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Resenha: Anotações de um Jovem Médico

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Resenha: Anotações de um Jovem Médico
Observações gerais sobre o livro: leitura obrigatória para estudantes de medicina, principalmente pela honestidade de mostrar “a vida como ela é”:
Ninguém sabe de tudo, às vezes você estará sozinho sem possibilidade de consulta, poderá se deparar com situações em que medidas heroicas serão necessárias ( que podem ter desfechos diversos e consequências que variam no espectro de processo judicial a gratidão eterna), a faculdade não lhe ensinou tudo o que você precisava saber, você vai errar, muitas coisas não estarão em livros nem em artigos apenas na prática, ..., dentre outras tantas lições que é bom ter uma ideia já de agora, antes de iniciar as atividades do internato com a prática médica mais próxima.
A toalha e o galo.
Interessante ler sobre um jovem médico, 104 anos atrás do outro lado do planeta, com as mesmas preocupações que afligem aqui atualmente os recém-formados e graduandos, apenas agravadas pelo isolamento de um hospital rural. Ora, não temos a medicina inteira na cabeça. Todos os fármacos, posologias, técnicas cirúrgicas, condutas emergenciais. E se aparece um caso X, ou Y? Pior, um Z!? Eu sozinha aqui? O que danado farei? Finalmente todos que me admiram e/ou dependem de mim saberão que sou um "Falso Dmitri".
Além de assombrado por todas as possibilidades imagináveis de doenças e complicações que não saberia tratar quando da necessidade, o jovem doutor ainda vive na sombra do lendário médico que o antecedeu, Dr. Leopold - cuidava de 50 pessoas por vez, passava o dia operando, tinha influência para conseguir os melhores equipamentos e insumos e era muito bem quisto por todos – fato que agrava ainda mais a sensação de “impostor” do protagonista em sua estreia profissional. 
O supracitado é um relato com o qual creio que vários colegas se identificariam.
Estreia obstétrica.
Este conto me remeteu a um comentário famoso de uma professora nossa: "O que está no livro é uma coisa, a verdade é outra". O protagonista recém-formado com notas excelentes nas provas da faculdade se depara com a realidade da prática e a diferença abissal entre teoria e ação.
O olho desaparecido.
"mas sou eu quem está aqui...e isso é tudo". Esse conto aborda o erro médico/desfechos negativos ou colaterais e como a prática pode inexoravelmente interferir na vida pessoal do profissional - médico e paciente são enfim ambos humanos. Quando ele conta os assombros da intercorrência ao extrair um dente sem experiência nem supervisão, e no primeiro tocotraumatismo por ele causado ("Tremi por 2 dias, mas após 2 dias a cabeça voltou ao normal"), fica clara a dificuldade de "não trazer para casa" o que foi visto e feito no serviço. 
Faz parte da responsabilidade do profissional médico se preocupar com a adequação de suas condutas, reavaliá-las, e quando cabível arcar com as consequências de equívocos, mas também é essencial manejar psicologicamente esses eventos para evitar adoecimento.
Garganta de aço: é interessante ver a relação médico-paciente-família nesse conto, em que há, sem censura nem remorso, violência e raiva incontida numa situação de emergência, com xingamentos e destratos entre o médico e os familiares.
Fica muito evidente a remanescente ansiedade e insegurança do jovem recém-formado em um novo local de trabalho, sempre achando que quando os demais profissionais experientes o elogiam estão na verdade tirando sarro sarcasticamente.
Exantema estrelado: até para o leitor chega a ser exasperante a frustração da não adesão ao tratamento de um paciente que não conhece nem tampouco acredita no diagnóstico, vai embora maldizendo o médico e se recusando a tratar uma doença grave, insidiosa e contagiosa. Importante aceitar que o paciente tem sua autonomia, na medicina e mesmo fora dela beira o impossível ajudar alguém que não queira ser ajudado.
Morfina: acompanhar o passo a passo da evolução do uso de opióide para alívio de uma dor aguda até se tornar uma drogadição severa e mortal é uma leitura tenebrosa. E importante, visto que ainda é uma experiência contemporânea dadas as estatísticas acerca da classe médica nesse tópico. O personagem em questão estava ainda em situação agravada pelo desamparo, havia apenas como rede de apoio próxima a Anna, que apesar de se esforçar não foi capaz de frear a ânsia frenética de seu colega/amante, após ela mesma ter introduzido a droga com a intenção exclusiva de amenizar o sofrimento do médico. A por vezes estreita janela dicotômica remédio-veneno está muito bem evidenciada nesse conto.
Tempestade de neve: a carga de trabalho insana a que o médico está submetido é bem explorada nesse conto, e como a "gestão" se porta de forma omissa, tanto no abastecimento de insumos e pessoal, como de informações.
Eu matei: é de se pensar como a posição de um profissional médico muda de acordo com o contexto sociocultural. Imaginaria-se que num cenário de guerra e caos tais profissionais seriam vistos como recurso precioso e escasso, dignos de gratidão pelos serviços prestados. Imagina-se também que o médico manteria a ética e a imparcialidade sobre o cuidado com os feridos, independentemente de que lado estão.
O conto no entanto revela outra realidade no contexto das guerras na Europa Oriental do século 20: religião, adesão à guerra, deserção, ameaças de morte, são todos conceitos que se interpõem entre o médico e o paciente, ao ponto de que o primeiro encontrou-se na necessidade de matar o segundo para escapar e sobreviver.

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