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Queimaduras {Sabiston, Cartilha para tratamento de emergências das queimaduras – Ministério da Saúde (2012)} CAUSAS Não há nenhum trauma maior do que uma grande queimadura, que pode ser classificado de acordo com suas diferentes causas e profundidades. De todos os casos 4.000 pessoas morrem das complicações relacionadas com lesões térmicas. Como em todas as mortes relacionadas com trauma, os óbitos por queimaduras geralmente ocorrer imediatamente após a lesão ou semanas mais tarde em consequência de falência múltipla de órgãos. De todas as queimaduras, 66% ocorrem em casa e os óbitos são predominantes nos extremos de idade, crianças e idosos. As causas mais comuns são as chamas e escaldaduras. As escaldaduras são mais comuns em vítimas de até 5 anos de idade. Uma porcentagem significativa de queimaduras em crianças é causada pelo abuso infantil. Existem vários fatores de risco vinculados às queimaduras – especificamente idade, localização, demografia e baixo nível socioeconômico. Localização desempenha um papel importante no risco e tratamento da queimadura. Os recursos disponíveis em uma determinada comunidade influenciam a morbidade e mortalidade. O tratamento ideal para queimaduras requer a colaboração de cirurgiões, anestesistas, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas, enfermeiros, nutricionistas, terapeutas de reabilitação e assistentes sociais para acomodar as necessidades básicas de um sobrevivente de grande queimadura. FISIOPATOLOGIA DAS QUEIMADURAS Alterações locais Localmente, a lesão térmica causa necrose coagulativa da epiderme e dos tecidos subjacentes, com a profundidade da lesão dependendo da temperatura à qual a pele foi exposta, do calor específico do agente causal e da duração da exposição. As queimaduras são classificadas em 5 categorias diferentes de causa e profundidade da lesão. As causas incluem lesão por chama (fogo), líquidos quentes (escaldadura), contato com objetos quentes ou frios, exposição química e/ou condução de eletricidade. As três primeiras causam dano celular pela transferência de energia, que leva à necrose de coagulação. Queimaduras químicas e queimaduras elétricas causam lesão direta às membranas celulares, além da transferência de calor, e podem causar necrose coagulativa ou coliquativa (liquefativa). A pele, que é o maior órgão do corpo humano, fornece forte barreira à transferência de energia para os tecidos mais profundos, confinando, assim, grande parte da lesão nesta camada. Uma vez removido o foco desencadeador da queimadura, no entanto, a resposta dos tecidos locais pode levar à lesão nas camadas mais profundas. A área de lesão cutânea foi dividida em 3 zonas (de coagulação, de estase e de hiperemia). A área necrótica da queimadura onde as células foram destruídas é denominada zona de coagulação. Esse tecido é danificado irreversivelmente no momento em que ocorre a lesão. A área imediatamente adjacente à zona necrótica tem um grau de lesão moderado, com perfusão tissular reduzida. Essa área é chamada de zona de estase e, dependendo das condições da ferida, pode sobreviver ou evoluir para necrose coagulativa. A zona de estase está associada a dano vascular com extravasamento de fluidos. O tromboxano A2, um vasoconstritor potente, está presente em altas concentrações nas feridas de queimaduras, e a aplicação local de inibidores melhora o fluxo sanguíneo e diminui a zona de estase. Antioxidantes, antagonistas da bradicinina e pressões subatmosféricas na ferida também melhoram o fluxo sanguíneo e afetam a profundidade da lesão. Interações endoteliais locais com neutrófilos medeiam algumas das respostas inflamatórias locais associadas à zona de estase. Tratamento direcionado para o controle da inflamação local, imediatamente após a queimadura pode preservar a zona de estase. A última zona é denominada zona de hiperemia, caracterizada pela vasodilatação em razão da inflamação cincunjacente à queimadura. Essa região contém o tecido claramente viável do qual se inicia o processo de cicatrização