outros.
A partir desses problemas sociais é que os governos são requisitados para propor soluções e assumir a responsabilidade da execução de políticas públicas. Por isso, o "problema social" é o objeto de análise de uma "política pública". Refletindo ainda sobre outros problemas sociais, como por exemplo, a violência urbana, a mortalidade infantil, a evasão escolar, as epidemias, a crise energética, entre outros, podemos então entender os problemas sociais como "disfunções do funcionamento de uma sociedade".
Mas além das disfunções, os problemas sociais também envolvem outros tipos de demandas, como por exemplo, os pleitos por maiores investimentos em infraestrutura turística, obras de revitalização dos centros urbanos, a realização de um evento cultural e artístico, entre outros casos de demandas que objetivam melhorias e avanços no atendimento de interesses mais específicos.
Para a solução dos problemas sociais (ou sua minimização) é condição essencial que:
a) a formulação (ou descrição) do problema social esteja adequado (ajustado conforme a natureza do problema);
b) os fatos que justificam os problemas sejam verificáveis;
c) utilizem indicadores estatísticos válidos para a análise do problema.
A partir da identificação do problema social, a próxima etapa é diagnosticar suas causas e soluções (ou medidas de correção). Ambas podem ser qualificadas como simples, ou complexas. Ou seja, existem problemas sociais que são facilmente detectados e resolvidos, como por exemplo, a desobstrução de uma rua que foi prejudicada com a quebra do semáforo. Basta os fiscais de trânsito trabalharem na orientação dos veículos, até o conserto do farol.
Já outros problemas, como a inflação, a violência, o desemprego, etc, são de identificação e solução mais complexa. Por isso, sob sua forma, podemos classificar os problemas sociais como (PONTES, 2013):
a) Diagnóstico e solução simples: o problema é facilmente verificado e sua solução envolve ações bem claras, como por exemplo, o vazamento de água pela perfuração de um encanamento (a solução é o conserto da tubulação);
b) Diagnóstico simples, mas solução complexa: o problema é observado com facilidade, porém, sua solução envolve fatores de alta complexidade, como por exemplo, o problema do desemprego (com base nas taxas de desemprego observa-se que mais pessoas estão desocupadas, para tanto, é necessário gerar empregos, porém, isso depende do crescimento da economia, dos investimentos na produção e outras ações governamentais e empresariais que são difíceis de serem implementadas);
c) Diagnóstico complexo, mas solução simples: neste caso, o problema é de difícil observação, porém, a solução é óbvia e facilmente definida. Um exemplo seria a infiltração de água em prédios e residências. Esse problema demora para ser percebido pois é acontece sem a possibilidade de ser visualizado, mas a solução é clara: será necessário uma reforma no local;
d) Diagnóstico e solução complexos: referem-se a problemas complexos que envolvem causas de difícil atribuição e sua soluções também. Podemos citar o caso da violência. Qual o nível de violência aceitável? Quais as reais causas do problema da violência? Como resolver esse problema de modo efetivo, respeitando os direitos humanos e garantindo plenamente a segurança para todas as classes sociais? São perguntas de difícil respostas.
Ainda segundo Matus (1993 apud Pontes, 2013), é essencial para a identificação e análise dos problemas sociais o entendimento dos seguintes conceitos:
1) O Problema Estruturado: é aquele que considera como solução uma única alternativa, tendo suas variáveis bem conhecidas e relacionadas, com suas causas bem claras, precisas e determinadas. A resolução do problema parte da ação do homem e suas consequências não geram outros problemas (as causas dos problemas e suas solução são perfeitamente definidos).
O problema estruturado envolve, basicamente, questões de ordem técnica e suas variáveis e relações são bem conhecidas, fazendo com que a solução seja única e bem aceita por todos. Se enquadram nessa categorias, os problemas de ordem quantitativa, como por exemplo, o quanto é necessário investir para construir mil moradias conforme o Programa Habitacional dos próximos quatro anos.
2) O Problema Parcialmente Estruturado: são representados por problemas mais ou menos estruturados, pois não são precisos, o que dificulta o reconhecimentos de suas causas, da relação entre as variáveis envolvidas e dos critérios para solucioná-los.
Para as soluções dos problemas parcialmente estruturados deve-se considerar que a percepção humana terá maior influência sobre os elementos técnicos, e por isso, as possibilidades são múltiplas, e não única como nos casos dos problemas estruturados. Portanto, as possibilidades de solução dos problemas envolvem outros problemas, o que gera ao mesmo tempo, alternativas e dificuldades para sua resolução.
Não existe precisão da ações e a soluções são discutíveis, com fronteiras dos problemas imprecisas e por isso, a solução é situacional (segundo os interesses dos envolvidos).
Na prática, a maioria dos problemas sociais podem ser classificados como "parcialmente estruturados", pois estes são resultantes do conjunto do "jogo social", contemplando aspectos variados e pouco precisos, ainda que o processo busque ações objetivas e dados reais quanto ao problema. Portanto, o problema social e sua estrutura não pode ser comparado, simplesmente, a um problema de natureza matemática, pois sua natureza subjetiva impede que suas soluções e respostas sejam únicas e definidas, tornando-se um grande desafio para os gestores públicos.
Aula: 14_Diagnóstico e Causa de um Problema Social
Segundo Pontes (2013, p.144), diagnóstico é "oconjunto de procedimentos que visa procurar as principais causas de um problema". E causa é comumente conceituada como "uma entre várias condições que, em conjunto, concorrem para a existência de um determinado problema".
Comparando o diagnóstico de um problema social com diagnóstico de problemas das ciências naturais, podemos observar que é muito mais complexo o problema social que o natural, devido à exatidão, precisão e objetividade dos problemas matemáticos, físicos e químicos, característicos das áreas exatas.
Já os problemas de caráter social, envolvem diagnósticos mais complexos, pois a observação e experimentação são metodologias insuficientes para entender as causas desses problemas, pois "os fenômenos humanos repousam sobre a multicausalidade" trazendo a dificuldade de "não se incorporar" no diagnóstico as preferências, os valores e as opiniões pessoais do analista (LAVILLE; DIONNE, 1999, p.41 apud PONTES, 2013, p.144).
Uma política pública eficiente necessita de um diagnóstico preciso do problema social, que é caracterizado por uma clara delimitação e identificação dos fatores determinantes do problema. Neste caso, estamos tratando de um "problema focal", que será objeto de uma política pública e seu programa governamental.
Uma das principais dificuldades de identificação de um problema social está na relação de "causa e efeito" do problema, justamente por que as questões sociais integram problemas diversos, dificultando o ordenamento correto de suas causas, efeitos e soluções. Portanto, primeiramente é necessário reconhecer os fatores de causa e depois seus efeitos, para enfim, tratar o problema social como um "problema focal". Por exemplo, considerando os seguintes problemas, quais são causas e quais são efeitos? Problemas como desemprego, evasão escolar, violência urbana e desnutrição.
Fazendo uma análise do ponto de vista temporal, podemos identificar uma relação entre os problemas que segue a seguinte ordem: (a) a desnutrição das crianças geram baixo rendimento escolar e por isso um aumento da evasão nas escolas públicas (b). Sem uma qualificação profissional adequada, uma boa parte dessa população não terá colocação no mercado de trabalho e o desemprego (c) deverá aumentar a violência nas cidades (d).
Portanto, o problema focal neste exemplo é a "violência urbana", enquanto as causas são os outros problemas descritos.
As Causas Responsáveis e as Causas Críticas
A preocupação central no processo de formulação das políticas públicas deve se concentrar nas principais causas que, se trabalhadas, possam gerar melhores resultados no combate dos problemas sociais. Ou seja, dentre um conjunto de "causas responsáveis", deve-se identificar as "causas críticas" do problema analisado, para assim, direcionar as políticas públicas e as ações governamentais que mitiguem os fatores essenciais causadores dos problemas.
Pela complexidade dos problemas sociais é comum identificarmos inúmeras causas que geram o problema e outros problemas relacionados. Porém, não é possível, especialmente pela limitação de recursos financeiros, que governos ataquem todos as causas responsáveis. Portanto, as ações governamentais e seus recursos deverão ser direcionados às causas críticas do problema. Vamos então analisar dois problemas que ilustram essa situação.
Sobre o problema da mortalidade infantil, identificada em determinado município, pode ter como causa possível o baixo nível educacional das mães. Contudo, não é a única, pois também podemos reconhecer que a falta de assistência médica, no pré-natal e no pós-parto, também influencia no número de bebês que morrem após o nascimento. Neste exemplo, então, qual seria a causa crítica?
Pois é, o fator crítico é a "precariedade médica", pois a educação das mães também tem relação com o problema da baixa qualidade de ensino público, e por isso, não deve ser considerado uma causa crítica, e sim, responsável.
Sobre o problema do desemprego, suponha as seguintes causas responsáveis do problema: inexistência de postos de trabalho; baixa qualificação profissional; legislação trabalhista desatualizada; cultura da acomodação.
Qual dessas causas seria a mais crítica para o desemprego? Se analisamos com calma, podemos observar que a falta de postos de trabalho é a causa crítica, se comparamos com a qualificação dos trabalhadores, visto que a primeira se relaciona à causas na estrutura da economia do país, e independe do nível de qualificação profissional, assim como com a legislação e a cultura (PONTES, 2013).
Portanto, para a formulação das políticas públicas deve existir a distinção entre as causas responsáveis e críticas, assim como, a definição do problema focal que permita um melhor direcionamento das ações dos governos em busca das soluções dos problemas sociais.
Aula: 15_Conceituação para a Formulação e Gestão de Políticas Públicas
Após os estudos das aulas anteriores, podemos entender que com o diagnóstico das causas críticas de um problema social é possível definir as ações governamentais que buscam solucionar o problema. O conjunto dessas ações de governo são os conceitos de "projetos ou atividades da política pública", ou ainda, "programas governamentais".
De acordo com a figura 1, podemos observar como o problema, suas causas e o programa do governo pode ser ordenado, segundo a metodologia e conceituação do PES (estudada na aula 12).
Utilizando a estrutura anterior, vamos aplicá-la ao exemplo do problema da "mortalidade infantil" (já citada na aula 14). Nesse caso, por exemplo, podemos formular a seguinte estrutura de problemas e ações do governo (figura 2). Note que foram definidas como causas críticas do problemas: a falta de saneamento básico; a falta de assistência pré e pós-parto; e a desnutrição das gestantes carentes.
Para combater a mortalidade infantil, foram escolhidas as seguintes ações governamentais: canalização do esgoto; melhoria no atendimento médico das gestantes; fornecimento de cestas básicas às famílias das gestantes carentes.
Observe que ao considerar a metodologia do PES para a problematização analisada, a formulação do planejamento governamental torna-se bastante simples, porém, ao mesmo tempo, coerente e focada em ações para o enfrentamento dos problemas sociais, o que é considerado um aspecto positivo na formulação das políticas públicas.
Aspectos da Formulação do Problema Social
Para melhorar a qualidade das políticas públicas, o problema social objeto do programa governamental, deve observar os seguintes aspectos e conceitos (PONTES, 2013, p.152-155):
a) os problemas devem ser declarados para as situações existentes na sociedade, e não para os interesses da instituição governamental que as formulam;
b) os problemas devem ser formulados de forma suficientemente clara;
c) os problemas devem ser passíveis de comprovação;
d) os problemas devem ser formulados como uma situação indesejável (uso inadequado das expressões, que não caracterizam os problemas e prejudicam a definição das ações governamentais. Por exemplo, a questão da "saúde pública" ou da "segurança pública" não são problemas. Os problemas são a "baixa qualidade dos serviços públicos de saúde e segurança". Para esses problemas, serão efetivadas ações específicas e focadas nesses problemas;
e) os problemas não devem ser formulados de modo a induzir ou a obrigar uma solução específica;
f) os problemas devem refletir rigorosamente o "cerne" da situação que se quer solucionar ou mitigar;
g) os problemas devem estar ao alcance dos instrumentos disponíveis para enfrentá-los.
Portanto, diagnosticar os problemas é muito importante, porém, não condição única e suficiente, pois também é essencial existirem condições financeiras que permitam operacionalizar as ações governamentais necessárias para a efetivação das políticas públicas (governança das políticas públicas).
Outros Conceitos Importantes para as Políticas Públicas
No ambiente das políticas públicas, existem importantes conceitos que devem ser considerados pelos agentes envolvidos e relacionados direta, ou indiretamente,com esse trabalho (técnicos, chefes e assessores políticos, empresários, comunidade e a população). Trata-se da imprecisão dos conceitos sobre projetos, programas, políticas públicas, metas, tarefas, objetivos entre outros, por exemplo.
É claro que são aceitas variações nas conceituações, porém, é necessário que em um mesmo ambiente, ou instituição, exista um alinhamento coerente entre o conjunto de conceitos e o objeto analisado, para que evitem problemas de linguagem e comunicação entre os agentes. Por exemplo, o entendimento sobre o que é um programa para um, pode ser o mesmo que um segundo entende como projeto, e um terceiro entende como política, e assim por diante.
Assim, a qualidade das políticas públicas também estão relacionadas à integração de métodos e conceitos entre as esferas governamentais, como no caso brasileiro ordenado pela União e suas unidades estaduais e municipais. Por isso, destacamos como exemplo, os instrumentos legais de planejamento e orçamento do Brasil, representados pelos PPA, as LDO e as LAO (Decreto Presidencial nº2829/1998 e Portaria nº42/1999 do Ministério do Orçamento e Gestão). São então observados os seguintes conceitos (PONTES, 2013, p.159):
a) Plano Plurianual: constituído por um conjunto de programas que integram as políticas públicas de uma determinada esfera governamental;
b) Programa: conjunto de ações governamentais;
c) Ações: são os projetos e atividades dos governos, sendo os projetos caracterizados por ações com início e fim, enquanto as atividades são ações contínuas;
d) Produto: bem ou serviço resultante de uma ação governamental;
e) Tarefas: são os procedimentos sequenciais necessários a obtenção do produto.
Conforme descrito na figura 3, note como esses conceitos são ordenados e se relacionam à gestão e formulação das políticas públicas:
Por fim, destacamos que a gestão das políticas públicas envolve portanto, a formulação, implementação, monitoramento (avaliação) e reprogramação dos programas governamentais (como visto na aula 10 sobre os ciclos das políticas públicas), e destacados agora sob a forma dos programas de governos.
Aula: 16_Ferramentas de Formulação e Gestão das Políticas Públicas
Com base no Planejamento Estratégico Situacional (PES), considerado o mais adequado como modelo de gestão pública nas economias atuais (conforme estudado anteriormente), é possível aplicar um conjunto de ferramentas de suporte que servem de instrumentos de escolha na formulação e gestão das políticas públicas (PONTES, 2013, p.168). Podemos citar como importantes ferramentas de suporte: a) matriz de decisão; b) árvore de problemas; e c) marco lógico. Vamos então conhecer cada uma dessas ferramentas.
Matriz de Decisão
Essa ferramenta é considerada simples, mas eficiente para definir quais políticas públicas serão utilizadas em determinados contextos. Funciona como um mecanismo de apoio à escolha, ou priorização de elementos em um conjunto de programas que farão parte da agenda do governo. Segundo Pontes (2013, p.169):
A escolha das políticas públicas para um plano de governo, ou seja, a priorização dos problemas que serão enfrentados pelo governante em seu mandato, assume uma importância estratégica. É essa escolha que vai demonstrar a competência do governante para selecionar problemas ou compromissos que resultem em maior impacto político positivo possível.
Para entendermos melhor a matriz de decisão, vamos analisar um modelo simplificado da matriz, considerando três aspectos sobre o problema, sendo eles a "urgência", a "importância" e a "governança". Cada um desses aspectos pode ter maior, ou menor grau de relevância na análise do problema, por isso, a matriz de decisão auxilia na visualização e padronização desses aspectos no conjunto da escolha do programa governamental.
De acordo com a tabela 1, foram atribuídos os seguintes pesos sobre os aspectos mencionados: peso 3 à governança (G); peso 2 à urgência (U); e peso 1 à importância (I)[1]. Além disso, a nota (score) para cada um dos elementos analisados foi definida de 1 a 5, sendo que, quanto mais próximo de 5, maior a "intensidade" do elemento analisado.
Quanto aos problema sociais, objeto de análise dessa matriz, esses podem ser agrupados em diferentes áreas de atuação do governo, como segurança, educação, emprego, etc. Para o exemplo citado, foi escolhido o problema social com a "saúde pública".
Tabela 1 - Exemplo Matriz de Decisão
Problema na Área da Saúde
(G)
(U)
(I)
Pontos
(3G + 2U + I)
Prioridade
Alta taxa de mortalidade infantil
4
4
5
25
3
Alta taxa de mortalidade por câncer
3
2
3
16
6
Alta taxa de mortalidade por tuberculose
3
2
3
16
6
Inexistência de ambulância no município
5
5
5
30
1
Inexistência de médico obstetra
4
3
5
23
4
Inexistência de médico especialista em oncologia
4
2
3
19
5
Falta de medicamentos para o hospital municipal
5
5
4
29
2
Fonte: Pontes (2013, p.172).
Observe que no resultado da matriz, a coluna de "Prioridade" apresenta em ordem (de 1 a 6), cada um dos elementos analisados sobre o problema da saúde, baseando-se no somatório dos pontos atribuídos ao peso e às notas sobre os aspectos de "governança", "urgência" e "importância".
Por exemplo, ficou em 1º lugar de prioridade nos problemas da saúde pública do município, a "Inexistência de Ambulância no Município", pois este item somou "30" pontos (resultante de 3(5) + 2(5) + (5) = 30).
Em 6º lugar ficaram a "Alta Taxa de Mortalidade por Câncer" e a "Alta Taxa de Mortalidade por Tuberculose", ambas com um total de "16" pontos cada (resultante de 3(3) + 2(2) + (3) = 16). Em 2º lugar em prioridade ficou "A Falta de Medicamentos para o Hospital Municipal", seguido pela "Alta Taxa de Mortalidade Infantil" (3º lugar). Em 4º lugar de prioridade a matriz classificou a "Inexistência de Médico Obstetra" e em 5º lugar a "Inexistência de Médico Especialista em Oncologia".
