Prévia do material em texto
Síndrome de Cushing 1.Revisar a anatomia e fisiologia das glândulas adrenais; As glândulas adrenais são bilaterais e são chamadas de suprarrenais por se localizar acima dos rins, no espaço retroperitoneal. Apresenta formato piramidal na glândula direita e semilunar na glândula esquerda. Produz hormônios esteroides(derivado do colesterol, exemplos: cortisol e aldolsterona) e catecolaminas (derivada de tirosina, exemplo: epinefrina e norepinefrina); - Dividida em córtex (porção externa) e medula (porção interna); ∙ Córtex: - Tecido epitelial endócrino; - Dividida em 3 zonas: * Glomerulosa: . A zona mais externa, imediatamente profunda à cápsula de tecido conjuntivo responsável por secretar mineralocorticoides (ex: aldosterona) que afetam a homeostasia mineral; * Fasciculada ou zona do meio: é a mais larga das três zonas e consiste em células distribuídas em colunas longas e retas. As células da zona fasciculada secretam principalmente glicocorticoides, em especial cortisol, assim chamados por afetarem a homeostasia da glicose; * Reticular: As células da zona mais interna, a zona reticular, são distribuídas em cordões ramificados. Elas sintetizam pequenas quantidades de androgênios fracos, que são hormônios esteroides que exercem efeitos masculinizantes. Mineralocorticoides: A aldosterona é o principal mineralocorticoide; regula a homeostasia de dois íons minerais – íons sódio (Na + ) e potássio (K + ) – e ajuda a ajustar a pressão arterial e o volume de sangue. A aldosterona também promove a excreção de H + na urina; essa remoção de ácidos do corpo pode ajudar a evitar a acidose (pH abaixo de 7,35). A via renina-angiotensina- aldosterona (RAAS) regula a secreção de aldosterona ∙ Medula: - Tecido derivado da crista neural; - Células cromafins (consideradas neurônios modificados) responsável por produzir as catecolaminas e recebem inervação simpática; - As catecolaminas são: epinefrina, norepinefrina e pequena quantidade de dopamina - Por meio de um estímulo o nervo simpático estimula a medula adrenal a secretar catecolaminas (toda a epinefrina vem da adrenal mas só 30% da norepinefrina vem da adrenal, os 70% vem dos gânglios simpáticos; - A regulação das catecolaminas é feita pelo SNA; Zona fasciculada: - Cortisol esteróide derivado do colesterol; - Colesterol se transforma em pregnenolona por meio da remoção da cadeia lateral que é feita pelo colesterol desmolase; - Pregnenolona se transforma em progesterona através da 3 beta hidroxiesteroide desidrogenase; - Progesterona se transforma em 17(OHhidroxi)progesterona através da CYP17; - 17progesterona se transforma em desoxicortisol por meio da CYP21A2 (21 hidroxilase); - Desoxicortisol se transforma em cortisol por meio da CYP11B1 (11 hidroxilase) Cortisol: Ações: - Hormônio do estresse; - Regulação da glicemia; -Anti-inflamatória; -Imunossupressora utilizado no LES (doença que tem auto-anticorpos e utiliza o corticoide para bloquear o sistema imune); - Aumenta a reabsorção óssea e inibem a formação óssea (pacientes que fazem uso crônico desenvolvem osteoporose); - Inibem a formação de colágeno; - Aumenta o apetite; Glicocorticoides Os glicocorticoides, que regulam o metabolismo e a resistência ao estresse, são o cortisol, a corticosterona e a cortisona. Desses três hormônios secretados pela zona fasciculada, o cortisol é o mais abundante, responsável por cerca de 95% da atividade glicocorticoide. Os glicocorticoides exercem os seguintes efeitos: 1.Degradação de proteína. Os glicocorticoides intensificam a taxa de degradação de proteína, principalmente nas fibras musculares e, dessa forma, aumentam a liberação de aminoácidos na corrente sanguínea. Os aminoácidos podem ser usados pelas células corporais na síntese de novas proteínas ou na produção de ATP. 2.Formação de glicose. Ao serem estimulados pelos glicocorticoides, os hepatócitos convertem determinados aminoácidos ou ácido láctico em glicose, que será usada por neurônios e outras células para produzir ATP. Tal conversão, de uma substância que não seja o glicogênio ou outro monossacarídio em glicose, é chamada de gliconeogênese. 3.Lipólise. Os glicocorticoides estimulam a lipólise, degradação dos triglicerídios e liberação de ácidos graxos do tecido adiposo para o sangue. 