Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Anna Beatriz Fonseca | MED UNIFTC 2020 INTRODUÇÃO A pele é composta por 3 camadas: Epiderme, derme e o tecido celular subcutâneo (hipoderme). Um dano nessas camadas pode desorganizar a conformação dessas camadas, em especial a derme, desencadeando uma série de acontecimentos que visam a reparação dessa estrutura com a formação de tecido cicatricial – a cicatriz representa o ponto final do processe de recuperação tecidual. Para o paciente a cicatriz traduz marcas emotivas e pessoais – procedimentos cirúrgicos, traumas, doenças ou aberrações adquiridas no decorrer na vida. A história do exame físico: ▪ Etiologia, história da infecção, sintomas associados (ex.: dor, prurido), exposição à radiação e esteroides. Avaliar tamanho, cor, textura, relação com estruturas normais, contraturas e mudanças com a movimentação. A avaliação da cicatriz pode ser completada com auxílio de alguns exames: ▪ Ultrassonografia com Doppler – fluxo sanguíneo; Ultrassonografia e espectrofotometria – profundidade; Medidores de elasticidade e dureza da pele. FASES O processo de cicatrização apresenta uma cascata de eventos divididos em três fases: !!!Obs.: Importante ressaltar que a cicatrização é um processo contínuo, sendo que uma mesma ferida pode apresentar-se simultaneamente com as três fases, visto que elas se sobrepõem e se completam. FASE INFLAMATÓRIA Inicia-se no momento da lesão cutânea e estende-se até 3-4 dias. O primeiro evento que ocorre é a hemostasia, com a formação do tampão plaquetário – cascata de coagulação (rede de fibrina) -, que tem função de barreira contra a perda sanguínea, além de liberar mediadores inflamatórios (ex.: PDGF – fator de crescimento derivado de plaquetas – e TGF – fator de crescimento transformador beta). Em seguida, por ação de diversas prostaglandinas - , ocorrem vasodilatação, aumento do fluxo sanguíneo e permeabilidade capilar, o que causa extravasamento de líquidos (edema) e facilita o afluxo de células da linhagem branca para o local da lesão – ex.: os neutrófilos são responsáveis pela fagocitose, liberação de substâncias bactericidas e pelo desbridamento – remoção de células e tecidos desvitalizados (privado de vida), retardam a cicatrização por atuarem como substrato para desenvolvimento bacteriano e uma barreira física para o tecido de granulação e epitelização. Os macrófagos liberam mediadores inflamatórios (ex.: citocinas) para atração de fibroblastos – sintetiza fibras – e células endoteliais auxiliando na ativação dos elementos celulares das etapas seguintes. FASE PROLIFERATIVA Inicia-se por volta de 3 dias após a lesão e estende-se até 21 a 30 dias. Os eventos dessas fase são desencadeados e estimulados por mediadores celulares originários das plaquetas, neutrófilos e macrófagos. Na fibroplastia, há migração de fibroblastos – principalmente produção de colágeno III, que fornece força e tênsil à cicatriz –, produção e deposito de colágeno, elastina, fibronectina, glicosaminoglicanos, ácido hialurônico e etc., no leito da ferida. Na neoangiogênese consiste na formação de novos capilares pela proliferação de brotos endoteliais que migram da periferia para o centro da ferida. A união do colágeno e dos outros componentes com os capilares forma o tecido de granulação. A epitelização é o crescimento do novo epitélio para cobrir a ferida, pela multiplicação de queratinócitos – da borda da ferida – e dos anexos dérmicos. FASE DE MATURAÇÃO Inicia-se em torno de 21 dias após a lesão estende-se até meses ou anos. Nessa fase, ocorre a substituição do colágeno III para o colágeno tipo I (mais resistente), até que chegue à proporção de 3:1. Isso leva ao