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Trabalho 1 - Direito das Sucessões - A exclusão por indignidade

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA 
FACULDADE DE DIREITO PROF. JACY DE ASSIS
 
 
 
 
JÚLIA AGUIAR CARVALHO - 11721DIR217
 
 
 
 
ATIVIDADE AVALIATIVA DIREITO CIVIL VI: 
Exclusão da herança por indignidade 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
UBERLÂNDIA-MG
 2020
1 INTRODUÇÃO
No Brasil, o direito à herança é constitucionalmente garantido como pode ser observado no artigo 5º, inciso XXX da Constituição Federal brasileira de 1988[footnoteRef:1]. Trata-se de um direito fundamental, que assegura os bens do de cujus aos sucessores do falecido por transmissão causa mortis. Dessa forma, o Código Civil brasileiro de 2002[footnoteRef:2] estabelece que a transmissão da herança aos sucessores ocorre quando da abertura da sucessão, a qual ocorre em decorrência da morte. Assim, devido ao princípio de saisine, a transferência da herança se dá automaticamente, não dependendo de qualquer manifestação dos beneficiados. [1: BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.] [2: BRASIL. Código Civil Brasileiro: Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.] 
Contudo, o direito sucessório prevê algumas possibilidades de o herdeiro perder o seu direito de herança, é o caso da exclusão por indignidade ou por deserdação. Nesses dois casos, percebe-se que há a finalidade de punir civil e patrimonialmente o sucessor que comete faltas graves contra o de cujus. Logo, de acordo com a doutrina majoritária, percebe-se que ambos os institutos não configuram a incapacidade ou ilegitimidade passiva do herdeiro excluído, mas sim, uma forma de punição ao sucessor, que mesmo sendo legitimado e capaz para suceder, praticou ato que o torna desmerecedor ao recebimento da herança, no ponto de vista moral e legal, uma vez que aquele que gera gravame ao autor da herança ou às pessoas próximas a ele não pode aproveitar-se de sua própria torpeza. 
Além disso, vale ressaltar que a exclusão por indignidade e por deserdação, se diferem bastante da renúncia, que se trata de um ato voluntário, unilateral, puro e simples do sucessor, por meio do qual este abre mão da herança de maneira irrevogável, expressa e definitiva. A renúncia é uma forma de auto exclusão da herança, a qual gera o direito de acrescer aos demais herdeiros da mesma classe, e não o direito de representação por parte dos descendentes do renunciante. A renúncia é dotada de efeito retroativo, de forma que o quinhão renunciado volta ao acervo hereditário como se o herdeiro renunciante nunca tivesse existido, o que não ocorre na exclusão por indignidade ou deserdação, uma vez que nessas há o direito de representação.
2 DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS ENTRE A INDIGNIDADE E A DESERDAÇÃO
Como já foi dito anteriormente, ambas as causas de exclusão da sucessão se dão em razão do cometimento de algum ato de desapreço e menosprezo contra o autor da herança ou seus familiares, com o objetivo de punir civilmente tais herdeiros. Logo, fica clara a natureza punitiva desses institutos que visam afastar da relação sucessória aquele que cometeu ato grave, socialmente reprovável em detrimento da vida, da integridade física, psicológica ou moral do autor da herança.[footnoteRef:3] Isso acontece porque não é justo ou digno que aquele que praticou tais atos se beneficie economicamente do patrimônio deixado pela pessoa agredida.[footnoteRef:4] [3: GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Manual de direito civil. São Paulo: Saraiva, 2017. 1768 p. v. único.] [4: GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Manual de direito civil. São Paulo: Saraiva, 2017. 1768 p. v. único.] 
Esses institutos são muito próximos e uma das principais semelhanças se encontra no fato de tais penas não poderem extrapolar a pessoa declarada indigna ou abarcada pela deserdação, assim, os descendentes do indigno e do deserdado são chamados para receber o quinhão em nome do excluído, herdando por direito de representação.
