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Síndromes Colestáticas

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MÓDULO 2- PROBLEMA 4
SÍNDROMES
COLESTÁTICAS
___
ANATOMIA
FÍGADO
A veia porta, curta e larga, é formada pela união das veias mesentérica superior e esplênica,
posteriormente ao colo do pâncreas. Ascende anteriormente à VCI como parte da tríade portal
no ligamento hepatoduodenal. A artéria hepática, um ramo do tronco celíaco, pode ser dividida
em artéria hepática comum, do tronco celíaco até a origem da artéria gastroduodenal, e artéria
hepática própria, da origem da artéria gastroduodenal até a bifurcação da artéria hepática. Na
porta do fígado, ou perto dela, a artéria hepática e a veia porta terminam dividindo-se em ramos
direito e esquerdo; esses ramos primários suprem as partes direita e esquerda do fígado,
respectivamente. Nas partes direita e esquerda do fígado, as ramificações secundárias
simultâneas da veia porta e da artéria hepática suprem as divisões medial e lateral das partes
direita e esquerda do fígado, com três dos quatro ramos secundários sofrendo ramificações
adicionais (terciárias) para suprirem independentemente sete dos oito segmentos hepáticos.
DUCTOS BILIARES
Os ductos biliares conduzem bile do fígado para o duodeno. A bile é produzida continuamente
pelo fígado, armazenada e concentrada na vesícula biliar, que a libera de modo intermitente
quando a gordura entra no duodeno. A bile emulsifica a gordura para que possa ser absorvida na
parte distal do intestino.
O tecido hepático normal, quando seccionado, é tradicionalmente descrito como um padrão de
lóbulos hepáticos hexagonais, quando visto em pequeno aumento. Cada lóbulo tem uma veia
central que atravessa seu centro, do qual se irradiam sinusóides (grandes capilares) e lâminas de
hepatócitos em direção a um perímetro imaginário extrapolado das tríades portais
interlobulares adjacentes (ramos terminais da veia porta e artéria hepática, e ramos iniciais dos
ductos biliares). Embora comumente sejam considerados as unidades anatômicas do fígado, os
“lóbulos” hepáticos não são entidades estruturais; em vez disso, o padrão lobular é uma
consequência fisiológica dos gradientes de pressão e é alterado por doença. Como o ducto biliar
não é central, o lóbulo hepático não representa uma unidade funcional como ácinos de outras
2
glândulas. Entretanto, o lóbulo hepático é um conceito firmemente estabelecido e é útil para
fins descritivos.
Os hepatócitos secretam bile para os canalículos biliares formados entre eles. Os canalículos
drenam para os pequenos ductos biliares interlobulares e depois para os grandes ductos biliares
coletores da tríade portal intra-hepática, que se fundem para formar os ductos hepáticos direito
e esquerdo. Os ductos hepáticos direito e esquerdo drenam as partes direita e esquerda do
fígado, respectivamente. Logo depois de deixar a porta do fígado, esses ductos hepáticos
unem-se para formar o ducto hepático comum, que recebe no lado direito o ducto cístico para
formar o ducto colédoco (parte da tríade portal extra-hepática do omento menor), que conduz a
bile para o duodeno.
DUCTO COLÉDOCO
O ducto colédoco (antes chamado de ducto biliar comum) forma-se na margem livre do omento
menor pela união dos ductos cístico e hepático comum. O comprimento do ducto colédoco varia
de 5 a 15 cm, dependendo do local onde o ducto cístico se une ao ducto hepático comum.
O ducto colédoco desce posteriormente à parte superior do duodeno e situa-se em um sulco na
face posterior da cabeça do pâncreas. No lado esquerdo da parte descendente do duodeno, o
ducto colédoco entra em contato com o ducto pancreático. Esses ductos seguem obliquamente
através da parede dessa parte do duodeno, onde se unem para formar uma dilatação, a ampola
hepatopancreática. A extremidade distal da ampola abre-se no duodeno através da papila maior
do duodeno. O músculo circular ao redor da extremidade distal do ducto colédoco é mais
espesso para formar o músculo esfíncter do ducto colédoco (L. ductus choledochus). Quando o
esfíncter contrai, a bile não consegue entrar na ampola e no duodeno; portanto, reflui e segue
pelo ducto cístico até a vesícula biliar, onde é concentrada e armazenada. A irrigação arterial do
ducto colédoco provém de:
Artéria cística: que irriga a parte proximal do ducto
Artéria hepática direita: que irriga a parte média do ducto
Artéria pancreaticoduodenal superior posterior e artéria gastroduodenal: que irrigam a parte
retroduodenal do ducto.
A drenagem venosa da parte proximal do ducto colédoco e dos ductos hepáticos geralmente
entra diretamente no fígado. A veia pancreaticoduodenal superior posterior drena a parte distal
do ducto colédoco e esvazia-se na veia porta ou em uma de suas tributárias.
3
METABOLISMO DA BILIRRUBINA
A bilirrubina é formada a partir da degradação de células vermelhas do sangue. Assim, ao final
de 120 dias (em média), as hemácias senis são fagocitadas pelo sistema reticuloendotelial,
principalmente do baço, onde a hemoglobina é degradada a heme, monóxido de carbono e
bilirrubina indireta sob ação da enzima hemioxigenase.
Essa bilirrubina formada é dita indireta ou não conjugada por ser lipossolúvel, atravessar
facilmente as membranas lipoproteicas (em particular, a barreira hematoliquórica) e não ser
excretada pelos rins. A sua produção diária é de cerca de 300 mg, sendo 70 a 75% provenientes
do sistema reticuloendotelial e os restantes 25 a 30% do heme hepático e de hemoproteínas,
sobretudo do citocromo P-450.
A fim de se tornar hidrossolúvel para ser excretada, a bilirrubina indireta se liga fortemente à
albumina plasmática, para assim ser transportada para o polo sinusoidal do hepatócito, e a
ligação é do tipo covalente. Dessa forma, se torna a bilirrubina direta ou conjugada. Uma vez
conjugada, a bilirrubina é transportada através da árvore biliar para o intestino por meio do
ducto biliar comum.
No intestino, a bilirrubina é metabolizada por bactérias para produzir estercobilinogênio, que
dá a cor marrom às fezes. Se ela não alcançar o intestino, as fezes ficam pálidas. O
estercobilinogênio é parcialmente reabsorvido e re-excretado na urina como urobilinogênio,
podendo ser detectado por exames bioquímicos simples.