e, geralmente, não tem risco de necrose adicional. Profundidade da queimadura A profundidade da queimadura é classificada em grau de lesão na epiderme, derme, tecido adiposo subcutâneo e estruturas subjacentes. → Queimaduras de primeiro grau são, por definição, lesões confinadas à epiderme. Queimaduras de primeiro grau são dolorosas, eritematosas e empalidecem ao toque, com uma barreia epidérmica intacta. Exemplos incluem queimaduras solares ou uma pequena escaldadura de um acidente na cozinha. Estas queimaduras não resultam em cicatrizes e o tratamento visão ao conforto com uso tópico de pomadas emolientes, com ou sem aloé, e AINEs orais. → Queimaduras de segundo grau são divididas em dois tipos: superficiais e profundas. Todas as queimaduras de segundo grau têm algum grau de dano térmico, por definição, e a divisão é baseada na profundidade da lesão na derme. Queimaduras dérmicas superficiais são eritematosas, dolorosas e empalidecem ao toque e frequentemente formam bolhas. Essas feridas reepitelizam espontaneamente por estruturas epidérmicas retidas nas cristas dermoepidérmicas, folículos pilosos e glândulas sudoríparas em uma a duas semanas. Após a cicatrização, essas queimaduras podem ter leve descoloração cutânea a longo prazo. Queimaduras dérmicas profundas na derme reticular mostram-se mais pálidas e mosqueadas, não empalidecem mais ao toque, mas permanecem dolorosas aos estímulos táteis. Essas queimaduras cicatrizam em duas a cinco semanas por reepitelização a partir de ceratinócitos dos folículos pilosos e das glândulas sudoríparas, muitas vezes formando cicatrizes graves devido à perda da derme. → Queimaduras de terceiro grau são de espessura total da derme e epiderme e se caracterizam por uma escara dura, semelhante ao couro, indolor e preta, branca ou cor de cereja nenhum apêndice epidérmico ou epidérmico resta. Desta forma, essas queimaduras devem reepitelizar-se a partir das bordas cutâneas. Queimaduras dérmicas profundas e de espessura total requerem enxertos de pele do paciente para cicatrizarem em tempo hábil. → Queimaduras de quarto grau envolvem outros órgãos abaixo da pele, como músculos, ossos e cérebro. A determinação precisa da profundidade é fundamental para a cicatrização, pois as feridas que vão cicatrizar com tratamento local são tratadas diferentemente daquelas que requerem intervenção cirúrgica. Novas tecnologias, como a dopplerfluxometria a laser multissensível, trazem a promessa de determinar, de forma quantitativa, a profundidade da queimadura. Vários estudos têm afirmado a superioridade desta nova tecnologia sobre o julgamento clínico na determinação das feridas que necessitam de enxerto de pele. Tamanho da queimadura O tamanho da queimadura estima a extensão da lesão. O tamanho da queimadura é geralmente avaliado pela regra dos noves. Em adultos, cada membro superior e a cabeça correspondem a 9% da área da superfície corporal total (ASCT), extremidades inferiores e troncos anterior e posterior correspondem a 18% cada e o períneo e genitália são considerados 1%. Outro método de estimar queimaduras menores é igualar a mão aberta do paciente (incluindo-se aí a palma e os dedos estendidos) a aproximadamente 1% As crianças têm comparativamente uma maior área da superfície corpórea na cabeça e no pescoço, que é compensada por um superfície relativamente menor nas extremidades inferiores. As crianças têm 21% da ASCT no somatório da cabeça e do pescoço e 13% em cada perna, que se aproximam gradualmente das proporções adultas com o aumentar da idade. A fórmula de Berkow é utilizada para determinar com precisão o tamanho das Queimaduras em crianças TRATAMENTO Tratamento básico Tratamento pré-hospitalar Antes de serem submetidos a qualquer tratamento específico, os pacientes queimados devem ser removidos do cenário do trauma, e o processo lesivo, interrompido. Lesão por inalaçãosempre deve ser suspeitada e o oxigênio a 100% deve ser administrado por máscara. Deve-se apagar o fogo das roupas em combustão e removê-las o mais cedo possível para prevenir lesões adicionais. Todos os