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traumatismo crânio encefálico Antes de partimos para o atendimento em si, vamos relembrar, rapidamente, um pouco da anatomia cranioencefálica. Este entendimento é valioso, visto que, os aspectos anatômicos podem influenciar nos padrões de TCE. - Couro cabeludo: lacerações no couro cabeludo podem gerar repercussões hemodinâmicas importantes no paciente. Devido a extensa vascularização, traumas nessa região podem levar a uma perda sanguínea significativa, suficiente para provocar um choque hemorrágico. - Crânio: corresponde a estrutura óssea de proteção do cérebro. Por ser uma estrutura rígida, não expansível, qualquer alteração no volume intracraniano pode levar a graves repercussões. - Meninges: correspondem a proteção membranosa do cérebro e são representadas por três camadas: dura-máter, aracnoide e pia-máter. A dura-máter é uma camada resistente e está aderida a superfície interna do crânio. Entre a dura-máter e o crânio há o espaço epidural, por onde passam as artérias meníngeas. Traumas nesses vasos podem levar a formação de grandes hematomas epidurais, com rápida deterioração do estado clínico da vítima. Abaixo da dura-máter, encontra-se a aracnóide, que é uma meninge fina e transparente. Como essas duas membranas não são aderidas, há um espaço potencial entre elas, chamado de espaço subdural. Lesões nas veias pontes pode levar a formação de um hematoma subdural. Por fim, a terceira meninge corresponde a pia-máter, que está firmemente aderida a superfície cerebral. Entre a aracnóide e a pia-máter, há o espaço subaracnóideo, preenchido pelo líquido cefalorraquidiano (LCR). As hemorragias que ocorrem dentro desse espaço são chamadas de hemorragias subaracnóideas, e costumam ocorrer nos casos de contusão cerebral ou grandes traumas vasculares na base do encéfalo. - Encéfalo: corresponde a uma porção do sistema nervoso central (SNC), sendo formado pelo cérebro, cerebelo e pelo tronco cerebral, que por sua vez, é formado pelo mesencéfalo, bulbo e ponte. - Sistema Ventricular: corresponde a um sistema de espaços e aquedutos, localizado no encéfalo e preenchido por LCR, que é constantemente renovado. A presença de sangue nesse líquido prejudica a sua absorção, podendo resultar em um aumento da pressão intracraniana. - Compartimentos intracranianos: a cavidade craniana é dividida pela tenda do cerebelo em um compartimento supratentorial e um compartimento infratentorial. Nessa tenda há uma incisura, que é por onde, habitualmente, ocorre a herniação do úncus (região medial do lobo temporal), nos casos de aumento da pressão intracraniana. Os profissionais de saúde que assistem pacientes com traumatismo craniano devem saber que (1) um traumatismo raquimedular muitas vezes acompanha um traumatismo craniano, e deve-se ter a cautela na forma de manusear o paciente para evitar a compressão da medula devido a instabilidade da coluna vertebral; (2) a intoxicação é um fator comum associado à lesão cerebral traumática e, quando apropriado, deve-se proceder à pesquisa de drogas e álcool; e (3) lesões adicionais, incluindo ruptura de órgãos abdominais, podem acarretar colapso vascular ou angústia respiratória, os quais exigem atenção imediata. ➔ Concussão Essa forma de traumatismo craniano leve refere-se à perda imediata e transitória de consciência, associada a um curto período de amnésia. Muitos pacientes não perdem a consciência após traumatismo craniano leve, mas ficam atordoados ou confusos, ou sentem-se desorientados ou "vendo estrelas''. A concussão grave pode desencadear uma crise epiléptica breve ou sinais autonômicos como palidez facial, bradicardia, desmaio com hipotensão discreta, ou reação pupilar lenta à luz, porém a maioria dos pacientes logo se apresenta neurologicamente normal. A mecânica da concussão típica envolve a desaceleração súbita da cabeça ao colidir com um objeto. Isso gera um movimento anteroposterior do cérebro dentro do crânio, devido à inércia e rotação dos hemisférios cerebrais sobre a parte superior relativamente fixa do tronco