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Medicina - 5º P Layssa Ravelle Gomes Silva Andrade Roteiro da Tutoria ✴ TUTORIA 01 ‣ “O TEMPO E O CUIDADO” ● José procura ajuda médica relatando angústia, insônia, dificuldade de concentração e perda de peso nos últimos dois meses. Nega alterações de sensopercepção. Pensamento com curso, forma e conteúdo normais. Juízo crítico preservado. Diz ter medo de que seu avô, acamado e sob seus cuidados há 5 anos, faleça durante a noite. José é encaminhado à psicoterapia. ↳ PERGUNTAS 1) Qual a importância do cuidado mental com o cuidador? 2) Como abordar e fazer avaliação de um paciente psiquiátrico? 3) Como se dá a fisiopatologia do estresse agudo e crônico? ↳ HIPÓTESES 1) O cuidado mental com o cuidador é fundamental para que ele não adoeça. Além disso, a saúde psicológica do cuidador pode influenciar na qualidade do cuidado. 2) A avaliação do paciente psiquiátrico deve ser iniciada com uma anamnese psiquiátrica detalhada e com o exame físico. 3) A fisiopatologia do estresse agudo é uma resposta do corpo diante de possíveis situações de perigo, com a ativação do sistema nervoso simpático, enquanto que o estresse crônico é resultado do estresse agudo durante um tempo prolongado. ↳ OBJETIVOS 1) Entender a semiologia do paciente psiquiátrico. 2) Compreender a fisiopatologia do estresse agudo e crônico. 3) Discutir a importância do cuidado da saúde mental do cuidador. ↳ PESQUISA OBJETIVO 01 ↪ A psiquiatria, tem área de atuação mais ampla que as demais especialidades médicas. ↪ Não se trata de uma especialidade que visa a uma determinada parte do corpo, um sistema ou um órgão, mas, sim, ao homem como um todo e às relações que o ligam a seu mundo. ↪ A psiquiatria, adota o modelo compreensivo com referenciais distintos daqueles do modelo médico tradicional. MODELO MÉDICO TRADICIONAL ↪ A doença é definida como um fato concreto, observável, que pode ser evidenciado por uma série de recursos técnicos. Ela é localizada em alguma parte, órgão ou sistema do corpo. ↪ O médico, apoiando-se nesse modelo, diagnostica a doença em virtude dos sinais e sintomas que sugerem uma lesão ou disfunção em determinada área ou sistema corporal, que pode ser comprovada pelos exames complementares. ↪ Seu objetivo, portanto, é descobrir quais f u n ç õ e s e e s t r u t u r a s c o r p o r a i s e s t ã o comprometidas, para chegar a um diagnóstico. Feito o diagnóstico, o objetivo passa a ser a a d o ç ã o d e m e d i d a s t e r a p ê u t i c a s q u e restabeleçam as estruturas e funções alteradas. ↪ O paciente é reduzido à enfermidade, e o complexo fenômeno do ato médico passa a ser exclusivamente uma ação técnica. O paciente, seus vínculos famil iares e seu contexto sociocultural deixam de ter relevância nesta abordagem. ↪ Acompanhando a evolução da medicina, a psiquiatria tentou seguir o mesmo modelo. As causas das doenças mentais são atribuídas a degeneração, herança ou lesões localizadas no cérebro. ↪ Assim, a tentativa de restringir a psiquiatria a um fragmento do corpo, a uma “especialidade do cérebro”, não teve êxito. Crise do Modelo Médico Tradicional ↪ O médico e o exercício profissional atravessam uma profunda crise, tanto em sua identidade como em sua ideologia. ↪ O especialista, com certa frequência, procura ser somente um técnico. Percebe, no entanto, que isto não é possível, pois se vê obrigado a atender e a manejar os aspectos psicológicos dos pacientes. Medicina - 5º P Layssa Ravelle Gomes Silva Andrade ↪ A atenção a este aspecto converte-se em uma “complicação embaraçosa”, da qual muitos médicos procuram afastar-se, objetivando fazer uma medicina de doenças e não de doentes. MODELO COMPREENSIVO ↪ Uma das con t r ibu ições do mode lo compreensivo é em relação ao conceito de saúde e doença. ↪ E l e i n t r o d u z a m o d e r n a v i s ã o d a multifatoriedade de causas e efeitos, ainda predominante na cultura médica. ↪ Fornece um conceito mais amplo de doença, sem confiná-la apenas aos seus aspectos biológicos. A doença passa a ser vista em todos os níveis de organização (biológica, psicológica e social) que se apresentam em constante interação. ↪ Isto implica a valorização do paciente, em sua singularidade de indivíduo e globalidade biopsicossocial. CONHECIMENTOS PSICOLÓGICOS E PRÁTICA MÉDICA ↪ Muitas enfermidades têm como fator etiológico fundamental transtornos emocionais, e todo paciente, no modo de viver sua doença e lutar con t ra e la , emprega recursos que sua personalidade e seu modo particular de reagir lhe permitem. ↪ Independentemente de sua etiologia, a doença está inserida na biografia do