Note que existe um grau de "subjetividade" na definição dos aspectos e dos padrões de notas e pesos aplicados à Matriz de Decisão. Ainda assim, essa ferramenta pode ser muito útil na construção de um modelo de escolha, sendo mais técnica e menos subjetiva, se do processo de sua construção, mais agentes e especialistas participarem na análise das variáveis que importam para a atuação do governo e sua política pública.
Árvore de Problemas
De acordo com Queiroz (2013, p.173), a "árvore de problemas é uma ferramenta que possibilita a melhor delimitação do problema e a identificação das principais causas de sua existência", pois a definição precisa do problema e suas causas é um fator primordial para o sucesso da política pública, pois do contrário, medidas equivocadas podem ser tomadas.
Outra vantagem dessa técnica é permitir a identificação da causa e efeito dos problemas analisados, facilitando a construção do problema focal (ou central), conduzindo os esforços na direção correta para resolver os fatores que promovem o problema.
Para visualizarmos essa ferramenta, a figura 1 apresenta um modelo de árvore de problemas, com a descrição das causas, efeitos e o problema focal, além das estratégias de ação que conduz a política pública.
Como apresentado na figura 1, o exemplo citado é do problema com acidentes de trânsito envolvendo veículos de táxis. Este é definido como o problema focal, visto que ele é caracterizado pela morte de pessoas e feridos em acidentes (alto número de acidentes). A partir dessa definição, se dá a construção da árvore de problemas, estabelecendo níveis de relação entre as causas preliminares e os problemas, que são os efeitos. Portanto, a partir da delimitação do problema focal, as estratégias de ação do programa serão definidas, ou seja, o programa do governo será o "meio" para atingir um "fim, que é a solução do problema focal.
Ainda segundo a figura, observa-se que são definidos como causas preliminares (nível 1), (a) os motoristas despreparados, (b) as más condições de conservação das ruas, e (c) as más condições de conservaçãodos táxis. Analisando essas causas é possível definir uma relação de "causas-efeitos" que são caracterizadas por causas que são efeitos de outras causas. Assim, as causas do nível 2, explicam as causas do nível 2.
Por exemplo, os motoristas despreparados (a) é uma causa dos acidentes, e estes, em segunda estância, são causados também, pela falta de treinamento dos motoristas de táxis, mais o número de horas de trabalho que, na maioria dos casos, são excessivas. O mesmo acontece com os táxis em más condições de conservação (c), que são também causados pela frota antiga (sem incentivos à renovação), mais o descuido com a manutenção dos veículos por parte dos motoristas de táxi.
Já a causa relacionada à má conservação das vias públicas não apresenta nenhuma relação com outras causas, portanto, esta é por si só uma causa que gera efeitos sobre o problema dos acidentes de trânsito, por isso, uma causa de nível 1.
Destacamos que a ferramenta apresentada é um diagnóstico do problema focal que se constrói baseada na percepção e avaliação dos participantes do processo de formulação da política pública e que por isso, é importante ser oi mais participativo possível, com a colaboração de vários integrantes que ajudem no julgamento do problema analisado.
Para tal processo é indicado a realização de um "brainstorm" (chuva de ideias/livre pensamento), que é uma metodologia em que os participantes anotam (em formato de cartões) todas suas ideias sobre os problemas analisados e suas correlações. Um elemento importante é relacionar as causas e efeitos no tempo, identificando o que começa primeiro e o que tornou-se então problema, por isso que é importante definir níveis para as causas e seus efeitos.
Trata-se de um processo de discussão que não é óbvio, nem simples, mas que conduz a uma reflexão produtiva sobre os problemas e suas causas. Após várias discussões, o grupo de participantes deverá chegar a um consenso sobre o que será acordado quanto à árvore de problemas (problema focal, causas responsáveis e causas críticas).
Marco Lógico
O marco lógico (quadro lógico, matriz lógica) é uma ferramenta que objetiva apresentar, de modo sistemático e lógico, os objetivos de uma política pública (ou até mesmo um projeto privado), relacionando suas causas e seu ciclo na política pública (preparação, execução, avaliação e reprogramação). É uma ferramenta que utiliza o mesmo padrão de causa e efeito da árvore de problemas, mas que também se preocupa com a verificação do grau de alcance do objetivo pretendido, dando atenção aos fatores externos (externalidades) que podem comprometer o programa ao longo de sua execução, buscando assim, incrementar a precisão das ações e dos objetivos pretendidos.
O marco lógico pode ser visto como um "gabarito" ou "forma" que leva à construção de um desenho simplificado do programa governamental, com padrão lógico e claro, delimitando os objetivos em todas as suas fases de execução da política pública (QUEIROZ, 2013).
A construção do marco lógico é na forma de uma "matriz" de quatro linhas e quatro colunas, inseridas as informações sobre as finalidades, objetivos, as ações, os produtos, as tarefas, os indicadores de acompanhamento, as fontes dos indicadores e as suposições, que podem ou não ocorrer (quadro 1).
Quadro 1 - Modelo de Marco Lógico
Objetivos
Indicadores
Fontes dos Indicadores
Suposições
Finalidade
Objetivo do programa
Ações do programa
Tarefa das ações
Fonte: Pontes (2013, p.188).
Com base nessa ferramenta, um programa é considerado adequado quando consegue atender a "lógica horizontal" e a "lógica vertical". A primeira representa o "vínculo existente entre o objetivo dos quatro níveis (linhas) da matriz com as respectivas medições do êxito obtido e suposições que constituem fatores externos que devem ou não ocorrer" (QUEIROZ, 2013, p.189). A segunda, referente à lógica vertical, representa as relações de causa-efeito entre as quatro linhas da matriz (deve ser lida debaixo para cima). Como exemplo, vamos analisar um caso hipotético de "Redução da taxa de mortalidade" para um município, apresentada no quadro 2.
Quadro 2 - Exemplo de Marco Lógico
Objetivos
Indicadores
Fontes dos Indicadores
Suposições
Finalidade superior do programa
Elevar o IDH de 0,4 para 0,8
IDH
IBGE
Outros três programas relacionadas a essa finalidade deverá ter seus objetivos alcançados
Objetivo do programa
Reduzir a taxa de mortalidade infantil de 10/1000 para 2/1000
Taxa de mortalidade
Secretaria Estadual de Saúde
1 - Construir e equipar os hospitais
Percentual de hospital construído e equipado
Instituto Municipal de Saúde
Ações do programa
2 - Canalizar 10Km de esgotos
Percentual de Km de esgotos construídos
Empresa Municipal de Águas e Saneamento
3 - Distribuir 100 mil cestas básicas
Percentual de cestas básicas distribuídas
Secretaria de Assistência Social
1.1 - Elaborar projeto de hospital
O projeto elaborado
Departamento de Engenharia da Prefeitura
1.2 - Elaborar edital de licitação
O edital elaborado
Departamento de Licitações da Secretaria Municipal
Tarefa das ações
1.3 - Publicar edital de licitação
O edital publicado
Departamento de Licitações da Secretaria Municipal
1.4 - Relação da demais tarefas para se obter o hospital pronto e equipado
Etc
Etc
2.1 - Relação das tarefas da ação 2
Etc
Etc
3.1 - Relação das tarefas da ação 3
Etc
Etc
Fonte: Pontes (2013, p.191).
Observe que podemos fazer uma análise horizontal da matriz relacionando cada objetivo com os indicadores que permitem medir as etapas do programa. Ao mesmo tempo, na análise vertical, fazendo uma leitura de baixo para cima, observamos as tarefas que deverão ser executadas para se chegar ao objetivo do programa, que é essencial para realizar a finalidade principal da política pública, que no caso descrito, é a elevação do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Essa finalidade será efetivada quando o IBGE indicar que houve um aumento do IDH do município, e para tanto, conforme a matriz apresentada, as etapas do programa deverão ser executadas com base no acompanhamento e verificação de cada ciclo da política pública.
[1] Lembrando que governança é a capacidade que os governos têm de gerir seus recursos financeiros, de modo a viabilizar suas políticas públicas, pois sem esses recursos os programas ficam impedidos de serem desenvolvidos, devido à falta de pagamentos. É por isso, que no exemplo citado, a governança assumiu um peso maior na matriz de decisão.
Aula: 17_Indicadores e Informações para a Gestão Pública
Na formulação e gestão das políticas públicas, os indicadores assumem um importante papel nesse processo, pois a partir da análise dos indicadores é que a avaliação e monitoramento dos programas governamentais são realizados. Ou seja, o conjunto de informações obtidas a partir dos indicadores permitem determinar e acompanhar as ações de formulação das políticas públicas, além do seu desempenho e objetivos alcançados.
Outra questão importante é que a própria escolha dos indicadores também é um elemento crucial para o melhor desempenho das políticas públicas, pois o indicador deve proporcionar condições para sua medição e análise e não somente um conjunto de dados sem utilidade.
De acordo com Queiroz (2013, p.200): "A 'dificuldade' em estabelecer os indicadores para um programa ou uma ação governamental, na maior parte dos casos, está relacionado ao fato de o programa (ou ação) estar imprecisamente formulado".
Se o programa governamental é muito abrangente e impreciso, isso torna o processo de avaliação também impreciso, o que compromete o alcance dos objetivos das políticas públicas. Sem a coerência entre os indicadores escolhidos e os objetivos definidos, o programa governamental fica comprometido por falhas no monitoramento e avaliação.
Os indicadores como informação
Para que a subjetividade não prevaleça no processo de formulação, monitoramentoe avaliação das políticas públicas, é importante o uso dos indicadores, são eles que tornam o processo mais técnico e o diagnóstico mais preciso, ou seja, não é possível permitir que as impressões pessoais, ou opiniões e valores individuais conduzam o diagnóstico dos problemas e das ações dos programas, é imprescindível que as informações utilizadas sejam baseadas em indicadores estatísticos que sejam de uso de todos e que as informações sejam entendidas por todos os participantes do processo:
No processo de gestão das políticas públicas, os indicadores são necessários para o monitoramento e a avaliação dos resultados obtidos, sempre tendo em vista que, no âmbito da avaliação das políticas públicas, mais importante que 'medir' os resultados é saber se a sociedade está satisfeita com eles, pois, não ambiente democrático contemporâneo, a relação do Estado com a sociedade é uma relação de parceria. Nesse contexto avaliar uma política pública é fundamentalmente 'medir' a sua efetividade (QUEIROZ, 2013, p.201).
Podemos então entender os indicadores como "informações" que são essenciais no reconhecimento dos problemas sociais e na formulação e gestão das políticas públicas.
É importante entender também que os indicadores se referem às informações tanto verbais quanto estatísticas, ou seja, informações escritas e informações obtidas por meio de porcentagens, índices, coeficientes, taxas etc. Já sobre as funções dos indicadores são consideras, basicamente, as seguintes: a) gerar informações que descrevam a realidade dos acontecimentos e do seu comportamento; e b) compor valores que possam servir para as análises presentes e futuras das políticas.[1]
Sendo assim, os indicadores não são somente números, mas sim, "atribuição de valor" conforme regras estabelecidas por meio de critérios de avaliação, como eficácia, efetividade e eficiência. Portanto, podemos entender que os indicadores servem:
a) para medir os resultados;
b) para gerir o desempenho;
c) para dar consistência à análise dos resultados e do processo de decisão;
d) para melhorar os processos organizacionais;
e) para facilitar o planejamento e o controle do desempenho; e
f) para viabilizar análises comparativas entre as condições presentes e futuras, além de outras comparações, como entre departamentos, estágios, organizações, etc.
Portanto, seja um dado simples verbal (escrito) quanto um dado complexo, como um coeficiente, todos são informações que podem ser utilizadas dentro do escopo que do processo da política pública. Portanto, a principal função dos indicadores é fornecer informações que auxiliem os gestores públicos e seus atores participantes, na condução do processo de formulação das políticas públicas, assim como suas correções e ajustes ao longo do processo de monitoramento e de avaliação.
Classificação dos Indicadores
O indicador, além de fornecer uma informação, permite também inferir atributo aos dados medidos, como qualidade, impacto, proporção etc. Todo indicador deve ser definido por uma unidade de medida, estabelecendo valor e a definição desse indicador no processo. Assim, podemos classificar os indicadores em "resultado" e "impacto".
1) Indicadores de resultado:
- Para produtos: atividade de medição dos produtos (bens e serviços) em quantidades físicas (por exemplo: número de hospitais; número de famílias; etc);
- Para objetivos: efeitos dos programas e das ações governamentais em relação aos objetivos propostos. Pode ser de caráter quantitativo como qualitativo sobre o êxito do programa (por exemplo: redução no número de evasão escolar; aumento nos custos financeiros com prevenção de acidentes; etc).
2) indicadores de impacto:
- São aqueles que contemplam aspectos mais amplos e de baixo controle dos programas, como os indicadores socioeconômicos, como renda, emprego, inflação, investimentos, etc.
[1] MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO (Brasil). Guia Referencial para Medição de Desempenho e Manual para Construção de Indicadores. Brasília, 2009.
Aula: 17_Indicadores e Informações para a Gestão Pública
Na formulação e gestão das políticas públicas, os indicadores assumem um importante papel nesse processo, pois a partir da análise dos indicadores é que a avaliação e monitoramento dos programas governamentais são realizados. Ou seja, o conjunto de informações obtidas a partir dos indicadores permitem determinar e acompanhar as ações de formulação das políticas públicas, além do seu desempenho e objetivos alcançados.
Outra questão importante é que a própria escolha dos indicadores também é um elemento crucial para o melhor desempenho das políticas públicas, pois o indicador deve proporcionar condições para sua medição e análise e não somente um conjunto de dados sem utilidade. De acordo com Queiroz (2013, p.200): "A 'dificuldade' em estabelecer os indicadores para um programa ou uma ação governamental, na maior parte dos casos, está relacionado ao fato de o programa (ou ação) estar imprecisamente formulado".
Se o programa governamental é muito abrangente e impreciso, isso torna o processo de avaliação também impreciso, o que compromete o alcance dos objetivos das políticas públicas. Sem a coerência entre os indicadores escolhidos e os objetivos definidos, o programa governamental fica comprometido por falhas no monitoramento e avaliação.
Os indicadores como informação
Para que a subjetividade não prevaleça no processo de formulação, monitoramento e avaliação das políticas públicas, é importante o uso dos indicadores, são eles que tornam o processo mais técnico e o diagnóstico mais preciso, ou seja, não é possível permitir que as impressões pessoais, ou opiniões e valores individuais conduzam o diagnóstico dos problemas e das ações dos programas, é imprescindível que as informações utilizadas sejam baseadas em indicadores estatísticos que sejam de uso de todos e que as informações sejam entendidas por todos os participantes do processo:
No processo de gestão das políticas públicas, os indicadores são necessários para o monitoramento e a avaliação dos resultados obtidos, sempre tendo em vista que, no âmbito da avaliação das políticas públicas, mais importante que 'medir' os resultados é saber se a sociedade está satisfeita com eles, pois, não ambiente democrático contemporâneo, a relação do Estado com a sociedade é uma relação de parceria. Nesse contexto avaliar uma política pública é fundamentalmente 'medir' a sua efetividade (QUEIROZ, 2013, p.201).
Podemos então entender os indicadores como "informações" que são essenciais no reconhecimento dos problemas sociais e na formulação e gestão das políticas públicas.
É importante entender também que os indicadores se referem às informações tanto verbais quanto estatísticas, ou seja, informações escritas e informações obtidas por meio de porcentagens, índices, coeficientes, taxas etc. Já sobre as funções dos indicadores são consideras, basicamente, as seguintes: a) gerar informações que descrevam a realidade dos acontecimentos e do seu comportamento; e b) compor valores que possam servir para as análises presentes e futuras das políticas.[1]
Sendo assim, os indicadores não são somente números, mas sim, "atribuição de valor" conforme regras estabelecidas por meio de critérios de avaliação, como eficácia, efetividade e eficiência. Portanto, podemos entender que os indicadores servem:
a) para medir os resultados;
b) para gerir o desempenho;
c) para dar consistência à análise dos resultados e do processo de decisão;
d) para melhorar os processos organizacionais;
e) para facilitar o planejamento e o controle do desempenho; e
f) para viabilizar análises comparativas entre as condições presentes e futuras, além de outras comparações, como entre departamentos, estágios, organizações, etc.
Portanto, seja um dado simples verbal (escrito) quanto um dado complexo, como um coeficiente, todos são informações que podem ser utilizadas dentro do escopo que do processo da política pública. Portanto, a principal função dos indicadores é fornecer informações que auxiliem os gestores públicose seus atores participantes, na condução do processo de formulação das políticas públicas, assim como suas correções e ajustes ao longo do processo de monitoramento e de avaliação.
Classificação dos Indicadores
O indicador, além de fornecer uma informação, permite também inferir atributo aos dados medidos, como qualidade, impacto, proporção etc. Todo indicador deve ser definido por uma unidade de medida, estabelecendo valor e a definição desse indicador no processo. Assim, podemos classificar os indicadores em "resultado" e "impacto".
1) Indicadores de resultado:
- Para produtos: atividade de medição dos produtos (bens e serviços) em quantidades físicas (por exemplo: número de hospitais; número de famílias; etc);
- Para objetivos: efeitos dos programas e das ações governamentais em relação aos objetivos propostos. Pode ser de caráter quantitativo como qualitativo sobre o êxito do programa (por exemplo: redução no número de evasão escolar; aumento nos custos financeiros com prevenção de acidentes; etc).
2) indicadores de impacto:
- São aqueles que contemplam aspectos mais amplos e de baixo controle dos programas, como os indicadores socioeconômicos, como renda, emprego, inflação, investimentos, etc.
[1] MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO (Brasil). Guia Referencial para Medição de Desempenho e Manual para Construção de Indicadores. Brasília, 2009.
Aula: 18_Monitoramento das Políticas Públicas
O monitoramento das políticas públicas representa as atividades de acompanhamento das ações e dos resultados dos programas governamentais, de modo sistemático e contínuo. Consiste, basicamente, na comparação entre os indicadores de resultado (para produtos e para objetos), promovendo assim a transparência e o melhor uso dos recursos públicos (desde sua formulação até à execução).
Segundo a UNESCO (2006, p.21):[1]
Monitoramento consiste no acompanhamento contínuo, cotidiano, por parte de gestores e gerentes, do desenvolvimento dos programas e políticas em relação a seus objetivos e metas. É uma função inerente à gestão dos programas, devendo ser capaz de prover informações sobre o programa para seus gestores, permitindo a adoção de medidas corretivas para melhorar sua operacionalização. É realizado por meio de indicadores, produzidos regularmente com base em diferentes fontes de dados, que dão aos gestores informações sobre o desempenho de programas, permitindo medir se objetivos e metas estão sendo alcançados.