encefálico. A TC e a RM costumam ser normais; contudo, em um pequeno número de pacientes, verifica-se a presença de fratura de crânio, hemorragia intracraniana ou contusão cerebral. Um período breve de amnésia retrógrada e anterógrada é característica da concussão e cede rapidamente em pacientes alertas. A perda de memória se estende aos momentos antes do impacto, mas pode abranger dias ou semanas (raramente meses). No caso de lesões graves, o grau de amnésia retrógrada correlaciona-se aproximadamente com a gravidade do traumatismo. ➔ Contusão, hemorragia cerebral e lesão axonal por cisalhamento Uma equimose superficial do cérebro, ou contusão, consiste em graus variáveis de hemorragia petequial, edema e destruição tecidual. As contusões e hemorragias mais profundas resultam de forças mecânicas que deslocam e comprimem vigorosamente os hemisférios e de desaceleração do cérebro contra a parte interna do crânio, seja sob um ponto de impacto (lesão por golpe), seja quando o cérebro balança de volta, na área antipolar (lesão por contragolpe). Um traumatismo suficiente para causar inconsciência prolongada em geral produz algum grau de contusão. Os sinais clínicos de contusão são determinados pela localização e pelo tamanho da lesão; com frequência, não há anormalidades neurológicas focais, porém essas regiões lesionadas constituem, posteriormente, os locais de cicatrizes gliais que podem produzir crises epilépticas. Hemiparesia ou preferência do olhar são típicas de contusões de tamanho moderado. Contusões bilaterais grandes provocam coma e postura em extensão, enquanto aquelas limitadas aos lobos frontais produzem um estado taciturno. As contusões no lobo temporal podem causar delirium ou uma síndrome agressiva, combativa. As contusões são facilmente visíveis à TC e à RM, aparecendo no início como hiperdensidades heterogêneas na TC e como áreas de sinal hiperintenso em sequências na RM que detectam sangue; em geral, há edema cerebral focal e algum grau de hemorragia subaracnóidea. A presença de sangue no líquido cerebrospinal (LCS) devido a traumatismo pode provocar reação inflamatória leve. Por motivos inexplicados, as hemorragias cerebrais profundas podem demorar vários dias para surgir após traumatismo grave. Portanto, deterioração neurológica súbita em paciente comatoso ou elevação abrupta da pressão intracraniana (PIC) sugerem essa complicação e devem motivar avaliação por TC. Nesses casos de hemorragia intraparenquimatosa, a intervenção cirúrgica está indicada quando há evidência de efeito de massa, ou seja, o paciente apresenta uma piora neurológica progressiva com hipertensão intracraniana refratária. Além disso, também são indicações de cirurgia os hematomas maiores que 50cm³ com GSC < 9, associados a desvio de linha média > 5mm. Um tipo de lesão especial da substância branca profunda consiste na ruptura mecânica difusa, ou cisalhamento, de axônios no momento do impacto. O achado mais típico são pequenas áreas de lesão tecidual no corpo caloso e na ponte dorsolateral. A presença de comprometimento difuso dos axônios em ambos os hemisférios, um estado denominado lesão axonal difusa (LAD), é uma explicação proposta para o coma e o estado vegetativo persistente após traumatismo craniano fechado, mas pequenas lesões isquêmico-hemorrágicas em mesencéfalo e tálamo são com igual frequência a causa. ➔ Fraturas de crânio Um golpe no crânio que excede a tolerância elástica do osso causa fratura. Lesões intracranianas acompanham 66% das fraturas de crânio, e a presença de uma fratura aumenta em muitas vezes a chance de hematoma subdural ou extradural subjacente. Em consequência, as fraturas são, principalmente, indicadores do local e da gravidade do traumatismo. Constituem também vias potenciais para a entrada de bactérias no LCS, com risco de meningite, e para o extravasamento de LCS por meio da dura-máter. Ocorre cefaleia ortostática intensa em consequência da redução da pressão no compartimento liquórico. A maioria das fraturasé linear e estende-se do ponto de impacto em direção à base do crânio. Embora não