Contudo, apesar de serem institutos muito parecidos, estes possuem diversas diferenças, o que faz com os mesmos não possam ser confundidos. As hipóteses de indignidade do herdeiro estão previstas no art. 1814, enquanto as de deserdação estão previstas nos artigos 1.961 a 1.963 do Código Civil[footnoteRef:5], e a primeira diferença entre esses institutos se encontra aqui, visto que suas causas geradoras não são semelhantes. Na deserdação, valem todos os motivos da indignidade, contudo, o legislador vai além e atribui mais causas a esse instituto, a exemplo da ocorrência de ofensa física, injúria grave, relações ilícitas com madrasta ou com o padrasto, e desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade. [5: BRASIL. Código Civil Brasileiro: Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.] 
Uma outra assimetria entre os fatos se dá pelo fato de a indignidade poder ser reconhecida por ato praticado antes ou depois da abertura da sucessão, enquanto a deserdação apenas se dá por ato praticado antes da abertura da sucessão, uma vez que há a necessidade do testamento.
Uma terceira diferença se baseia no fato de que a indignidade alcança todos os herdeiros: legítimos, necessários, facultativos, testamentários e legatários. Já a deserdação é restrita aos herdeiros necessários. Além disso, a deserdação só pode ser imposta por testamento, com expressa declaração da causa que motivou o testador a querer privá-lo da herança, já a indignidade pode ser pedida por qualquer terceiro interessado, no prazo de quatro anos da abertura da sucessão, sem que o de cujus tenha se manifestado sobre isso.
Contudo, em ambos os casos se faz necessária sentença judicial reconhecendo a prática de atos aptos a ensejar a exclusão do herdeiro por deserdação ou indignidade, uma vez que não há exclusão automática e imediata. Nesse sentido, o prazo prescricional da ação declaratória é de quatro anos para os dois institutos, e pelo fato de se tratar de direito potestativo, o prazo é decadencial. O que se distingue é o termo inicial para a propositura das demandas, que na ação de indignidade é a abertura da sucessão e na demanda de deserdação é a abertura do testamento. Ademais, em ambos os casos, quando do trânsito em julgado da sentença, a qual declarou a indignidade ou ratificou a deserdação, há a perda da condição de herdeiro, de forma que isso possui efeito retroativo à data de abertura da sucessão, de forma que acontece como se tal herdeiro nunca tivesse existido.
Traçadas tais diferenças e semelhanças, passa-se para a análise exclusiva da exclusão do herdeiro por indignidade.
3 AS CAUSAS GERADORAS DA EXCLUSÃO POR INDIGNIDADE
Pelo fato de a dignidade humana ser prestigiada cada vez mais, sendo o princípio de maior relevância da Constituição da República, presume-se que quem desrespeita a dignidade do outro merece ser punido, ainda mais quando isso ocorre entre pessoas que possuem vínculo familiar e afetivo muito estreito, de forma são consideradas herdeiras. A forma encontrada para evitar esse tipo de lesão é de natureza patrimonial, subtraindo o direito à herança de quem pratica tais atos. A exclusão por indignidade trata-se, portanto, da privação do direito hereditário assegurado por lei, a quem cometeu certos atos ofensivos a pessoa ou aos interesses de seu antecessor, merecendo ser alijado da sucessão. Pode-se citar entre as causas de exclusão por indignidade a prática de atos contra a vida ou a honra do autor da herança, ou de atos ofensivos contra os membros de sua família.[footnoteRef:6] [6: DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. Ed. 7. São Paulo: Editora Juspodivm, 2021.] 
Como sujeitos ativos na prática desses atos pode-se citar os herdeiros legítimos, necessários ou facultativos, testamentários e legatários. Logo, percebe-se que todos aqueles que são eventuais beneficiários da herança que agirem contra o seu titular podem ser reconhecidos como indignos. Ademais, quando esses atos forem praticados por cônjuge ou companheiro, pode levar a perda do direito de concorrênciasucessória também, não levando, contudo, à perda do direito de meação, o qual pertence a eles por direito próprio.
Em relação ao sujeito passivo desses atos, pode-se considerar o autor da herança, bem como o seu cônjuge ou companheiro, os seus ascendentes e descendentes, de forma que quanto mais grave é o ato praticado, maior é o número de sujeitos contra os quais a postura do herdeiro pode afastá-lo da herança[footnoteRef:7]. Contudo, no caso dos crimes contra a honra, percebe-se que consideramos como sujeito passivo o de cujus e o seu cônjuge ou companheiro. [7: DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. Ed. 7. São Paulo: Editora Juspodivm, 2021.] 