anéis, relógios, joias e cintos devem ser removidos, pois eles retêm calor e podem produzir efeito torniquete. Água à temperatura ambiente pode ser vertida no ferimento dentro, mas quaisquer medidas subsequentes para refrescar o ferimento devem ser evitadas a fim de prevenir a hipotermia durante as manobras de reanimação. Avaliação inicial Como qualquer paciente traumatizado, o paciente queimado deve ser abordado inicialmente com uma avaliação primária e secundária. Na avaliação primária, condições que ameaçam imediatamente a vida são rapidamente identificadas e tratadas. Na avaliação secundária, procede-se a uma avaliação mais completa da cabeça aos pés. A exposição a gases aquecidos e à fumaça resulta em danos no trato respiratório superior. Lesão direta das vias aéreas resulta em edema, que, em combinação com o edema generalizado associado à queimadura grave, pode obstruir as vias aéreas. Deve-se suspeitar de lesão das vias aéreas nos vasos de queimaduras faciais, vibrissas chamuscadas, escarros carbonáceos e taquipneia. A rouquidão progressiva é um sinal de obstrução iminente das vias aéreas, e a entubação endotraqueal deve ser instituída precocemente. O tporax deve ser exposto para avaliar a respiração Cuidados iniciais com a ferida Cuidados pré-hospitalares com a área queimada são básicos e simples, porque requerem apenas proteção contra o ambiente com a aplicação de um curativo limpo e seco ou de um lençol para cobrir a parte envolvida. Curativos úmidos não devem ser usados. O paciente deve ser envolvido em um cobertor para minimizar a perda de calor e controlar a temperatura durante o transporte. O primeiro passo na diminuição da dor é cobrir o ferimento para evitar o contato com as terminações nervosas expostas. Injeções intramusculares ou subcutâneas de narcóticos contra dor nunca devem ser utilizadas, pois a absorção de drogas está reduzida devido à vasoconstrição periférica. Isso pode se tornar um problema posteriormente quando o paciente for reanimado e a vasoconstrição aumentar a absorção do narcótico depositado, resultando em apneia. Pequenas doses de morfina IV podem ser administradas após a avaliação completa do paciente por um medico experiente que possa garantir a segurança do uso deste medicamento. Transporte O transporte rápido e sem controle da vítima de queimadura não é uma prioridade, exceto quando coexistem outras condições que ameacem a vida. Na maioria dos incidentes envolvendo grandes queimados, o transporte terrestre das vítimas ao hospital de destino é apropriado. O transporte por helicóptero é de grande utilidade quando a distância entre o acidente e o hospital é de 50 a 240 quilômetros. Para distancias superiores a 240 km, o transporte por aeronaves de asa fixa é mais apropriado. Reanimação Reanimação volêmica adequada do paciente de queimadura depende do estabelecimento e da manutenção de acesso venoso confiável. O acesso venoso é mais bem obtido com punção venosa periférica através de pele não queimada e usando cateteres curtos; entretanto, a punção de veia através de pele queimada pode ser utilizada e é preferível à não punção de acesso intravenoso. As veias superficiais estão frequentemente trombosadas em lesões de espessura total da pele e, desta forma não são apropriadas à punção. Dissecações de veia safena são úteis em casos de difícil acesso e são preferencialmente usadas em detrimento das punções de acessos centrais devido a menores taxas de complicação. Em crianças com menos de 6 anos, médicos experientes podem usar o acesso intraósseo na tíbia proximal até que um acesso venoso possa ser puncionado. Solução de Ringer lactato sem glicose é o fluido de escolha, exceto em crianças com menos de 2 anos, que devem receber Ringer lactato com glicose a 5%. A taxa inicial para infunsão horária de líquidos pode ser rapidamente estimada multiplicando-se a ASCT queimada pelo peso do paciente em quilogramas e dividindo por 8. A taxa de infusão para um homem de 80 kg com queimadura de 40% da ASCT pode ser calculada pela seguinte fórmula: *Essa taxa deve ser continuada até