O monitoramento pode se referir a dois processos distintos, porém, interligados que é o acompanhamento dos programas como uma atividade interna com procedimentos a distância, e como uma atividade externa, caracterizada por processos presenciais (checagens locais que auxiliam na verificação da implementação dos programas e se seus objetivos estão sendo atingidos, além de identificar problemas que possam interferir nos objetivos determinados).
De acordo com Oliveira e Berge (2012, p.109), o monitoramento é uma atividade que ocorre durante a execução de um programa, tendo como finalidade a produção de dados que subsidiem a análise e o processo de tomada de decisão referentes ao planejamento das ações vinculadas à:
a) Gestão de diferentes modalidades de políticas e programas governamentais;
b) Melhoria da função gerencial;
c) Garantia da eficiência, eficácia e efetividade das ações desenvolvidas;
d) Organização das informações de uma política ou programa, constituindo-se em fonte de consulta.
O monitoramento, por ser uma função da gestão dos programas governamentais, permite que medidas corretivas sejam aplicadas, de modo a buscar a melhoria da operacionalização das ações. Sendo assim, é reconhecido que o monitoramento e a avaliação das políticas públicas são atividades interligadas e complementares, ainda que apresentem funções e objetivos diferentes; porém, ambos operam com indicadores quantitativos e qualitativos construídos com as atividades de acompanhamento e análise das ações governamentais (na próxima aula a avaliação das políticas públicas serão estudadas mais detalhadamente).
No quadro 1 é apresentada seis dimensões comparando o monitoramento e a avaliação conforme suas diferenças e complementaridades:
Quadro 1 - Síntese das Complementaridades e Diferenças entre
Monitoramento e Avaliação
Dimensão
Monitoramento
Avaliação
Momento de realização
Durante
Antes, durante ou depois
Frequência
Regular, sistemática, contínua
Ocasional e circunstancial
Conteúdo
Insumos, produtos, processos, efeitos, plano de trabalho
Processos, produtos e resultados
Objetivos
Melhorar a ação desenvolvida, adequando-a aos objetivos e as metas previstas no planejamento
Analisar a proposta de um programa (ou projeto) e de um conjunto de atividades nas diferentes modalidades, com o fim de contribuir para a tomada de decisão
Sujeitos que realizam
Pesquisadores, formuladores, executores, financiadores e população beneficiária
Pesquisadores, formuladores, executores, financiadores e população beneficiária
Destinatários
Formuladores, executores, financiadores e população beneficiária
Formuladores, executores, financiadores e população beneficiária
Fonte: Oliveira e Berge (2012, p.110)
Nota-se que o monitoramento e a avaliação apresentam diferenças quanto à realização, frequência, conteúdo e objetivos. Por outro lado, ambos se assemelham no que se refere aos sujeitos e destinatários, e se complementam pois a análise necessita dos dados e dos objetivos do monitoramento, para que os planos e programas sejam aperfeiçoados e alcancem seus objetivos.
O Monitoramento Estratégico
O "monitoramento estratégico" pode ser entendido como um tipo específico de registro, análise e interpretação da realidade, que conduz ao aprendizado institucional na execução das políticas públicas, produzindo informações ao longo do tempo e auxiliando o processo de tomada de decisão por parte dos agentes públicos (IPEA, 2015).[2]
O monitoramento estratégico tem como orientação a busca pelo alcance das metas prioritárias da administração pública, acompanhando a execução de cada programa conforme suas especificidades organizacionais. Na figura 1 é apresentado alguns elementos centrais do monitoramento estratégico:
a) flexibilidade para dialogar com a dinâmica de implementação de cada programa;
b) ênfase nas metas prioritárias, sejam estas quantitativas ou qualitativas;
c) responsabilidade compartilhada da administração pública federal;
d) articulação federativa; e
e) participação e controle social público.
Se a atividade de monitoramento for institucionalizada na prática cotidiana do planejamento governamental, sendo dinâmica, sistêmica, abrangente e complexa, seus atributos e implicações podem ser relacionadas como no quadro 1:
Quadro 1 - Monitoramento Estratégico de Políticas Públicas: Atributos e Implicações
Informativo e Formativo
Analítico e Avaliativo
Prospectivo e Corretivo
Produz conhecimento:
- denso e aprofundado da realidade; e da
- implementação e gestão cotidiana das políticas públicas.
Dinâmico
Sistêmico
Abrangente
Complexo
Gera:
- informações armonizadas; e
- indicadores úteis.
Contínuo
Coletivo
Cumulativo
Fonte: IPEA (2015, p.11)
Observe que o monitoramento estratégico tem como importantes atributos informativos e analíticos o conhecimento aprofundado da realidade e sua natureza dinâmica e abrangente, tendo como implicações a geração de indicadores úteis, que se acumulam e tornam a análise mais robusta e completa. Portanto, o monitoramento é uma atividade muito importante do processo de implementação, execução e gestão das políticas públicas, devendo ser prática, contínua, cumulativa e coletiva, melhorando assim, a gestão e as ações governamentais.
[1] VAITSMAN, Jeni; RODRIGUES, Roberto W. S.; SOUSA, Rômulo Paes. O Sistema de Avaliação e Monitoramento das Políticas e Programas Sociais: a experiência do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome do Brasil. Brasil, 2006.
[2] Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Monitoramento Estratégico de Políticas Públicas.Texto para Discussão. José Celso Cardoso Júnior. Rio de Janeiro, 2015.
Aula: 19_Avaliação das Políticas Públicas
Na aula anterior estudamos as principais características das atividades de monitoramento das políticas públicas. Destacamos também que o monitoramento e a avaliação dos programas governamentais são conceitos interligados e não independentes, mas que se diferem quanto aos objetivos e funções. Ao mesmo tempo, o monitoramento e avaliação se complementam, pois a partir do monitoramento é que dados são produzidos permitindo que os mesmos sejam analisados pelas atividades de avaliação, o que é essencial para a tomada de decisões por parte dos agentes.
Para identificar a eficiência de um programa de governo é importante desenvolver uma avaliação constante dos processos e dos resultados alcançados, assim como de seus objetivos. Além disso, a sustentabilidade de uma política depende também da capacidade de manter-se constante ao longo do tempo. Por isso, "é importante se apreender, dentre outras coisas, quais seriam outras alternativas de ações que poderiam ter sido adotadas – e que poderão ser em intervenções futuras – e quais lições se tirar da experiência – tanto daquilo que deu certo como do que deu errado" (LOPES, 2008, p.20).[1]
Na literatura das Políticas Públicas é comum observar duas formas de avaliação: uma referente aos responsáveis por avaliar a política (avaliação interna) e outra referente à finalidade da avaliação da política (avaliação externa).
A avaliação interna é conduzida pela equipe responsável pela operacionalização do programa, e a externa é feita por especialistas que não participam do programa. A vantagem da primeira se dá devido ao fato de que, ao estarem inseridos no programa, a equipe terá maior conhecimento sobre ele, além de acesso facilitado às informações necessárias, o que diminui o tempo e os custos da avaliação. Em contrapartida, a equipe envolvida no programa pode não contar com a separação do objeto avaliado, necessária para se garantir a imparcialidade. Essa imparcialidade é melhor garantida no caso da avaliação externa, porém, esse tipo de avaliação demanda mais tempo e custo para seu desenvolvimento.
Tipos de Avaliação
A tipologia da avaliação das políticas públicas pode ser definida segundo os seguintes critérios: a) o momento em que se avalia; b) a natureza, o papel, ou a função da avaliação; e c) a procedência dos avaliadores (OLIVEIRA e BERGUE, 2012, p.111).
Vamos analisar cada um deles conforme os quadros apresentados. Neles estão sintetizadas as principais características que determinam os tipos de avaliação. Conforme o quadro 1, em função do momento, a avaliação se aplica às ações e decisões que ocorrem antes, durante e depois do programa governamental.
Quadro 1 - Tipologia de Avaliação em função do momento
Avaliação antes, ou ex-ante
Avaliação durante
Avaliação expost
Momento inicial ou pré-decisão de empreender um programa ou projeto ou sua aprovação, ou sobre a conveniência ou não de levar a cabo.
Momento durante a execução ou avaliação da gestão; avaliação contínua, avaliação concorrente, monitoração ou avaliação concomitante: no andamento do programa ou projeto, obsevando distância entre a proposta inicial e o desenvolvimento da ação.
Momento na fase de conclusão de um ciclo planejado de um programa e/ou projeto.
Fonte: Oliveira e Bergue (2012, p.112, baseado em AGUILAR; ANDER-EGG, 1994).
Na avaliação que acontece antes do programa ou projeto governamental, três aspectos são considerados (OLIVEIRA e BERGUE, 2012, p.112, 113):
a) Pertinência do programa, ou projeto com relação ao problema (diagnóstico da realidade): trata-se de analisar se as propostas concretas contemplam as prioridades identificadas (se há coerência intrínseca entre o planejamento e a situação sobre o qual se pretende intervir);
b) Coerência e congruências internas: refere-se à viabilidade do programa, considerando os aspectos formais e organizacionais do programa, ou projeto;
c) Rentabilidade econômica das diferentes ações para alcançar os objetivos propostos: determinar o grau de viabilidade econômica, comprando resultados, benefícios e os custos.
Sobre o momento da avaliação que ocorre durante a programa, ou projeto, é possível realizar uma tríplice análise, constituídas dos seguintes movimentos: i) apreender (com indicadores quantitativos e qualitativos de eficiência, eficácia e efetividade; ii) efetuar (a contextualização do programa); e iii) realizar (modificações necessárias para atingir os resultados).
E no momento expost, a avaliação contempla dois aspectos:
1) Avaliação do fim do projeto ou do programa: a avaliação indicará a continuidade, ou não, do programa (período de estabilização);
2) Avaliação expost: estimativa de quando o programa chega ao seu pleno desenvolvimento (avaliação de impacto/pós decisão - até que ponto a mudança objetivada pelo programa ocorreu).
Vamos agora analisar o quadro 2 sobre a tipologia da avaliação quanto à natureza, o papel (ou função):
Quadro 2 - Tipologia de Avaliação em função da natureza, papel ou função
Avaliação somativa
Avaliação formativa
- refere-se à análise e à produção de informações sobre as etapas posteriores à implementação do programa;
- tende a coletar dados relativos aos resultados esperados, ou não alcançados pelo programa;
- visa a analisar em que medida o programa atingiu os resultados pretendidos (efetividade).
- refere-se à análise e à produção de informações acerca das etapas de implementação de um programa ou política pública;
- busca compreender os processos e mecanismos no momento de constituição de um programa ou política pública;
- intenciona: gerar um feedback para os sujeitos envolvidos no desenvolvimento ou na implementação do programa; subsidiar possíveis correções e/ou melhorar o programa.
Fonte: Oliveira e Bergue (2012, p.114, baseado em NEPP/UNICAP, 1999).
Note que a avaliação formativa e somativa são complementares, pois a primeira refere-se às informações de desenvolvimento da política pública (gera feedback para possíveis ajustes e correções), e a segunda reúne informações posteriores ao programa (de resultados). Segundo Oliveira e Bergue (2012), os elementos que diferem a avaliação formativa e somativa são: o conteúdo (ou objeto); as razões (motivações); os objetivos; para quem são; para onde; e para quando (antes, durante ou depois).
Por último, vamos analisar a tipologia da avaliação quanto à procedência (quadro 3). Pode-se observar que a avaliação mista é mais abrangente e que a avaliação participativa é mais democrática.
Quadro 3 - Tipologia de Avaliação em função da procedência dos avaliadores ou de quem realiza a avaliação
Avaliação externa
Avaliação interna
Avaliação mista
Avaliação participativa
- concretizada por pessoas alheias à organização;
- por ser realizada por avaliadores que não dominam o conteúdo ou objeto da avaliação, pode ocorrer prejuízos à análise comparativa dos resultados de diferentes avaliações.
- efetivada dentro da organização gestora do projeto;
- por ser realizada por avaliadores internos que conhecem o conteúdo/objeto da avaliação, seria um processo de reflexão e aprendizado;
- por outro lado, os avaliadores internos podem ter pré-concepções a repeito do projeto tanto por interesses institucionais quanto por valores relacionados ao alcance e à forma de alcançar os objetivos do projeto.
- combina a avaliação externa com a interna;
- propicia estreito contato entre os avaliadores internos e externos;
- preserva as vantagens das duas avaliações.
- envolve a participação da população beneficiária do projeto;
- tem por finalidade minimizar a distância entre o avaliador e os beneficiários do projeto.
Fonte: Oliveira e Bergue (2012, p.116, baseado em COHEN; FRANCO, 1993).
Enceramos essa aula destacando que a literatura sobre o tema da avaliação e monitoramento das políticas públicas é extensa e bem fundamentada, porém, ainda existe um amplo debate sobre sua efetividade e benefícios, especialmente no cenário sócio econômicobrasileiro, pois muitos autores questionam a eficiência dos instrumentos de avaliação, além de suas metodologias e aplicações. Portanto, é ainda um tema complexo e que demanda muitos estudos e aperfeiçoamentos.
[1] LOPES, Brenner Lopes; AMARAL, Jefferson Ney. Políticas Públicas: conceitos e práticas. Belo Horizonte: Sebrae, 2008.
Aula: 20_Os Índices
Aprendemos, em aulas anteriores, que o monitoramento e a avaliação das políticas públicas são conceitos interligados, mas com aspectos diferenciados quanto à função e objetivo. Lembrando, monitoramento é o acompanhamento sistemático do programa governamental que compara seus resultados com as metas traçadas, utilizando-se dos indicadores de produto e de resultado, sendo então considerada uma tarefa mais simples.
Já a avaliação se refere a uma tarefa mais complexa, pois vai além do levantamento e comparação das informações coletadas, mas compreende também da observação e reflexão sobre as explicações, causas e efeitos dos programas de governo, dentro do contexto econômico, social e ambiental afetado. Para a avaliação das políticas públicas os indicadores mais adequados são os de impacto (resultado de médio e longo prazo dos efeitos gerados pelo programa governamental sobre o problema social, objeto da política pública).
A análise dos indicadores de impacto são menos objetivas que a análise dos indicadores de resultado, pois envolve aspectos mais complexos. Segundo Queiroz (2009, p.204): "A avaliação dos impactos causados por uma política pública é, portanto, uma tarefa relativamente complexa, que exige análises mais profundas e, muitas vezes, somente a experiência pessoal dos analistas é que pode permitir bons resultados".
A avaliação das políticas públicas, por se tratar de uma atividade de longo prazo, acaba proporcionando um aprendizado importante para a gestão das políticas públicas, além de permitir que a prestação de contas aconteça por parte dos governos à sociedade. Mas para que isso aconteça, o uso dos indicadores é primordial. Dentro dessa categoria, os índices são classificados como indicadores compostos, pois combinam diferentes indicadores em um único número (resultantes de duas grandezas diferentes).
Produção per capita = Valor da produção da região no período
População total da região
QI (quociente de inteligência) = Idade mental__
Idade cronológica
Os índices se constituem da relação entre duas variáveis (ou uma variável e uma constante), sendo úteis para estudar variáveis que incorporam tempo (época) e espaço (local) na comparação (QUEIROZ, 2009):
O número de telefones para cada mil habitantes (relação entre variável e constante). O número de alunos aprovados em relação ao número de alunos matriculados em um curso (duas variáveis).
Ainda assim, a utilização do indicador, em boa parte das avaliações, não deve ser utilizado com base em apenas um dado, mas sim, combinado com vários indicadores. Isso por que, um indicador acaba refletindo um dado que pode não contemplar outros variáveis e informações relevantes para a análise em questão.
Por exemplo, não se pode fazer uma análise somente com um indicador de renda per capita, pois este é calculado com base na divisão da renda nacional pelo número de habitantes (média aritmética - média geral). Mas quando estamos fazendo uma análise de desenvolvimento, este indicador é incompleto, pois não é capaz de captar a distribuição da renda nacional (se a renda está concentrada ou não em determinada parcela da população). Daí a importância de se utilizar os chamados "índices-sínteses".
O índice-síntese é aquele composto por dois ou mais indicadores, correlacionando variáveis e seus aspectos determinantes sobre a realidade que se busca analisar. Um exemplo desse tipo de índice é o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano)[1]. Vamos conhecer como esse indicador é construído e qual é sua capacidade de medição.
O IDH é um indicador utilizado para medir o desenvolvimento de um país, ou seja, a qualidade de vida de sua população (bem-estar social e não somente crescimento econômico). Seus parâmetros de medida básicos são: renda, educação e saúde. Muitos governos utilizam esse indicador para direcionar suas políticas públicas sociais.
Desde 2010 novas metodologias foram incorporadas ao cálculo do IDH, sendo hoje baseada em três pilares mensurados da seguinte forma (PNUD, 2015):
a) Saúde: uma vida longa e saudável é medida pela expectativa de vida (longevidade);
b) Educação: o acesso ao conhecimento é medido por:
i) média de anos de educação de adultos, que é o número médio de anos de educação recebidos durante a vida por pessoas a partir de 25 anos;
ii) a expectativa de anos de escolaridade para crianças na idade de iniciar a vida escolar, que é o número total de anos de escolaridade que um criança na idade de iniciar a vida escolar pode esperar receber se os padrões prevalecentes de taxas de matrículas específicas por idade permanecerem os mesmos durante a vida da criança;
c) Renda: o padrão de vida é medido pela Renda Nacional Bruta (RNB) per capita expressa em poder de paridade de compra (PPP) constante, em dólar, tendo 2005 como ano de referência.
Cálculo e Classificação do IDH
De acordo com o PNUD (2015), o cálculo do IDH é resultante da média aritmética: IDH = (L + E + R)/3, onde L = longevidade, E = educação, R = renda. O indicador de longevidade/saúde (L) é medido pela seguinte fórmula
L = (EV - 25)/60, onde EV = expectativa de vida.
O indicador (E) de educação é medido por: E = (2TA + TE)/3, onde TA = taxa de alfabetização e TE = taxa de escolarização.
E o indicador de renda (R) é medido por: R = (Log 10 PIB pc - 2)/2,60206, em que log 10 PIB pc = logaritmo decimal do produto interno bruto per capita.