paciente, e o médico nunca poderá ajudá-lo devidamente se não compreender o significado biográfico do seu padecimento. ↪ O significado de uma fratura de fêmur, por exemplo, para um homem de meia-idade, apoio da família, que não receberá nenhuma ajuda financeira enquanto estiver impossibilitado de voltar ao trabalho, será bem distinto daquele que possua uma situação estável, sem preocupações financeiras, que terá seus proventos integrais enquanto estiver afastado de sua função. ↪ Estes modos involuntários de reação operam de maneira inconsciente e, muitas vezes, são irracionais, absurdos e contraproducentes para os desejos do paciente, e formam a base de condutas neuróticas. ↪ Todo médico, seja qual for sua área, de vez em quando terá de enfrentar situações em que se manifestem quadros psiquiátricos. São exemplos disso as crises histéricas, estados de angústia no pré e pós-operatório, quadros confusionais com agitação, como o delírio febril das doenças infecciosas. E X A M E C L Í N I C O ↪ O exame clínico em psiquiatria compreende a entrevista psiquiátrica (que inclui a anamnese tradicional e o exame psíquico), além do exame físico. ↪ Seus objetivos são semelhantes àqueles das outras especialidades médicas. No entanto, há particularidades que o diferenciam dos demais. Cumpre ressaltar que, além do objetivo do diagnóstico, a entrevista psiquiátrica tem importante função terapêutica. ENTREVISTA PSIQUIÁTRICA ↪ Ainda que o médico veja o paciente uma única vez, é possível uma interação verdadeiramente terapêutica. Mesmo que seguido de outros subsequentes, esse primeiro encontro tem um s ignificado fundamenta l , tanto em níve l psicoterápico como diagnóstico. Entrevista inicial - O paciente ↪ O paciente costuma reagir influenciado pelo que vivenciou em experiências anteriores. Assim, ele chega à primeira entrevista com um pre- julgamento ou sentimento antecipado sobre o médico que o entrevistará. ↪ É importante, para a relação terapêutica, que o médico compreenda e aceite a desconfiança e os temores que o paciente traz para a primeira entrevista. ↪ Em geral, ele se mostra ansioso acerca de sua enfermidade, da reação do médico e do tratamento psiquiátrico. ↪ Ademais, sentem vergonha ou humilhação por terem de descrever seus sofrimentos mais íntimos, e os de sua família, a um estranho. ↪ Por isso, é importante que o profissional evite qualquer atitude que pareça de aprovação ou reprovação. Ele deve compreender o paciente, e não julgá-lo. Entrevista inicial - O médico ↪ O médico, por sua vez, estará ansioso a cada encontro com um novo paciente, trazendo consigo a incerteza se saberá diagnosticar e atuar corretamente. ↪ Talvez esteja preocupado com o julgamento que o paciente fará dele e de sua competência profissional. ↪ Isso faz com que muitos profissionais procurem dar a seus pacientes um “rótulo diagnóstico” o Medicina - 5º P Layssa Ravelle GomesSilva Andrade quanto antes possível, encaixando-os em um esquema preestabelecido, por meio de uma percepção seletiva desde as primeiras frases do paciente, valorizando apenas os sintomas que concordam com o seu diagnóstico. ↪ Seria uma maneira de livrar-se de um incômodo encontro, o mais rapidamente possível. ↪ Não se pode desconhecer que o médico não leva para a entrevista apenas suas qualidades profissionais, mas também suas características pessoais. Sua estrutura de caráter, seus valores e sua sensibilidade aos sentimentos alheios terão grande influência no relacionamento com os pacientes. ENTREVISTADOR PRINCIPIANTE ↪ O estudante apresenta o temor de estar agindo de maneira inadequada ou estar importunando, deixando, com frequência, tais sentimentos transparecerem para o paciente. ↪ As referências a essas questões deverão ser manejadas de maneira espontânea, e o estudante deve esclarecer sua condição de estudante (acadêmico, interno). ↪ É a própria natureza da relação médico- paciente que favorece o desejo de onisciência e onipotência. Se o entrevistador assumir esse papel, o paciente não poderá superar seus sentimentos básicos de impotência e inferioridade. ↪ O médico poderá utilizar ainda o exibicionismo como uma maneira de conquistar a afeição ou a admiração de seus pacientes. A ostentação de grande conhecimento e de status social e profissional elevados são exemplos dessa atitude. ALIANÇA TERAPÊUTICA ↪ Nas situações em que o paciente vê o médico como fonte potencial de ajuda, este pode obter uma quantidade considerável de informações sobre ele e seu sofrimento, apenas ouvindo-o. ↪ Contudo, há casos em que o paciente não consegue confiar no médico de início. Em tais situações, o sucesso da