que seja realizado um calculo formal das necessidades volêmicas para reanimação. Escarotomias Quando queimaduras profundas de 2º e 3º graus envolvem a circunferência de uma extremidade, a circulação periférica para o membro pode ser comprometida. O desenvolvimento de edema generalizado abaixo de uma escara não complacente impede a drenagem venosa e, eventualmente, afeta a irrigação arterial dos leitos distais. Isso pode ser reconhecido por insensibilidade e parestesia do membro e hiperestesia nos dígitos. O doppler pode avaliar o fluxo arterial das artérias digitais e dos arcos palmoplantares das extremidades afetadas. O enchimento capilar também pode ser observado. As extremidades sob risco são identificadas no exame clínico ou por medição das pressões teciduais maiores que 40 mmHg. Essas extremidades requerem escarotomias, que são liberações da escara da queimadura realizadas no leito, através de incisão latera e medial da extremidade afetada usando uma lâmina de bisturi ou um eletrocautério. Toda escara constritiva deve ser incisada longitudinalmente para aliviar o obstáculo ao fluxo sanguíneo completamente. As incisões são realizadas nas eminências tenar e hipotênar ao longo das faces dorsolaterais dos dígitos para abrir a mão completamente, se ela estiver envolvida. Caso seja óbvio que a ferida exigirá excisão e enxerto devido à sua profundidade, as escarotomias são mais seguras para restaurar a perfusão para os tecidos não queimados subjacentes até que a excisão formal seja feita. Se o comprometimento vascular for prolongado, a reperfusão após uma escarotomia poderá causar hiperemia reativa e desenvolvimento de edema muscular adicional, tornando necessária a observação contínua das extremidades afetadas. A fasciotomia pode ser necessária caso haja aumento das pressões compartimentais musculares. As complicações mais comuns associadas a estes procedimentos são a perda sanguínea e a liberação de metabólitos anaeróbicos, causando hipotensão transitória. Se a perfusão distal não melhorar com essas medidas, hipotensão central devido à hipovolemia deve ser suspeitada e tratada. Uma escara constritiva no tronco pode causar um fenômeno similar, com a exceção de que o efeito é reduzir a ventilação pela limitação da expansão torácida. Qualquer redução da ventilação de um paciente queimado deve levar à inspeção do tórax e a escarotomias apropriadas para aliviar a constrição e permitir volumes correntes adequados. Essa necessidade torna- se evidente em um paciente em ventilação mecânica controlada a volume cuja pressão inspiratória de pico aumenta. Tratamento específico Lesão por inalação Lesão por inalação constitui uma das lesões concomitantes mais críticas. Aproximadamente 80% das mortes relacionadas a incêndios resultam não de queimaduras, mas na inalação de produtos tóxicos da combustão e a lesão por inalação tem permanecido a uma taxa de mortalidade global de 25 a 50% quando os pacientes necessitam de suporte ventilatório por mais de uma semana. Diagnóstico precoce de lesão broncopulmonar, portanto, é fundamental para a sobrevivência e é principalmente conduzido clinicamente, com base no histórico de queimaduras em ambientes fechados, queimaduras faciais e debris carbpnáceos na boca, faringe e escarro. A radiografia de tórax é rotineiramente normal até que complicações, como infecções, se desenvolvam. O método diagnóstico padrão deve ser broncoscopia das vias aéreas superiores de todo paciente queimado. Achados broncoscópicos compatíveis com lesão por inalação incluem edema das vias aéreas, necrose da mucosa, presença de fuligem e carbonizaçãodas vias aéreas, descamação de tecido e material carbonáceo nas vias aéreas. O tratamento da lesão por inalação deve começar imediatamente com a administração de oxogênio a 100% através de máscara facial ou cateter nasal. Se houver evidência inicial de edema das vias aéreas superiores, a entubação precoce é necessária porque o edema das vias aéreas superiores normalmente aumenta dentro de 9 a 12 horas. Entubação profilática sem as indicações apropriadas não deve