tenha maiores complicações, a maioria das fraturas da base do crânio pode causar extravasamento de LCS, pneumoencéfalo e fístulas cavernoso-carotídeas. Hemotímpano (sangue atrás da membrana timpânica), equimose tardia sobre o processo mastóide (sinal de Battle) ou equimose periorbital ("sinal do guaxinim") estão associados a fraturas basilares. Fraturas selares, mesmo aquelas associadas à disfunção neuroendócrina grave, às vezes são radiologicamente ocultas, ou evidenciam-se apenas por um nível hidroaéreo no seio esfenoide. Fraturas do dorso da sela podem causar paralisias do sexto ou do sétimo nervos cranianos ou lesão do nervo óptico. As fraturas do osso petroso, especialmente aquelas orientadas com o eixo longitudinal do osso, podem ser acompanhadas de paralisia facial, ruptura dos ossículos da orelha e otorreia de LCS. As fraturas do osso frontal em geral são com afundamento, acometendo os seios frontais e etmoidais e as órbitas. As fraturas com afundamento do crânio são compostas, mas, com frequência, assintomáticas porque a energia do impacto dissipa-se ao quebrar o osso; algumas têm contusões cerebrais subjacentes. Desbridamento imediato e exploração das fraturas compostas são indispensáveis para evitar infecção; as fraturas simples não exigem cirurgia. ➔ Lesões de nervos cranianos Os nervos cranianos mais frequentemente lesionados nos traumatismos cranianos são o olfatório, óptico, oculomotor e troclear; o primeiro e o segundo ramos do trigêmeo; e os nervos facial e vestíbulo coclear. Anosmia e perda aparente da gustação ocorrem em cerca de 10% das pessoas com traumatismo craniano grave, em especial por quedas sobre a parte posterior da cabeça. Essa sequela resulta de deslocamento do cérebro e cisalhamento de filamentos finos do nervo olfatório que seguem o seu trajeto através da lâmina cribriforme. Lesão do nervo facial por uma fratura basal manifesta-se imediatamente em 3% dos traumatismos graves; também pode demorar 5 a 7 dias para aparecer. As fraturas através do osso petroso, em particular do tipo transversal menos comum, são propensas a causar paralisia facial. A lesão do oitavo nervo craniano por uma fratura do osso petroso causa perda auditiva, vertigem e nistagmo imediatamente após a lesão. ➔ Crises epilépticas As crises convulsivas são surpreendentemente incomuns imediatamente após um traumatismo craniano, mas pode haver um breve período de postura extensora tônica ou alguns movimentos clônicos dos membros logo após o momento do impacto. Contudo, as cicatrizes corticais superficiais que resultam das contusões são altamente epileptogênicas e depois podem manifestar-se como crises epilépticas, mesmo após muitos meses ou anos. A intensidade do traumatismo determina aproximadamente o risco de crises epilépticas futuras. Estimou-se que 17% dos indivíduos com contusão cerebral, hematoma subdural, ou perda prolongada de consciência apresentarão um distúrbio epiléptico, e que esse risco estende-se por um tempo indefinido, enquanto o risco é de 2% ou menos após traumatismo leve. A maioria das crises epilépticas no último grupo ocorre nos primeiros 5 anos após o traumatismo, mas seu início pode demorar décadas. ➔ Hematomas subdurais e extradurais As hemorragias sob a dura-máter (subdurais) ou entre esta e o crânio (extradurais) têm características clínicas e radiológicas próprias. O efeito expansivo e a elevação da PIC causados por esses hematomas podem pôr em risco a vida, o que torna obrigatório identificá-los imediatamente por TC ou RM e, quando apropriado, evacuá-los. - Subdural agudo Aqui, a principal causa é a ruptura de pequenos vasos superficiais ou vasos ponte do córtex cerebral, de modo que não mais ocorre o deslocamento da dura e aí o sangue se acumula no espaço subaracnoide. Por conta disso, na TC, ele se apresenta com aspecto côncavo-convexo (meio que acompanhando o contorno do cérebro). As forças de aceleração em si, como na lesão em chicotada, às vezes são suficientes para produzir hemorragia subdural. Até 33% dos pacientes têm um intervalo lúcido durante minutos a horas antes de o