O IDH é apresentado de 0 a 1, sendo que quanto mais próximo de 1, mais desenvolvido é o país (também é utilizado para medir desenvolvimento de cidades, estados e regiões). Segundo sua última atualização metodológica, a classificação do IDH é a seguinte:
a) Baixo desenvolvimento: países que atingem um índice menor que 0,499;
b) Médio desenvolvimento: países com índice entre 0,500 e 0,699;
c) Alto desenvolvimento: países com índice entre 0,700 e 0,799;
d) Muito alto desenvolvimento: países que atingem um índice superior a 0,800.
No Relatório de 2014, o IDH do Brasil foi medido em 0,744 ficando na posição 79º no Ranking Mundial entre 187 países (alto desenvolvimento).
[1] O IDH foi criado pelo economista paquistanês Mahbub ul Haq com a colaboração do economista indiano Amartya Sen (ganhador do Prêmio Nobel de Economia de 1998). Esse índice é publicado, anualmente, desde 1990 no Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH) da PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), agência vinculada à Organização das Nações Unidas (ONU) (PNUD, 2015).
Aula: 21_Características dos Indicadores
Nas aulas anteriores conhecemos que as atividades de monitoramento e avaliação das políticas públicas necessitam de uma boa escolha e aplicação dos indicadores, tornando assim, a gestão da política pública mais eficiente. Portanto, a qualidade dos indicadores depende das seguintes características, a se considerar (QUEIROZ, 2009, p.207):
a) Finalidade: o indicador deve ser adequado aos parâmetros dos objetivos definidos no programa de governo. Quando definido com base em metas, os indicadores tornam-se mais úteis e aplicáveis;
b) Disponibilidade de dados: é importante que os indicadores reflitam dados contínuos e com intervalos que permitam comparações coerentes (antes, durante e depois), caso contrário, a qualidade do indicador torna-se baixa e a análise incompleta;
c) Sensibilidade em relação à atuação do Governo: em virtude da dinâmica do contexto social e das condições de governo, os indicadores dos programas também precisam ser passíveis de alterações e ajustes;
d) Confiabilidade e credibilidade: a confiabilidade se refere ao valor dos dados coletadose seus indicadores, que precisam ser isentos de questionamentos, ou seja, qualquer pessoa quantifica o dado da mesma forma, sem variações que gerem desconfiança. Já a credibilidade se refere aos métodos adotados para o levantamento e análise dos dados, de modo a garantir a reputação da instituição responsável pela coleta dos dados e divulgação dos seus indicadores (é preferível que esses sejam atores externo ao programa, para que haja imparcialidade);
e) Comparabilidade: é a característica definida pela capacidade do indicador gerar informações passíveis de comparação, ou seja, que programas e ações governamentais possam servir de referência para outros programas, o que torna o indicador mais eficiente;
f) Validade: um bom indicador é aquele caracterizado pela clareza de informação, permitindo que sua interpretação seja do alcance dos vários participantes e dos atores sociais. É importante que os indicadores de impacto realmente forneçam condições de avaliação do resultados e dos seus reflexos sobre a sociedade.
A partir da observação dessas características é possível determinar se os indicadores selecionados no processo de monitoramento e avaliação das políticas públicas são alta, média ou baixa qualidade.
Outras Ferramentas de Estimação
Existem várias ferramentas de medição que são aplicadas aos indicadores das políticas públicas. Conhecemos os índices, agora vamos conhecer as proporções, as porcentagens, os coeficientes e as taxas.
1) Proporções: a proporção reflete o quanto um dado, ou variável representa em relação ao todo dessa variável (ou de um conjunto de dados) em determinado intervalo de tempo. Sendo assim, a proporção é expressa por:
P = n/N, onde n = número de unidades observáveis na amostra e N = total da amostra.
2) Porcentagens: representa a proporção (P) de uma amostra em termos percentuais (%), ou seja, a proporção multiplicada por 100. É expressa por:
P% = (nx100)/N
Trabalhar com dados percentuais facilitam a análise e comparação dos dados coletados.
3) Coeficientes: é a comparação entre duas grandezas quando uma está contida na outra (comparação entre o número de unidades observáveis efetiva e o número potencial).
Coeficiente de aproveitamento escolar = Número de aprovados
Total de alunos
Coeficiente de mortalidade = Número de óbitos
População total
4) Taxas: é o coeficiente multiplicado pela potência de 10, como forma de facilitar a apresentação do indicador.
Coeficiente de mortalidade = 6.000__ = 0,015
400.000
Taxa de mortalidade = 6.000__ x 10³ = 15 óbitos a cada 1.000 habitantes
400.000
Encerramos essa aula destacando a importância de se construir e utilizar indicadores adequados ao monitoramento e avaliação das políticas públicas, visto o aumento das demandas sociais que esperam resultados e exigem o melhor uso dos recursos públicos. Sem um eficiente sistema de indicadores, a boa gestão pública fica comprometida.
REFERÊNCIAS
QUEIROZ, Roosevelt Brasil. Formação e Gestão de Políticas Públicas. 2ª. Edição. Curitiba: IBPEX, 2009.
Aula: 22_Os Serviços Públicos
Os serviços públicos promovidos pelo Estado representam o objetivo básico de todos os modelos de políticas públicas, preocupados em promover o bem estar social. Pode ser expresso por outros termos, como "serviços públicos" básicos, essenciais, universais, de utilidade pública, entre outros. De acordo com Queiroz (2009), não existe um conceito único para definir os serviços públicos. Segundo Blancher (2004, p.55 apud Queiroz, 2009, p.218):
É serviço público somente a atividade assim considerada pela Constituição da República ou pela lei, atividade prestada de forma permanente submetida ao regime de direito público, executada concreta e diretamente pelo Estado, ou por aqueles a quem tal incumbência for delegada, visando à satisfação de necessidades ou à criação de utilidades, ambas de interesse coletivo.
Para esta aula serão considerados como referência dois conceitos de serviços públicos, os serviços públicos de interesse geral e os serviços públicos essenciais.
1) Serviços Públicos de Interesse Geral: essa categoria engloba todos os serviços básicos necessários ao bom funcionamento da sociedade, disponíveis a todos os cidadãos, sendo utilizados pela maioria das pessoas, seja no âmbito social, econômico e cultural. Cada sociedade tem sua própria concepção de serviço público de interesse geral, pois essa condição depende também do nível de desenvolvimento do pais. Comumente, é possível observar que, quanto maior o desenvolvimento, maior a disponibilidade à sociedade de serviços de interesse geral.
Principais exemplos desses serviços: abastecimento e saneamento de água e esgoto, energia elétrica, saúde, telecomunicações, serviços postais, serviços funerários, limpeza urbana, transporte em geral, transporte coletivo, infraestrutura portuária, seguridade social, educação, segurança pública, justiça pública, entre outros serviços que demandam a participação direta do porder público.
2) Serviços Públicos Essenciais: é uma subcategoria dos serviços de interesse geral, portanto, também é um serviço que está na base do funcionamento da sociedade, porém, o seu grau de essencialidade é o que o determina. Por isso, para cada sociedade, certos serviços públicos são considerados essenciais, ou não. Por exemplo, em países mais desenvolvidos, os serviços de canalização de gás, que faz parte da infraestrutura urbana e industrial, são considerados essenciais, enquanto no Brasil, esse tipo de serviço não é tão essencial. O abastecimento de água e o esgoto, por exemplo, é muito mais demandado como um serviço público essencial.
Princípios Fundamentais dos Serviços Sociais Essenciais
No Brasil, a Lei nº8.987/1995[1], art.7º, inciso I, determina o direito do usuário de "receber serviço adequado", e o define como sendo o "aquele que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade de tarefas" (art.6º, parágrafo 1º) (QUEIROZ, 2009, p.222).
São considerados os principais princípios fundamentais dos serviços públicos essenciais:
a) Princípio da Universalidade: refere-se a condição de acesso a todos os cidadãos, independente das condições econômicas. Ou seja, é imprescindível que as normas governamentais garantam acesso do serviço público mesmo àqueles que não disponham de renda para contribuir ou arcar com os gastos das tarifas públicas. Além dessa condição, também podem ser considerados a universalidade àqueles que estejam distantes do local de acesso ao serviço público. Portanto, nem a condição de renda e nem de localização devem ser empecilho para o acesso ao serviço público universal.
Para custear a universalidade dos serviços públicos, governos necessitam praticar os subsídios diretos ou cruzados, ou seja, o Estado financia por meio da arrecadação de impostos (entre outras fontes de receitas), a transferência para o atendimento às demandas da sociedade. Outro mecanismo, mais recentemente utilizado, é a obrigatoriedade contratual por parte das empresas concessionárias de serviços públicos, de ofertar de modo universal os serviços explorados na atividade de concessão;
b) Princípio da Legalidade: todo serviço deve ser legalmente estabelecido, ou seja, deve estar definido e regulamentado em lei;
c) Princípio da Isonomia: refere-se à condição de impessoalidade, ou seja, todo serviço público deve ser prestado sem distinção entre as pessoas;
d) Princípio da Continuidade: compreende a necessidade de manutenção dos serviços públicos, sem interrupção, de modo a garantir o atendimento à sociedade no longo prazo;
e)Princípio da Modicidade das Tarefas: quando o serviço público é cobrado individualmente, a tarifa pública deve ser fixada em valor acessível ao usuário;
f) Princípio da Eficácia: que a prestação do serviço público atenda aos padrões de qualidadeestabelecidos em lei;
g) Princípio da Adaptabilidade: que a execução do serviço público possa se adaptar às inovações tecnológicas e às demandas da sociedade conforme o momento exigir, garantindo o atendimento dos serviços públicos em conformidade com as mudanças necessárias.
Independente da forma como os serviços públicos sejam ofertados, seja diretamente pelo Estado, ou por meio de concessões, parcerias público privado, ou ainda pela iniciativa privada, os serviços públicos são um direito dos cidadãos, e estes devem respeitar os princípios de sua prestação, para garantir assim o bom funcionamento da sociedade.
REFERÊNCIAS
Blancher, Luiz Alberto. Curso De Direito Administrativo. 4ªed. Curitiba: Jurua, 2004.
QUEIROZ, Roosevelt Brasil. Formação e Gestão de Políticas Públicas. 2ª. Edição. Curitiba: IBPEX, 2009.
[1] Conhecida como Lei de Concessões que regulamentou o art. 175 da Constituição Federal de 1988 sobre o serviço público adequado.
Aula: 23_Serviços Públicos e o Poder Concedente
O poder concedente se refere a quem tem a titularidade e a obrigatoriedade da prestação do serviço público, ou seja, a esfera pública de poder que concede o serviço, que pode ser da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios. Este então será responsável por "dimensionar, planejar e decidir sobre a política de oferta do serviço em questão e a estratégia para atendê-la (QUEIROZ, 2009, p.223).
A Constituição Federal do Brasil determina à União a competência de prestar os serviços de caráter estrutural, essenciais ao funcionamento da infraestrutura do país, como os serviços de energia elétrica, navegação aérea, aeroespacial, portuária, ferroviária e aquaviária, telecomunicações entre outros.
No quadro 1 estão descritos os serviços públicos responsáveis pelas diferentes esferas públicas.
Então no caso dos Estados cabe, essencialmente, a prestação dos serviços de distribuição de gás, transporte ferroviário, distribuição de água, entre outros (em parceria com municípios, ou quando for de exclusividade da União, os Estados ficam desobrigados dos serviços).
E aos Municípios ficam estabelecidos os serviços de interesse local, como o transporte rodoviário urbano, a coleta de lixo, a distribuição de água, serviços funerários, etc.
Portanto, o poder concedente é um prerrogativa constitucional e pode ser promovida direta, por empresa pública, ou indiretamente (permissão ou concessão) por empresa privada, ou ainda em parceria com o setor público e privado. De qualquer modo, cabe ao poder concedente a responsabilidade maior pelos serviços prestados, sendo a União, o Estado ou os Municípios, o responsável perante a sociedade, pelo oferecimento dos serviços públicos.
Quadro 1 - Serviços Públicos e o Poder Concedente no Brasil
Serviço Público
Poder
Serviço postal e correio aéreo nacional
União
Telecomunicações
União
Radiodifusão sonora, de sons e imagens
União
Energia elétrica
União
Petróleo e derivados
União
Mineração
União
Navegação aérea, aeroespacial e infraestrutura aeroportuária
União
Transporte ferroviário e aquaviário entre portos brasileiros e as fronteiras nacionais ou que transponham os limites de estado ou território
União
Transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros
União
Portos marítimos, fluviais e lacustres (lagos)
União
Rodovias
União, Estado e Município
Transporte rodoviário intermunicipal
Estado
Serviços públicos de interesse local (distribuição domiciliar de água, limpeza urbana, serviços funerários, transporte coletivo urbano, entre outros)
Município
Serviços de gás canalizado
Estado
Irrigação
Estado e Município
Inspeção veicular
Estado e Município
Abastecimento de água e saneamento
Município
Saúde e assistência pública, proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência
União, Estado e Município
Acesso à cultura, à educação e à ciência
União, Estado e Município
Fonte: Queiroz (2009, p.225-226)
Observe que à União são atribuídos muitos serviços públicos de caráter estrutural, e outros serviços que cabem aos três poderes, desde mobilidade urbana até os serviços de assistência aos portadores de deficiência. Ou seja, o Estado Brasileiro detêm inúmeras responsabilidades sociais essenciais à melhoria da qualidade de vida da população.
REFERÊNCIAS
QUEIROZ, Roosevelt Brasil. Formação e Gestão de Políticas Públicas. 2ª. Edição. Curitiba: IBPEX, 2009.
Aula: 24_Formas de Provimento dos Serviços Públicos
Já citamos nas aulas anteriores que o Estado Brasileiro poderá prestar os serviços públicos por meio de diferentes formas, seja de modo direto ou indireto. Quando indireto, o serviço é prestado por meio de concessão ou permissão, sendo esta aplicada sob regime licitatório (art.175 da CF).
Portanto, quando o Estado permite a concessão de um serviço, não significa que foi dado uma "licença" ao setor privado para que a atividade seja explorada de modo indiscriminado, mas sim, que o Estado está transferindo a responsabilidade de execução do serviço, o que exige o cumprimento de rígidas obrigações por parte da empresa concessionário (ou permissionária). Ou seja, caberá ao Estado o papel de fiscalizador da empresa e dos serviços prestados, podendo até mesmo, conforme caracterizado o descumprimento contratual de condições técnicas, operacionais e financeiras, ter a concessão da empresa suspensa pelo Estado (CUÉLLAR, 2001, apud QUEIROZ, 2009).
Agora vamos analisar a figura 1, no qual são descritas as formas de provimento dos serviços públicos.
A forma de provimento dos serviços públicos pode ser então direta ou indireta, ou seja, por delegação. A delegação, se por meio de permissão é realizada por ato administrativo e tem caráter "unilateral", "discricionário" e "precário", ou seja, o poder concedente transfere a execução de um serviço público a outra empresa que o exerce em seu nome próprio, por sua conta e risco, mediante pagamento de tarifa pelo usuário, podendo ainda a permissão ser revista a qualquer momento pelo Estado.
Já a concessão, esta é realizada por contrato administrativo e por isso, se dá num período de tempo maior e se constitui a mais importante das formas de delegação (decorre de acordo de vontades entre as partes). De acordo com a Lei 8.987/1995, art.2º, inciso II, a concessão de serviço público é definida como:
...delegação de sua prestação, feita pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresa que demonstre capacidade para seu desempenho , por sua conta e risco e por prazo determinado (QUEIROZ, 2009, p.228).
Esta então é a concessão comum, no qual não há contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado. Quando existe a contraprestação pelo Estado, então trata-se da concessão público privada. Esta, se envolver, adicionalmente à tarifa cobrada ao usuário, uma contraprestação pecuniária pública ao parceiro privado, será a concessão patrocinada.
Agora, se for a modalidade de concessão administrativa, o contrato de prestação de serviço terá o poder público como seu usuário direto, ou indireto (mesmo nos casos que sejam executados obras, fornecimento ou instalações de bens).
No Brasil, a partir da década de 90, com a Lei de Concessões e mais a Lei das Parcerias Público Privada (PPP) em 2005, ampliou-se aos governos as possibilidades de provimento dos serviços públicos, dividindo com o setor privado os esforços de investimento e de execução para a oferta desses serviços. Essa reestruturação dos governos acompanhou as mudanças decorrentes da crise do Estado moderno, e no Brasil, tornou-se uma estratégia comum da administração pública central, estadual e municipal, que concedeu ao setor privado a exploração de muitos serviços que antes eram oferecidos por empresas públicas, como a distribuição de energia, telecomunicações, rodovias, ferrovias, portos, aviação, entre outros serviços.
Desse processo emerge uma discussão ainda atual que é sobre a eficiência dos resultados do modelo de concessões sobre os custose a qualidade dos serviços públicos à sociedade. Nesse debate, muitos analistas classificam as concessões como uma "privatização disfarçada", no qual o setor privado acaba obtendo grandes vantagens econômicas sobre um serviço que é de responsabilidade do Estado. Por outro lado, outros entendem que trata-se de um processo de modernização do Estado, no qual as demandas sociais são crescentes e a necessidade de aumentar a concorrência e a participação do setor privado na economia, é relevante para uma sociedade moderna e globalizada.
REFERÊNCIAS
CUÉLLAR, Leila. As Agências Reguladoras e seu Poder Normativo. São Paulo: Dialética, 2001.
QUEIROZ, Roosevelt Brasil. Formação e Gestão de Políticas Públicas. 2ª. Edição. Curitiba: IBPEX, 2009.
Aula: 25_Políticas Públicas de Combate à Desigualdade Social
Com o processo de globalização do mundo capitalista, acompanhado pela dissolução dos países socialistas na década de 90, observou-se um processo de abertura econômica que redesenhou a estrutura de vários países que antes estavam no estágio de subdesenvolvimento, como o caso do Brasil, e assim, inseriram-se outras economias no cenário internacional, como a China, a Índia e a África do Sul.