4
ICTERÍCIA
Icterícia significa coloração amarelada de pele e mucosas, consequente ao acúmulo de
bilirrubina no soro e tecidos. Representa sinal clínico de extrema importância no diagnóstico e
estadiamento das doenças hepatobiliares, podendo ocorrer também como consequência de
doenças extrínsecas a essas estruturas.
➔ Manifesta-se clinicamente quando os níveis séricos de bilirrubina excedem 2,5 mg/dl, no
adulto, e 8 a 9 mg/ dl, no neonato.
Icterícia por hiperbilirrubinemia direta:
As colestáticas ocorrem por déficit na excreção hepatocitária. Existe predomínio da bilirrubina
direta:
➔ Obstrução biliar extra-hepática: cálculos biliares, câncer de pâncreas e linfonodos.
O bloqueio completo está associado a um aumento tanto da bilirrubina quanto da fosfatase
alcalina (FA), com pouco ou nenhum urobilinogênio na urina e fezes claras.
Icterícia por hiperbilirrubinemia indireta:
As não colestáticas são causadas por: maior oferta de bilirrubina ao fígado, deficiência de
captação pelo hepatócito ou defeito no transporte extracelular e/ou na conjugação.
5
O acúmulo de bilirrubina no plasma e tecidos resulta de alteração ou bloqueio nos processos de
metabolização, que incluem as fases de formação, transporte, captação, conjugação e excreção
do pigmento. Alterações na forma e função dos eritrócitos e situações que interferem no seu
transporte levam a um aumento da oferta do pigmento.
Icterícia por danos hepáticos:
➔ Obstrução biliar intra-hepática (também relacionada à hiperbilirrubinemia indireta): cirrose,
câncer de fígado, infecção ou toxinas
1. A bilirrubina pode estar normal no bloqueio parcial, embora a FA esteja geralmente alta. Isto
é tradicionalmente visto em uma neoplasia secundária isolada no fígado, perturbando
parcialmente a árvore biliar. O tecido hepático não afetado ainda pode processar e excretar
bilirrubina; a FA refleteo grau de obstrução.
2. A obstrução biliar intra-hepática é muito mais difícil de diagnosticar do que a obstrução
extra-hepática.
3. As causas mais comuns de icterícia aguda observadas em adultos são hepatite viral e
intoxicação por paracetamol. Nesses casos, não apenas a bilirrubina e as concentrações de FA
estão elevadas, mas a ALT está elevada, indicando dano hepatocelular.
COLELITÍASE
ETIOLOGIA E FATORES DE RISCO
A agregação familiar de colelitíase se deve, provavelmente, à influência genética. Em tais
pacientes, podem-se notar vagas de crises dolorosas, frequentemente iniciadas antes dos 40
anos e cerca de 50% deles apresentam uma anomalia do gene MDR3 (mutações homozigotas ou
heterozigotas). Embora a litíase vesicular seja observada na infância e adolescência, a
predominância se faz a partir da quinta década de vida, aumentando progressivamente com a
idade. É mais frequente na mulher, na qual ocorre mais cedo do que no homem. Influências
hormonais parecem ser o fator responsável pela diferença, já que os anticoncepcionais duplicam
a incidência na mulher fértil, e o uso de estrogênios na pós-menopausa estava associado a
incidência duas vezes e meia maior. A diminuição da motilidade vesicular é um fator
importante, efeito adicional dos hormônios.
Existe maior prevalência de litíase em multíparas, quando comparadas com nulíparas, e
evidências recentes confirmam o tradicional conceito de que o risco de adquirir cálculos
6
vesiculares aumenta com o número de gestações. Além do efeito hormonal, alterando a
composição biliar, durante a gestação há relativa hiperlipoproteinemia e alterações motoras da
vesícula. Os cálculos de colesterol são três vezes mais frequentes na obesidade acentuada. Há
prevalência aumentada de litíase colesterólica em indivíduos com hiperlipoproteinemia do tipo
IV, em que o defeito fundamental é a elevação sérica dos triglicerídios e pré-betalipoproteínas,
havendo uma deficiente regulação da secreção biliar, com redução do pool de sais biliares e
síntese deficiente de lecitina. Observou-se maior incidência de colelitíase em diabéticos
(distúrbio do metabolismo lipídico ao nível do hepatócito).
FISIOPATOLOGIA
A formação dos cálculos de colesterol compreende três estágios principais: supersaturação biliar
com formação de bile litogênica, nucleação e crescimento dos cálculos.
LITÍASE DE COLESTEROL
Na etiopatogenia da litíase de colesterol, atribui-se papel primordial à secreção pelo fígado de
bile supersaturada em colesterol, também chamada bile litogênica (contém excesso de
colesterol em relação aos sais biliares e fosfolipídios). Nessas condições, há mudanças no seu
estado físico, e a bile, habitualmente urna solução homogênea, transforma-se em um sistema
bifásico, contendo colesterol em estado cristalino. Esse fenômeno ocorre quando a relação de
sais biliares mais fosfolipídios sobre colesterol cai abaixo de um nível crítico.
Diversos mecanismos podem produzir bile hipersaturada em colesterol Esses mecanismos
podem ser intra ou extrahepáticos. Dentre os mecanismos intra-hepáticos que podem levar a
uma secreção de "bile litogênica", destaca-se a deficiência de solventes (sais biliares e/ou
fosfolipídios), que pode ocorrer nas seguintes condições: 1) hipersensibilidade do mecanismo de
retroalimentação de sais biliares ao nível do fígado; 2) perda excessiva de sais biliares (doenças
no, ou operações sobre o íleo terminal); 3) síntese deficiente de sais biliares; e 4) redução na
síntese de fosfolipídios. O outro mecanismo é o excesso de soluto (colesterol), sendo este
considerado o mais importante, encontrado na obesidade, em grupos étnicos ou genéticos,
dietas hipercalóricas, dietas de redução de peso, dietas ricas em colesterol, no uso de drogas,
como a colestiranina, e em distúrbios metabólicos, tais como hipertrigliceridemias,
hiperlipoproteinemias e diabetes.