coma sobrevir, porém a maioria apresenta-se sonolenta ou comatosa desde o momento da lesão. Cefaleia unilateral e midríase discreta no lado do hematoma estão frequentemente, mas nem sempre, presentes. Estupor ou coma, hemiparesia e aumento pupilar unilateral são os sinais dos hematomas maiores. Os hematomas subdurais pequenos podem ser assintomáticos e em geral não precisam de evacuação se não sofrerem expansão. Uma síndrome de evolução subaguda devida a hematoma subdural ocorre dias a semanas após o traumatismo, com sonolência, cefaleia, confusão ou hemiparesia leve, habitualmente em alcoolistas e no idoso e, com frequência, após traumatismo apenas leve. A descompressão cirúrgica deverá ser feita nas situações em que o hematoma apresentar espessura > 10mm ou houver evidência na TC de desvio de linha média > 5 mm. Além disso, a cirurgia é recomendada para os pacientes que apresentarem uma queda de 2 pontos na GSC a partir do momento da admissão, pupilas assimétricas ou uma pressão intracraniana sustentada > 20mmHg. - Extradural agudo O hematoma epidural é um tipo relativamente raro, estando presente em apenas 0,5% dos pacientes com TCE (chegando até 9% nos casos de pacientes com TCE associado a coma). E apesar de ele poder ser causado pela ruptura de algum seio venoso, o mais comum é ele advir de um sangramento arterial devido a lesão da Artéria Meníngea Média. Esses hematomas evoluem com mais rapidez que os hematomas subdurais, portanto são mais traiçoeiros. A maioria dos pacientes está inconsciente quando socorrida. Um "intervalo lúcido" de vários minutos a horas antes que sobrevenha o coma é mais típico da hemorragia extradural, mas ainda é incomum e a hemorragia extradural não é a única causa dessa sequência de eventos. Indicam-se evacuação cirúrgica rápida e ligadura ou cauterização do vaso lesionado, em geral a artéria meníngea média lacerada por uma fratura do crânio sobrejacente. O tratamento cirúrgico desse hematoma está indicado quando seu volume é maior que 30cm³, independente da pontuação na GSC; ou quando o paciente com GSC ≤ 8 apresenta anisocoria, ou seja, uma reatividade desigual das pupilas. ➔ Tratamento - Traumatismo leve O paciente que teve breve perda da consciência ou que ficou atordoado depois de um traumatismo craniano leve torna-se, em geral, totalmente alerta e atento dentro de poucos minutos, mas pode queixar-se de cefaleia, tontura, desmaio, náusea, episódio único de vômitos, dificuldade de concentração, breve período de amnésia ou leve turvação da visão. Essa síndrome de concussão típica tem bom prognóstico, com pouco risco de deterioração subsequente. Cefaleia intensa persistente e vômitos repetidos sem alteração da consciência e sem sinais neurológicos focais em geral são benignos, mas deve-se obter uma TC, e um período de observação mais longo é apropriado. A decisão de solicitar exames de imagem também depende dos sinais clínicos sugestivos de que o impacto foi grave (p. ex., concussão prolongada, hematoma periorbital ou mastóide, vômitos repetidos, fratura de crânio palpável), da gravidade de outras lesões corporais e do grau de vigilância que se pode esperar após a alta. Dois estudos indicaram que idade mais avançada, dois ou mais episódios de vômitos, amnésia anterógrada persistente ou retrógrada por mais de 30 min, crise epiléptica e intoxicação concomitante por fármaco ou álcool são indicadores sensíveis (mas não específicos) de hemorragia intracraniana que justificam a obtenção de TC. É apropriado ser mais liberal na solicitação de TC em crianças, pois um pequeno número, mesmo sem perda da consciência, exibirá lesões intracranianas. - Traumatismo intermediário Os pacientes que não estão totalmente alertas ou que apresentam confusão persistente, alterações de comportamento, tontura extrema ou sinais neurológicos focais como hemiparesia devemser hospitalizados e submetidos a uma TC. Em geral, encontra-se uma contusão ou hematoma cerebral. As síndromes comuns incluem: (1) delirium com recusa a ser examinado ou movido, agressividade verbal e resistência se for perturbado (contusões do lobo temporal anterior); (2) estado mental quieto, desinteressado, lento (abulia), alternando com irascibilidade (contusões frontal inferior e frontopolar); (3) déficit focal como afasia ou hemiparesia leve (devida a hematoma subdural ou contusão da convexidade ou, menos frequentemente, dissecção da artéria carótida); (4) confusão e desatenção, baixo desempenho em tarefas mentais simples e orientação flutuante (associada a vários tipos de lesões, incluindo as descritas anteriormente e com contusões frontais mediais e hematoma subdural inter-hemisférico); (5) vômitos repetidos, nistagmo, sonolência e instabilidade (concussão labiríntica, mas às vezes devido a hematoma subdural na fossa posterior ou dissecção da artéria vertebral); ( 6) diabetes insípido (lesão da eminência mediana ou do pedículo hipofisário). As lesões de grau intermediário muitas vezes são complicadas por intoxicação por drogas ou álcool, e pode haver traumatismo raquimedular cervical clinicamente não evidenciado. Após remoção cirúrgica apropriada de hematomas, a maioria dos pacientes nessa categoria melhora ao longo de várias semanas. - Traumatismo grave Os pacientes em coma desde o momento da lesão exigem assistência neurológica imediata e reanimação. Após a intubação, avaliam-se, tendo-se o cuidado de imobilizar a coluna cervical, a profundidade do coma, o tamanho e a reatividade das pupilas, os movimentos dos membros e os sinais piramidais. Tão logo as funções vitais permitam e tenham-se obtido radiografias da coluna cervical e uma TC, o paciente deve ser transportado para uma unidade de terapia crítica. A hipoxia deve ser revertida e deve-se utilizar soro fisiológico a 0,9% como solução na reanimação, em lugar de albumina. O achado de um hematoma extradural ou subdural ou hemorragia intracerebral extensa são indicações para cirurgia imediata e descompressão intracraniana nos pacientes que possam ser recuperados nos demais aspectos. O uso de medicamentos antiepilépticos profiláticos tem sido recomendado, porém existem poucos dados que sustentem essa conduta. No traumatismo craniano grave, constatou-se que as manifestações clínicas de abertura ocular, melhor resposta motora dos membros e emissão verbal são fatores preditivos do prognóstico. Essas três respostas são avaliadas pela Escala de Coma de Glasgow; atribui-se um escore entre 3 e 15. Mais de 85% dos pacientes com escores agregados menores que 5 morrem dentro de 24 h. Contudo, um grupo de pacientes com escores um pouco mais altos, incluindo alguns sem resposta pupilar à luz, sobrevivem, o que sugere que o tratamento inicial agressivo justifica-se na maioria dos pacientes. Idade mais avançada, PIC elevada, hipoxia ou hipotensão precoce, compressão do tronco encefálico na TC ou RM e atraso na evacuação de hemorragias intracranianas grandes são indicadores de prognóstico sombrio. ➔ Avaliação Uma análise rápida da cinemática da lesão, combinada com uma avaliação primária rápida (ABCDE), ajudará a identificar possíveis problemas de ameaça à vida em um doente com suspeita de TCE. - Via aérea (Airway) A patência das vias aéreas do doente deve ser examinada e assegurada. Em indivíduos inconscientes, a língua pode obstruir totalmente a via aérea. Ventilações barulhentas indicam obstrução parcial pela língua ou corpo estranho. Êmese, hemorragia e edema causados pelo trauma facial são causas comuns do comprometimento das vias aéreas em doentes com TCE. - Respiração (Breath) A avaliação da função respiratória deve incluir a observação da frequência ventilatória, profundidade e eficiência da ventilação. O fornecimento de oxigênio adequado para o cérebro lesionado é uma parte essencial do esforço para limitar a lesão cerebral secundária. Deixar de manter o SpO2 acima de 90% parece provocar resultados muito mais insatisfatórios para doentes de lesão cerebral; manter o SpO2 acima de 90% é essencial. Avaliar as vias aéreas adequadas e o esforço ventilatório é crucial nos primeiros estágios do tratamento de TCE. - Circulação (Circulation) Manter uma pressão arterial sistólica acima