As causas que ensejam a exclusão do herdeiro ou legatário estão previstas no artigo 1814 do Código Civil, que assim dispõe:
“Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:
I - que houverem sido autores, coautores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;
II - que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;
III - que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.”[footnoteRef:8] [8: BRASIL. Código Civil Brasileiro: Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.] 
	O rol de causas para a exclusão por indignidade é considerado taxativo de forma uníssona pela doutrina, de forma que não seria possível identificar outros fatos como indignos. Essa postura se dá, sobretudo, pelo fato de que as condutas que levam á exclusão do direito sucessório são tipificadas no Direito Penal, onde vigora o princípio da analogia contra o autor do delito, ou seja, a proibição da analogia in malam partem. Contudo, para Maria Berenice Dias[footnoteRef:9], essa ideia é absolutamente desarrazoada, uma vez que tal instituto, que apresenta acentuado conteúdo ético, não permite interpretação tão limitada, de forma a engessar as possibilidades de configuração, uma vez que nesse rol, considerado taxativo, não se encerram todas as possibilidades de aplicação ao caso concreto. [9: DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. Ed. 7. São Paulo: Editora Juspodivm, 2021.] 
	Ademais, Berenice Dias[footnoteRef:10] ainda afirma que pelo fato de a declaração de indignidade depender de reconhecimento judicial, tal limitação do rol não se justifica. Ela cita como possíveis causas de exclusão do herdeiro por indignidade a eutanásia, o induzimento ao suicídio, o infanticídio e o abandono afetivo. [10: DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. Ed. 7. São Paulo: Editora Juspodivm, 2021.] 
	Contudo, essa visão é muito particular da referida autora, de forma que a doutrina majoritária e a jurisprudência se posicionam de forma contrária. Assim, parte-se para as causas que são legalmente elencadas pela Código Civil brasileiro.
3.1 Homicídio doloso e tentativa de homicídio
	O inciso I do art. 1814 do CC[footnoteRef:11] traz como causa de exclusão do herdeiro por indignidade a prática de homicídio doloso contra o autor da herança, seu cônjuge ou companheiro, ascendente e descendente, não havendo a necessidade de o delito ter se consumado, visto que a modalidade tentada se enquadra nesse caso. Diante disso, percebe-se que o indigno tem que ser o autor, coautor ou partícipe do crime doloso, visto que a modalidade culposa do homicídio não gera a declaração de indignidade, assim como nos casos de configuração das excludentes de ilicitude do Código Penal. [11: BRASIL. Código Civil Brasileiro: Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.] 
	A autora Maria Berenice Dias[footnoteRef:12] defende a ideia de que no lugar da palavra homicídio deveria ser colocada a expressão delito contra a vida, de forma a incluir os delitos de induzimento ao suicídio, eutanásia e infanticídio. Contudo, essa abrangência de outras figuras delituosas ainda é controvertida na doutrina, ainda havendo dissenso sobre o assunto. [12: DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. Ed. 7. São Paulo: Editora Juspodivm, 2021.] 
	Para configurar a indignidade não é necessária a prévia condenação do réu, sendo preciso apenas a prova da prática do delito. Contudo, não caberá a exclusão, se no âmbito criminal, ocorrer a absolvição pelo reconhecimento da inexistência do fato ou se foi admitida causa de excludente da ilicitude: o estado de necessidade, legitima defesa, o estrito cumprimento de dever legal ou exercício regular de direito. Contudo, se o juízo absolutório decorrer da falta de provas, nada impede o reconhecimento da indignidade. 
	Uma outra divergência doutrinária ocorre quando a prática do delito ocorre por menor de 18 anos, pelo fato deste não responder a processo-crime, mas apenas pela prática de ato infracional, se sujeitando a medidas específicas. Nesse ponto, a doutrina ainda não possui consenso sobre a possibilidade de excluir herdeiro menor de 18 anos que praticou delito que enseja a declaração de indignidade.