Os mecanismos extra-hepáticos causadores de bile "litogênica" são: 1) circulação acelerada de
sais biliares; 2) distúrbios primários da vesícula, canais ou esfíncteres. Ultimamente, têm se
falado na possibilidade de um trânsito intestinal mais lento, associado à hipomotilidade da
vesícula; isso acarretaria maior quantidade de bile hepática entrando no intestino proximal,
7
maior e mais prolongada exposição dos sais biliares à ação bacteriana anaeróbica e consequente
maior transformação de colato em desoxicolato. desoxicolato. Esse sal hidrofóbico diminuiria
ainda mais o transporte intestinal, permitindo que maior quantidade de colesterol fosse
absorvida e recirculada. O desoxicolato ainda seria responsável por um aumento no processo de
cristalização do colesterol.
NUCLEAÇÃO DO COLESTEROL
Para haver formação de cálculos a partir de bile hipersaturada, é preciso que ocorra o fenômeno
da nucleação, que é o processo pelo qual os cristais de colesterol monoidratado se formam e
aglomeram. Um avanço importante na patogenia da litíase de colesterol foi a descoberta de que
o tempo de nucleação - tempo necessário para detecção microscópica de cristais de colesterol in
vitro - da bile vesicular dos indivíduos com litíase é muito menor do que em indivíduos
controles, mesmo que tenham bile hipersaturada. A nucleação é precedida pela formação das
vesículas (organelas) unilamelares de colesterol - fosfolípidos que, ingressando em uma fase
metastável, formam vesículas multilamelares, que, posteriormente, dão origem aos cristais
líquidos, antecedendo a precipitação dos cristais sólidos de colesterol monoidratado. Fatores
antinucleantes (apoproteínas AI e A2), que são encontrados na bile não litogênica, impedem,
em uma certa medida, a formação de agregados de cristais de colesterol.
CRESCIMENTO DOS CÁLCULOS
Os microcálculos assim formados vão atingir tamanho macroscópico pela influência de fatores
encontrados no interior da vesícula biliar. Além da estase vesicular e da estratificação da bile
por esta determinada, valoriza -se cada vez mais o papel do muco vesicular no crescimento dos
cálculos. Assim, admite-se que o gel de mucina age por diferentes mecanismos: 1) formando
bolsões que retêm os cristais; 2) as moléculas de glicoproteínas da mucina parecem formar um
cimento intercristalino que provoca a aderência entre os cristais; 3) devido à hipomotilidade
vesicular, o conglomerado gel de mucina - cristais permanece na vesícula por tempo
prolongado, permitindo a moldagem de cálculos grandes pela adição contínua de novos cristais.
QUADRO CLÍNICO
O episódio mais característico é a chamada cólica biliar. A dor é intensa, contínua, e, raramente,
em cólica, com períodos de exacerbação, localizada em epigástrio ou hipocôndrio direito, às
vezes irradiando-se para a região interescapulovertebral. Pode também ser referida na região
lateral do pescoço. É de início súbito, aumentando de intensidade rapidamente. Se persistir por
mais de 3 h, deve-se pensar em colecistite aguda. Ocorre mais frequente à noite, quando a
vesícula biliar assume posição horizontal, facilitando a mobilização dos cálculos para o cístico.
8
O intervalo entre as cólicas é variável. É frequente a presença de náuseas e vômito. Os sintomas
dispépticos, a intolerância a alimentos gordurosos, a cefaleia e a pirose dificilmente poderiam
ser atribuídos à litíase biliar. A cólica pode iniciar sem nenhum evento precipitante. Não se
conseguiu demonstrar relação entre o tipo de dieta e o início da dor. Um fato clínico
interessante é que pode ocorrer desaparecimento de cálculos biliares no interior da vesícula,
sem que se constitua fístula bilioentérica. A primeira possibilidade corresponde à migração dos
cálculos para o intestino, mesmo sem dor ou icterícia. A segunda possibilidade refere-se à
dissolução espontânea de cálculos de colesterol.
DIAGNÓSTICO
A cólica biliar simples é tipicamente associada a exames hematológicos normais. Os métodos
complementares de diagnóstico mais importantes são os exames radiológicos e
ultrassonográficos. Deve-se iniciar pela ultrassonografia, que apresenta sensibilidade e
especificidade de 95% para cálculos com mais de2 mm. Em casos suspeitos, sem alterações à
ultrassonografia, prossegue-se com a colecistografia oral e prova motora. Esse método, embora
pouco usado hoje, ainda pode ser útil. A radiografia simples de abdome pode diagnosticar
cálculos radiopacos, eventualidade que não excede 15% dos casos. Na colecistografia oral,
quando a vesícula não é identificada, convém repetir o exame no dia seguinte com dose dupla de
contraste. Se, ainda assim, persistir a falha de impregnação, há 95% de chance de existir doença
vesicular. Em 2 a 6% de portadores de litíase vesicular, com colecistografias orais positivas, não
serão evidenciados os seus cálculos, mas falso-negativos também são observados à
ultrassonografia.
Há grande possibilidade de a vesícula opacificar-se à colangiografia venosa (CV) sem demonstrar
cálculos contidos no seu interior. Mesmo considerando-se a via biliar principal, os erros
diagnósticos com a CV são elevados. Esse procedimento quase não é mais usado. A
colangiografia retrógrada por via endoscópica (CRE) constitui um meio muito sensível de
diagnosticar a litíase ductal. Atualmente, tem crescido em importância a colangiografia por
ressonância nuclear magnética, que, no momento, só pode servir para fins diagnósticos, e não
terapêuticos. É um método que pode ser usado em grávida, pois não é ionizante.
TRATAMENTO
De acordo com os conhecimentos atuais, que naturalmente poderão ser modificados, a nossa
conduta é indicar o tratamento da litíase biliar nos seguintes casos:
1) Pacientes com sintomas de dor biliar e cálculos. 2) Pacientes com doença biliar complicada.
3) Vesícula biliar em porcelana. 4) Pacientes com vesícula funcionalmente excluída.
9
5) Casos selecionados de litíase assintomática: Paciente com expectativa de vida superior a 30
ou 40 anos. Portadores de múltiplos cálculos vesiculares menores que 5 mm. Indivíduos de
populações com alto índice de câncer da vesícula biliar. Portadores de cálculos que vivem em ou
viajem para regiões sem condições de assistência médica. Pessoas que, por motivos psicológicos,
ou por conhecerem e temerem complicações, prefiram a colecistectomia, por exemplo, médicos
que solicitam a operação. Ressalvamos que há médicos que defendem nunca operar a litíase
assintomática.