No contexto macroeconômico, a globalização gerou avanços em termos tecnológicos, empresariais, científicos, materiais, educacionais e sociais; porém, nem todos os países participaram desses avanços e o mundo continua desigual, com países ricos e desenvolvidos, enquanto outros convivem com baixa qualidade de vida (YUNUS, 2008). Tradicionalmente, a desigualdade social está associada ao problema da concentração de renda na sociedade, refletindo as diferentes condições de vida entre as pessoas. O Índice Gini[1] é o indicador comumente utilizado para representar o problema da desigualdade social, pois este mede a concentração de renda de um país.
Porém, a desigualdade social não é um problema simples, mas sim, um fenômeno social complexo e com diferentes efeitos sobre as condições de vida de uma sociedade, por isso, não é apenas analisando a concentração de renda que esse problema será entendido, mas também pelas condições de pobreza.[2]
De acordo com Scalon (2011, p.49), “...a pobreza deve ser compreendida como a privação de capacidades básicas que conduz à vulnerabilidade, exclusão, carência de poder, de participação e voz, exposição ao medo e à violência; enfim, à exclusão de direitos básicos e de bem-estar”.
A busca pela redução das desigualdades sociais é reconhecida por ações baseadas na construção de “Modelos de Desenvolvimento” e de “Políticas Públicas Sociais” que objetivam a melhoria das condições de equidade dos recursos na sociedade (SCALON, 2011).
No Brasil, o problema da desigualdade social se reproduz ao longo da história e por isso, o debate sobre quais e como as políticas públicas sociais devem ser implementadas para serem eficientes, é sempre recorrente. Mais recentemente, especialmente após a Constituição de 1988 e todo o processo de redemocratização e abertura econômica iniciada a partir de meados da década de 80, mudanças importantes aconteceram no contexto sócio econômico do Brasil, o que gerou uma redução nos índices de concentração de renda e a elevação do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)[3].
Contudo, esses indicadores ainda apontam que o problema da desigualdade social existe e, em patamares que demandam ações permanentes do Estado, aliadas aos diferentes setores da sociedade como os setores empresariais privados, as organizações civis, os organismos internacionais e a própria população.
De acordo com o Banco Mundial (2013), o Brasil é um país com alta concentração de renda, pois apresenta um coeficiente de 0,547 (comparativamente com o Uruguai e o Peru, por exemplo, estes países apresentam índices de 0,419 e 0,447 respectivamente, ou seja, menos concentração de renda que o Brasil). Países com melhor distribuição de renda apresentam índices menores que 0,3 (como Ucrânia com 0,246; Noruega com 0,259; e Suécia com 0,273).
OBS: Lembrem-se que, na aula 06 dessa disciplina, estudamos os tipos de políticas públicas e vimos que, sobre a função do Estado, as políticas públicas podem ser do tipo “Distributiva”, ou seja, é quando o Estado implementa políticas públicas que objetivam a melhoria da distribuição da riqueza na sociedade, transferindo parte dos recursos arrecadados com os impostos para políticas sociais que atendam as demandas das camadas mais pobres da população. Também na disciplina de Economia e Finanças Públicas, do 3º semestre do curso, na aula sobre Políticas Econômicas, destacamos os objetivos de “Distribuição de Renda” das políticas de governo, que buscam encontrar meios de gerar crescimento econômico e o mesmo tempo, melhorar as condições de vida da sociedade.
Vamos agora relacionar as mais recentes políticas públicas brasileiras, de base social, que objetivam melhorar a distribuição de renda no país e com isso, contribuir para a redução da desigualdade social.
Destaca-se aqui a criação do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) em 2004, que tornou se o principal meio de organização das políticas públicas sociais de combate à pobreza, compolíticas de inclusão social, transferência de renda condicionada, assistência social e segurança alimentar e nutricional.
O MDS coordena o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) e o Plano Brasil Sem Miséria. É responsável pela gestão do Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) e do Fundo Nacional de Combate e Erradicação da Pobreza (FNCP). Além disso apoia o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) e é responsável pelo Programa Bolsa Família (PBF). Essas políticas são desenvolvidas em parceria com Estados e municípios, além de organizações da sociedade civil.
Sobre o PBF, que é considerado um importante programa social de combate à pobreza e desigualdade social, este foi criado em 2003 e atua com a transferência de um valor às famílias brasileiras de baixa renda, como forma de aumentar os recursos mensais dessas pessoas com menor poder aquisitivo.[4]
Após se cadastrar no programa, o saque do valor pela família é feito por meio de cartão bancário da Caixa Econômica Federal (CEF) e o mesmo é calculado com base no tamanho da família, na idade das pessoas e na renda familiar (soma das rendas de cada integrante da família), portanto, o valor da bolsa varia.
Também estão incluídos no programa outros grupos populacionais como:
a) Grupos de origem étnica: famílias quilombolas, famílias indígenas, famílias ciganas, famílias pertencentes às comunidades ciganas;
b) Grupos relacionados ao meio ambiente: famílias extrativistas, famílias de pescadores artesanais, famílias ribeirinhas;
c) Grupos relacionados ao meio rural: famílias de agricultores familiares, famílias assentadas de reforma agrária, famílias beneficiárias do Programa Nacional de Crédito Fundiário, famílias acampadas;
d) Grupos em situações conjunturais: famílias atingidas por empreendimentos de infraestrutura, famílias com pessoas presas no sistema carcerário, famílias em situação de rua, famílias em situação de trabalho infantil.
De acordo com o MDS, em setembro de 2015, existiam 26.850.486 famílias inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais (80.034.574 pessoas cadastradas), sendo distribuídas em: 12.362.376 com renda per capita familiar de até R$77,00; 4.219.431 com renda per capita familiar entre R$77,00 e R$ 154,00; 6.144.320 com renda per capita familiar entre R$ 154,00 e meio salário mínimo; 4.124.359 com renda per capita acima de meio salário mínimo.
No mês de novembro de 2015, segundo o MDS (2015), o PBF gerou benefícios à 13.782.217 famílias, com valor médio de R$ 163,06 (Valor total dos benefícios no mês de R$ 2.247.275.686,00).
Com o que foi exposto nessa aula, podemos entender que o conjunto das políticas públicas sociais é de extrema relevância para a condução de um processo de redução das desigualdades sociais, contudo, as políticas em si, não se bastam, pois, as relações de poder e de oportunidades também sãodesiguais, e, portanto, impedem muitas vezes, que a distribuição de renda e melhoria da qualidade de vida atinja plenamente todas as camadas sociais.
O problema da desigualdade esbarra então, não somente em limitações de recursos financeiros e técnicos, mas também defrontam com barreiras políticas que centralizam o poder e os interesses dos grupos mais privilegiados na sociedade.
Destacamos também que mesmo os países mais ricos enfrentam inúmeros problemas de ordem social, associados a outras questões como a imigração (imigrantes comuns e refugiados), atentados terroristas, aquecimento global e impactos ambientais, violência e discriminação, entre outros tipos de problemas que preocupam as sociedades modernas. Portanto, defende que a questão das desigualdades sociais e os problemas decorrentes do mundo moderno capitalista, devem ser tratados como questões de Estado e de nação, além do debate com outros países e acordos com as nações mais desenvolvidas, pois a sustentabilidade das gerações futuras dependem da integração e do compartilhamento dos problemas que atingem todas as nações, especialmente no que se refere à pobreza e à desigualdade social.
Referências
MDS. Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Portal Brasil. Disponível em: http://www.mds.gov.br/. Acesso em outubro de 2015.
SCALON, Celi. Desigualdade, pobreza e políticas públicas: notas para um debate. Contemporânea – Revista de Sociologia da UFSCar. São Carlos, Departamento e Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFSCar, 2011, n. 1, p. 49-68.
YUNES, Muhammad. Um mundo sem pobreza: a empresa social e o futuro do capitalismo. São Paulo: Ática, 2008.
[1] O Índice Gini foi criado pelo matemático italiano Corrado Gini, em 1912. Esse coeficiente varia entre 0 e 1, sendo que quanto mais próximo de zero, menor será a desigualdade de renda no país (melhor distribuição de renda/maior equidade). Portanto, quanto mais próximo do um, maior a concentração de renda. Também pode ser expresso em porcentagem, ou graficamente (pela Curva de Lorenz).
[2] Destacamos aqui que o tema da Desigualdade Social é muito amplo, sendo estudado sob diversas perspectivas, como é o caso da Sociologia, que em seus estudos destaca as condições de formação histórica da pobreza e de sua permanência na sociedade, mesmo diante de todos os avanços tecnológicos, institucionais e políticos das últimas décadas (Direitos Humanos, Organismos Internacionais, Responsabilidade Social, Governança, Consciência Ambiental, entre outros temas). Para a Sociologia, a desigualdade social não é um fenômeno natural, mas sim, uma “construção social” resultante das escolhas políticas que cada sociedade fez ao longo de sua história (SCALON, 2011). Neste curso, em função das limitações do plano, o tema será exclusivamente tratado sob a perspectiva dos instrumentos de políticas públicas.
[3] De acordo com o Relatório do Desenvolvimento Humano de 2014, lançado pelo PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), o IDH do Brasil apresentou melhora em 2013, chegando a 0,744 na posição 79º no ranking de 187 países (subiu uma posição em relação a 2012). Na aula 20, sobre Índices, conhecemos a estrutura do IDH que é classificado como índice-síntese, pois correlaciona diferentes indicadores para determinar o seu valor, no caso, lembrando, o IDH expressa a relação entre educação, saúde e renda de uma população.
[4] Além da transferência de valor, o programa também atua com o acompanhamento na saúde e educação dos adolescentes e mulheres grávidas vinculadas ao programa (MDS, 2015).
Aula: 26_Políticas Públicas de Inclusão Social
Dentro do atual contexto econômico brasileiro, o debate sobre o Estado da “Inclusão Social” diz respeito aos governos que reconhecem o seu papel diante das necessidades sociais, regulamentando, fiscalizando e atuando em parceria com as instituições privadas de proteção social, atendendo assim as exigências das políticas públicas sociais que se tornaram as bases da nossa Constituição Federal (CF, 1988), conhecida como “Constituição Cidadã”. Nela, são descritos os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (Dos Princípios Fundamentais, Art.3º):
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Como estudamos na aula anterior, o combate às “desigualdades sociais” é um relevante objetivo das políticas públicas sociais, mas que também converge com o tema da “inclusão social”, pois as diferenças de renda, as diferenças sociais e a exclusão social integram os problemas de interesse de uma sociedade que busca relações sócio econômicas mais equilibradas, democráticas e justas. Portanto, o Estado deve então assumir a responsabilidade de realizar a equidade social e também a inclusão social.
Essa inclusão se refere à aplicação de políticas públicas que desenvolvam programas e parcerias que prezem pela ética, pela cidadania, pela democracia participativa e pelo desenvolvimento de uma estrutura que não se restrinja a certos grupos de interesse, mas que atinja a maioria da sociedade que se encontra em condições de precariedade e vulnerabilidade (SILVA, 2011). Ou seja, que atenda também as demandas das minorias.
De acordo com Minhoto (2009, p.22), as “minorias” podem ser conceituadas como:
...um segmento social, cultural ou econômico vulnerável, incapaz de gerir e articular sua própria proteção e a proteção de seus interesses, objeto de pré-conceituações e pré-qualificações de cunho moral em decorrência de seu distanciamento do padrão social e cultural hegemônico, vitimados de algum modo e em graus variados de opressão social e, por tudo isso, necessitados e demandantes de especial proteção por parte do Estado.
Contudo, apesar dos inúmeros avanços em relação às políticas sociais, observamos que muitos governos ainda se mostram pouco efetivos nesse campo de atuação, apresentando baixa eficácia e ineficiências (SCHMIDT, 2007). De acordo com Silva (2011, p.162), para que as políticas públicas funcionem adequadamente como instrumento de inclusão social é necessário:
...a real implementação dos mecanismos que aumentem a sua efetividade, eficácia e eficiência, tais como: a formação de capital social; uma efetiva avaliação das políticas públicas, com consequente utilização dos resultados; implementação de controle sobre os grupos de interesse (lobby); e observância com vistas a exercer controle sobre as interferências decorrentes da globalização.
Além disso, destaca-se ainda a importância de se fortalecer o processo de desenvolvimento educacional e dos vínculos sociais e democráticos da sociedade civil, de modo a capacitá-la para trabalhar efetivamente pelo interesse coletivo.
Como exemplo, podemos citar o caso de inclusão social de pessoas com necessidades especiais. Essa preocupação começou a se difundir a partir de 1994, com a Declaração de Salamanca, respaldada pela Convenção dos Direitos da Criança (1989)[1] e pela Declaração sobre Educação para Todos (1990)[2]. Com a institucionalização desse processo social, podemos destacar alguns projetos que se inseriram nas políticas públicas brasileiras:
a) A inclusão das pessoas com necessidades educacionais especiais nas escolas de ensino regular;
b) A inclusão de negros, índios e estudantes egressos da rede pública de ensino, por meio de cotas nas faculdades e universidades públicas;
Além disso, podemos citar outros programas de inclusão, como:
a) A inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho nas empresas com mais de cem funcionários, proporcionalmente;
b) Estabelecimento de padrões de acessibilidade em diversos espaços públicos e privados, como ruas e avenidas, escolas, empresas e estabelecimentos públicos, além de calçadas e veículos de transporte coletivo;
c) Regulamentação da carteira de habilitação especial, que garanteincentivos fiscais e isenção de impostos na compra de veículos automotores para pessoas com necessidades especiais.
Ministérios, Secretarias e Projetos de Inclusão Social
O tema proposto nessa aula é ainda muito discutido nos estudos de políticas públicas, especialmente no caso dos países pobres, ou ainda em desenvolvimento, como o Brasil. A proposta agora é então relacionar as principais ações do governo brasileiro que visam fortalecer as políticas de inclusão social, como forma de conhecermos melhor como na prática, essas políticas são desenvolvidas.
Na aula anterior apresentamos alguns programas do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, o MDS, que ao atuar com políticas de transferência de renda, como o programa Bolsa Família, também acaba atendendo minorias sociais, como indígenas, quilombolas, pequenos agricultores, entre outros.
Atualmente, o governo federal brasileiro possui 39 ministérios (sendo 10 secretarias e 05 órgãos com poder de ministério). Muitos entre eles atuam em áreas de interesse público e social. Destacamos aqui: o Ministério da Cultura, o Ministério da Educação, o Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, o Ministério da Previdência Social, o Ministério da Saúde, o Ministério das Cidades, o Ministério do Trabalho e Emprego, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e a Secretaria de Políticas para as Mulheres.
O MDS já foi citado, e para essa aula vamos conhecer alguns outros ministérios e as 03 secretarias citadas. Nas aulas seguintes continuaremos com essa abordagem.
1) Ministério da Cultura (MinC): é um órgão da administração pública federal direta que tem como área de competência a política nacional de cultura e a proteção do patrimônio histórico e cultural. Por meio das metas do Plano Nacional da Cultura, o MinC trabalha a concepção de cultura articulada em diferentes dimensões, sendo a dimensão cidadã referente ao aspecto em que a cultura é entendida como um direito básico do cidadão, garantindo aos brasileiros a participação na vida cultural, criando e tendo mais acesso a livros, espetáculos de dança, teatro e circo, exposições de artes visuais, filmes nacionais, apresentações musicais, expressões da cultura popular, acervo de museus, entre outros;
2) Ministério do Trabalho e Emprego (MTE): é um órgão da administração federal direta, que tem como principais competências as políticas para geração de emprego e renda, além de apoio ao trabalhador (como salário mínimo, seguro-desemprego, o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e o Programa de Proteção ao Emprego (PPE)). Além disso, cabe ao MTE a própria fiscalização do trabalho, combatendo o trabalho escravo, o trabalho infantil, a informalidade e garantindo a segurança e saúde do trabalho;
3) Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República: criada em abril de 1997, essa secretaria está vinculada ao poder executivo do país, por isso assumiu status de ministério. Tem como principais áreas de atuação a Crianças e os Adolescentes, Pessoa com Deficiência, Pessoa Idosa, LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais), Adoção e Sequestro Internacional, Mortos e Desaparecidos Políticos, Combate às Violações de Direitos Humanos, Combate ao Trabalho Escravo, Prevenção e Combate à Tortura;
4) Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR): foi criada em 2003 pela Lei nº 10.678, com a principal missão de formular, coordenar e avaliar políticas públicas de promoção da igualdade e da proteção dos direitos de indivíduos e grupos étnicos, com ênfase na população negra, afetados por discriminação racial e outras formas de intolerância. A SEPPIR utiliza como referência política o Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010), que orientou a elaboração do Plano Plurianual (PPA 2012-2015), resultando na criação do programa chamado "Enfrentamento ao Racismo e Promoção da Igualdade Racial”. Além disso, essa secretaria trabalha na articulação, promoção e acompanhamento da execução dos programas de cooperação com organismos nacionais e internacionais, públicos e privados, voltados à implementação da promoção da igualdade racial;
5) Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM): secretaria vinculada ao Ministério da Cidadania. Tem como principal finalidade estabelecer políticas públicas de interesse das mulheres, de modo a promover melhores condições de vida a esse gênero. Como exemplos de ações dessa secretaria, temos a chamada “Lei Maria da Penha” (Lei 11.340/2006), o Ligue 180 (Central de atendimento à mulher) e o Programa “Mulher, Viver sem Violência”, lançado em março de 2013, com o objetivo de integrar e ampliar os serviços públicos existentes voltados às mulheres em situação de violência, mediante a articulação dos atendimentos especializados no âmbito da saúde, da justiça, da segurança pública, da rede sócio assistencial e da promoção da autonomia financeira (BRASIL, 2015).
Referências
BRASIL. Portal Brasil. Disponível em: < http://www.brasil.gov.br/>. Acesso em: 25/08/2015.
BRASIL. Constituição Federal. 1988. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 15/09/2015.
MINHOTO, Antônio. Org. Constituição, minorias e inclusão social. São Paulo: Rideel, 2009.
SCHMIDT, João Pedro. Para entender as políticas públicas: aspectos conceituais e metodológicos. In: REIS,Jorge Renato; LEAL, Rogério Gesta (Org.). Direitos Sociais & Políticas Públicas. Desafios contemporâneos.
Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2008, t.8.
SILVA, Jacqueline Maria Cavalcante da. Políticas Públicas como Instrumento de Inclusão Social. Revista Faculdade de Direito UFG. V.35, n.01, p. 160-185. Jan./jun. 2011.
UNESCO. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. 2015. Disponível em: http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/. Acesso em: 10/09/2015.