3.2. Calúnia em juízo e crimes contra a honra
	O inciso II do artigo 1814 do CC[footnoteRef:13] traz a prática de acusação caluniosa em juízo como causa de exclusão de herdeiro. O código penal traz o crime de denunciação caluniosa, no seu artigo 339, contudo, não é a prática deste delito que configura indignidade, uma vez que a lei a lei civil não traz a expressão denunciação caluniosa, mas sim, acusação caluniosa. Logo, neste caso, assim como no inciso primeiro, não é necessária condenação na esfera criminal. Além disso, a doutrina entende que para a declaração de indignidade, a denúncia pode ser feita nas esferas cível, administrativa, criminal ou eleitoral. [13: BRASIL. Código Civil Brasileiro: Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.] 
	A segunda parte do referido inciso trata da prática de crimes contra a honra para a configuração da indignidade. Pode-se citar a calúnia, elencada no artigo 138 do Código Penal, a difamação, artigo 139 CP, e a injúria, presente no artigo 140 CP. Neste caso, a lei fala em crime, logo a condenação no juízo penal transitada em julgada é necessária para dar ensejo a declaração de indignidade.
	Nas duas possibilidades de configuração da indignidade citadas por este artigo, os atos podem ser praticados contra o de cujus, seu cônjuge ou companheiro hétero ou homossexual, sendo excluídos aqui, os ascendentes e descendentes. 
3.3. Inibição e obstáculo à disposição de vontade
	Por fim, o inciso III do art. 1814[footnoteRef:14] se refere à hipótese de inibir o obstar o autor da herança a dispor livremente dos seus bens, ou seja, se refere aos casos em que o herdeiro usa violência física ou psicológica, ou meios fraudulentos para privar a liberdade de testar e dispor dos seus bens livremente por testamento ou codicilo. Nesse caso, apenas o autor da herança pode ser a vítima, não sendo considerado indignidade quando for praticado contra os demais familiares e sucessores. [14: BRASIL. Código Civil Brasileiro: Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.
] 
	Diante disso, percebe-se que qualquer interferência à liberdade de testar do autor da herança, por violência física ou psicológica, ou ainda, por meio fraudulento, gera possibilidade de exclusão do herdeiro, contudo, nem todos os atos que geram obstáculos a liberdade de testar configuram atos ilícitos e podem dar ensejo a instauração da ação penal. É necessário, entretanto, declarar a indignidade na atitude do herdeiro que altera, falsifica, inutiliza ou oculta o testamento, neste caso, aquele herdeiro testamentário, que ficou impedido de perceber o quinhão que lhe fora contemplado, tem a possibilidade de reclamar perdas e danos daquele que agiu dolosamente para este fim.
4 EFEITOS DA EXCLUSÃO POR INDIGNIDADE
Em razão do princípio de saisine, a transmissão dos bens aos herdeiros, inclusive os indignos, ocorre no momento da aberturada sucessão, ou seja, quando da morte do autor da herança. Até o trânsito em julgado da sentença declaratória de indignidade, o indigno é considerado herdeiro aparente, sendo permitido a este o exercício de todos os direitos, inclusive o direito de promover a alienação onerosa do patrimônio hereditário a terceiro de boa fé. Contudo, após a declaração da indignidade, percebe-se que este herdeiro fica excluído da sucessão como se não tivesse participado dela nunca, isso é um resquício da antiga morte civil no plano sucessório. Diante disso, percebe-se que sentença que declara a indignidade é dotada de eficácia ex tunc, retroagindo a data da abertura da sucessão, de forma que a mesma é devolvida aos demais herdeiros e o indigno não deverá responder pelos encargos sucessórios sobre o seu quinhão perdido.
Nesses casos, o herdeiro aparente, isto é, aquele herdeiro que foi declarado indigno, ainda que tenha recebido a posse dos bens da herança, precisa os devolver, assim que a sentença declaratória transitar em julgado. É necessário que este também devolva os frutos e rendimentos oriundos dos bens ereptícios, conforme o que está prescrito no artigo 1817, parágrafo único, do Código Civil. Ademais, os outros sucessores também podem exigir que o herdeiro considerado indigno realize a reposição patrimonial, bem como arque com perdas e danos, uma vez que possuem direito à integralidade da herança desde a abertura da sucessão.