6) Pacientes portadores de litiase nos canais biliares, sintomáticos ou não.
O tratamento da litíase biliar, tanto da vesícula quanto dos ductos biliares, modificou-se
consideravelmente na última década. O método mais definitivo e curativo da doença litiásica
vesicular continua a ser a colecistectomia, quer por videolaparoscopia, quer pela via aberta. De
maneira geral, os métodos optativos atualmente disponíveis agem por retirada dos cálculos,
fragmentação ou por dissolução deles, ou, ainda, por uma combinação desses procedimentos.
Litotripsia por ondas de choque extracorpóreas.
A litotripsia por ondas de choque extracorpóreas (LOCEC) é uma técnica não invasiva,
introduzida em 1985, aplicável a pacientes selecionados, em regime ambulatorial, sem anestesia
geral obrigatória e que possibilita o retorno ao trabalho quase imediatamente. Considerando-se
os conhecimentos atuais, o método é indicado em menos de 10% dos casos de litiase vesicular
sintomática, conforme os seguintes critérios:
Critérios de Inclusão: História de dor biliar. Vesícula funcionante (contrastada à colecistografia
oral). Cálculo vesicular radiotransparente, com diâmetro maior que 4 mm e inferior a 30 mm, ou
até três cálculos com diâmetros que, somados, não ultrapassem 30 mm. Admite-se a inclusão de
cálculos com camada periférica delgada calcificada, ou com núcleo de calcificação, ambos
inferiores a 3 mm. Não deve haver interposição de pulmão, osso, cisto ou aneurisma no trajeto
das ondas de choque. Dueto cístico prévio. Paciente motivado e bem esclarecido a respeito do
método. Anuência assinada.
Critérios de Exclusão: Vesícula não funcionante (excluída à colecistografia oral). Presença de
colecistite aguda, colangite ou pancreatite aguda. Presença de cálculos duetais concomitantes.
Úlcera péptica gastroduodenal em atividade. Coagulopatia. Hepatopatia em atividade. Arritmia
cardíaca grave. Presença de marca-passo. Gravidez. Terapia com anticoagulantes ou inibidores
de agregação plaquetária.
Dissolução de cálculos vesiculares por medicamentos usados VO
10
O uso clínico de sais biliares VO só começou na década de 1970. Os critérios para inclusão são:
cálculos de colesterol pouco numerosos e com diâmetro inferior a 5 a 1 O mm; vesícula
funcionante, com dueto cístico pérvio; pacientes magros e com cálculos que boiam na bile. Hoje
em dia, há principalmente dois medicamentos que podem ser usados na dissolução de cálculos
biliares: o ácido quenodesoxicólico (AQDC) ou o seu epímero, o ácido ursodesoxicólico (AUDC).
As doses do AUDC são de 8 a 15 mg por kg/peso/dia e, para o AQDC, 750 mg/dia. A combinação
dos dois ácidos não demonstrou vantagens sobre a utilização de apenas um ácido, embora
alguns advoguem o uso da combinação. A eficiência do AQDC pode ser melhorada com a
associação das estatinas, que ativam o gene MDR3, e limitada pelos fibratos, que aumentam a
secreção de colesterol e não estimulam o gene MDR3. Os efeitos colaterais, mais frequentes com
o AQDC, incluem diarreia, hipercolesterolemia e, raramente, lesão hepática. Pode também
ocorrer obstrução dos canais biliares, gerada por migração de cálculos, ocasionando cólica biliar,
colecistite ou colangite. As contraindicações são cálculos radiopacos, vesícula não funcionante,
colecistite aguda, colangite, calculose do colédoco, doenças inflamatórias intestinais e
insuficiência renal.
Dissolução de cálculos vesiculares por éter metiltertbutil através de cateter percutâneo
transepático
O EMTB é um solvente de contato. A vesícula é puncionada por via percutânea transepática e
posicionado cateter em seu interior, sob controle ultrassonográfico ou fluoroscópico. Cinco a 10
mf de éter são instilados e trocados a cada 4 a 6 min (o que pode ser feito por máquina
automática).
Colecistectomia
Foi por muito tempo considerada como tratamento "padrão-ouro", com o qual os outros
métodos terapêuticos deveriam ser comparados. Entretanto, visando a uma menor agressão ao
paciente, métodos cirúrgicos menos invasivos foram estudados. Entre eles, a colecistectomia
por minilaparotomia (atualmente pouco utilizada) e a colecistectomia por videolaparoscopia.
COLECISTITE
COLECISTITE AGUDA CALCULOSA (CAC)
ETIOLOGIA
A colecistite aguda calculosa é uma complicação da litíase biliar e depende da obstrução do
canal cístico por um ou mais cálculos biliares.
11
FISIOPATOLOGIA
A migração de cálculo( os) da vesícula para o infundíbulo vesicular, para o cístico ou para o
colédoco, pode provocar uma obstrução. Se esta não é aliviada, há aumento da pressão
intraluminal e distensão da vesícula. Isso provoca os sintomas dor, náusea e vômito. A
inflamação resulta de três fatores, mecânico, químico e infeccioso. Com a obstrução do canal
cístico, a bile torna-se hiperconcentrada em sais biliares e colesterol, causando irritação
química e consequente edema da mucosa. A lesão da mucosa libera enzimas intracelulares, que,
por sua vez, ativam mediadores da inflamação. Ocorre um aumento da produção de
prostaglandinas, com consequente menor produção de muco pela mucosa, levando a
espessamento da parede vesicular, aumento da pressão intraluminar e compressão dos vasos
sanguíneos e linfáticos. Essas alterações vasculares, caracterizadas por insuficiência arterial e
congestão venosa intensa, interferem secundariamente na evolução da colecistite aguda e
influem na extensão da necrose da parede vesicular.
As bactérias aeróbias geralmente encontradas são E. coli, Streptococcus faecalis, Streptococcus
não hemolíticos, Klebsiella e Proteus. Entre os anaeróbios, os principais são C. welchii e C.
perfringens. As alterações anatomopatológicas variam amplamente. A evolução natural da
doença e a gravidade das lesões dependem da persistência da obstrução, da contaminação
bacteriana, da virulência dos germese do grau de isquemia da parede vesicular. As alterações
macroscópicas consistem em edema, congestão e espessamento da parede vesicular. O peritônio
perde o brilho e é coberto por exsudato serofibrinoso. Formam -se aderências que isolam a
vesícula do resto da cavidade abdominal. A inflamação estende-se à junção do cístico com a via
biliar principal, e o linfonodo do cístico geralmente aumenta de volume. Quando a vesícula está
fibrosada e retraída devido a crises prévias, as alterações inflamatórias são menos evidentes.