aumento da resistência tênsil da cicatriz conforme ocorrem a reorganização do colágeno e ao aumento de suas ligações •Hemostasia • Inflamação Fase inflamatória (reativa) •Fibroplastia •(Neo)Angiogênese •Reepitelização Fase proliferativa •Contratura •Remodelação da cicatrizFase de maturação Plástica Plástica Deiscência: Abertura espontânea de suturas cirúrgicas Anna Beatriz Fonseca | MED UNIFTC 2020 cruzadas. Além disso, também ocorre a contração da ferida pela ação periférica dos miofibroblastos, remodelando a cicatriz (1/2 anos de duração) – muita MEC, colágeno. Durante o processo cicatricial, vários fatores podem contribuir para melhora ou piora da sua evolução, atrapalhando as fases da cicatrização, podendo instaurar uma ferida crônica – relação com mecanismos bioquímicos e fisiológicos que ocorrem nas fases inflamatória ou proliferativa. Fatores prejudiciais aos processos de inflamação: ▪ Local: Insuficiência arterial, que pode levar a hipóxia tecidual; Insuficiência venosa; Edema; Infecção; Tensão mecânica; Presença de necrose; Corpos estranhos. ▪ Sistêmicos: Idade avançada; Desnutrição; Tabagismo; Diabetes; Imunossupressão (doenças ou medicamentos); Uso de corticoide; Irradiação; Doenças metabólicas e genéticas. !!!Obs.: As feridas agudas têm seu leito células com elevado índice de mitose e fatores de crescimento, além da baixa quantidade de citocinas pró-inflamatórias (prolongam o processo inflamatório) e enzimas proteolíticas (ex.: metaloproteases – degradam o colágeno e inibem diversos processos da cicatrização), já a ferida crônica (3 meses) possui todos os fatores acima ao contrário, com acréscimo de fibroblastos senescentes que são responsáveis pela formação de uma matriz extracelular deteriorada que impede a cicatrização da ferida. Os processos de cicatrização crônicas não acontecem de maneira adequada nas feridas crônicas – permanecem na fase inflamatória. Então, o tratamento está envolvendo, a transformação de crônica em aguda – estimular a formação de tecido de granulação –, para que as fases acontecem de forma coordenada e no tempo correto. TIPOS PR IMEIRA INTENÇÃO Ocorre por aproximação dos bordos em procedimento de cunho cirúrgico em tempo adequado – fechamento imediato por suturas simples, enxertos ou retalhos. As fases inflamatória e de maturação ficam diminuídas, havendo assim uma deposição do tecido de tecido fibrótico em menor quantidade, proporcionando ao paciente um resultado de melhor qualidade e um melhor aspecto estético final. SEGUNDA INTENÇÃO As bordas não são tão próximas – seja por perda considerável da estrutura da pele ou presença de condições desfavoráveis (ex.: desnutrição, má cicatrização, infecção e etc.). Período de duração prolongada das fases cicatriciais, resultando num tecido de má qualidade que favorece ao surgimento de hipertrofia, podendo evoluir para contraturas, bordas e sinequias. TERCEIRA INTENÇÃO Primeira intenção retardada, pois deixa-se para realizar o procedimento por alguns dias, com a intenção de melhorar as condições da região e melhor atenção médica. Essa técnica é utilizada, geralmente, em feridas infecciosas. !!!Obs.: Os enxertos e retalhos são técnicas utilizadas nessa intenção. REEPITELIZAÇÃO Relacionada as lesões localizadas na epiderme ou derme superficial. O fechamento dessas lesões ocorre por multiplicação, migração e distribuição de queratinócitos, apresentando um encurtamento das fases cicatriciais. O resultado final é a ausência visual da cicatriz podendo seguir com uma alteração pigmentar local. FATORES DE CRESCIMENTO EM FERIDAS DE CURA Proteínas que estimulam e ativam a proliferação celular, a angiogênese, mitogênese e a transcrição genética, além