 Existe uma divergência doutrinária em relação à natureza da posse do herdeiro excluído. Parte da doutrina acredita que este é possuidor de boa-fé, e assim teria direito de ser reembolsado dos gastos que efetuou para a conservação dos bens ereptícios, contudo, uma outra parte acredita que sua posse é de má-fé. Independente de tal distinção, o que é incontroverso é que ainda que a sentença tenha efeito retroativo, esta não pode prejudicar terceiros de boa-fé, em razão ao princípio da aparência, uma vez que, pelo fato de o indigno estar na posse e administração dos bens da herança, esse é considerado herdeiro aparente. Logo, as alienações onerosas feitas por ele a terceiro de boa-fé são consideradas válidas. Contudo, deve-se levar em consideração a boa-fé do adquirente que acreditou ou não na legalidade do ato negocial efetivado. Todavia, tal regra não vale para doações e transferências gratuitas de bens, de forma que atos de liberalidade do herdeiro não subsistem e são anuláveis, ou seja, podem ser desconstituídos. 
Em suma, é perceptível que as alienações onerosas e os atos de administração praticados antes da declaração de indignidade são válidos e possuem efeito ex nunc. Porém, depois de citado para ação de indignidade, não mais se pode falar em boa-fé, em face dos defeitos do ato citatório. Diante disso, até o indigno ser excluído do direito a herança, este continuará sendo herdeiro aparente, e por isso terá direito a reembolso das despesas de conservação que tiverem efetuado. [footnoteRef:15] [15: DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. Ed. 7. São Paulo: Editora Juspodivm, 2021.] 
De forma contrária ao que ocorre na renúncia, percebe-se que, em razão do caráter personalíssimo da exclusão e pelo fato da necessidade de a pena ser considerada restritivamente, o quinhão hereditário do indigno é transmitido aos seus descendentes, que é herdam por representação. Contudo, se os descendentes do indigno forem menores de idade, o pai indigno não vai poder exercer os encargos patrimoniais decorrentes do poder familiar, de forma que não terá direito ao usufruto dos bens do filho e nem poderá administrá-los. Além disso, o legislador ainda excluiu o direito sucessório do indigno com referência aos bens que foram percebidos por seus descendentes, ou seja, os bens ereptícios que foram recebidos pelo filho do indigno não serão transmitidos ao genitor no caso de falecimento do filho. 
Além disso, vale ressaltar que um ato de indignidade pode gerar várias indignidades, sem que seja necessário ajuizar as respectivas ações, assim, um único ato, pode gerar a exclusão do herdeiro em relação a diversas heranças, é o que se chama de efeito cascata. 
Um outro efeito da declaração de indignidade que deve ser observado, é em relação ao cônjuge ou companheiro, pois mesmo a indignidade sendo pessoal, se o indigno for casado, a exclusão alcançará o cônjuge, mesmo que casados pelo regime da comunhão universal de bens, no qual se comunicam os direitos sucessórios. Nesse caso, o cônjuge ou companheiro não farão jus nem a metade do quinhão hereditário, uma vez que o direito de representação só beneficia os descendentes.
Quanto aos herdeiros testamentários e legatários que são considerados indignos, percebe-se que tal fato não afeta a higidez do testamento, pois apenas serão ineficazes as disposições que beneficiavam o herdeiro indigno. No caso do legado, este caduca, nos termos do artigo 1939, inciso IV, do Código Civil[footnoteRef:16]. Nesses casos, a declaração de indignidade de herdeiro testamentário ou legatário, não gera direito de representação, de forma que os sucessores não recebem no lugar do indigno, uma vez que isso apenas ocorre na sucessão legitima. Logo, se o testador não tiver especificado a quota parte de cada testamentário, a parte do indigno será repartida entre os demais herdeiros testamentários e legatários, por força do direito de acrescer. Todavia, se o testador definir o quinhão de cada herdeiro testamentário ou se o indigno for o único, a parte deste vai para os herdeiros legítimos. [16: BRASIL. Código Civil Brasileiro: Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.] 