O exame histopatológico evidencia quatro fases evolutivas. A fase aguda, observada na 1ª
semana, caracteriza-se por edema maciço da parede, com hemorragia e necrose da mucosa. No
2º ou 3º dia, já se inicia a proliferação de fibroblastos. Na fase subaguda, que corresponde à 2ª
semana, notam-se infiltração leucocitária pronunciada, regressão do edema e maior
proliferação de fibroblastos, além de necrose e abscessos intramurais. A fase subcrônica,
durante a 3 e a 4ª semanas, é marcada pela substituição dos leucócitos polimorfonucleares por
linfócitos e células plasmáticas. Aparecem eosinófilos e lesões granulomatosas plasmáticas. Na
fase crônica, que se inicia com a 5ª semana, a mucosa torna-se fina e sem vilosidades.
Observa-se acentuada fibrose de todas as túnicas. Embora as fases evolutivas descritas sejam
bem definidas, os limites de cada uma não são rígidos. Além disso, pode haver associação de
lesões típicas de fases diversas.
12
QUADRO CLÍNICO
A colecistite aguda incide principalmente após a 4ª década. Em 75% dos casos, os pacientes
descrevem crises anteriores de dor do tipo biliar. O sintoma mais evidente é a dor abdominal
aguda, contínua, no epigástrio ou quadrante superior direito, mas pode ser de localização
variada, às vezes mal definida, antes de se restringir ao hipocôndrio direito. Pode simular uma
cólica biliar, porém é mais intensa e prolonga-se por mais de 3 h. Apresenta, com frequência
variada, irradiação dorsal para as regiões escapular direita e interescapular. Em mais da metade
dos casos, há náusea e vômito. A temperatura eleva-se até 38,5°C, e a frequência cardíaca
acelera moderadamente. Quando a inflamação atinge o peritônio parietal, surgem dolorimento,
dor à descompressão e contratura muscular no quadrante superior direito. O sinal de Murphy
fica caracterizado quando o doente respira profundamente, durante a palpação da área
subcostal direita, e sente dor aguda que o obriga a interromper subitamente a inspiração. Em
30-50% dos casos, palpa-se uma vesícula distendida, arredondada e lisa, ou nota-se plastrão
formado pela vesícula e por estruturas a ela aderidas. Se já houver fibrose anterior à inflamação
aguda, isto é, colecistite crônica escleroatrófica, a vesícula não se distenderá, nem será palpável.
A icterícia manifesta-se em torno de 20% dos pacientes, sendo geralmente discreta e fugaz.
Resulta de inflamação do pedículo hepático, de litíase ductal, de inflamação hepatocelular, de
espasmo do esfíncter de Oddi ou de colangite associada. Se a icterícia se acentua, o médico deve
pensar em litíase no colédoco, que pode estar associada em até 50% dos casos de colecistite.
DIAGNÓSTICO
Os exames subsidiários aconselháveis em doentes com diagnóstico provável de colecístíte aguda
são: hemograma, com contagem global e diferencial, e eletrólitos no sangue. Especialmente
quando se observa icterícia, acrescentam-se dosagens de transaminases, fosfatase alcalina e
tempo de protrombina.
Naturalmente, os exames de sangue pré-operatórios de rotina devem ser solicitados. Na
colecistite aguda não complicada, a leucocitose costuma ser moderada, de 10.000 a 15.000
leucócitos por mm3 . Elevação discreta das bilirrubinas séricas é frequente. Em alguns casos, a
concentração de amilase aumenta, mesmo na ausência de pancreatite aguda associada. O
eletrocardiograma faz parte do estudo pré-operatório porque muitos desses pacientes são
idosos e portadores de cardiopatias, sobretudo de doença coronariana.
O estudo radiológico inclui radiografias de tórax e simples do abdome. Através deste último
exame, evidenciam-se cálculos radiopacos em até 15% dos doentes, ou pode-se identificar ar na
parede da vesícula em casos de colecistite enfisematosa.
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A ultrassonografia merece especial menção. Por ser exame não invasivo, muito bem tolerado e
simples, deve ser o primeiro a ser solicitado. Além do diagnóstico de cálculos, serve também
para o diagnóstico diferencial com abscessos, câncer ou cistos. O índice de diagnóstico correto
ultrapassa a taxa de 95%. Um sinal de Murphy ultrassonográfico tem um valor preditivo acima
de 90%, se a litíase vesicular está presente. Atualmente, a determinação do volume da vesícula
biliar, da espessura de sua parede e de alterações do fluxo vascular ao Doppler são sinais
importantes que ajudam a prever dificuldades técnicas durante a colecistectomia. Porém, os
achados ultrassonográficos ainda são considerados limitados em relação ao prognóstico. A
cintigrafia hepatobiliar não identifica cálculos, mas pode ser importante no diagnóstico de
colecistite aguda.
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Úlcera perfurada, pancreatite, apendicite aguda e várias outras afecções que se manifestam por
dor no hipocôndrio direito. Dentre estas, ressaltam-se a hepatite aguda, a pneumonia do lobo
inferior direito, o infarto pulmonar e pleurite basal, a pielonefrite à direita, o abscesso hepático
e a síndrome de peri-hepatite (síndrome de Fitz-Hugh e Curtis). Em pacientes idosos, deve-se
considerar o infarto do miocárdio de apresentação atípica.
TRATAMENTO
O tratamento definitivo da colecistite aguda é cirúrgico. Entretanto, deve ser precedido de
terapêutica clínica, cuja duração depende da gravidade das lesões, do estado geral do paciente e
da escolha do momento oportuno para intervir. Interrompe-se a alimentação VO. A sonda
nasogástrica só será aconselhável quando houver vômito. A escolha do analgésico, assim como
sua dosagem, dependerá de cada caso. Habitualmente, a dipirona IV, é suficiente, sendo
desnecessária a utilização de antiespasmódicos. Se a dor persiste, pode-se administrar
meperidina. Nem sempre é necessário usar antibióticos nos portadores de colecistite aguda. No
entanto, a indicação de antibioticoterapia é indiscutível quando a colecistite aguda é grave, em
idosos, diabéticos, imunossuprimidos e, de maneira geral, em pacientes com defesa
antibacteriana reduzida. A escolha de antibióticos que sejam eliminados pelo fígado é
dispensável, porque a oclusão do cístico impede sua penetração na luz da vesícula.