entrevista vai depender da capacidade do examinador em conquistar essa confiança, estabelecendo com seu paciente uma aliança terapêutica. ↪ Os primeiros momentos da entrevista têm importância fundamental na configuração da relação médico-paciente. A primeira impressão que o profissional produz no paciente costuma ficar gravada na mente dele de maneira permanente. ↪ Se o primeiro contato não for bom, mas, ao contrário, for traumático para o paciente, é provável que os efeitos negativos sobre a relação jamais sejam anulados, por mais esforços que o médico faça em restabelecê-la. TRANSFERÊNCIA E CONTRATRANSFERÊNCIA ↪ Alguns fatores sempre presentes na dinâmica de uma entrevista são difíceis de serem percebidos, pois ocorrem em nível inconsciente, tanto no paciente como no médico. ↪ Estes derivam da identificação inconsciente que ele faz do médico com algum personagem significativo de sua infância (pais, irmãos, tios, babás). ↪ Sem se dar conta, o paciente tende a se relacionar com o médico da mesma maneira como se relacionava com tal personagem (ou personagens) de sua infância: ou seja, transfere para a relação médico-paciente a dinâmica psicológica de seus primeiros conflitos afetivos infantis, que marcaram de maneira permanente seu modo de reação inconsciente. ↪ O médico não está imune à psicodinâmica do inconsciente. Chamam-se contratransferência os fenômenos de projeção sobre o paciente da própria estrutura inconsciente do médico. ↪ Nessa situação, o profissional reage ao paciente como se este fosse uma figura de seu passado. Então, quanto mais intensos forem os padrões neuróticos do médico, maior é a possibilidade de respostas contratransferenciais. ↪ O manejo desses mecanismos transferenciais e contratransferenciais exige um treinamento especial, que inclui a própria análise pessoal. ↪ Contudo, isso não impede que o médico geral ou especialista possa desfazer certas reações transferenciais, por meio de uma relação médico- paciente compreensiva e afetuosa. A N A M N E S E ↪ Durante a entrevista, o médico obtém dados que serão incorporados à anamnese e ao exame psíquico. ↪ A anamnese psiquiátrica tem os mesmos elementos de toda história clínica: identificação, queixa principal, história da doença atual, história pessoal, antecedentes pessoais e familiares, bem como hábitos de vida. Medicina - 5º P Layssa Ravelle Gomes Silva Andrade ↪ No entanto, em virtude das características da doença mental, a coleta e a interpretação dos dados apresentam algumas peculiaridades. ↪ Em geral, os dados da anamnese são obtidos de duas fontes: do próprio paciente e de seus acompanhantes (geralmente familiares). Nem sempre, as duas fontes são tota lmente concordantes. ↪ O paciente pode simular sintomas psiquiátricos, porém isso é um fato relativamente raro. Difici lmente uma pessoa pode sustentar sintomatologia coerente com determinado transtorno psiquiátrico por muito tempo. ↪ A omissão de sintomas, em contrapartida, ocorre com bastante frequência. Nesse caso, o paciente omite os sintomas por medo do tratamento (p. ex., internação) ou como consequência da sua atitude de desconfiança em relação ao examinador. ↪ Mesmo que o paciente procure ser sincero, poderá omitir importantes informações por mecanismos de defesa inconscientes. ↪ Com frequência, o paciente psiquiátrico vai acompanhado à entrevista. Quando isso ocorre, deve-se ouvi-lo em primeiro lugar, para, depois, sempre na presença dele, ouvir o acompanhante. ↪ Os dados fornecidos por outras pessoas também podem estar distorcidos, como, por exemplo, as dificuldades que os pais têm em ver distúrbios de conduta nos filhos, bem como as deformações por inveja e a competição entre irmãos. ↪ Nesses momentos, é preciso lembrar que a imparcialidade é uma das condições necessárias na relação médico-paciente, não devendo o profissional tomar partido de um ou de outro. ↪ No caso de crianças e adolescentes, alguns psiquiatras preferem entrevistar primeiro os pais e, em um segundo encontro, o paciente. Outros acreditam que a entrevista com todos os familiares possibilita, desde o início, a observação de como interagem entre si. ↪ A entrevista deve ser em um ambiente que re s g u a rd e a p r i v a c i d a d e d o p a c i e n t e . Evidentemente, ele não se sentirá encorajado a revelar aspectos íntimos de sua vida em um local onde a privacidade não esteja assegurada. ↪ Da mesma maneira, é importante que o profissional fale ao paciente de seu compromisso de guardar sigilo do que lhe for comunicado, quando perceber seu embaraço no decorrer da entrevista. ↪ O médico precisa ter em mente um roteiro que o auxilie a cobrir