Por fim, se o herdeiro indigno tiver recebido adiantamento de legitima, isso não impede que ele venha a ser declarado indigno, de forma que terá que devolver os bens recebidos, os quais devem ser trazidos à colação. Se a doação tiver ocorrido antes do ato de indignidade, este fato não livra o herdeiro de ser excluído da sucessão. Entretanto, se esta foi feita após o ato indigno do herdeiro, do qual o de cujos tinha conhecimento, considera-se que houve perdão. Mas, ainda assim, existe o direito de o doador revogar a doação por ingratidão do herdeiro.[footnoteRef:17] [17: DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. Ed. 7. São Paulo: Editora Juspodivm, 2021.] 
5 POSSIBILIDADE DE REABILITAÇÃO DO INDIGNO
Além da possibilidade do herdeiro ser considerado indigno, ainda há a possibilidade de o autor da herança o perdoar, conforme o que preceitua o art. 1818 do Código Civil.[footnoteRef:18] O perdão, que é ato personalíssimo, é chamado de reabilitação, e segundo Maria Berenice Dias é “declaração expressa do autor da herança, perdoando a indignidade de seu herdeiro”[footnoteRef:19]. Essa reabilitação pode ser levada a efeito por testamento ou ato autêntico (escritura pública, codicilo, escritura particular firmado pelo de cujus na presença de testemunhas). [18: BRASIL. Código Civil Brasileiro: Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.] [19: DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. Ed. 7. São Paulo: Editora Juspodivm, 2021.] 
A reabilitação apenas pode ser realizada por ato do autor da herança, uma vez que não afasta a indignidade, o perdão concedido pelas vítimas contra as quais o herdeiro cometeu a conduta indevida, sendo necessário, portanto, o perdão do de cujus. Contudo, caso os herdeiros deixem de promover de ajuizar ação de indignidade, a inércia destes acaba por ter o mesmo efeito da absolvição do indigno.
A reabilitação é irretratável e irrevogável, pois depois que há o perdão, o autor da herança não pode desfazê-lo, ou seja, não há o direito de arrependimento por parte do de cujus.
Além disso, vale ressaltar que se reabilitação foi levada a efeito por testamento, é preciso que esse seja válido, uma vez que se este for anulado, a reabilitação não valerá. Todavia, se este for considerado ineficaz, isto não invalida o perdão.
Resta claro que a reabilitação deve se dar de forma expressa pelo autor da herança, o que nos leva a acreditar não há que se falar em reabilitaçãotácita. Nesse sentido, se o de cujus simplesmente contemplar o indigno no testamento, isto não configurará o perdão. Contudo, existe uma única exceção para isso, que é o caso de o testamento ser elaborado depois do agir indevido do herdeiro, sendo o autor da herança sabedor da prática de tal ato, logo, nessas circunstâncias haverá perdão e reabilitação do herdeiro indigno.
Por fim, vale destacar que se o documento que configura o perdão for descoberto apenas depois que o herdeiro for excluído, a declaração de indignidade é anulável por meio do ajuizamento de ação rescisória ou ação de anulação da declaração de indignidade. Diante disso, o sucessor indigno recuperará o seu quinhão hereditário como se não tivesse perdido, podendo ainda buscar o ressarcimento contra os herdeiros que se beneficiaram de sua exclusão, recebendo o valor correspondente à data da abertura da sucessão com todos os acréscimos[footnoteRef:20]. [20: DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. Ed. 7. São Paulo: Editora Juspodivm, 2021.] 
6 ASPECTOS PROCESSUAIS DA EXCLUSÃO POR INDIGNIDADE
Pelo fato da exclusão do herdeiro indigno não se dar de forma automática, por força do artigo 1815[footnoteRef:21], é preciso que a indignidade seja declarada judicialmente por meio de uma ação ordinária com eficácia declaratória, a ação declaratória de exclusão por indignidade. Essa ação somente pode ser ajuizada após a morte do autor da herança, uma vez que antes disso pode ocorrer o perdão por parte do de cujus. Assim, percebe-se que no caso de o autor da herança querer afastar qualquer herdeiro por indignidade, não se pode valer de ação judicial, devendo deserdá-lo via testamento ou ato autêntico. [21: BRASIL. Código Civil Brasileiro: Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.] 