4.Resistência ao estresse. Os glicocorticoides trabalham de muitas maneiras para promover a resistência ao estresse. A glicose extra fornecida pelos hepatócitos oferece aos tecidos uma pronta fonte de ATP para combater inúmeros estresses, inclusive exercício, jejum, medo, temperaturas extremas, altitudes elevadas, sangramento, infecção,cirurgia, traumatismo e doença. Uma vez que tornam os vasos sanguíneos mais sensíveis a outros hormônios que causam vasoconstrição, os glicocorticoides elevam a pressão sanguínea. Esse efeito é vantajoso nos casos de perda significativa de sangue, que faz com que a pressão arterial caia. 5. Efeitos antiinflamatórios. Os glicocorticoides inibem a participação dos leucócitos nas respostas inflamatórias. Infelizmente, os glicocorticoides também atrasam o reparo tecidual; em consequência disso, retardam a cicatrização de feridas. Embora em doses elevadas possam ocasionar transtornos mentais graves, os glicocorticoides são muito úteis no tratamento de condições inflamatórias crônicas como artrite reumatoide. 6. Depressão das respostas imunes. Doses elevadas de glicocorticoides deprimem as respostas imunes. Por esse motivo, os glicocorticoides são prescritos para receptores de órgãos transplantados com objetivo de retardar a rejeição tecidual promovida pelo sistema imune. Controle da secreção de glicocorticoide O controle da secreção de glicocorticoide ocorre por meio de um sistema de feedback negativo típico (Figura 18.17). Níveis sanguíneos baixos de glicocorticoides, principalmente cortisol, estimulam as células neurossecretoras no hipotálamo a secretarem hormônio liberador da corticotrofina (CRH). O CRH (junto com a baixa concentração de cortisol) promove a liberação de ACTH da adenohipófise. O ACTH flui no sangue para o córtex da glândula suprarrenal onde estimula a secreção de glicocorticoide (em grau muito menor, o ACTH também estimula a secreção de aldosterona). Androgênios Tanto em homens quanto em mulheres, o córtex da glândula suprarrenal secreta pequenas quantidades de androgênios fracos. O principal androgênio secretado pela glândula suprarrenal é a desidroepiandrosterona (DHEA). Nos homens, depois da puberdade, o androgênio testosterona também é liberado, e em quantidade muito maior, pelos testículos. Dessa forma, a quantidade de androgênios secretada pela glândula suprarrenal masculina é normalmente tão baixa que seus efeitos são insignificantes. Nas mulheres, no entanto, os androgênios suprarrenais desempenham funções importantes. Eles promovem a libido (desejo sexual) e são convertidos em estrogênios (esteroides sexuais feminilizantes) por outros tecidos corporais. Após a menopausa, quando a secreção ovariana de estrogênios cessa, todos os estrogênios femininos são provenientes da conversão dos androgênios suprarrenais. Os androgênios suprarrenais também estimulam o crescimento de pelos axilares e púbicos nos meninos e nas meninas e contribuem para o estirão de crescimento prépuberal. Embora o controle da secreção suprarrenal de androgênio não seja totalmente compreendido, o principal hormônio que estimula sua secreção é o ACTH. Medula da glândula suprarrenal A região interna da glândula suprarrenal, a medula da glândula suprarrenal, consiste em um gânglio simpático da divisão autônoma do sistema nervoso (SNA) modificado. Essa área se desenvolve a partir do mesmo tecido embrionário de todos os outros gânglios simpáticos, porém suas células,que não possuem axônios, formam grupos em torno de grandes vasos sanguíneos. Em vez de liberar um neurotransmissor, as células da medula da glândula suprarrenal secretam hormônios. As células produtoras de hormônio, chamadas de células cromafins, são inervadas por neurônios préganglionares simpáticos do SNA. Uma vez que o SNA exerce controle direto sobre as células cromafins, a liberação de hormônio pode ocorrer com muita rapidez. Os dois principais hormônios sintetizados pela medula suprarrenal são a epinefrina e a norepinefrina, também chamadas de adrenalina e noradrenalina, respectivamente. As células cromafins da medula da glândula suprarrenal secretam quantidades desiguais desses hormônios – cerca de 80% de epinefrina e 20% de norepinefrina. Os hormônios da medula da glândula suprarrenal intensificam respostas simpáticas que ocorrem em outras partes do corpo. Controle da secreção de epinefrina e norepinefrina Em situações de estresse e durante a prática de exercícios, impulsos provenientes do hipotálamo acionam os neurônios préganglionares simpáticos que, por sua vez, estimulam as células cromafins a secretarem epinefrina e norepinefrina. Esses dois hormônios intensificam a resposta de luta ou fuga. Ao aumentar a frequência e a força de contração cardíacas, a epinefrina e a norepinefrina elevam o débito cardíaco e a pressão arterial. Além disso, aumentam o fluxo de sangue para o coração, o fígado, os músculos esqueléticos e o tecido adiposo; dilatam as vias respiratórias para os pulmões e elevam os níveis sanguíneos de glicose e ácidos graxos. 