[1] Adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), em 20 de novembro de 1989. Com base nessa Convenção, o Brasil aprovou o Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990, que regulamentou o artigo 227 da Constituição Federal (1988). Esse artigo trata do dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público em assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária das crianças e adolescentes (UNICEF - Fundo das Nações Unidas para a Infância,2015).
[2] Organizado pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), em Jomtien, Tailândia, de 5 a 9 de março de 1990.
Aula: 27_Políticas Públicas Educacionais
A educação é reconhecida como um dos maiores problemas de exclusão social no Brasil. A desigualdade e a alta taxa de analfabetismo no país são problemas históricos, e nas últimas décadas têm sido o foco das atenções dos governos brasileiros. Observamos que nos últimos anos as políticas públicas educacionais alcançaram bons resultados agregados quanto ao acesso às escolas, resultado de um processo de democratização do ensino, aumentando o número de estudantes no ensino superior, reduzindo a evasão escolar e aumentando as taxas de alfabetização. Contudo, o país enfrenta grandes desafios em termos de políticas educacionais, pois os níveis de qualidade do ensino ainda são considerados baixos, mesmo com a existência de centros de excelência em pesquisa e desenvolvimento, que garantiu o aumento do número de mestres e doutores.
No Brasil, a dificuldade de escolarização e do sucesso acadêmico é permeada por inúmeras variáveis, que incluem desde a formação do professor até as condições econômicas do país. Muitas crianças brasileiras não têm se beneficiado do sistema escolar, de modo que os motivos deste não aproveitamento podem ser vistos por meio da evasão escolar nas camadas menos favorecidas de nossa sociedade (GUEBERT,2012). Diante desse cenário desigual, vamos agora entender melhor as reformas no sistema educacional e depois destacar a legislação que fundamenta a educação brasileira.
A Reforma Educacional
Os anos de 1946 a 1964 foram de forte ascensão dos movimentos populares, que, ao lado do questionamento global da sociedade brasileira, propunham a realização de amplas reformas em todos os campos – a chamada reforma de base. Quando se trata da Reforma Educacional, se está retomando a um assunto que já é antigo na esfera política, o que se espera é um sistema que atenda as reais necessidades da nação, para que a desigualdade social seja atenuada. De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO, 2002):
Os problemas educacionais não têm origem exclusivamente na educação, mas busca-se resolvê-los apenas com reformas educacionais. O tema do abandono precoce da escola é um exemplo paradigmático desta situação um alto percentual de fracasso escolar tem sua origem direta nas carências econômicas, sociais e culturais que sofrem determinados grupos da população.
As famílias, o sistema educacional, as escolas, os professores e os próprios alunos, não têm nada a fazer diante de uma realidade sociocultural desvantajosa. O abandono precoce da escola deve ser visto a partir de uma perspectiva multidimensional e interativa, em que as condições sociais, a atitude da família, a organização do sistema educacional, o funcionamento das escolas, a prática docente na sala de aula e a disposição do aluno para a aprendizagem ocupam um papel relevante. Cada um deles não é um fator isolado, mas está em estreita relação com os demais. As Políticas Públicas visam utilizar-se de paliativos geralmente sociais cortando verbas das Políticas Educacionais (DEMO, 2011).
A Legislação e a Educação no Brasil
A Lei de Diretrizes e Base (LDB), instituída pela Lei 9394/96, em seu artigo 43 estabelece as seguintes finalidades para a educação superior:
a) Estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do pensamento reflexivo;
b) Formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua;
c) Incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica, visando ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia e da criação e difusão da cultura, e, desse mundo, desenvolver o entendimento do homem e do meio em que vive;
d) Promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicações ou de outras formas de comunicação;
e) Suscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento cultural e profissional e possibilitar a correspondente concretização, integrando os conhecimentos que vão sendo adquiridos numa estrutura intelectual sistematizadora do conhecimento de cada geração;
f) Estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em particular os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade;
g) Promover a extensão, aberta à participação da população, visando à difusão das conquistas e benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na instituição.
É preciso reconhecer que o país avançou significativamente em suas políticas educacionais, ainda assim, os investimentos precisam ser melhor aplicados. Todos os segmentos da sociedade precisam se envolver com o desafio de um Plano Nacional de Educação efetivo e coerente com os objetivos de crescimento e desenvolvimento do país.
Estado e a Formação de Política Educacional
Para Torres (2003) a definição de Políticas Educacionais precisa vir de uma ação do Estado, descrita como:
Uma sociologia política da educação deriva das teorias do Estado, e critica as análises convencionais ou dominantes porque a estas faltam uma abordagem holística ou abrangente dos determinantes da formulação de políticas. Em um nível mais alto de abstração, por exemplo, falta abordagens convencionais da formulação de políticas a capacidade de relacionar o que acontece nas escolas e nos locais de educação não formal o que ocorre na sociedade relativamente à dinâmica do processo de acumulação do capital e de legitimação política.
As definições e acepções do que se entende por igualdade levam a formular políticas educacionais que têm, em alguns casos, efeitos contrários. Examinando a evolução histórica das políticas educacionais, as políticas públicas devem reivindicar a equidade proporcionando igualdade de oportunidades. No caso do Brasil, o Ministério da Educação (MEC) tem atuado com algumas políticas de integração do sistema educacional, visando a padronização e a uniformização do sistema, especialmente em relação à avaliação e ao ingresso no ensino superior. Vamos conhecer alguns desses programas:
1) Fies (Fundo de Financiamento Estudantil): criado pela Lei nº 10.260, de 12 de julho de 2001, é um programa que financia cursos superiores não gratuitos com avaliação positiva no Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes)[1]. Podem se inscrever no processo seletivo do Fies estudante que não tenham concluído curso superior, tenham renda familiar mensal bruta, por pessoa, de até dois e meio salários mínimos, e tenham participado de alguma das edições do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) a partir de 2010 e obtido nota mínima de 450 pontos na média das provas e nota na redação que não seja zero;
2) Prouni: criado pela Lei nº 11.096, de 13 de janeiro de 2005, esse é um programa que que concede bolsas de estudo integrais e parciais de 50% em instituições privadas de educação superior, em cursos de graduação e sequenciais de formação específica, a estudantes brasileiros sem diploma de nível superior. Podem participar do Prouni estudantes que não possuam diploma de curso superior e que atendam, a pelo menos, um dos seguintes requisitos:
- ter cursado o ensino médio completo em escola da rede pública;
- ter cursado o ensino médio completo em escola da rede privada, na condição de bolsista integral da própria escola;
- ter cursado o ensino médio parcialmente em escola da rede pública e parcialmente em escola da rede privada, na condição de bolsista integral da própria escola privada;
- ser pessoa com deficiência;
- ser professor da rede pública de ensino, no efetivo exercício do magistério da educação básica e integrando o quadro de pessoal permanente da instituição pública e concorrer a bolsas exclusivamente nos cursos de licenciatura. Nesses casos não há requisitos de renda.
Para concorrer às bolsas integrais o candidato deve ter renda familiar bruta mensal de até um salário mínimo e meio por pessoa. Para as bolsas parciais de 50%, a renda familiar bruta mensal deve ser de até três salários mínimos por pessoa.
Encerramos essa aula deixando uma questão para reflexão: Como o Brasil pode desenvolver seu sistema educacional? O que é necessário para que as políticas educacionais existentes se tornem mais eficientes?
Esperamos então que os gestores públicos e os profissionais da educação trabalhem pela sociedade, e não por interesses políticos.
Referências
BRASIL. Portal Brasil. Ministério da Educação. Disponível em: < http://www. brasil.gov.br/>. Acesso em: 26/08/2015.
DEMO, Pedro. Política social, educação e cidadania. 13ª ed. São Paulo: Papirus, 2011.
GUEBERT, Mírian Celia Castellain. Inclusão: uma realidade em discussão. Curitiba: InterSaberes, 2012.
TORRES, Carlos Alberto. Teoria Crítica e Sociológica. São Paulo: Cortez, Instituto Paulo Freire, 2003.
UNESCO. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. 2002. Disponível em: http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/. Acesso em: 03/09/2015.
[1] Os financiamentos concedidos com recursos do Fies a partir do segundo semestre de 2015 têm taxa de juros de 6,5% ao ano. Durante o curso, o estudante deve pagar,a cada três meses, o valor máximo de até R$ 150, referente ao pagamento de juros incidentes sobre o financiamento. Após a conclusão do curso, o estudante terá 18 meses de carência para começar a pagar o financiamento. Nesse período, deve continuar pagando, a cada três meses, o valor de até R$ 150, referente aos juros que incidem sobre o financiamento. Encerrado o período de carência, o financiamento pode ser pago pelo estudante em até três vezes o período financiado do curso (BRASIL, 2015).
Aula: 28_Políticas Públicas de Saúde
A Constituição Federal de 1988 assegura o direito à saúde como sendo direito fundamental e social do ser humano, resguardado através do artigo 6º da carta magna. Trata-se de uma proteção ao direito à saúde, que deverá sempre ser resguardado como tutela do Estado Social e Democrático Brasileiro. Além do artigo 6º, o direito à saúde está assegurado no artigo 196 da Constituição Federal de 1988, instituído como direito de todos e dever do Estado:
A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
O mesmo artigo ainda assegura a implantação de políticas públicas e econômicas como forma de efetivação do direito à saúde, com o objetivo de diminuir o número de doenças de grave risco, o acesso igualitário e universal à saúde e a promoção de políticas preventivas e de recuperação ao direito à saúde.
A garantia do direito à saúde se concretiza a partir de políticas sociais e econômicas executadas pelo Estado, visando a diminuição do risco de doenças através do acesso universal à saúde através de serviços para sua promoção, proteção e recuperação. De acordo com Silva (2001, p.808), a saúde é um direito inerente a todo cidadão, tendo o Estado o dever de garantir e efetivar tal direito através da implantação de políticas públicas, sociais e econômicas:
... a saúde é concebida como direito de todos e dever do Estado, que a deve garantir mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doença e de outros agravos. O direito à saúde rege-se pelos princípios da universalidade e da igualdade de acesso às ações e serviços que a promovem, protegem e recuperam.
O direito à saúde está intimamente ligado ao Princípio Fundamental da Dignidade da Pessoa Humana. Tal princípio, tornou-se um verdadeiro alicerce para a existência de outros direitos, fez com que sem ele o ser humano jamais atingisse a plenitude e conseguisse viver em situação de bem estar perante a sociedade. A preocupação com a devida efetivação do direito à saúde, e consequentemente, à vida, de forma digna, estão tutelados pela própria Constituição Federal de 1988 e leis específicas sobre o assunto.
O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE
O Sistema Único de Saúde, o SUS, é uma forma de política pública implantada pela Lei nº 8.080/1990, que traz um rol de princípios, objetivos e garantias inerentes à efetivação da saúde, garantindo assim a aplicação do direito fundamental de proteção à saúde.
A lei nº 8.080/1990, em seu artigo 2º elenca os princípios do programa de proteção à saúde, instituídos no artigo 196da Constituição Federal de 1988, que são:
Art. 2º: A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.
§ 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.
§ 2º O dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade.
As políticas públicas de saúde devem atender aos princípios legais que demandam o funcionamento do Estado de Direito. São eles:
a) Princípio da Universalidade: diz respeito aos titulares do direito à saúde. Tal princípio estabelece que todos os cidadãos possuem acesso gratuito aos serviços de saúde, implantados por políticas públicas. Não há distinção de classe social ou restrição ao uso de práticas de serviços de saúde particulares;
b) Princípio da Igualdade: garante aos usuários as mesmas oportunidades e qualidade de acesso aos serviços de saúde. Porém, tal princípio não exclui a prática de critérios para o acesso dos serviços, como prioridade, doenças de greve risco, etc;
c) Princípio da Integralidade: diz respeito ao alcance dos serviços públicos de saúde. Tal princípio assegura a abrangência do atendimento, em todos os níveis de complexidade. Além da atuação do Poder Público em novas pesquisas, exames e tratamentos médicos.
De acordo com o SUS, este cumpre seu objetivo de prestar atendimento de saúde pública à sociedade, a partir da verba pública nele aplicada. De acordo com os dados do Ministério da Saúde, entre o período de 2011 a 2014, o número de atendimentos realizados pelo SUS foi o seguinte:
(i) Unidades Básicas de Saúde: Equipes: 43.081/Cobertura populacional: 127,4 milhões de habitantes (66,8%);
(ii) Saúde da Família: Equipes: 34.216/Cobertura populacional: 108,18 milhões de habitantes (55,8%)/Municípios atendidos: 5.319 (95,5%);
(iii) Centros de Atenção Psicossocial: Unidades: 2.020 (abrangendo as seis categorias de CAPS)/Cobertura populacional: 1,59 milhões de habitantes (0,82%)/Municípios atendidos: 1.357 (24,4%);
(iv) Farmácia Popular: Unidades: 546/Municípios atendidos: 432 (7,76%);
(v) Hospitais credenciados: Especializados: 1.090/Gerais: 5.195;
(vi) Profissionais com vínculo: Médicos: 215.640/ Cirurgiões dentistas: 165.323/Enfermeiros: 261.064;
(vii) Leitos: Cirúrgicos: 76.461/ Clínicos: 107.325/ Obstétricos: 43.632/ Pediátricos: 46.157;
(viii) Equipamentos: Diagnóstico por imagem: 41.802/ Odontologia: 153.353/ Manutenção da vida (Equipamentos de UTI): 337.488;
(ix) Número de beneficiados: 201 milhões de pessoas;
(x) Pessoas que dependem exclusivamente do SUS para ter acesso aos serviços de saúde: 152 milhões de pessoas (80% do total);
(xi) Procedimentos ambulatoriais anuais: 2,8 bilhões;
(xii) Internações anuais: 11 milhões;
(xiii) Número de usuários com acesso ao SAMU - Serviço de Atendimento Móvel de Urgência: 130 milhões de pessoas.
Assim, podemos reconhecer que grande parte da população brasileira depende do SUS para sua sobrevivência, com a necessidade de bom atendimento e condições de tratamentos satisfatórios. Observa-se também que o atual programa de saúde se encontra saturado, não conseguindo comportar tal demanda exigida. É necessária uma grande reforma no sistema de saúde brasileiro em benefício da população, que necessita do Estado para a sua sobrevivência e efetivação da dignidade da pessoa humana.
Principais Programas do Ministério da Saúde (MS)
Para entender melhor as ações de políticas públicas direcionadas à saúde, vamos conhecer alguns programas desenvolvidos pelo governo federal por meio do MS:
a) Saúde da Família: O objetivo é atuar na manutenção da saúde e na prevenção de doenças, alterando, assim, o modelo de saúde centrado em hospitais, tendo sido criado em 1993;
b) Mais Médicos: este Programa faz parte de um amplo pacto de melhorias no atendimento aos usuários do SUS, convocando profissionais da saúde para atuar na Atenção Básica de municípios com maior vulnerabilidade social;
c) Provab: O programa leva mais médicos para mais perto da população. Amplia a assistência principalmente aos usuários do SUS que ainda têm dificuldades para acessar serviços e profissionais de saúde;
d) Academia da Saúde: Lançado em abril de 2011, o Programa Academia da Saúde estimula a criação de espaços públicos adequados para a prática de atividade física e de lazer. O objetivo é contribuir para a promoção da saúde da população;
e) Melhor em Casa: Lançado em 8 de novembro de 2011, o programa amplia o atendimento domiciliar no SUS. O objetivo é oferecer aos pacientes da rede pública de saúde, um serviço humanizadoe acolhedor;
f) Farmácia Popular: Programa criado para ampliar o acesso da população a medicamentos essenciais, vendidos a preços mais baixos que os praticados no mercado. São medicamentos contra diabetes e hipertensão, entre outra doenças;
g) Cartão Nacional de Saúde: instrumento que possibilita a vinculação dos procedimentos executados no âmbito do SUS ao usuário, ao profissional que os realizou e também à unidade de saúde onde foram realizados;
h) Pronto Atendimento: chamada de “UPA”, são estruturas de complexidade intermediária, entre as Unidades Básicas de Saúde e as portas de urgência hospitalares, e, em conjunto com estas, compõem uma rede organizada de Atenção às Urgências que atendem 24 horas por dia;
i) HumanizaSUS: trata-se de uma Política Nacional de Humanização que aposta em estratégias construídas por gestores, trabalhadores e usuários do SUS para qualificar a atenção e gestão em saúde;
j) Doação de Órgãos: política de conscientização à população sobre a importância da doação de órgãos;
l) SAMU: Serviço de Atendimento Móvel de Urgência e Emergência, que prestar socorro à população em casos de urgência. O socorro é feito após chamada para o telefone 192.
Existem outros programas desenvolvidos pelo MS e apesar de todos os avanços, reconhecemos que a saúde no Brasil ainda é deficitária e necessita de uma reforma em seu sistema. Muitos Estados e municípios não conseguem manter o bom funcionamento de sua rede pública de saúde, especialmente em razão das deficiências no seu sistema de financiamento, o que gera o fechamento de postos, hospitais e outras unidades. Portanto, este ainda é um tema que demanda muitas análises e discussões sobre como melhorar as políticas públicas de saúde no país.
Referências
BRASIL. Portal Brasil. Ministério da Saúde. Disponível em: < http://www.brasil. gov.br/>. Acesso em: 27/08/2015.
BRASIL. Constituição Federal. 1988. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 12/08/2015.
HERÉDIA, Vânia B. M.; DE LORENZI, Dino Roberto Soares; FERLA, Alcindo Antônio. Org. Envelhecimento, saúde e políticas públicas. Caxias do Sul, RS: Educs, 2007.
SILVA, Jose Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19ª ed. ed. São Paulo: Malheiros, 2001.
Aula: 29_Políticas Previdenciárias
Conhecemos na aula anterior que o Ministério da Saúde opera com diversas políticas públicas direcionadas à promoção do bem estar da sociedade, pois sem saúde, a qualidade de vida da população fica comprometida. Além disso, podemos também observar que a falta de uma boa educação sobre saúde compromete o sucesso das políticas públicas que objetivam a prevenção de doenças e acidentes, pois uma sociedade pouco consciente acaba contribuindo para aumentar os gastos públicos com internação, cirurgias e tratamentos de saúde (HERÉDIA, 2007).