de modular resposta inflamatória. ▪ PDGF: Fator de crescimento derivado de plaqueta (derivado de plaquetas, macrófagos, células endoteliais e queratinócitos) – possui função quimiotática para leucócitos, fibroblastos, macrófagos e células do musculo liso, estimula a síntese de colágenos, ativa macrófagos e fibroblastos, possui alta função mitogênica, estimula a produção de fibronectina e ácido hialurônico,auxilia na remodelação e contração de feridas, além de apresentar atividade angiogênica – efeito específico. Anna Beatriz Fonseca | MED UNIFTC 2020 ▪ EGF: Fator de crescimento epidérmico (produzido por macrófagos e plaquetas) – atua, principalmente, na regulação mitótica de fibroblastos, queratinócitos e células endoteliais. ▪ TGF-α: Fator de crescimento transformador (produzido por macrófagos, plaquetas, queratinócitos, linfócitos T etc.) – Possui ação semelhante ao EGF, além de estimular a angiogênese e contração da ferida. ▪ TGF-β: Fator de crescimento transformador (liberados por plaquetas, linfócitos T, células endoteliais, queratinócitos, fibroblastos e principalmente macrófagos) – seus efeitos incluem a migração de queratinócitos, fibroblastos e células endoteliais, estimula a síntese e maturação da matriz extracelular, além de participar no metabolismo do colágeno. Ele mesmo induz sua própria produção. ▪ FGF: Fator de crescimento de fibroblasto (produzido por macrófagos, mastócitos, linfócitos T, fibroblastos e células endoteliais) – potente fator angiogênico, quimiotáxico e mitógênico por fibroblasto e queratinócitos. ▪ VEGF: Fator de crescimento de célula endotelial (produzido por macrófagos e queratinócitos) – aumento da permeabilidade vascular, além de ser mitógênico (estimula a proliferação) das células endoteliais. ▪ KGF: Fator de crescimento de queratinócitos ou FGF-7 (produzido por fibroblastos) e participa da migração, proliferação e diferenciação de queratinócitos. ▪ IGF-1: Fator de crescimento insulino-símile (produzido por fibroblastos e macrófagos) – É um dos principais envolvidos na cicatrização, pois apresentam efeitos endócrinos parecidos ao GH, são potentes agentes anabólicos que estimulam a síntese do colágeno, além de auxiliar na migração de queratinócitos e na proliferação de fibroblastos. Processo Fatores de crescimento envolvidos Migração de neutrófilos TGF-β (1 e 2), interleucinas Migração de macrófagos PDGF, TGF-β (1 e 2), VEGF, IGF, NGF Angiogênese VEGF, FGF, TGF-β (1 e 2), TGF-α, PDGF Fibroplastia PDGF, TGF-β (1 e 2); EGF, IGF, FGF, CTGF, KGF Reepitelização FGF, EGF, NGF, TGF-β (1 e 2) CICATRIZES INÉSTICAS OU PATOLÓGICAS ALARGADAS Decorrentes de tensão excessiva durante a síntese de uma incisão, deiscências, queimaduras e outros traumas, e não a realização de repouso adequado no pós-operatório, além de causas metabólicas de má cicatrização. Na primeira imagem uma descência, e na segunda uma forma de tratamento por sutura elástica – aos poucos trasiona o elástico e a ferida vai cicatrizando – por 2ª intenção, já que a 1ª não aconteceu. HIPERTRÓFICAS E QUELOIDES Representam um crescimento exagerado de tecido fibroso que surge com uma resposta a uma lesão cutânea. Acontece a deposição excessiva de colágeno X degradação de colágeno. ▪ As hipertróficas mantem-se dentro dos limites da cicatriz inicial, crescem no início formando cordões endurecidos, elevados e avermelhados, mas geralmente, regressam com o decorrer dos meses ou anos. ▪ Os queloides têm crescimento mais exacerbado que ultrapassam os limites iniciais da cicatriz, além de não regredirem espontaneamente com o decorrer do tempo. Diferenças clínicas Queloide Hipertróficas Incidência Menos comum Mais comum Sempre precedida