ser realizada. O tratamento da lesão por inalação consiste em suporte ventilatório, toalete pulmonar agressiva (??), remoção broncoscópica de rolhas de secreção e terapia de nebulização. A terapia de nebulização pode consistir de heparina, alfa miméticos ou polimixina B e é aplicada de duas a seis vezes ao dia. Ventilação controlada por pressão com hipercapnia permissiva é uma estratégia útil no tratamento desses pacientes, e níveis de PaCO2 de até 60 mmHg podem ser bem tolerados se forem atingidos gradualmente. Antibióticos protiláticos não são indicados, mas são imperativos com infecções pulmonares documentadas. O diagnóstico clínico de pneumonia inclui: radiografia de tórax revelando um novo e persistente infiltrado, consolidação ou cavitação; sepse. Cuidados com as feridas Após a via aérea ter sido avaliada e quando a reanimação volêmica estiver em andamento, as atenções devem se voltar às feridas com queimaduras. O tratamento depende das características e dos tamanhos das feridas. Todos os tratamentos são direcionados à cicatrização rápida e indolor. A terapia atual dirigida especificamente à queimadura pode ser dividida em 3 estádios: avaliação, tratamento e reabilitação. Uma vez avaliadas extensão e profundidade das feridas e que as feridas tenham sido completamente limpos e desbridados, começa a fase de tratamento. Cada ferida deve ser coberta com um curativo adequado que satisfaça diversas funções. Em primeiro lugar, ele deve proteger o epitélio danificado, minimizar a colonização bacteriana e fúngica, e providenciar a imobilização para manter a posição funcional adequada. Em segundo lugar, o curativo deve ser oclusivo para minimizar a perda de calor por evaporação e a agressão pelo frio. Terceiro, o curativo deve promover conforto à ferida dolorosa. A escolha do curativo baseia-se nas características da ferida. → Queimaduras de 1º grau são de menor importância, não requerem curativos e podem ser tratadas com pomadas tópicas para diminuir a dor e manter a pele úmida. AINES sistêmicos administrados VO ajudam no controle da dor. → Queimaduras de 2º grau podem ser tratados com trocas diárias de curativo com antibióticos tópicos, compressas ou gazes de algodão e ataduras elásticas. Alternativamente, as feridas podem ser tratadas com revestimento temporário sintético ou biológico para cobrir o ferimento. → Queimaduras de 2º grau profundas e de 3º grau exigem excisão cirúrgica e enxerto de pele quando as queimaduras apresentam tamanhos consideráveis; a escolha do curativo inicial deve visar a contenção da proliferação bacteriana e promover oclusão até que a cirurgia seja realizada. Antibióticos Antibióticos tópicos Antibióticos tópicos disponíveis podem ser divididos em duas classes: pomadas e soluções. As pomadas geralmente são aplicadas diretamente na ferida que, por sua vez, é coberta com curativo; as soluções normalmente são vertidas sobre o curativo que cobre a ferida. Cada uma dessas classes possui vantagens e desvantagens. As soluções podem ser aplicadas uma ou duas vezes ao dia, mas podem perder sua eficácia durante as trocas de curativos. Trocas frequentes de curativos podem resultar em tensão de cisalhamento local, com perda de enxertos ou de células subjacentes em processo de cicatrizaçõ; as soluções permanecem eficazes porque podem ser adicionados sem a remoção do curativo; a pele subjacente, contudo, pode se tornar macerada. (??) Antibióticos em forma de pomada incluem o acetato de madenida a 11% (Sulfamylon), sulfadiazina de prata a 1% (Silvadene), polimixina B, neomicina, bacitracina, mupirocina e agente antifúngico nistatina. Os agentes disponíveis para aplicação em soluções incluem o nitrato de prata a 0,5%, o hipoclorito de sódio a 0,025% (solução de Dakin), ácido acético a 0,25%, e acetato de mafenida a 5%. Antibióticos sistêmicos O uso de antibióticos sistêmicos pré-operatórios também tem seu papel na redução da sepse pela queimadura até que ela cicatrize. Organismos mais comuns que devem ser levados em consideração na escolha do regime antibiótico para tratamento incluem o S. aureus