2.Entender a definição de Síndrome de Cushing, sua etiologia, fatores de risco e dados epidemiológicos; DEFINIÇÃO A síndrome de Cushing (SC) é a condição resultante da exposição prolongada a quantidades excessivas de glicocorticoides (GC). Pode resultar da administração prolongada de doses suprafisiológicas de GC (SC exógena ou iatrogênica) ou, bem menos frequentemente, da hiperprodução crônica de cortisol (SC endógena) EPIDEMIOLOGIA A SC endógena pode ocorrer em qualquer faixa etária, mas é mais comum em adultos, com idade mediana de 41,4 anos ao diagnóstico, e predomínio no sexo feminino (3:1). 1,4 Trata-se de doença rara, com incidência estimada de 0,7 a 2,4 casos novos por milhão de habitantes por ano e prevalência estimada de 37 a 39 por milhão em várias populações. No entanto, maior prevalência foi relatada para o hipercortisolismo subclínico (HCSC) em indivíduos com diabetes melito tipo 2 (DM2) mal controlado (2 a 3%), hipertensão (0,5 a 1%), incidentalomas adrenais (até 10%) e osteoporose de início precoce (até 11%). A SC está associada a elevadas taxas de morbidades e mortalidade (razão de mortalidade padronizada [SMR] entre 2 e 5), que, mesmo sendo reduzidas, não necessariamente serão revertidas com o tratamento adequado. Entre pacientes com adenomas hipofisários secretores do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) – doença de Cushing – que obtiveram reversão do hipercortisolismo após a cirurgia transesfenoidal, a normalização da SMR foi demonstrada em alguns estudos, mas não em todos. Da mesma forma, podem persistir, em uma significativa proporção de casos, fatores de risco cardiovasculares (obesidade, diabetes, hipertensão e dislipidemia), transtornos psiquiátricos (depressão e ansiedade) e transtornos cognitivos. ETIOLOGIA As causas da SC dividem- se em duas categorias, de acordo com os níveis circulantes de ACTH, também chamado corticotrofina: ACTHdependentes (71 a 80% dos casos) e ACTHindependentes (20 a 29% dos casos). A doença de Cushing (DC) é a etiologia mais comum (cerca de dois terços dos casos), seguida dos distúrbios adrenais e da síndrome do ACTH ectópico (SAE). Em uma coorte com 154 pacientes, observouse DC em 61,7% dos casos; os distúrbios adrenais em 29,2% e a SAE em 7,1%. 3.Compreender a fisiopatologia e principais complicações da Síndrome de Cushing; A síndrome pode ter causas exógenas ou endógenas. No primeiro tipo,caracterizado como Síndrome de Cushing (SC) iatrogênica, a desordem é provocada pelo uso excessivo ou prolongado de corticosteroides, como a prednisona. A SC endógena pode ser classificada em relação à etiologia em dois grandes grupos, de acordo com as concentrações plasmáticas de ACTH em: SC ACTH-dependente e ACTH-independente. As formas ACTH-dependentes se relacionam a doenças do eixo hipotálamo-hipofisário, ou tu- mores diversos secretores de ACTH/CRH. Já as formas ACTH-independentes ocorrem em consequência a doenças primárias da suprarrenal. Síndrome de Cushing ACTH-dependente A SC ACTH-dependente ocorre quando o hipercortisolismo se origina da secreção excessiva de ACTH. Em cerca de 80 a 90% dos pacientes, o fator etiológico é um adenoma hipofisário secretor de ACTH (também denominado corticotropinoma ou adenoma corticotrófico), caracterizando a DC. Os casos restantes decorrem da secreção ectópica de ACTH ou, bem mais raramente, do hormônio liberador da corticotrofina (CRH). Em alguns casos, a fonte de secreção de ACTH pode permanecer incerta DOENÇA DE CUSHING A DC resulta, na maioria dos casos, de um microadenoma (diâmetro < 10 mm) hipofisário secretor de ACTH. Apenas 10 a 20% dos casos são associados a um macroadenoma, e os carcinomas são extremamente raros. A DC tem predomínio no sexo feminino (M:H = 8:1), início, em geral, entre 20 e 40 anos de idade e progressão lenta (vários anos de sintomas). Nos casos prépuberais, contudo, há maior ocorrência no sexo masculino As bases genéticas da DC ainda são pouco conhecidas; sabese, todavia, que a maioria dos casos são esporádicos. Raramente, a DC surge como parte da neoplasia endócrina múltipla (MEN) tipos 1 ou 4, ou em consequência de mutações germinativas do gene da proteína de interação do receptor arilhidrocarboneto (AIP). Recentemente, tem sido mostrado que