por lesão Não Sim Associação anatômica Orelha, ombro e pré-esternal Não Resolução espontânea Não Sim Recorrência após cirurgia Maioria Raro Associação com contratura Não Sim As consequências não são apenas estéticas, uma vez que o desconforto com dor e prurido estão, muitas vezes, associados ao crescimento exagerado de tecido fibroso. (Para queloides, os tratamentos disponíveis ainda não são resolutivos em todos os casos. Anna Beatriz Fonseca | MED UNIFTC 2020 Respectivamente, hipertrófica e queloide. ▪ Epidemiologia: Maior em pessoas de pele escura. O queloide tem sido associado à presença de melanócitos, melanina por ser mais frequentes em negros, orientais e hispânicos. !!!Obs.: Histologia: A cicatriz hipertrófica e queloide mostram abundância de colágeno – tipo III – na derme. O tecido de queloide é predominantemente composto por colágeno tipo I e III alinhados no mesmo plano da epiderme, em oposição ao tecido cicatricial normal, contendo colágeno hipocelular pouco corado, sem nódulos e sem excesso de miofibroblastos. Ambos possuem uma produção aumentada de proteínas derivadas de fibroblastos como a fibronectina, sugerindo persistência patológica dos sinais inflamatórios na ferida em cicatrização ou a falha do down regulation das células da ferida. OUTROS DISTÚRBIOS CONTRATURAS Quanto mais tempo uma ferida demora sem se epitelizar, maior a contração – pelo fibroblasto, colágeno. ▪ Tratamento não cirúrgico (dilatações, massagens, fisioterapia) e cirúrgicos (retalhos, enxertos e etc.). PIGMENTAÇÃO Hipercromia e hipocromia, por fatores genéticos, exposição solar, hormonais e medicamentosa. ▪ Tratamento de hipocromia – expectante, exposição solar, maquiagem; Tratamento de Hipercromia – expectante, proteção solar, ácidos clareadores. TRATAMENTO ▪ Pressoterapia: Compressão (24mmHg) externa e prolongada sobre cicatrizes hipertróficas e queloides; ▪ Tratamento tópico: Gel de silicone – hipertróficas; Creme com óleo de silicone – hipertróficas e queloide; Creme com ácido retinóico – queloides; ▪ Tratamento intralesioal: De corticosteróides (Cuidado para possíveis formações de estrias e teleangictasias. Aconselhável para cicatrizes mais volumosas); ▪ Tratamento cirúrgico: (Tendência a recidivas – retorno). PROCEDIMENTOS ANCILARES ▪ Laser: Empregado como coadjuvante em tratamento de cicatrizes, pois gera calor nos tecidos e inibe a proliferação de fibroblastos e a deposição de colágeno do tipo III; ▪ Subcisão e preenchimentos: Com matérias sintéticos ou biológicos (ex.: gorduras) a fim de corrigir deformidades no contorno, depressões e atrofias; ▪ Dermoabrasão em revisão de cicatriz: ou lixamento cirúrgico da pele (peeling mecânico) – técnica que remove a epiderme e derme superficial fazendo que haja a reorganização das fibras de colágeno paralelas as linhas de tensão da ferida. PREVENÇÃO DAS CICATRIZES INESTÉTICAS ▪ Uso de cauterização deve ser mínima pertos dos bordos da ferida; ▪ Laceração traumática: Desbridamento adequado e irrigação abundante com soro fisiológico ou água esterilizada a fim de remover todo tecido desvitalizado – prevenir infecção; CUIDADOS PÓS-OPEATÓRIOS ▪ Micronutrientes (vitaminas A, C, B) como suplementação; ▪ Fumo deve ser evitado; ▪ Feridas permanecerem em ambiente semiúmido com curativos oclusivos ou semioclusivos até a Reepitelização (48h); ▪ Fios removidos em tempo apropriado – evitar marcas permanentes -. Pode se utilizado fitas adesivas do tipo steri-strips e depois micropore para evitar alargamento; ▪ Usar protetor na cicatriz exposta para evitar hiperpigmentação. Referência: Campos, Humberto. Cirurgia Plástica para estudantes de medicina. 1ª ed. Salvador BA: Editora Sanar, 2020.
Compartilhar