Além dessa questão, governos também precisam cuidar das questões previdenciárias, pois estas envolvem o sistema de aposentadoria e de financiamento de serviços como auxílio saúde, salário maternidade, pensões entre outros serviços públicos. No Brasil, cabe ao Estado e seus governos estaduais e municipais, a maior parte da administração dos fundos previdenciários, sejam para os trabalhadores do setor privado, que é o caso do INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social), seja dos servidores públicos federais, estaduais e municipais (OLIVEIRA, 2007). De acordo com a Constituição Federal (CF, 1988, Art.6º): “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.
Nessa aula vamos conhecer um pouco da estrutura desse sistema, destacando as políticas desenvolvidas pelo Ministério da Previdência Social (MPS).
A Previdência Social
A Previdência Social brasileira já passou por várias mudanças conceituais e estruturais, envolvendo o grau de cobertura, o elenco de benefícios oferecidos e a forma de financiamento do sistema. Vamos destacar o período mais recente, no qual importantes mudanças reformularam o sistema e influenciaram o momento atual da previdência no país.
A Constituição Federal de 1988 inseriu a Previdência Social em um sistema de proteção social mais amplo. No conjunto com políticas de saúde e assistência social, a previdência compõe o sistema de seguridade social, conforme consta do art. 194, do capítulo que trata da Seguridade Social. De acordo com o citado art. 194, a seguridade social consiste em um conjunto de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinado a assegurar o direito à saúde, à previdência social e à assistência social (CF, 1988).
Tomando como marco temporal a década de 80, nessa época, a sociedade brasileira despertou para a urgência de suas demandas sociais. E, ao final daqueles anos, em 1988, uma nova Constituição tratava de expressar nos artigos (arts. 194 e 195) destinados à criação da Seguridade Social a decisão coletiva de não mais compatibilizar exclusão e desenvolvimento.
Uma sombra de incerteza se estende sobre a nova Constituição desde o momento da sua promulgação: estabelecia-se o período até outubro de 1993 como prazo final para sua revisão, pela maioria simples do Congresso eleito em 1990. Nesse mesmo ano, inicia-se o desmonte do Sinpas, criado em 1977, mediante a extinção do Ministério do Trabalho e do Ministério da Previdência e Assistência Social. Também extintos foram o INPS e o IAPAS, e substituídos pelo Instituto Nacional de Seguro Social (INSS); o INAMPS foi transferido para o Ministério da Saúde, até ser extinto em 1993.
Ainda em 1990, são sancionadas as Leis 8.112 e 8.113, respectivamente regulamentando a Constituição com respeito aos benefícios e ao custeio da Previdência Social. A Lei 8.112/90 também instituiu o novo Regime Jurídico Único (RJU), responsável pela equiparação imediata dos direitos dos funcionários públicos então celetistas aos antigos estatutários, ou seja: direitos referentes a contagem de tempo, estabilidade, integralidade entre proventos e salários; paridade entre ativos e inativos, entre outros benefícios. Nenhuma instituição específica foi criada para gerir o sistema próprio dos servidores públicos, e tanto as receitas quanto as despesas passaram a vincular-se ao órgão/esfera de origem de cada servidor inativo.
Em janeiro de 1992, é formada uma Comissão Especial para Estudo do Sistema Previdenciário no Congresso e, em 1993, instaura-se o processo de revisão constitucional. Nada menos que 17.246 propostas de emendas constitucionais foram apresentadas, deixando de alterar apenas 4 dos então 245 artigos que compunham o texto permanente e os 70 da parte transitória (ANFIP, 1994). Nesse cenário difuso que mais se assemelhava à elaboração de uma nova Constituição, somado a crescentes descontinuidades políticas, a revisão é remetida a um certo “limbo”, do qual só sairia no início de 1995, com o envio da Proposta de Emenda Constitucional 21/95, no primeiro governo Fernando Henrique Cardoso.
O processo truncado de tramitação da PEC-21/95 terminou em seu desdobramento em outras quatro (PEC-30, PEC-31, PEC-32, PEC-33)10. Diante da crescente oposição à sua proposta e da rejeição de vários aspectos na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, o governo passa a uma atitude protelatória para sua votação no Congresso. Os primeiros anos da década de 1990 também foram marcantes para a delimitação de novos condicionantes políticos para a organização dos Estados de bem-estar social, especialmente para a América Latina.
Tradicionalmente, os objetivos dos sistemas de seguridade públicos eram sociais: manutenção da renda na velhice, invalidez e morte, solidariedade entre gerações, entre outros. A crise econômica e da Seguridade Social, seguida dos programas de ajustes estruturais, promoveu o interesse dos organismos financeiros internacionais em relação à montagem desses programas: em primeiro lugar o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (Bird), seguidosdo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal).
Os objetivos econômico-financeiros passam a prevalecer nas avaliações dos sistemas de proteção públicos-sociais: altas contribuições sobre os salários, evasão e atrasos, dotação inadequada de recursos fiscais, perda de capacidade de poupança, pesada e crescente dívida beneficiária, estímulo ao déficit fiscal e à inflação e, como resultado geral, impacto negativo no crescimento econômico, na produtividade e no emprego. Do ponto de vista das agências internacionais, a substituição dos sistemas públicos por sistemas privados eliminaria esses problemas e incrementaria a poupança nacional, o mercado de capitais, o rendimento real dos investimentos, o desenvolvimento econômico e a criação de empregos, que, por sua vez, garantiriam benefícios adequados e equitativos.
No Brasil, a PEC-33/95, após tramitar por 16 meses entre as Comissões e o plenário da Câmara, foi redirecionada para o Senado Federal, por meio de um substitutivo apresentado pelo relator, senador Beni Veras. Este substitutivo resultou na Emenda 20 de Reforma Previdenciária, finalmente aprovada em dezembro 1998. Resumindo brevemente suas diretrizes principais, pode-se dizer que a primeira direção a ser ressaltada é a de cada vez mais afastar-se do arcabouço institucional da Seguridade Social enquanto um sistema envolvendo ações integradas relativas à Saúde, à Previdência e à Assistência Social, privilegiando reformas previdenciárias pontuais, de caráter eminentemente fiscal.
Por outro lado, a reforma apresentada pelo governo Lula por meio da PEC-40/03, designada como PEC-67/03 no Senado Federal, parte da constatação de que os regimes próprios dos servidores públicos, por abrigarem privilégios iníquos, não apenas colocam em xeque sua própria sobrevivência, como ocupam papel destacado no desajuste das finanças públicas, bloqueando gastos na área social e investimentos em infraestrutura. No conjunto da proposta de reforma, a criação de Fundos de Pensão complementar para os funcionários públicos representará, segundo a proposta do governo, uma alavancagem na formação de poupança interna, que por sua vez financiará um novo período de crescimento econômico.
O Ministério da Previdência Social (MPS)
Como mencionado anteriormente, o MPS é a instituição governamental responsável pela administração e manutenção da previdência social no país, assegurando os direitos ao seguro social para a pessoa que contribui (Artigo 6º da Constituição de 1988). A renda transferida pela previdência social é utilizada para substituir a renda do trabalhador contribuinte, quando este perde a capacidade de trabalho, seja por doença, invalidez, idade avançada, morte e desemprego involuntário, ou mesmo a maternidade e a reclusão.
Principais serviços oferecidos pela Previdência Social
1) Aposentadorias: por Idade; por Idade da pessoa com deficiência; por tempo de contribuição; por tempo de contribuição da pessoa com deficiência; por tempo de contribuição do professor; por invalidez; especial por tempo de contribuição.
2) Outros benefícios previdenciários:
· Auxílio-doença;
· Auxílio-acidente;
· Auxílio-reclusão;
· Pensão por morte;
· Salário-família;
· Salário-maternidade;
· Seguro-desemprego do pescador artesanal (seguro-defeso).
3) Benefícios assistenciais e de legislação específica:
Benefício assistencial ao idoso e à pessoa com deficiência (BPC/LOAS);
Benefício assistencial ao Trabalhador Portuário Avulso;
Pecúlio;
Pensão Especial – Hanseníase;
Pensão Especial – Talidomida.
4) Outros serviços ao cidadão: agendamentos, atualizações cadastrais, certidões, perícias, empréstimo consignado, entre outros serviços.
Finalizamos essa aula destacando a importância de se ter um sistema previdenciário sustentável, pois se este não operar e condições financeiras e econômicas adequadas, sua manutenção no longo prazo é incerta. Atualmente, um dos temas de discussão da previdência social no Brasil, não somente no âmbito privado, mas dos servidores públicos também, é o de reformar o modelo atual para garantir maior sustentabilidade para o sistema, visto o aumento da expectativa de vida dos brasileiros, e os déficits apresentados no balanço do INSS. Sabe-se que nesse caso, muitos conflitos e debates surgem, pois a cada reforma na previdência, maior deverá ser o tempo de contribuição e menor será o valor dos benefícios previdenciários.
Referências
BRASIL. Portal Brasil. Ministério da Previdência Social. Disponível em: < http:// www.brasil.gov.br/>. Acesso em: 03/09/2015.
HERÉDIA, Vânia B. M.; DE LORENZI, Dino Roberto Soares; FERLA, Alcindo Antônio. Org. Envelhecimento, saúde e políticas públicas. Caxias do Sul, RS: Educs, 2007.
OLIVEIRA, Fátima Bayma de; KASZNAR, Istvan Karoly. Org. Saúde, previdência e assistência social: políticas públicas integradas, desafios e propostas estratégicas. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007.
Aula: 30_Políticas Habitacionais e Urbanas
Nessa aula vamos conhecer o funcionamento de programas direcionados à habitação, que envolvem, especialmente, as áreas urbanas. Essa demanda social é recorrente no Brasil, até mesmo por que a questão territorial é histórica e ainda enfrenta inúmeros problemas de ordem fundiária no país.
O processo de ocupação do território brasileiro se deu de modo desordenado ao longo da história, e se constituiu no problema da alta concentração de terras, com grandes cidades muito populosas e com áreas de risco para boa parte da população que vive em regiões não planejadas.
Estatuto das Cidades
O modelo de urbanização brasileiro produziu nas últimas décadas cidades caracterizadas pela fragmentação do espaço e pela exclusão social e territorial (BERNARD, 2012). O desordenamento do crescimento periférico associado à profunda desigualdade entre áreas pobres, desprovidas de urbanidade, e áreas ricas, nas quais os equipamentos urbanos e infraestruturas se concentram, aprofunda essas características, reforçando a injustiça social e inviabilizando as cidades.
Grande parcela das cidades brasileiras abriga algum tipo de assentamento precário, normalmente distante, sem acesso, desprovido de infraestruturas e equipamentos mínimos. Na totalidade das grandes cidades essa é a realidade, no qual muitos ficam à margem dos sistemas financeiros formais da habitação e do acesso à terra regularizada e urbanizada. Essa condição acaba impulsionando a ocupação em áreas de risco, como encostas e locais inundáveis. Por outro lado, em muitas cidades, principalmente em suas áreas centrais, uma massa enorme de imóveis se encontra ociosa ou subutilizada, reforçando a exclusão e a criação de guetos (tanto de pobres que não dispõem de meios para se deslocar, quanto de ricos que temem os espaços públicos) (MCidades, 2015).
Diante desse cenário, o Ministério das Cidades organiza políticas de planejamento territorial urbano e políticas fundiárias direcionadas aos municípios. Dessa forma, a Secretaria Nacional de Programas Urbanos (SNAPU) assumiu a responsabilidade de implantar o chamado “Estatuto das Cidades”, conforme Lei nº 10.257/2001, por meio do qual recursos do Orçamento Geral da União (OGU) são transferidos para ações de mobilização e capacitação na área. O Estatuto das Cidades, que regulamenta os artigos da Constituição Federal referentes à Política Urbana, constitui um importante avanço da legislação urbanística brasileira.
O Ministério das Cidades
Esse ministério foi criado em janeiro de 2003, a partir da Medida Provisória nº 103/2003 (convertida na Lei nº 10.683 de 28/05/2003). Constituem áreas de competência do Ministério das Cidades:
a) política de desenvolvimento urbano;
b) políticas setoriais de habitação, saneamento ambiental, transporte urbano e trânsito;
c) promoção, em articulação com as diversas esferas de governo, com o setor privado e organizações não governamentais, de ações e programas de urbanização, de habitação, de saneamento básico e ambiental, transporte urbano, trânsito e desenvolvimento urbano;
d) política de subsídioà habitação popular, saneamento e transporte urbano;
e) planejamento, regulação, normatização e gestão da aplicação de recursos em políticas de desenvolvimento urbano, urbanização, habitação, saneamento básico e ambiental, transporte urbano e trânsito;
f) participação na formulação das diretrizes gerais para conservação dos sistemas urbanos de água, bem como para a adoção de bacias hidrográficas como unidades básicas do planejamento e gestão do saneamento.
Outro aspecto importante da criação do Ministério das Cidades está na definição de uma política nacional de desenvolvimento urbano em consonância com os demais entes federativos (município e estado), demais poderes do Estado (legislativo e judiciário), além da participação da sociedade, visando a coordenação e a integração dos investimentos e ações nas cidades do Brasil, dirigidos à diminuição da desigualdade social e à sustentabilidade ambiental.
Nas atribuições solidárias entre governo federal, governos estaduais e governos municipais como o financiamento da habitação e da infraestrutura urbana, o MCidades organiza novas políticas e novos sistemas que viabilizem o investimento coerente e integrado (público e privado), de modo a racionalizar os recursos de acordo com as prioridades e necessidades previstas em planos, indicadores de desempenho e posturas (nacionais/gerais e locais/específicas) definidos de forma democrática. O objetivo é eliminar os constantes desperdícios de recursos decorrentes da descontinuidade de projetos, desarticulação entre ações simultâneas e sucessivas, falta de integração intermunicipal, falta de controle social e público, e desconhecimento das questões ambientais.
Ao Governo Federal cabe definir as diretrizes gerais da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano (conforme Estatuto da Cidade), e aos municípios (ou aos gestores metropolitanos, definidos por lei estadual) cabe o planejamento e a gestão urbanos e metropolitanos, desempenhada por meio de políticas fundiárias e imobiliárias (que incluem zoneamento, regularização da posse ou propriedade, código de obras), requalificação de áreas centrais, prevenção a riscos de desmoronamento de encostas e recuperação de áreas ambientalmente degradadas.
Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV)
É importante destacar que com fim do Banco Nacional da Habitação (BNH), ocorrido em 1985, o Brasil vivenciou um momento de crise no mercado imobiliário, causada pela instabilidade financeira e a escassez de recursos para o crédito imobiliário. De lá para cá, a Caixa Econômica Federal (CEF) passou a administrar os recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e a organizar o financiamento habitacional. Nesse caso, podemos citar o Programa “Minha Casa Minha Vida”, criado em 2009 pelo governo federal, que atende a demanda de imóveis das famílias de menor renda (CEF, 2015).
Atualmente, com financiado pelo FGTS, o programa atende famílias com renda de até R$ 5 mil. Quanto às regras gerais do imóvel, este deve ter o valor máximo de R$ 190 mil, com financiamento em até 360 meses (30 anos). As taxas de juros são a partir de 5% ao ano, passíveis de redução de 0,5% para trabalhadores que possuam conta no FGTS há pelo menos três anos. Além disso, para famílias com renda bruta de até R$ 3.275,00, existe a possibilidade de um subsídio que pode chegar a R$ 25 mil, dependendo da renda do beneficiário e da região onde o imóvel está localizado.
O PMCMV ainda contempla o chamado Fundo Garantidor da Habitação (FGHab), que fornece cobertura parcial (proporcional à renda familiar) em caso de perda de renda ou capacidade de pagamento, morte, invalidez permanente e danos físicos ao imóvel. E ainda pode ser incluído no financiamento, os valores de despesas com cartório e ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis).
Além desses tipos de financiamentos, o programa opera com o Fundo de Arrendamento Residencial (FAR) que atende famílias com renda mensal de até R$ 1.600,00 em municípios conveniados; e o Fundo de Desenvolvimento Social (FDS) que trabalha atendendo as famílias com renda mensal de até R$ 1.600,00 organizadas em cooperativas habitacionais ou mistas, associações demais entidades privadas sem fins lucrativos, visando a produção, aquisição e requalificação de imóveis urbanos. Por fim, citamos também o Programa Nacional de Habitação Rural (PNHR) que tem por objetivo subsidiar a produção ou reforma de imóveis aos agricultores familiares e trabalhadores rurais cuja renda familiar anual bruta não ultrapasse R$ 60.000,00 (sessenta mil reais).
Referências
BERNARDI, Jorge. A organização municipal e a política urbana. Curitiba: Intersaberes, 2012.
BRASIL. Portal Brasil. Ministério das Cidades. Disponível em: < http://www. brasil.gov.br/>. Acesso em: 10/10/2015.
CEF. Minha casa minha vida. Disponível em: < http://www.caixa.gov.br/voce/ habitacao/minha-casa-minha-vida/Paginas/default.aspx>. Acesso em: 03/09/2015.
Aula: 31_Política Pública e o Terceiro Setor
Na presente aula vamos estudar como estão organizadas as políticas públicas no âmbito do chamado “Terceiro Setor”. Se é terceiro setor, então quem são os outros setores? Tradicionalmente, nos referimos ao “Primero Setor” como sendo aquele constituído pelo Estado, com suas esferas governamentais e o fornecimento de bens e serviços públicos. O “Segundo Setor” é aquele formado pelas atividades produtivas, no qual as empresas agrícolas, industriais, comerciais, entre outros serviços, atuam com fins lucrativos. Já o terceiro setor é aquele que intermedia os outros dois setores atuando nas relações entre empresas e pessoas, com a prestação de serviços de interesse social que buscam equilibrar os problemas relacionados às limitações do Estado e os excessos do mercado, assumindo iniciativas voltadas para o desenvolvimento social.
As organizações do terceiro setor são formadas por sociedade civis sem fins lucrativos, ou seja, associações civis e fundações de direito privado. As fundações privadas, apesar de criadas pela vontade e patrimônio de particulares, destinam-se a fins públicos, de alcance social (interesse público e social).
Entidades do Terceiro Setor
As entidades que integram o terceiro setor se originaram a partir dos movimentos sociais que funcionavam como interlocutores sociais e se transformaram em importantes instrumentos para a organização de uma nova dinâmica social e democrática, em que as relações foram orientadas pelos laços de solidariedade entre os indivíduos, espírito voluntariado, consenso e anseio do bem comum.