mutações no gene da protease 8 ubiquitinaespecífica (USP8) são frequentes nos corticotropinomas. De fato, em 148 pacientes submetidos a cirurgia, 48 (36%) apresentavam as referidas mutações, as quais se mostraram mais frequentes nas mulheres do que nos homens (43 versus 17%), bem como mais assídua em adultos do que na população pediátrica (41 versus 17%); ■ Síndrome do ACTH ectópico A SAE pode originarse de diversos tumores, porém, provavelmente, a causa mais comum é o carcinoma pulmonar de células pequenas. Estimase que até 12% dos casos desse carcinoma desencadeiem a SAE. No entanto, poucos pacientes acometidos buscam o endocrinologista, visto que, na maioria das vezes, têm manifestações atípicas da síndrome, com predomínio de sintomatologia da malignidade em si (tosse, perda de peso e anemia), eventualmente associada a hiperglicemia, hipertensão e/ou hipocalemia. Por isso, na grande maioria das séries oriundas de centros endocrinológicos, os tumores carcinoides brônquicos constam como a etiologia predominante. Outras causas bem documentadas são os carcinoides tímicos e, menos comumente, os carcinoides de outros órgãos (vesícula, fígado, intestino delgado, cólon etc.), o feocromocitoma, o carcinoma de ilhotas pancreáticas e o carcinoma medular da tireoide (CMT). Em 6 séries de pacientes com SAE, feocromocitoma foi a fonte da secreção de ACTH em 19 de 363 pacientes (5,2%). 22 Estimase que somente 0,6% dos CMT causem SC por secretar ACTH ou CRH Síndrome do CRH ectópico Esta síndrome é bastante rara (menos de 30 casos descritos na literatura) e difícil de ser diagnosticada. A maioria dos casos é secundária a carcinoides brônquicos, CMT e carcinoma prostático. A secreção combinada de ACTH e CRH é muito mais comum do que a secreção isolada de CRH. Recentemente, foram relatados casos de SC resultante da produção de CRH por tumor pancreático, hamartoma hipotalâmico, metástases hepáticas de CMT, feocromocitoma e carcinoma pulmonar metastático. SÍNDROME DE CUSHING ACTH-INDEPENDENTE DISTÚRBIOSADRENAIS Os distúrbios adrenais primários representam até 30% dos casos da SC. Em geral, são causados por um adenoma (cerca de 80%) ou, menos comumente, um carcinoma produtor de cortisol. Normalmente os adenomas medem menos de 3 cm, são unilaterais e facilmente visualizados à tomografia computadorizada (TC) ou à ressonância magnética (RM). 34,35Causas muito raras de SC de origem adrenal são a hiperplasia nodular pigmentada primária bilateral, o complexo de Carney, a hiperplasia adrenal macronodular bilateral e a síndrome de McCuneAlbright (SMA). Em crianças com idade < 5 anos, os tumores adrenais, sobretudo os carcinomas, destacam-se como uma das principais causas, senão a mais prevalente; Carcinomas Os carcinomas adrenocorticais (CAC) representam cerca de 20% do total de casos de SC ACTH- independentes. Geralmente, são grandes (> 6 cm), quando diagnosticados, e até 10% são bilaterais. Sua distinção histológica com os adenomas pode ser, contudo, difícil. Devem ser sempre suspeitados, quando o tumor adrenal for > 6 cm e/ou cursar com hipercortisolismo associado a marcante hiperandrogenismo, na presença de achados à TC sugestivos de malignidade (ver adiante). A incidência dos CAC é de, aproximadamente, 0,2 por milhão ao ano. Eles são 1,5 vez mais comuns em mulheres e têm uma distribuição etária bimodal, com picos na infância e na adolescência, bem como ao final da vida. Estimulação de neurônios hipotalâmicos induz a liberação de hormônio coticotrófico (CRH) na hipófise que libera na corrente sanguínea o hormônio ACTH. Estes agindo em receptores acoplados à proteína G estimula a síntese e liberação de cortisol e pequenas quantidades de andrógenos. O cortisol atuando sobre o hipotálamo e hipófise anterior inibe a liberação de ACTH. A este mecanismo de controle é dado o nome de retroalimentação negativa (feedback negativo). Pense que forma inteligente de controle – quando tem muito cortisol – é passada a informação para produzir menos. O rompimento deste controle significa um estado patológico. O córtex da adrenal é formado por três zonas concêntricas – reticular, fasciculada e glomerulosa. Na primeira, são sintetizados os andrógenos; na segunda, o cortisol; e na terceira, a mais externa, o mineralocorticoide aldosterona. Esta, na realidade, é a fonte de andrógenos das mulheres. O controle de síntese e liberação de cortisol é realizado pelo sistema nervoso central – quer por uma via neural direta, quer por uma via hormonal, ativando