Antes de obtermos o resultado da cultura e provas de sensibilidade aos antibióticos, optamos
pela cefalosporina de 1ª geração em casos moderados, e pela clindamicina associada à
gentamicina, ou cefalosporina de terceira geração e metronidazol, em casos graves.
Naturalmente, pode ser aconselhável modificar o esquema terapêutico no pós-operatório
segundo os resultados da cultura e do antibiograma. O uso bem orientado de antibióticos reduz
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significativamente a incidência de complicações e infecções pós-operatórias em portadores de
colecistite aguda.
A maioria dos cirurgiões recomenda a operação precoce, em geral nas primeiras 24 a 48 h após a
admissão, mas alguns poucos ainda preferem intervir tardiamente. A operação precoce é
geralmente mais fácil nos três primeiros dias da doença, porque o edema inflamatório da
vesícula e das estruturas vizinhas facilita a dissecção. Esse aspecto é importante porque parcela
apreciável de pacientes é hospitalizada três ou mais dias após o início da sintomatologia aguda.
Se a crise aguda melhora com o tratamento clínico, conforme acontece na maioria dos casos,
preferimos operar logo depois de estabelecer o diagnóstico e de preparar convenientemente o
enfermo, o que leva de 2 a 3 dias. É aconselhável efetuar a operação até 7 dias após o início da
crise, porque, a partir da 2ªsemana de evolução, as alterações inflamatórias, especialmente a
fibrose, dificultam a identificação dos elementos anatômicos, o descolamento de aderênciase a
dissecção ao nível do pedículo hepático. Quando não é possível operar nessa fase, pode-se
manter o tratamento clínico e intervir 2 a 3 meses mais tarde. A operação tardia é realizada após
a regressão do processo inflamatório agudo.
A colecistectomia videolaparoscópica (CVL) constitui moderna opção para tratamento da
colecistite aguda e tem sido a abordagem de escolha. É preciso ter em mente que a incidência de
conversão de CVL para operação aberta eleva-se consideravelmente em casos de colecistite
aguda. Em estudo recente, a realização do procedimento após 48 h do início dos sintomas,
leucócitos acima de 15.000 e parede da vesícula com espessura superior a 7 mm foram
considerados os fatores mais importantes para ocorrer a conversão.
A colecistostomia (convencional ou percutânea) ocupa um lugar bem definido. É a intervenção
de escolha em alguns doentes considerados de mau prognóstico cirúrgico devido a idade
avançada, graves doenças associadas ou intensa toxemia. Também deve ser preferida quando o
cirurgião planeja efetuar uma colecistectomia, mas encontra lesões inflamatórias tão intensas
que dificultam a operação e colocam em risco a segurança do paciente.
O prognóstico da colecistite aguda é muito variável, pois depende da idade do paciente, da
intensidade das lesões, da presença de complicações e de afecções associadas.
COLECISTITE AGUDA ACALCULOSA (CAA)
ETIOLOGIA
Em pequeno número de casos, a colecistite pode ser acalculosa. A obstrução do canal cístico
pode decorrer de neoplasia, estenose fibrosa, Ascarís lumbricoídes, compressão por linfonodos
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aumentados, artérias císticas ou hepáticas anômalas, aderências, ou de vólvulo da vesícula com
angulação acentuada do canal cístico. Ultimamente, têm sido relatadas séries de casos de CAA
após intervenções não relacionadas com as vias biliares, traumatismos de guerra e queimaduras
graves. A inflamação seria desencadeada por estase de bile hiperconcentrada em consequência
de jejum prolongado, anestesia, opiáceos, desidratação e imobilização, além de infecção por
germes oriundos de diferentes setores do organismo. Têm sido descritos casos em pacientes
imunodeprimidos, tais como em aidéticos, doentes submetidos a quimioterapia antineoplásica,
leucêmicos e portadores de linfomas.
DIAGNÓSTICO
A dor é a queixa mais frequente, localizando-se geralmente no quadrante superior direito,
acompanhada de vômito e febre. Ao exame físico, o mais constante sinal é a defesa no
hipocôndrio direito e, menos frequentemente, palpa-se tumefação nessa área. A icterícia é
achado inconstante. O hemograma apresenta leucocitose com frequente desvio para a esquerda.
A hemocultura, nas septicemias, pode demonstrar o agente infeccioso implicado na CAA. Nos
casos de pneumocolecístíte (colecístíte enfisematosa ou gasosa), demonstra-se ar na parede da
vesícula e nos duetos biliares na radiografia simples do abdome, sinal que, entretanto, demora
de 24 a 48 h para aparecer (ver adiante). O principal exame por imagem é a ultrassonografia
abdominal. Nesta, quando a espessura da parede da vesícula mede 3,5 mm ou mais e na
ausência de ascite, o diagnóstico é provável em 98% dos casos.
A tomografia computadorizada mostra sensibilidade de 95% e é particularmente útil para
excluir outras doenças abdominais que poderiam estar confundindo o diagnóstico correto.
Entretanto, depende da mobilização do paciente para o aparelho, o que pode ser impossível em
casos muito graves. Pode-se, ainda, recorrer à cintigrafia (IDA), mas resultados falso-positivos
podem ser encontrados em pacientes alcoólatras, em casos submetidos a nutrição parenteral e
em doentes em jejum prolongado ou que se alimentaram recentemente. Além disso, na CAA o
dueto cístico pode estar pérvio, permitindo o acesso da substância radioativa ao interior da
vesícula, portanto um resultado falso-negativo.
TRATAMENTO
O tratamento é cirúrgico e consiste na colecistectomia sempre que possível. Em casos
especialmente graves, pode-se optar pela colecistostomia. Atualmente, é possível fazer a
colecistostomia colocando um cateter por via percutânea, guiado por ultrassonografia,
procedimento aconselhável em pacientes de alto risco para a cirurgia convencional. Para muitos
doentes, esse será o tratamento definitivo.