e Pseudomonas spp que são os mais prevalentes nas queimaduras. Excisão cirúrgica das feridas de queimadura Métodos para tratamento das feridas de queimadura mudaram e são semelhantes para adultos e crianças. Excisão tangencial precoce cada vez mais agressiva dos tecidos queimados e fechamento precoce da ferida, principalmente com enxertos de pele, levaram à melhora significativa das taxas de mortalidade e custos substancialmente menores. Além disso, o fechamento precoce das feridas tem sido associado a menores índices de cicatrizações hipertróficas, contraturas articulares e rigidez, promovendo uma reabilitação mais rápida. → Excisão tangencial: técnica que requer debridamento com repetidas raspagens das queimaduras dérmicas profundas de espessura parcial usando facass de Braithwaite, Watson, Goulian ou dermátomo, a uma profundidade de 0,1 a 0,3 mm até que seja atingido um leito viável dérmico. Isso é caracterizado clinicamente por sangramentos pontuais do leito da ferida cutânea. → Excisão total: uma faca de mão como a de Watson ou um dermátomo elétrico calibrado de 0,4 a 0,8 mm e várias passadas para desbridar excisando a ferida de espessura total são feitas. A excisão é auxiliada pela tração da escara excisada que atravessa a faca ou o dermátomo. Excisão adequada é clinicamente caracterizada por um sangramento do leito viável da ferida, que é geralmente constituído de gordura. → Excisão fascial: essa técnica é reservada para queimaduras se estendendo através da gordura e músculos, em que o paciente se apresenta tardiamente com grandes feridas infectadas e infecções fúngicas invasivas ameaçadoras à vid. Ela envolve a excisão cirúrgica de toda a espessura do tegumento, incluindo o tecido adiposo subcutâneo até a fáscia. Infelizmente, a excisão fascial é mutilante e deixa um defeito permanente no contorno corporal, que é quase impossível reconstruir. Vasos linfáticos podem ser excisados com essa técnica (pode ocorrer linfedema periférico). A maioria dos pacientes pode ser tratada com excisões em camadas, que otimizam o resultado estético e funcional final. Cobertura das feridas de queimaduras Após a excisão cirúrgica da ferida de queimadura é vital obter o fechamento da ferida. Vários substratos biológicos e sintéticos têm sido usados para substituir a pele lesada após a queimadura. Autoenxertos de pele não lesionada continuam sendo o principal tratamento para muitos pacientes. Em decorrência de poder ser difícil o fechamento da ferida usando um autoenxerto quando as queimaduras de espessura total excedem 40% da ASCT, aloenxertos (pele de cadáver) frequentemente servem como substitutos de pele para pacientes gravemente queimados. Embora essa abordagem seja ainda comumente usada em centros de queimados, carrega riscos consideráveis, incluindo antigenicidade, infecção cruzada e disponibilidade limitada. Xenoenxertos têm sido usados por centenas de anos como substitutos temporários para perda de pele. Embora esses enxertos forneçam uma matriz dérmica biologicamente ativa, disparidades imunológicas não permitem a pega do enxerto e predeterminam sua rejeição com o tempo. Xenoenxertos e aloenxertos são medidas temporárias de cobertura de feridas de queimaduras. O fechamento verdadeiro somente pode ser obtido com autoenxertos ou isoenxertos vivos. TRATAMENTO DE EMERGÊNCIA DAS QUEIMADURAS 1. Tratamentoimediato da emergência: interrompa o processo da queimadura; remova roupas, joias, anéis, piercings e próteses e cubra as lesões com um tecido limpo 2. Tratamento na sala de emergência: → Vias aéreas: avalie a presença de corpos estranhos, verifique e retire qualquer tipo de obstrução. → Respiração: Aspire as vias aéreas superiores, se necessário. Administre oxigênio a 100% (máscara umidificada) e, na suspeita de intoxicação por monóxido de carbono, mantenha a oxigenação por 3 horas. Suspeita de lesão inalatória: queimadura em ambiente fechado com acometimento da face, presença de rouquidão, estridor, escarro carbonáceo, dispneia, queimadura das vibrissas, insuficiência respiratória. Manter a cabeceira elevada