o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal. A ativação neural está ligada ao processo do despertar, enquanto a via hormonal está ligada ao controle do estresse. O pico de cortisol gerado pela ativação simpática é breve, enquanto o pico de cortisol gerado pelo eixo hipotálamo-hipófise-adrenal é mais longo. Neste caso, o CRF (fator de liberação de corticotrofina) é liberado pelo hipotálamo a partir do núcleo paraventricular. Este peptídeo, de 41 aminoácidos, atua como liberador de ACTH e betaendorfina. O ACTH atua sobre a zona fasciculada da adrenal, levando à liberação de cortisol. Finalmente, o cortisol, atuando sobre o sistema nervoso central, diminui a liberação de CRF e inibe a síntese de ACTH quando atua diretamente na hipófise. Portanto, a administração de altas concentrações de medicamentos que contêm cortisol leva a uma inibição da função adrenal. A este processo de controle dá-se o nome de retroalimentação negativa. Em circunstâncias fisiológicas, ou seja, quando o indivíduo não está exposto a situações de estresse, a secreção do cortisol é regulada pelo ciclo circadiano. Ao longo do dia, o cortisol apresenta concentrações elevadas pela manhã, com pico trinta minutos após acordar, seguindo com queda progressiva no restante do dia e concentrações mais baixas no começo da noite. Este padrão típico de secreção é fundamental para o funcionamento dos demais sistemas do organismo. O cortisol tem efeitos no controle do humor, na resposta imunológica e no metabolismo de carboidratos, lipídios e proteico. Ele altera de forma importante o metabolismo ósseo e con- centrações altas estão associadas à osteoporose. Os glicocorticoides também aumentam a função cardíaca e o tônus vascular periférico. Este é o hormônio do alerta, do estresse e da defesa, tendo, portanto, efeito sobre diferentes funções biológicas. Complicações Hiperplasia adrenal congênita: Bloqueio na produção de cortisol por uma deficiência enzimática, mais comum a 21-hidroxilase (CYP21). Consequentemente tem um acúmulo da 17 hidroxiprogesterona desloca para androstenediona e testosterona promove características virilizante Correlacionar as manifestações clínicas com os achados diagnósticos da Síndrome de Cushing Quanto à Doença de Cushing (DC) refere-se ao hipercortisolismo causado pela secreção excessiva de hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) por lesão hipofisária, sendo essa a causa mais frequente de SC endógena. O principal glicocorticoide produzido pelo córtex da glândula suprarrenal é o cortisol. Em excesso, pode conduzir a uma gama de sintomas, podendo, inclusive, apresentar sinais neuropsiquiátricos de ansiedade, depressão, psicose, instabilidade emocional e apatia. Em indivíduos saudáveis, a homeostase fisiológica dos corticotróficos é ajustada por fatores hipotalâmicos estimulatórios e inibitórios e pelo ciclo de feedback negativo dos glicocorticoides das glândulas suprarrenais. No entanto, o tumor produtor de ACTH presente na DC é insensível às inibições que ocorreriam normalmente, resultando, assim, em um sistema incapaz de se autorregular e, consequentemente, em níveis aumentados de glicocorticoides causando o hipercortisolismo. O diagnóstico da DC pode ser um desafio clínico. Alguns pacientes apresentam alguns dos sinais e sintomas característicos, como mal-estar generalizado, obesidade e fraqueza muscular, porém o diagnóstico pode ser lento pois parte da sua manifestação ainda permanece ampla e não específica. Outros sintomas, incluindo suor excessivo, pelos no corpo, ansiedade, depressão, facilidade de obter hematomas e irritabilidade, são difíceis de diagnosticar, e não são inicialmente alarmantes aos pacientes ou se apresentam de forma gradativa o suficiente para serem notados apenas em retrospecto. Além disso, o diagnóstico laboratorial não é totalmente preciso, por vezes é demorado e incômodo ao paciente e pode apresentar resultados inicialmente confusos. Em paralelo a isto, vê-se que a doença está associada ao aumento da mortalidade e a complicações variadas devido à adiposidade visceral, resistência à insulina, hipertensão e hipercoagulabilidade, levando a riscos como doença cardíaca isquêmica, doença cerebrovascular, diabetes mellitus (secundária ao hipercortisolismo), osteoporose e infecções (devido ao estado de imunossupressão). Alguns destes riscos podem persistir mesmo após a remissão da doença. A DC apresenta-se principalmente pelo ganho de peso em obesidade central, fadiga com miopatia proximal, afinamento da pele com estrias arroxeadas