de 90 mmHg é essencial para limitar a lesão cerebral secundária nas vítimas de TCE. Portanto, o controle da hemorragia e a prevenção e tratamento de choque são essenciais. Os socorristas devem observar e quantificar a evidência de sangramento externo, se possível, e controlar a hemorragia rapidamente. Na ausência da perda de sangue externo significativo, uma pulsação fraca e rápida, em uma vítima de trauma contuso, sugere hemorragia interna e risco de vida nos espaços pleurais, peritônio, retroperitônio ou tecidos moles ao redor de fraturas de ossos longos. A PIC aumentada pode levar a uma série de alterações vasculares conhecidas, como a herniação da massa encefálica. À medida que a PIC aumenta e o fluxo sanguíneo cerebral é afetado, o cérebro e o tronco cerebral tornam-se hipóxicos. Isso causa a estimulação do sistema nervoso simpático na tentativa de aumentar a pressão arterial. Com o aumento na pressão arterial, o sistema parassimpático desacelera o coração; e a bradicardia então se manifesta. Este efeito é conhecido como reflexo de Cushing. A tríade de Cushing descreve a combinação de achados que ocorrem com a PIC aumentada: pulso lento, pressão arterial aumentada associada a uma pressão de pulso ampliada e respirações irregulares, como respiração Cheyne-Stokes. - Incapacidade (Disability) Durante a avaliação primária e após o início das medidas adequadas para tratar os problemas identificados nas avaliações da via aérea, respiração e circulação, um escore basal da Escala de Coma de Glasgow (GCS) deve ser calculado para avaliar precisamente o nível de consciência do doente. Se o doente estiver entubado, o escore será calculado a partir somente das escalas ocular e motora, e um "T" será adicionado para marcar a incapacidade de avaliar a resposta verbal, tal como "8T". Geralmente é aceito que um escore de 13 a 15 provavelmente indique TCE leve, enquanto que um escore de 9 a 12 seja indicativo de TCE moderado. Um escore da GCS de 3 a 8 sugere TCE grave. É óbvio que muitos fatores podem afetar a GSC, incluindo a presença de intoxicantes ou outros medicamentos. Além disso, um doente morto ainda tem um escore de 3. Na 10ª edição do ATLS algumas mudanças foram propostas na Escala de Coma de Glasgow, entre elas temos a reatividade pupilar. Na antiga versão da escala, os únicos critérios avaliados eram: abertura ocular, resposta verbal e resposta motora. Agora, na nova versão, foi incluída a Reatividade Pupilar, ou seja, a reatividade da pupila à luz. Ao contrário dos outros critérios, este é pontuado de forma decrescente: o pior resultado apresenta a maior pontuação. Assim, teremos a seguinte atribuição: 2 pontos – Nenhuma reatividade em ambas as pupilas; 1 ponto – Sem reação em apenas uma das pupilas; 0 pontos – Caso as duas pupilas estejam funcionando normalmente. Pontuaremos normalmente todos os outros critérios e, após a nota final, o score da reatividade pupilar será subtraído! O que faz com que a escala varie de 1 a 15 pontos. Caso todos os critérios estejam normais, teremos um escore de 15 (afinal, as pupilas normais significam 0 pontos a menos!). Entretanto, caso o paciente apresente a menor pontuação em todos os critérios, teremos o escore final de 1! - Exposição (Exposure) Doentes que sofreram um TCE frequentemente apresentam outras lesões que ameaçam a vida e membros, assim como o cérebro. Todas essas lesões devem ser identificadas. O corpo inteiro deve ser examinado para outros problemas potencialmente fatais. Após a avaliação primária, é importante ter um histórico SAMPLE (symptoms (sintomas), allergies (alergias), medications (medicamentos), past history (histórico passado), last meal (última refeição), events (eventos)do doente, membros da família ou de pessoas que estavam por perto se o tempo e as circunstâncias permitirem. Diabetes mellitus, distúrbios de convulsão e intoxicação medicamentosa ou alcoólica podem disfarçar o TCE. Qualquer evidência de uso de medicamento ou superdosagem deve ser observada. O doente pode ter um histórico anterior de lesão na cabeça e pode reclamar de dor de