a 30º. Indicar intubação orotraqueal quando: a escala de Glasgow for menor que 8; a PaO2 for menor que 60; a PaCO2 for maior que 55 na gasometria; a dessaturação for menor do que 90 na oximetria; se houver edema importante de face e orofaringe. → Avalie se há queimaduras circulares no tórax, nos membros superiores e inferiores e verifique a perfusão distal e o aspecto circulatório (oximetria de pulso). → Avalie se há traumas associados, doenças prévias ou outras incapacidades e adote providências imediatas. → Exponha a área queimada. → Acesso venoso: obtenha preferencialmente acesso venoso periférico e calibroso, mesmo em área queimada, e somente na impossibilidade desta utilize acesso venoso central. → Instale sonda vesical de demora para controle da diurese nas queimaduras em área corporal superior a 20% em adultos e 10% em crianças. 3. Profundidade da queimadura: → Primeiro grau: afeta somente a epiderme, sem formar bolhas. Apresenta vermelhidão, dor edema e descama em 4 a 6 dias. Ex: eritema solar. → Segundo grau: afeta a epiderme e parte da derme, forma bolhas ou flictemas. Queimadura de segundo grau superficial apresenta base da bolha rósea, úmida e dolorosa. Queimadura profunda: a base da bolha é branca, seca, indolor e menos dolorosa. A restauração das lesões ocorre entre 7 e 21 dias. → Terceiro grau: afeta epiderme, derme e estruturas profundas. É indolor, existe presença de placa esbranquiçada ou enegrecida, possui textura coreácea e não reepiteliza espontaneamente (necessita de enxerto de pele). 4. Extensão da queimadura: → Regra dos nove → A superfície palmar do paciente (incluindo os dedos) representa cerca de 1% da área da superfície corporal. → Área nobres/ queimaduras especiais: olhos, orelhas, face, pescoço, mão, pé, região inguinal, grandes articulações (ombro, joelho, cotovelo, punho, articulação coxofemoral, tornozelo, axila) e órgãos genitais, bem como queimaduras que atinjam estruturas profundas como ossos, músculos, nervos e/ou vasos desvitalizados. 5. Cálculo da hidratação: fórmula de Parkland = 2 a 4 ml x %ASCT x peso (kg) para crianças e adultos. → Idosos, portadores de insuficiência renal e de insuficiência cardíaca congestiva devem ter seu tratamento iniciando com 2 a 3 ml/ kg/ %ASCT e necessitam de observação mais criteriosa quanto ao resultado da diurese. → Use preferencialmente soluções cristalides (Ringer lactato) → Faça infusão de 50% do volume calculado nas primeiras 8 horas e 50% nas 16 horas seguintes. → Considere as horas a partir da queimadura. → Mantenha a diurese entre 0,5 a 1 ml/ kg/ h. → No trauma elétrico, mantenha adiurese em torno de 1,5 ml/kg/h ou até o clareamento da urina. → Observe a glicemia nas crianças, nos diabéticos e sempre que necessário. → Na fase de hidratação (nas 24 h iniciais), evite o uso de coloide, diurético e drogas vasoativas. 6. Tratamento da dor: instale acesso intravenoso e administre: → Para adultos: dipirona de 500 mg a 1 g em injeção EV ou morfina 1 ml (ou 10 mg) diluído em 9 ml de solução fisiológica a 0,9%, considerando-se que cada 1ml é igual a 1 mg. Administre 0,5 a 1 mg de morfina para cada 10 kg de peso. → Para crianças: dipirona de 15 a 25 mg/kg EV; ou morfina 10 mg diluída em 9 ml de soro fisiológico a 0,9%. Administre 0,5 a 1 mg para cada 10 kg de peso. 7. Gravidade da queimadura → Condições que classificam queimadura grave: extensão/profundidade maior que 20% da ASCT em adultos ou maior que 10% em criança. Idade menor que 3 anos ou maior que 65. Presença de lesão inalatória. Politrauma e doenças prévias associadas. Queimadura química. Trauma elétrico. Áreas nobres especiais. Violência, maus tratos, tentativa de suicídio etc. 8. Medidas gerais imediatas e tratamento da ferida: → Limpe a ferida com água e clorexidina desgermante a 2%. Na falta desta, use água e sabão neutro. → Mantenha a cabeceira elevada, pescoço em hiperextensão e membros superiores elevados e abduzidos, se houver lesões em pilares axilares. → Administre toxoide tetânico para profilaxia/reforço antitétano. → Administre bloqueador de receptor H2 para profilaxia da úlcera de estresse. → Administre heparina subcutânea para profilaxia do tromboembolismo; → Administre sulfadiazina de prata a 1% como antimicrobiano tópico. → Fazer curativo → Restringir o uso de antibiótico sistêmico prolongado. → Evite o uso indiscriminado de corticosteroides por qualquer via. → Queimaduras circunferenciais podem necessitar de escarotomia. 