e hematomas difusos. Alguns pacientes apresentam menores picos de hipercortisolismo, com diagnóstico alcançado depois de muitos anos e consultas médicas. As manifestações do hipercortisolismo incluem hipertensão, distribuição anormal de gordura, pele fina sensível a hematomas, fraqueza muscular, osteoporose, hirsutismo e disfunção gonadal. Os pacientes com DC também podem apresentar uma ampla variedade de sintomas psiquiátricos, incluindo depressão, instabilidade emocional, deficiências cognitivas, apatia, ansiedade e psicose. No caso de pseudocushing, definida pela condição na qual os pacientes apresentam o quadro clínico e níveis de cortisol anormais, porém não é causado por disfunções eixo hipotálamo- hipófise-adrenal, a manifestação se dá de maneira parcial apresentando obesidade, estresse, diabetes mellitus descontrolado e síndrome do ovário policístico(SOP). Dessa forma, diferenciação do que é DC e pseudocushing nem sempre é muito precisa. Os desafios para diagnosticar tal doença se dão, em parte, pela ampla manifestação. O termo “cushingóide” existe para demonstrar alguns dos sintomas clássicos da doença, porém alguns deles se mostram presentes também em outros distúrbios, como é o caso da obesidade, fraqueza muscular e mal-estar generalizado. Secreção ectópica Os pacientes portadores da síndrome ectópica de ACTH (SEA), particularmente aqueles com doenças malignas como o carcinoma pulmonar de pequenas células, podem apresentar quadro clínico atípico predominando o estado consumptivo (35%) e maior frequência de hipopotassemia (> 70%), hiperpigmentação, osteopenia/osteoporose e alterações metabólicas, como a intolerância à glicose. Além do carcinoma do pulmão, a SEA pode ainda ser secundária a tumores no timo ou no pâncreas, e em casos mais raros carcinoma medular da tireoide ou feocromocitoma. Ainda são possíveis outras manifestações da SC, como as formas ectópicas de fontes não hipofisárias, podendo ocorrer de duas maneiras já descritas na literatura: Síndrome de Cushing Ectópica (SCE) associada a neoplasias agressivas e SCE com tumores indolentes e ocultos. A SCE é considerada uma síndrome paraneoplásica. Dessa forma, as neoplasias que secretam quantidades excessivas de ACTH geralmente se diferenciam a partir de células neuroendócrinas e podem se apresentar em forma delesões benignas e indetectáveis a tumores com metástases múltiplas. Cerca de 50% dos tumores ectópicos causadores da Síndrome de Cushing são pulmonares; se mostrando, em alguns casos, indistinguíveis das características da Doença de Cushing, sendo, portanto, muitas vezes impossível estabelecer diferenciações. A Síndrome de Cushing cíclica é outra forma de manifestação da SC menos frequente, caracterizada por momentos de hipercortisolismo intercalados com outros de normocortisolismo. Tais ciclos podem ser tanto regulares como não; podendo os momentos de cortisol normal durarem por dias ou anos. Tumores adrenocorticais A síndrome de Cushing ACTH-independente é habitualmente causada por uma doença suprarrenal unilateral. De acordo com os diferentes relatos da literatura, a ocorrência de adenoma e carcinoma de suprarrenal pode ser semelhante ou com predomínio dos adenomas. Em crianças, as causas primárias ocorrem em 65% dos pacientes com síndrome de Cushing, sendo a frequência de carcinoma 3 a 4 vezes maior do que a de adenomas. Os carcinomas adrenocorticais são tumores raros, com incidência de 1-2 por milhão de pessoas por ano. Os pacientes com carcinomas adrenocorticais tendem a apresentar uma evolução rápida e progressiva dos sinais clínicos de hipercortisolismo, muitas vezes coexistindo com sinais de virilização (tumores de secreção mista). Além do quadro clínico secundário à hipersecreção hormonal, queixas de dor e desconforto abdominal, acompanhado ou não de massa palpável, são frequentes. A distribuição etária é bimodal, com um primeiro pico na infância e um segundo pico entre a 4ª e 5a décadas da vida. A maioria dos pacientes com carcinoma da suprarrenal apresenta-se com doença metastática no momento do diagnóstico, o que caracteriza um prognóstico reservado da doença. QUADRO CLÍNICO Os sinais considerados mais específicos da SC são: pletora facial, fácies de lua cheia, fraqueza muscular proximal, estrias cutâneas largas e avermelhadas/violáceas (> 1 cm), pele atrófica e fragilidade capilar/equimoses espontâneas num paciente que apresenta ganho de peso ou redistribuição do peso. Uma pista clínica importante para a presença de excesso de glicocorticoide