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COLECISTITE ENFISEMATOSA
Esta forma de colecistite caracteriza-se por infiltração gasosa da parede vesicular, de sua luz, de
duetos biliares e até de tecidos perivesiculares. Pode tanto complicar a doença litiásica da
vesícula quanto surgir em uma vesícula sem cálculos. A flora responsável varia, mas o principal
agente é o Clostridium welchii; a Escherichia coli e outras bactérias anaeróbias podem estar
envolvidas. Os homens são mais acometidos do que as mulheres, em uma proporção de 3:1.
Cerca de 20% dos doentes são diabéticos. Suspeita-se que a doença seja desencadeada por
obstrução da artéria cística e consequente isquemia vesicular. O quadro clínico é semelhante ao
que se descreveu para as outras formas de colecistite aguda, mas a dor é mais pronunciada e o
paciente mostra um aspecto mais grave e tóxico. O melhor método de diagnóstico é a
ultrassonografia, e as alterações da vesícula e vizinhanças são detectadas mais precocemente
que ao exame radiológico simples de abdome. O tratamento inclui a imediata introdução de
antibióticos (penicilina, clindamicina ou, então, imipenen), em doses plenas, e colecistectomia
tão cedo quanto possível. A complicação local mais grave é a gangrena da parede do colecisto e
sua perfuração. A morbidade e a mortalidade são superiores às observadas nas outras formas de
colecistite.
COLANGITE
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
O desenvolvimento de colangite necessita de duas condições:
1- Presença de bactérias no trato biliar;
2- Obstrução biliar parcial ou completa.
A origem das bactérias que colonizam o trato biliar é incerta. A teoria mais aceita é a de que
algumas bactérias, vindas do intestino, ganham o sistema porta e alcançam o trato biliar
passando pelo fígado. Quando existe uma lesão, ou mesmo um corpo estranho no trato biliar, é
frequente a contaminação bacteriana. O que se presume é que a lesão obstrutiva ou o corpo
estranho predispõem à colonização e ao crescimento bacteriano.
Uma colangite clínica ocorre quando as bactérias, liberadas do trato biliar, ganham a circulação
sistêmica, o que ocorre quando a pressão do trato biliar está alta. É como se a bile (junto com as
bactérias) extravasasse dos canalículos biliares que percorrem os lóbulos e caísse nos sinusóides
hepáticos. A causa mais comum de colangite é a coledocolitíase, que responde por 60% dos
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casos. Assim, a presença de cálculos biliares (sejam primários ou secundários) muitas vezes é
diagnosticada quando da avaliação de um episódio de colangite.
Os tumores malignos que causam obstrução biliar, como o tumor de cabeça de pâncreas, o
carcinoma de vias biliares e o carcinoma da ampola de Vater, são causas menos comuns de
colangite e geralmente são suspeitados e identificados pelo surgimento de icterícia. Entretanto,
quando há associação de câncer biliar com colangite, esta parece ser mais severa e de pior
prognóstico, fato atribuído provavelmente à completa obstrução que os tumores geralmente
determinam. Estreitamentos não malignos dos ductos são também frequentemente
diagnosticados quando da avaliação de uma colangite. Muitos destes estrangulamentos
resultam de trauma iatrogênico durante uma colecistectomia. O processo de reparação de uma
estenose é associado com uma alta chance de recorrência da própria estenose, de tal sorte que a
ocorrência de um episódio de colangite constitui indicação para novo procedimento reparador.
Como os cálculos costumam se formar próximos a uma estenose, o desenvolvimento de
colangite nestes pacientes pode resultar de ambos. Outra causa de estenose do trato biliar é a
pancreatite crônica. Esta estenose, localizada na porção intrapancreática do ducto biliar
comum, pode se manifestar inicialmente como um episódio de colangite. As anastomoses
bilioentéricas são fatores derisco bactibilia (por refluxo do conteúdo intestinal para o interior
da via biliar).
QUADRO CLÍNICO
A descrição original da colangite foi feita por Charcot, numa referência à presença de febre e
calafrios intermitentes, associada à icterícia e dor abdominal. Esta síndrome, conhecida como
“tríade de Charcot”, permanece ainda hoje como estereótipo de colangite.
A descrição original faz menção à presença de pus misturado à bile estagnada, numa importante
condição conhecida hoje como colangite supurativa. Reynold descreveu pacientes que, junto
com a tríade de Charcot, apresentavam também hipotensão e depressão do sistema nervoso
central. Foi notado que essa combinação de sintomas ocorria quando da presença de obstrução
completa de um sistema biliar supurado (“pus sob alta pressão”).
A associação da tríade de Charcot com choque e depressão do sistema nervoso central é
conhecida como pêntade de Reynold, e representa o quadro clínico de uma colangite supurativa
(pus sob alta pressão na via biliar). A importância da colangite supurativa, ou seja, a
importância da pêntade de Reynold vem do fato de que esta síndrome é progressiva e fatal, caso
não se realize uma intervenção cirúrgica imediata.
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A tríade de Charcot, apesar de aguda, não necessita de cirurgia emergencial.
COLANGITE AGUDA
A maior incidência de colangite aguda ocorre entre os 55 e 70 anos, refletindo, na verdade, a
incidência das doenças associadas (e também a maior propensão à bacterbilia que ocorre
naturalmente com a idade). A tríade de Charcot completa, com febre, icterícia e dor abdominal,
ocorre em 60% dos pacientes com colangite. O sintoma mais frequente é a febre (90%). A dor
abdominal costuma ser apenas moderada e se localiza principalmente no quadrante superior
direito. Dor abdominal severa é muito rara, não sendo comum o achado de irritação peritoneal.
A peristalse não costuma ser alterada. A icterícia está presente em 80% dos pacientes com
colangite aguda.
As características-chave no diagnóstico de colangite aguda são a história detalhada, tendo em
mente que apenas um ou dois elementos da síndrome de Charcot podem estar presentes e o
exame físico, fora a icterícia, pode estar inalterado.
Os achados laboratoriais da colangite aguda refletem a natureza infecciosa e inflamatória da
doença e a obstrução biliar associada.