9. Trauma elétrico: → Identifique se o trauma foi por fonte de alta tensão, por corrente alternada ou contínua e se houve passagem de corrente elétrica com ponto de entrada e saída. → Avalie os traumas associados (queda de altura e outros traumas) → Avalie se ocorreu perda de consciência ou PCR no momento do acidente → Avalie a extensão da lesão e passagem da corrente. → Faça a monitorização contínua por 24 h a 48 h e faça coleta de sangue para dosagem de enzimas (CPK e CKMB) → Procure sempre internar o paciente vítima deste tipo de trauma. → Avalie eventual mioglobulinemia e estimule o aumento da diurese com maior infusão de líquidos. → Na passagem de corrente pela região do punho, avalie o antebraço, o braço e os membros inferiores e verifique a necessidade de escarotomia com fasciotomia em tais segmentos. 10. Queimadura química → A equipe responsável pelo primeiro atendimento deve utilizar proteção universal para evitar o contato com o agente químico. → Identifique o agente causador da queimadura: ácido, base ou composto orgânico. → Avalie a concentração, o volume e a duração de contato. → Lembre que a lesão é progressiva, remova as roupas e retire o excesso do agente causador. → Remova previamente o excesso com escola ou panos em caso de queimadura por substancia em pó. → Dilua a substância em água corrente por no mínimo 30 minutos e irrigue exaustivamente os olhos, no caso de queimaduras oculares. → Interne o paciente e, na dúvida, entre em contato com o centro toxicológico mais próximo. → Nas queimaduras por ácido fluorídrico com repercussão sistêmica, institua aplicação por via endovenosa lenta de soluções fisiológicas com mais de 10 ml de gluconato de cálcio a 10% e acompanhe laboratorialmente a reposição do cálcio iônico. → Aplique gluconato de cálcio a 2,5% na forma de gel sobre a lesão, friccione a região afetada durante 20 minutos (para atingir planos profundos) e monitore os sintomas dolorosos. → Caso não haja melhora, infiltre o subcutâneo da área da lesão com gluconato de cálcio diluído em soro fisiológico a 0,9% na média de 0,5 ml por centímetro quadrado da lesão com agulha fina de 0,5 cm, da borda da queimadura com direção ao centro. → Nos casos associados à dificuldade respiratória, poderá ser necessária a intubação orotraqueal. 11. Infecção da área queimada: são considerados sinais e sintomas de infecção em queimadura: mudança na coloração da lesão, edema de bordas nas feridas ou do segmento corpóreo afetado, aprofundamento das lesões, mudança do odor, descolamento precoce da escara seca e transformação em escara úmida, coloração hemorrágica sob a escara, celulite ao redor da lesão, vasculite no interior da lesão (pontos avermelhados), aumento ou modificaçãoda queixa dolorosa. 12. Critérios de transferência de pacientes para unidades de tratamento de queimaduras: → Queimaduras de 2º grau em áreas superiores a 20% da ASCT em adultos ou maiores que 10% em crianças ou maiores que 10% em pessoas com mais de 50 anos. → Queimaduras de 3º grau em qualquer extensão. → Lesões em face, olhos, períneo, mãos, pés e em grandes articulações. → Queimadura elétrica ou química. → Lesão inalatória ou lesão circunferencial de tórax ou de membros. → Doenças associadas, tentativa de suicídio, politrauma, maus tratos. → A transferência do paciente deve ser solicitada à unidade de tratamento de queimaduras de referência após a estabilização hemodinâmica e as medidas iniciais, com leito de UTI reservado para queimados. → Transporte aéreo para pacientes com trauma, pneumotórax ou alterações pulmonares deve ser realizado com extremo cuidado, pelo risco de expansão de gases e piora clínica.
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