é o desenvolvimento simultâneo e a gravidade crescente de vários desses sintomas. As manifestações clínicas da síndrome de Cushing podem ser categorizadas em reprodutivas, dermatológicas, metabólicas, cardiovasculares, musculoesqueléticas, neuropsiquiátricas e infecciosas. Além da considerável morbidade causada pelo hipercortisolismo, também há um aumento nas taxas de mortalidade. Reprodutivo: ◊ Irregularidades menstruais devido a correlação com o aumento do cortisol sérico e a diminuição das concentrações séricas de estradiol, mas não com as concentrações séricas de androgênio. ◊ Sinais de excesso de andrógeno adrenal. Mulheres com alguns tipos de síndrome de Cushing apresentam sinais de excesso de andrógeno (mais comumente carcinoma adrenal). As glândulas supra-renais são a principal fonte de andrógenos nas mulheres. Por outro lado, os testículos são a principal fonte de andrógenos nos homens. Assim, homens com síndrome de Cushing não apresentam sinais de excesso de androgênio, porque o cortisol não possui atividade androgênica. O excesso de andrógeno nas mulheres afetadas pode causar os seguintes sintomas: hirsutismo, pele facial oleosa e acne no rosto, pescoço ou ombros e virilização. • Dermatológica: Estrias ocorrem quando a pele frágil se estende devido ao aumento do tronco, seios e abdômen. As estrias aparecem como estrias largas, roxo--avermelhadas, porque a pele cada vez mais fina não esconde a cor do sangue venoso na derme subjacente. ◊ Atrofia de pele há perda de gordura subcutânea a um grau suficiente para que os vasos sanguíneos subcutâneos possam ser vistos. A pele eventualmente se torna frágil devido a essas alterações ◊ Infecções fúngicas, especialmente tinea versicolor, são frequentemente encontradas no tronco. ◊ Hiperpigmentação induzida pelo aumento da secreção de ACTH, não de cortisol. ACTH é o principal hormônio pigmentar em humanos. Ele atua através da ligação a receptores de hormônios estimuladores de melanócitos. Metabólicas: ◊ Intolerância à glicose. É principalmente devido à estimulação da gliconeogênese pelo cortisol e resistência periférica à insulina causada pela obesidade, mas a supressão direta da liberação de insulina também pode contribuir. ◊ Obesidade progressiva. A característica mais comum dos pacientes com síndrome de Cushing é a obesidade progressiva central (centrípeta), geralmente envolvendo a face, pescoço, tronco, abdômen e, internamente, canal medular e mediastino. As extremidades são frequentemente poupadas. Cardiovascular ◊ Pacientes com síndrome de Cushing endógena apresentam risco aumentado de morte por doença cardiovascular, incluindo infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral e tromboembolismo. Outros problemas cardiovasculares comuns em pacientes com síndrome de Cushing incluem hipertensão e dislipidemia. • Musculoesqueléticas ◊ Perda muscular e fraqueza proximais, sendo induzidas pelos efeitos catabólicos do excesso de glicocorticoide no músculo esquelético. ◊ Perda óssea. A osteoporose é muito comum na síndrome de Cushing e é causada pela diminuição da absorção intestinal de cálcio, diminuição da formação óssea, aumento da reabsorção óssea e diminuição da reabsorção renal de cálcio. • Neuropsiquiátricas ◊ Podem ocorrer vários sintomas neuropsicológicos, incluindo insônia, depressão e perda de memória. • Infecciosas ◊ Os glicocorticoides inibem a função imune, contribuindo assim para um aumento da frequência de infecções. A inibição da liberação de citocinas contribui com a redução associada nas respostas inflamatórias e febris à infecção bacteriana, podendo dificultar a detecção dessas infecções. DIAGNÓSTICO Antes da avaliação para possível Síndrome de Cushing, é essencial que uma história cuidadosa tenha excluído a ingestão de glicocorticoides exógenos. O diagnóstico de síndrome de Cushing se inicia pela determinação de um estado de hipercortisolismo e da perda do ritmo cicardiano da secreção do cortisol, preferencialmente confirmado por dois testes, visto que quando apenas um teste encontra-se alterado, pode se tratar de pseudo-Cushing. O teste de supressão com dexametasona 1 mg e 2 mg, bem como a medida do cortisol salivar à meia noiteou sérico noturno, e a medida do cortisol urinário de 24 horas são testes de primeira linha para este fim, tendo os dois últimos maiores especificidade e sensibilidade. • Mensuração de cortisol urinário livre: O cortisol urinário livre é elevado (> 120 μg/24h e > 331 nmol/24 h]) em quase todos os pacientes com síndrome de