Assim, devemos esperar uma leucocitose com desvio, associada à hiperbilirrubinemia (presente
em 90% dos casos, com predomínio da bilirrubina direta), e aumento da fosfatase alcalina, GGT,
AST e ALT. As hemoculturas frequentemente são positivas em um paciente com colangite aguda
e devem ser sempre solicitadas. Os organismos mais encontrados são, em ordem de frequência:
E. coli.; Klebsiella; Enterococcus faecalis; B. fragilis.
COLANGITE TÓXICA AGUDA
A presunção é que este tipo de colangite esteja associado a um processo de “sepse contínua”,
devido ao fenômeno de “pus sob alta pressão” no trato biliar. De todos os pacientes que
desenvolvem colangite, 15% apresentam esta forma tóxica ou supurativa, com sintomas
proeminentes de choque e depressão do sistema nervoso central aliados à tríade de Charcot
(pêntade de Reynold). Clinicamente se observa confusão mental, comportamento inadequado,
desorientação e coma, não diferindo dos estados mentais associados a qualquer outra patologia
grave (como sepse). Em última análise, a pêntade de Reynold descreve um paciente com
colangite que evolui com sinais de sepse, com instabilidade hemodinâmica e alterações do
estado de consciência.
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DIAGNÓSTICO
A colangiografia é o teste definitivo e necessário para que se possa planejar o tratamento,
entretanto, não deve ser feita até que o processo agudo esteja sob controle. Pode ser
trans-hepática percutânea ou endoscópica retrógrada. A injeção de contraste sob pressão dentro
do trato biliar pode exacerbar a colangite e a sepse, a menos que se tenha controlado a infecção
com antibioticoterapia.
Pacientes com colangite aguda devem ser inicialmente avaliados por ultrassonografia, que deve
dar especial atenção à presença de colelitíase, coledocolitíase, dilatação dos ductos biliares e
massas na cabeça do pâncreas. A US é altamente sensível para detectar a presença de cálculos
na vesícula e de dilatação dos ductos biliares.
Uma vez que a colangite esteja sob controle, testes posteriores podem ser utilizados mantendo a
US como guia. Se houver suspeita de massa no fígado, pâncreas ou sistema porta, o exame de
escolha é TC. Uma cintigrafia hepática também pode ser útil por detectar cistos, abscessos ou
outras lesões intra-hepáticas que podem estar associadas à colangite. Da mesma forma, a
colangiorressonância tem excelente sensibilidade para lesões obstrutivas da árvore biliar.
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Colecistite: febre, dor abdominal em QSD e leucocitose são comuns a ambas. Os únicos achados
clínicos que tendem a diferenciar as duas condições são o grau e as características da dor do
QSD e a presença de icterícia colestática intensa. Na colecistite aguda, a dor é persistente e está
presente em quase todos os casos – na colangite, a dor não costuma ser forte e pode estar
ausente em até 20% dos casos. Da mesma forma, hiperestesia abdominal está presente
invariavelmente na colecistite aguda, mas pode estar ausente em 20% dos casos de colangite
aguda. Sinais de irritação peritoneal, ausentes na colangite, são bastante frequentes na
colecistite (ex.: sinal de Murphy).
Abscesso hepático piogênico: Os sintomas de ambas as condições podem ser idênticos, e o
abscesso de fígado ainda pode ser uma complicação da própria colangite. O abscesso de fígado
pode ser identificado por US, TC ou cintigrafia.
Hepatites: dor e hipersensibilidade no QSD, febre e icterícia, completando também os critérios
para a tríade de Charcot. Entretanto, a diferenciação se faz prontamente com as provas de
função hepática (padrão de “lesão hepatocelular” na hepatite x padrão de “colestase” na
colangite) e os marcadores virais.
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Pancreatite aguda: febre e aumento das bilirrubinas, mas a dor e a hipersensibilidade são muito
mais proeminentes do que na colangite. Apesar de os níveis séricos de amilase estarem
aumentados em ambas as condições, eles são muito mais altos na pancreatite, fora o fato de que
apenas nesta última ocorre aumento da lipase.
Úlcera duodenal perfurada: dor abdominal, febre e elevação das bilirrubinas e até de amilase.
Contudo, nesta condição espera-se franca irritação peritoneal, a qual está ausente nas
colangites.
Patologias menos comumente confundidas com colangite são pielonefrite, apendicite,
pneumonia do lobo inferior direito ou infarto pulmonar e sepse de qualquer causa.
TRATAMENTO
1- Controlar o processo séptico (antibioticoterapia).
2- Corrigir a condição subjacente (desobstrução biliar).
Todos os pacientes com sintomas de colangite aguda ou colangite tóxica devem receber
antibioticoterapia. Não existe um esquema ideal, e a escolha dos antibióticos deve se basear nos
organismos mais comumente isolados das hemoculturas de pacientes com colangite, em
especial, E. coli, Klebsiella, Enterococcus e B. fragilis.
Pode-se optar pela monoterapia com drogas de amplo espectro, como betalactâmicos +
inibidores de betalactamase (ex.: amoxicilina + clavulanato, ampicilina + sulbactam), ou pela
associação de cefalosporina de terceira geração (ex.: ceftriaxone) ou quinolona (ex.:
ciprofloxacina, levofloxacina) com metronidazol.
Na colangite aguda não complicada, devemos iniciar o esquema antibioticoterápico empírico e
aguardar a evolução. A melhora do quadro infeccioso costuma ser dramática, e o paciente, em
menos de 48h de tratamento, já mostra sinais clínicos como resgate do estado geral e queda da
febre. A partir de então, programa-se uma desobstrução eletiva, cirúrgica ou endoscópica.
Na colangite tóxica (“pus sob pressão”), quando o paciente se apresenta já com sinais de sepse
(instabilidade hemodinâmica e alterações do estado de consciência), a conduta é outra:
iniciamos a antibioticoterapia empírica, mas não podemos retardara desobstrução, que deve ser
feita o mais rápido possível. Nestes pacientes, a antibioticoterapia isolada não resolve o
problema e o prognóstico depende do alívio imediato da obstrução.
Se a colangite sabidamente se deve à colelitíase complicada por coledocolitíase, um método
para a descompressão do trato biliar pode ser a papilotomia endoscópica (CPRE), com extração
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dos cálculos que estão obstruindo os ductos. Esta abordagem combina tanto a descompressão
emergencial quanto à terapia definitiva para a doença associada (no caso coledocolitíase) em até
60% dos pacientes.
A drenagem biliar trans-hepática percutânea (CTP) também é uma forma de desobstrução biliar,
simples e relativamente segura. A CTP será preferida na suspeita de obstruções mais proximais
das vias biliares.

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