 De forma semelhante ao que acontece na ação declaratória de deserdação, o prazo para a propositura da referida ação é de 4 anos, trata-se de um prazo decadencial, que é contado a partir da abertura da sucessão. Em relação a isso existe uma exceção, pois no caso de existirem herdeiros menores de idade, o prazo só começa a ser contado após todos os herdeiros atingirem a maioridade.
Os legitimados para a propositura da ação, de acordo com Maria Berenice Dias[footnoteRef:22], são todos aqueles que demonstrarem legítimo interesse: cordeiros, legatários, donatários, credores e até mesmo o fisco, no caso de a herança poder ser considerada vacante. Ademais, o parágrafo segundo, do artigo 1815, do Código Civil, reconhece a legitimidade concorrente do Ministério Público. Essse artigo possui a constitucionalidade questionada por grande parte dos doutrinadores, os quais consideram que há a legitimidade do Ministério Público para a propositura da ação quando o ato de indignidade constituir crime de ação pública incondicionada e na hipótese de haver herdeiros incapazes ou interesse público. A ação pode ser proposta por um ou mais interessados, em litisconsórcio facultativo unitário, mas mesmo que nem todos os herdeiros participem da demanda, os efeitos da sentença valeram para todos, uma vez que os quinhões de cada um dos coerdeiros aumentarão se o indigno for excluído da sucessão. [22: DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. Ed. 7. São Paulo: Editora Juspodivm, 2021.] 
Na hipótese de o herdeiro falecer antes da abertura da sucessão, não haverá legítimo interesse para a busca da exclusão do herdeiro, assim, não caberá a propositura da ação declaratória de exclusão por indignidade. Nesse caso, será assegurado aos descendentes o direito de representação. Porém, se o herdeiro falecer depois da abertura da sucessão, isso não obsta a propositura da demanda, apesar de declaração de indignidade possuir natureza personalíssima, ademais, se a morte ocorrer no curso da demanda, a ação prosseguirá contra os herdeiros do indigno. 
É válido ressaltar que indignidade não pode ser declarada nos autos do inventário, mas deve tramitar perante o mesmo juízo deste. Além disso, não caberá a suspensão do processo de inventário, sendo que a única medida possível é a tutela antecipada, para que não se proceda a entrega do quinhão ao herdeiro cuja dignidade está sendo questionada em outros autos[footnoteRef:23]. [23: DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. Ed. 7. São Paulo: Editora Juspodivm, 2021.] 
Por fim, a sentença que declara a indignidade do herdeiro produzirá efeitos a partir do trânsito em julgado, contudo, possui eficácia ex tunc, de forma que os seus efeitos retroagem a data de abertura da sucessão. 
7 CONCLUSÃO
Em suma, percebe-se que a exclusão dos herdeiros por indignidade se traduz em um instituto que visa privar os direitos sucessórios de herdeiros legítimos ou testamentários que praticaram atos reprováveis contra o autor da herança. Esses atos são reprovados no âmbito legal, moral e ético, de forma que precisam ser sancionados e penalizados. Logo, a exclusão por indignidade mostra-se como uma sanção civil que gera reflexos patrimoniais negativos aos herdeiros, os quais deixam de receber o quinhão da herança do de cujus sobre o qual possuíam direito.
Esse instituto se mostra muito compatível com a atualidade, uma vez que prestigia a dignidade humana como princípio basilar da Constituição da República e de todo o direito brasileiro. Logo, percebe-se que o mesmo visa proteger a dignidade da pessoa humana, bem como outros de seus direitos fundamentais, fazendo com que aquele fere e desrespeita a dignidade do outro, sobretudo daquele com quem possui vínculo familiar e afetivo, seja punido na seara cível.
	Por fim, considera-se que este instituto, que gera a privação do direito sucessório hereditário assegurado constitucionalmente, é extremamente importante para evitar a prática de tais atos reprováveis contra o autor da herança. Além disso, o mesmo é muito importante para o direito sucessório e civil, bem como para a manutenção do princípio dignidade da pessoa humana.
8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Código Civil Brasileiro: Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 4 abr. 2021.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm >. Acesso em: 4 abr. 2021.
DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. Ed. 7. São Paulo: Editora Juspodivm, 2021.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 29. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. v. 6.
GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Manual de direito civil. São Paulo: Saraiva, 2017. 1768 p. v. único.

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