cabeça persistente ou recorrente, distúrbios visuais, náusea e vômito ou dificuldade de falar. É importante reavaliar a GCS e determinar quais alterações estão ocorrendo com o passar do tempo. O doente que inicialmente apresentou um escore da GCS que agora está diminuindo é de preocupação muito maior para TCE grave do que um doente que apresenta um escore da GCS melhorando. Aproximadamente 3% dos doentes com lesão cerebral aparentemente leve (GCS de 14 ou 15) podem experimentar uma deterioração inesperada do seu estado mental. Durante o transporte, tanto a avaliação primária quanto a avaliação da GCS devem ser repetidas em intervalos frequentes. Doentes cuja GCS piora em mais de dois pontos durante o transporte particularmente correm alto risco de um processo patológico contínuo. ➔ Conduta - TCE leve - TCE moderado - TCE grave Em doentes portadores de TCE grave, a hipotensão na admissão é acompanhada de taxa de mortalidade que é maior que o dobro da mortalidade de doentes sem hipotensão. A presença de hipóxia somada à hipotensão está associada a um aumento relativo no risco de mortalidade de 75%. Portanto, é imperativo que a estabilização cardiopulmonar seja alcançada rapidamente. A parada respiratória transitória e a hipóxia são comuns em doentes portadores de lesão cerebral grave e podem causar lesão cerebral secundária. A intubação endotraqueal precoce deve ser realizada em doentes comatosos. Se o doente está hipotenso, deve-se estabelecer a normovolemia logo que possível utilizando-se produtos de sangue, sangue total ou soluções isotônicas conforme a necessidade. Uma TC de urgência deve ser realizada logo que possível após a normalização hemodinâmica. Deve ser repetida sempre que houver mudança no estado clínico do doente e rotineiramente durante as 24 horas após o trauma naqueles com contusão ou hematoma à TC inicial. O suporte nutricional precoce é recomendado em pacientes com TCE, devendo ser iniciada assim que a estabilidade hemodinâmica for obtida. Estudos mostram que o início precoce da dieta está associado à melhores resultados de sobrevida e melhores taxas de recuperação pós-lesão neuronal. O início precoce de suporte nutricional está associado a um aumento na função imunológica dos pacientes, com aumento dos valores de células T CD4, relação CD4-CD8 e linfócitos T mais responsivos. ➔ Tratamento clínico Inclui líquidos intravenosos, hiperventilação temporária, manitol, solução salina hipertônica, barbitúricos e anticonvulsivantes. Fluidos intravenosos: administrados conforme a necessidade para manter a normovolemia. O uso de soluções glicosadas pode produzir hiperglicemia, prejudicial ao cérebro lesado; portanto, utilizar solução salina isotônica ou Ringer Lactato. Monitorar níveis séricos de sódio (Na): hiponatremia está associada ao edema cerebral, logo, deve ser prevenida. Hiperventilação: a normocapnia é preferida na maioria dos casos. A hiperventilação deve ser usada apenas em curtos períodos, pois reduz a PaCO2, produzindo vasoconstrição cerebral. Isso leva à diminuição da PIC, mas pode causar isquemia. Utilização prática: reduzir a PIC em doentes que estão se deteriorando com hematoma intracraniano em expansão, até que a craniotomia de emergência seja realizada. Anticonvulsivantes: utilizar apenas quando necessário, pois podem inibir a recuperação cerebral. As convulsões devem ser controladas logo que possível, porque episódios prolongados causam lesão cerebral secundária. Manitol: utilizado para reduzir PIC elevada; a preparação mais utilizada é solução a 20 % (20g de manitol para 100mL de solução). Não administrar em pacientes hipotensos, porque é um potente diurético osmótico. Pacientes euvolêmicos com deterioração neurológica aguda podem receber dose de ataque (1g/kg, rápido). Solução salina hipertônica: utilizada também para reduzir a PIC, em pacientes hipotensos (que não podem utilizar o manitol). Barbitúricos: efetivos em reduzir a PIC refratária a outras medidas, porém não podem ser utilizados com hipotensão ou hipovolemia.
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