Cushing. Entretanto, vários pacientes com elevações de cortisol urinário livre entre 100 e 150 μg/24 h (276 e 414 nmol/24 h) apresentam obesidade, depressão ou síndrome de ovários policísticos, mas não síndrome de Cushing. Um paciente com suspeita de síndrome de Cushing, com concentração muito elevada de cortisol urinário livre (> 4 vezes o limite superior da normalidade), quase certamente apresenta síndrome de Cushing. Duas a três coletas normais geralmente excluem o diagnóstico. Níveis ligeiramente elevados costumam exigir investigação mais aprofundada, assim como os níveis normais quando a suspeita clínica é alta. Teste de supressão com dexametasona: são administrados 1, 1,5 ou 2 mg de dexametasona, VO, entre 23 e 0 h, e o cortisol plasmático é medido das 8 às 9 h da manhã seguinte. Na maioria dos pacientes normais, esse fármaco diminui o cortisol sérico matinal para < 1,8 μg/mL (< 50 nmol/L), ao passo que os pacientes com síndrome de Cushing praticamente sempre apresentam níveis mais elevados. Um teste mais específico, porém igualmente sensível, é a administração de 0,5 mg de dexametasona, VO, a cada 6 h, por 2 dias (baixa dose). Em geral, uma incapacidade evidente de suprimir as concentrações de cortisol em resposta à baixa dose de dexametasona estabelece o diagnóstico. Medições de cortisol à meia noite: Se os resultados das medições de cortisol urinário livre e do teste de supressão com dexametasona são indeterminados, o paciente é hospitalizado para a medição de cortisol sérico à meia-noite, que provavelmente é mais conclusivo. Alternativamente, amostras de cortisol na saliva podem ser recolhidas e armazenadas na geladeira em casa. O cortisol normalmente tem limites entre 5 e 25 μg/dL (138 a 690 nmol/L) no início da manhã (6 a 8h) e diminui gradualmente para < 1,8 μg/dL (< 50 nmol/L) à meia-noite. Uma vez confirmado o hipercortisolismo endógeno, o segundo passo na investigação é determinar se a síndrome de Cushing é dependente ou independente de ACTH, que se faz pela medida de duas amostras do ACTH plasmático. Se o paciente tiver síndrome de Cushing independente de corticotropina (ACTH), a tomografia computadorizada (TC) das glândulas suprarrenais é geralmente o próximo procedimento, procurando uma massa adrenal. Caso a medida de ACTH plasmático se encontre maior do que 20 pg/dL, o diagnóstico de doença de Cushing pode ser feito mediante a presença de uma lesão > 6mm de diâmetro na ressonância magnética de hipófise, pelo teste do hormônio liberador de corticotrofina (CRH) e o teste de supressão após alta dose de dexametasona. Pacientes com doença dependente de ACTH devem ser submetidos a testes não invasivos (teste de supressão de altas doses de dexametasona e teste de estimulação do hormônio liberador de corticotropina [CRH]). A supressão do cortisol durante a administração de dexametasona, associada a aumentos no ACTH plasmático e no cortisol sérico após a administração de CRH, é consistente com o diagnóstico de adenoma hipofisário (doença de Cushing). As imagens de RM de alta resolução sem sutura e com gadolínio da sela turca devem ser obtidas antes da amostragem do seio petrosal para excluir um tumor com mais de 6 mm de tamanho, o que pode evitar a necessidade de amostragem venosa. O procedimento também é indicado antes da exploração transesfenoidal para documentar a anatomia da sela turcica. O resultado inconclusivo após a realização destes exames indica o cateterismo do seio petroso inferior, padrão ouro para o diagnóstico de doença de Cushing. A maneira mais direta de demonstrar a hipersecreção de ACTH na hipófise é documentar um gradiente de ACTH central- periférico no sangue que drena o tumor. O seio venoso petroso drena a hipófise através do seio cavernoso. Para realizar esse procedimento, os cateteres são inseridos pelas veias jugular ou femoral nas duas veias petrosais inferiores. REFERÊNCIAS Guerrero J. Para entender la acción de cortisol en inflamación aguda: una mirada desde la glándula suprarrenal hasta la célula blanco [Understanding cortisol action in acute inflammation: A view from the adrenal gland to the target cell]. Rev Med Chil. 2017 Feb;145(2):230-239. Spanish. doi: 10.4067/S0034-98872017000200011. PMID: 28453590. REIS, Ana Amélia do Nascimento. Distúrbios das glândulas suprarrenais. 2016. Tese de Doutorado. TORTORA, Gerard. J.; DERRICKSON, Bryan. Princípios de Anatomia e fisiologia. 14. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. VILAR, Lúcio. Endocrinologia Clínica- Editora Guanabara Koogan, 2021;