Essas entidades atuam em atividades como: defesa dos direitos humanos, proteção do meio ambiente, assistência à saúde, apoio às populações carentes, educação, cidadania, direitos da mulher, dos indígenas, do consumidor, das crianças, entre outras atividades de interesse público e social.
De acordo com o Manual sobre as Instituições Sem Fins Lucrativos no Sistema Nacional de Contas (IBGE, 2002, p.3), as entidades do terceiro setor são pessoas jurídicas que devem se enquadrar nos seguintes critérios:
a) privadas, não integrantes, portanto, do aparelho de Estado;
b) sem fins lucrativos, isto é, organizações que não distribuem eventuais excedentes entre os proprietários ou diretores e que não possuem como razão primeira de existência a geração de lucros (podem até gerá-los desde que aplicados nas atividades fins);
c) institucionalizadas, isto é, legalmente constituídas;
d) auto administradas ou capazes de gerenciar suas próprias atividades;
e) voluntárias, na medida em que podem ser constituídas livremente por qualquer grupo de pessoas, isto é, a atividade de associação ou de fundação da entidade é livremente decidida pelos sócios ou fundadores.
No Brasil, as seguintes figuras jurídicas apresentam as características de entidades sem fins lucrativos: as associações e as fundações privadas. Dentre as associações, integram o terceiro setor aquelas que perseguem o bem comum, que tem, portanto, atuação na esfera social, pública.
As fundações perseguem o bem comum na medida em que a finalidade delas pode ser religiosa,moral, cultural ou de assistência social. É comum chamar essas associações e fundações de Organização Não Governamentais (ONGs). Além dessa, também são conhecidas como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), Organizações Sociais (OS), Institutos, Instituições, entre outros (TSO, 2015).
Do ponto de vista econômico financeiro, o terceiro setor avançou mantendo relações bem estreitas com o Estado e as empresas privadas, pois seu capital é solidário e depende em boa parte, da colaboração dos agentes públicos e privados. No caso do primeiro setor, este se mantém com a arrecadação de impostos; o segundo setor depende dos lucros do capital; e o terceiro setor se sustenta por meio da prestação de serviços, convênios, parcerias e doações recebidas do poder público e dos agentes privados.
Parcerias no Terceiro Setor
As relações de parcerias entre o setor empresarial e organizações governamentais não são recentes no Brasil, mas, ao longo do tempo, tem passado por grandes transformações que levaram mais empresas e entidades do Terceiro Setor a encontraram pontos de convergência de valores e princípios, firmando assim as parcerias. O desenvolvimento do conceito de responsabilidade social e investimento social privado tem promovido o fortalecimento desta expansão.
É recomendado que as organizações adotem certos procedimentos antes de firmarem suas parcerias, analisando a convergência de interesses entre as empresas e as entidades do terceiro setor (TSO, 2015):
a) Conhecer a empresa e suas atividades, objetivando apurar a coerência entre a visão, missão e a prática da empresa, bem como analisar suas práticas, com o fim de saber se, no exercício das atividades, respeita as leis brasileiras;
b) Analisar o grau de compromisso da empresa, verificar as intenções dela com a parceria e a congruência destas intenções com os objetivos e fins da ONG;
c) Identificar as prioridades da empresa e a motivação dela pela parceria;
d) Analisar as vantagens e os riscos da parceria.
As parcerias entre o Estado e as organizações da sociedade civil representa a associação entre governos e entidades com interesses comuns, o que no caso das políticas públicas, torna-se um importante meio de promover projetos governamentais aproximando a sociedade de sua realidade local e atendendo a problemas sociais específicos.
No Brasil, desde a implantação da "Reforma Administrativa", no final da década de 1990, as ONGs assumiram importante papel na execução das políticas públicas sociais. Segundo o IBGE (2010), existem cerca de 556.846 unidades locais sem fins lucrativos, com pessoal ocupado assalariado de 2.893.854 pessoas, com salários e outras remunerações que totalizam um valor de R$ 57.651.563,15.
Alguns exemplos de associações e instituições presentes no terceiro setor:
- AACD - Associação de Assistência à Criança Deficiente;
- ABONG - Associação Brasileira das Organizações Não Governamentais;
- AMA - Associação de Amigos do Autista;
- ANDI - Agência de Notícias dos Direitos da Infância;
- APAE-SP - Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de São Paulo;
- CENPEC - Centro de Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária;
- Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente;
- Fundação Dorina Nowill para Cegos;
- Fundação Educar DPaschoal;
- Fundação SOS Mata Atlântica;
- Instituto Akatu pelo Consumo Consciente;
- Instituto Ayrton Senna;
- IBASE - Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas;
- Instituto Ecoar para a Cidadania;
- Instituto Ethos;
- Instituto Paulo Freire;
- Instituto Socioambiental;
- Laramara - Associação Brasileira de Assistência ao Deficiente Visual;
- Programa Alfabetização Solidária;
- Projeto Aprendiz do Futuro.
Tomando como o exemplo o caso do Instituto Ayrton Senna, que foi criado em 1994.[1] Este instituto apresenta como principal objetivo: “trabalhar para ampliar as oportunidades de crianças e jovens por meio da educação” (INSTITUTO AYRTON SENNA, 2015).
Como missão, o instituto busca “levar educação de qualidade para as redes públicas de ensino no Brasil”, atuando em parceria com gestores públicos, educadores, pesquisadores e outras organizações. As ações são financiadas por recursos de doações e de parcerias com a iniciativa públicas e privadas.
Como exemplo, vamos citar a parceria do instituto com a Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro (SEEDUC), que trabalha com uma “Solução Educacional” para o Ensino Médio. O objetivo é transformar paradigmas das políticas educacionais do ensino médio, introduzindo novos modelos e processos de gestão, formação, acompanhamento e avaliação, viabilizando uma proposta curricular inovadora que aproxima a escola do mundo contemporâneo e dos interesses dos jovens.
Segundo o Instituto Ayrton Senna (2015), atualmente a “Solução Educacional” para o Ensino Médio vem sendo validada de forma bem sucedida em dois modelos curriculares na rede estadual do Rio de Janeiro. O Colégio Estadual Chico Anysio (CECA) que funciona como o ambiente de validação da iniciativa em sua plenitude. E em seu modelo parcial, a Solução vem sendo validada em 51 escolas estaduais do Rio de Janeiro parceiras do Programa Ensino Médio Inovador, e também em escolas de tempo parcial que aderiram ao componente Jovens Leitores em Ação (uma iniciativa para tornar a sala de leitura um espaço de integração curricular).
Para finalizar essa aula, chamamos a atenção para os problemas relacionados à fiscalização dessas entidades. É inegável a importância do terceiro setor para as políticas públicas e a sociedade civil, contudo, tornou-se comum as denúncias de corrupção nesse segmento, no qual organizações privadas e o setor público se articulam, de modo oportunista, para utilizarem recursos financeiros em prol de interesses escusos, e não, efetivamente, do interesse público. Por isso, destaca-se a importância do papel do Ministério Público (MP) como fiscalizador desse setor (Constituição Federal, 1988, artigo 129; e Código Civil, artigo 66).
REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério Público. Disponível em: <IBGE. As Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos no Brasil 2002. Notas Técnicas, 2002.
BOCCHI, Olsen Henrique. O Terceiro Setor: Uma visão estratégica para projetos de interesse público. Curitiba: IBPEX, 2009.
IBGE. As fundações privadas e associações sem fins lucrativos no Brasil. 2010. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/ fasfil/2010/default_entidades_ods_nova_2010.shtm. Acesso em 29/09/2015.
INSTITUTO AYRTON SENNA. Soluções. 2015. Disponível em: <http://www.institutoayrtonsenna.org.br/como-atuamos/solucoes-educacionais/ensino-medio/>. Acesso em 05/09/2015.
TSO. Portal Terceiro Setor Online. 2015. Disponível em: < http://www.terceiros etoronline.com.br/ong-os-oscip/>. Acesso em: 11/10/2015.
[1] Instituto criado pela família do tricampeão de Fórmula 1, Ayrton Senna, falecido em 01 de maio de 1994 (acidente na corrida da temporada do GP de San Marino, em Ímola, Itália). Tem como presidente do instituto a empresária e irmã Viviane Senna. Anualmente, o Instituto Ayrton Senna capacita 75 mil educadores e seus programas beneficiam diretamente cerca de 2 milhões de alunos em mais de 1.300 municípios nas diversas regiões do Brasil.
Aula: 32_Meio Ambiente e Políticas Públicas
Nesta última aula do curso vamos estudar as principais características das políticas públicas aplicadas às questões ambientais. Os temas relacionados à preservação e sustentabilidade do meio ambiente se tornaram relevantes e recorrentes no debate sobre o papel do Estado e o desenvolvimento das economias capitalistas. Equilibrar interesses de ordem econômica e ambiental é um grande desafio para os atuais governos e para a sociedade em geral. Portanto, destacamos a importância desse tema para os gestores públicos e para a sociedade das gerações futuras.
A Questão Ambiental
Nas últimas décadas a questão da preservação dos recursos naturais passou a ser uma preocupação mundial, e todos os países, desenvolvidos, em desenvolvimento e paísespobres, reconheceram a importância de assumir essa responsabilidade, pois com a evolução da sociedade, o homem foi rapidamente degradando o meio ambiente, contaminando-o com resíduos nucleares, disposição de lixos químicos, domésticos, industriais, hospitalares de forma inadequada, pelas queimadas, pelo desperdício dos recursos naturais não renováveis, pelo efeito estufa, pelo desmatamento indiscriminado, pela contaminação dos rios, pela degradação do solo através da mineração, pela utilização de agrotóxicos, pela má distribuição de renda, pela acelerada industrialização, pelo crescimento sem planejamento das cidades, pela caça e pela pesca predatória (LUNELLI, 2011).
Com o acontecimento de catástrofes e problemas ambientais, os organismos internacionais passaram a exigir uma nova postura dos países, sendo marcante a atuação da Organização das Nações Unidas (ONU) que em 1972 organizou a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano em Estocolmo. Nela, seu primeiro princípio estabelece que o homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e a condições de vida satisfatória, num ambiente cuja qualidade lhe permita viver com dignidade e bem estar. Ele tem o dever solene de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações presentes e futuras.
A partir dessa Conferência, os problemas ambientais receberam tratamentos diferenciados, tendo repercussão no Brasil também. A Constituição Federal (CF) de 1988 foi a primeira a tratar, de modo direito, sobre a questão ambiental, estabelecendo mecanismos de proteção e controle dos recursos ambientais.
Então, conforme o artigo 225 da CF (1988) é estabelecido que:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provo quem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
§ 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
§ 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
§ 5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.
§ 6º - As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.
Ministério do Meio Ambiente
O Ministério do Meio Ambiente (MMA), criado em novembro de 1992, tem como missão promover a adoção de princípios e estratégias para o conhecimento, a proteção e a recuperação do meio ambiente, o uso sustentável dos recursos naturais, a valorização dos serviços ambientais e a inserção do desenvolvimento sustentável na formulação e na implementação de políticas públicas, de forma transversal e compartilhada, participativa e democrática, em todos os níveis e instâncias de governo e sociedade (BRASIL, 2015).
De acordo com a Lei nº 10.683/2003, compete ao Ministério do Meio Ambiente os seguintes assuntos:
I - política nacional do meio ambiente e dos recursos hídricos;
II - política de preservação, conservação e utilização sustentável de ecossistemas, e biodiversidade e florestas;
III - proposição de estratégias, mecanismos e instrumentos econômicos e sociais para a melhoria da qualidade ambiental e o uso sustentável dos recursos naturais;
IV - políticas para a integração do meio ambiente e produção;
V - políticas e programas ambientais para a Amazônia Legal;
VI - zoneamento ecológico-econômico.
As políticas públicas do MMA incluem programas voltados à recuperação, conservação e sustentabilidade em variadas áreas ambientais. Entre os destaques está o Cadastro Ambiental Rural (CAR) de imóveis em todo o território nacional, com o objetivo de promover a recuperação de ecossistemas nos moldes do novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012).
Para as unidades de conservação, há o Programa Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa) e o Bolsa Verde, que concede incentivos financeiros para famílias promoverem ações de conservação reservas extrativistas, florestas nacionais e assentamentos.
Os recursos hídricos têm como destaque o programa Água Doce, que promove a construção sustentável de poços e, assim, fornece água potável para comunidades de baixa renda no semiárido brasileiro. Além disso, o MMA desenvolve programas ligados ao combate à desertificação, à educação ambiental e ao zoneamento ecológico econômico. Outros programas: A3P (Agenda Ambiental na Administração Pública); Agenda 21; Águas Subterrâneas; ARPA (Áreas Protegidas da Amazônia); Cerrado Sustentável; Corredores Ecológicos; Projeto Orla; Revitalização de Bacias; entre outros.
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama)
O Ibama foi criado em 1989 (um pouco antes da criação do Ministério do Meio Ambiente em 1992), e durante a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento/Rio 92, foram lançadas três das principais Convenções internacionais de meio ambiente:
- de Mudanças Climáticas;
- da Diversidade Biológica; e
- da Desertificação.
A partir daí, ao longo da década de 90, a legislação brasileira foi se fortalecendo em relação à questão ambiental. Em 1997 foi aprovada a chamada Lei das Águas e, em 1998, a Lei dos Crimes Ambientais. Em 1999 foi criada a lei que estabelece a Política Nacional de Educação Ambiental e, em 2000, a que estabelece o Sistema Nacional de Unidades de Conservação. E mais adiante, em 2006, foi estabelecida a Lei de Gestão de Florestas Públicas.
O Ibama atua, especialmente, sobre as ações de licenciamento ambiental, controle da qualidade ambiental, autorização de uso dos recursos naturais e fiscalização, monitoramento e controle ambiental.
Sobre suas principais ações e programas, temos:
1) Plano Diretor de Tecnologia da Informação - PDTI
O Plano Diretor de Tecnologia da Informação (PDTI) é um instrumento de diagnóstico, planejamento e gestão dos recursos e processos de Tecnologia da Informação que visa a atender às necessidades tecnológicas e de informação de um órgão ou entidade para um determinado período, possibilitando alinhar os recursos aplicados em TI, eliminar o desperdício, garantir o controle, aplicar recursos no queé mais relevante e, por fim, melhorar o gasto público e o serviço prestado ao cidadão. É uma importante ferramenta de apoio à tomada de decisão para o gestor, habilitando-o a agir de forma proativa, contra as ameaças e a favor das oportunidades.
2) Plano Estratégico IBAMA:
O Plano Estratégico do Ibama para o período de 2012 a 2015 adotou como referências básicas os preceitos da Política Nacional do Meio Ambiente, as orientações do Plano de Governo, as diretrizes do Ministério do Meio Ambiente, as deliberações da Conferência Nacional do Meio Ambiente, as orientações do Gespública, as finalidades do Ibama e as ações federais de sua competência que constituem suas obrigações legais. O Plano Estratégico é composto por um conjunto de documentos sobre a Identidade Organizacional (Missão, Visão, Valores), Análise de Ambiente (Matriz SWOT), Objetivos e Diretrizes Estratégicos (IBAMA, 2011).
3) Plano Plurianual (PPA):
O plano plurianual é uma ferramenta de planejamento da gestão pública que estabelece as diretrizes, objetivos e metas a serem alcançadas no médio e longo prazo (está previsto na Constituição Federal de 1988, artigo 165). No caso do IBAMA, o PPA de 2015 está organizado da seguinte forma:
a) Programa Biodiversidade
- Fiscalização dos Recursos da Biodiversidade;
- Avaliação dos Estoques e do Potencial Sustentável dos Recursos Pesqueiros;
- Estruturação da Gestão Nacional dos Recursos Faunísticos;
- Conservação e Uso Sustentável de Espécies Ameaçadas de Extinção;
- Controle, monitoramento, triagem, recuperação, destinação de animais silvestres.
b) Programa Florestas, Prevenção e Controle do Desmatamento e dos Incêndios:
- Fortalecimento e aprimoramento da fiscalização ambiental;
- Prevenção e combate a incêndios florestais e controle de queimadas;
- Fiscalização de atividades de desmatamento;
- Monitoramento e controle do desmatamento e dos incêndios florestais;
- Estruturação dos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente para a Gestão Florestal Compartilhada;
- Autorização e controle das atividades florestais.
c) Programa Licenciamento e Qualidade Ambiental:
- Promoção de ações de gestão de riscos, preparação e atendimento a emergências ambientais;
- Avaliação da periculosidade e controle de produtos, substâncias químicas e resíduos perigosos;
- Fiscalização de atividades degradadoras, poluentes e contaminantes;
- Licenciamento Ambiental Federal;
- Educação ambiental para grupos em situação de vulnerabilidade socioambiental.
d) Programa de Gestão e Manutenção:
- Referente à manutenção do bom trabalho dos servidores públicos.
Como podemos observar, a questão ambiental está bem reconhecida e institucionalizada no Brasil e no mundo, porém, ainda existem muitos debates sobre como implementar as ações governamentais de modo eficiente, ao mesmo tempo que interesses financeiros e comerciais de diferentes setores são impactados. Este é ainda um problema recorrente no Brasil e que demanda políticas públicas efetivas e eficientes do ponto de vista técnico e econômico. Muitas vezes a ausência de atuação e fiscalização do Estado trazem efeitos negativos sobre a sociedade, o meio ambiente e à qualidade de vida das pessoas, sendo necessária também a conscientização da população que deve exigir o cumprimento das leis existentes que asseguram uma efetiva proteção ambiental.
Referências
BRASIL. Constituição Federal. 1988. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 22/09/2015.
BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Disponível em: < http://www.brasil.gov. br/>. Acesso em: 25/10/2015.
IBAMA. Boletim de serviço especial nº11, de 07.11.2011. Disponível em: http://www.ibama.gov.br/phocadownload/acesso_a_informacao/plano_estrategico_ibama-2012_2015.pdf>. Acesso em: 11/10/2015.
LUNELLI, Carlos Alberto; MARIN, Jederson. Org. Ambiente, políticas públicas e jurisdição. Caxias do Sul, RS: Educs, 2012.
RECH, Adir Ubaldo. Org. Instrumento de desenvolvimento e sustentabilidade urbana. Caxias do Sul, RS: Educs, 2014.
RODRIGUES, Marta M. Assumpção. Políticas Públicas. São Paulo: PubliFolha, 2009.