todos os pontos úteis e necessários para diagnóstico e compreensão global do paciente. No entanto, esse roteiro não deve ser aplicado por meio de um questionário. As informações devem ser colhidas a partir da exposição do paciente, iniciada de modo mais livre possível. ↪ A intervenção inicial do médico deve ser cumprimentar o paciente. Em seguida, perguntar- lhe o motivo de sua ida à consulta. ↪ Geralmente, o paciente começa a falar de suas queixas ou do motivo pelo qual foi à consulta. Outras vezes, permanece em silêncio, como se estivesse aguardando as perguntas do examinador (como no modelo médico tradicional). O esclarecimento quanto à importância de ouvir o que ele tem a dizer, encorajando-o a falar livremente, costuma quebrar o silêncio inicial. ↪ Próximo ao final da entrevista (10 a 15 min antes do término previsto), o médico deve informar ao paciente que ela está terminando. Nesse caso, devem-se aproveitar os minutos finais para esclarecer, com o paciente, algum ponto que não tenha ficado claro. ↪ Outra questão que pode interferir na anamnese e na relação com o paciente, refere-se às informações obtidas pelos pacientes em sites de busca da internet sobre doenças, exames e tratamentos. ↪ Muitos pacientes se apropriam deles e, mesmo sem entendê-los,introduzem-nos durante a entrevista, questionando e até contradizendo o médico. ↪ É necessário adquirir capacidade de lidar com esse problema, aprendendo, inclusive, a tirar proveito para informar melhor o paciente e os familiares. ↪ Geralmente, o paciente (ou acompanhante) espera que o médico, ao fim da entrevista, diga alguma coisa sobre o que ele tem, e lhe dê esclarecimentos e orientações sobre o tratamento a ser seguido. ↪ O plano geral da assistência proposta deve ser feito da maneira mais clara possível, no nível de compreensão do paciente. O uso de termos técnicos deve ser sempre evitado. Medicina - 5º P Layssa Ravelle Gomes Silva Andrade ↪ Caso o médico não esteja seguro do diagnóstico, é preferível que ele faça novas entrevistas antes de começar o tratamento, desde que não seja, obviamente, um caso de emergência psiquiátrica. E X A M E P S Í Q U I C O ↪ O exame psíquico consiste na avaliação do estado mental do paciente no momento da entrevista. É feita pela observação do seu comportamento, pela relação que estabelece com o examinador e pela pesquisa de sinais e sintomas psicopatológicos. ↪ Sua importância é comparável à do exame físico para os outros ramos da medicina. Há, contudo, uma particularidade fundamental: diferentemente das outras áreas nas quais se pode recorrer a aparelhos e testes laboratoriais para confirmar os achados clínicos, não se dispõe, na maioria das vezes, de recursos complementares que confirmem as impressões colhidas no exame psíquico. ↪ Tais influências fazem com que um mesmo paciente examinado por outro médico tenha seu estado mental avaliado diferentemente, assim como um examinador pode avaliar o estado mental de seu paciente de maneira diferente, dias ou mesmo horas após o primeiro exame. ↪ Essas discordâncias podem ser também consequentes às flutuações e modificações da sintomatologia psicopatológica. Um paciente examinado pela manhã, mostrando um estado de consciência, orientação e pensamento normais, pode apresentar-se desorientado e confuso ao final do dia. ↪ As dificuldades do exame psíquico não devem servir de pretexto para deixá-lo de lado, negando sua importância. No curso de medicina, pouca atenção e tempo são dedicados ao ensino do exame psíquico. Isso favorece a tendência de ver o paciente sem uma avaliação diagnóstica adequada. ↪ O perigo dessa atitude pode ser exemplificado pelo estudo feito por Murphy em um grupo de pacientes que cometeram suicídio. Verificou-se que a maioria deles foi vista por médicos 6 meses antes de suas mortes. Não só as queixas depressivas passaram despercebidas, como também foram prescritos sedativos para suas queixas de insônia, em quantidade suficiente para transformar-se em dose letal, caso o paciente resolvesse ingeri-los de uma só vez. ↪ O exame psíquico detalhado constitui função do especialista, mas, de modo resumido, como exposto aqui, deve ser um instrumento a ser utilizado por todo médico. EXAME PSÍQUICO DA CRIANÇA ↪ Nesse exame, procura-se pesquisar os dados necessários para traçar o perfil do estado ou funcionamento mental da criança. ↪ A maior parte dessas funções está sob o domínio do ego e, por isso, são chamadas de funções do ego. Elas são responsáveis pelo controle das funções motoras, desenvolvimento da fala, pela memória, percepção, atenção, inte l igência, noção de real idade e pelo pensamento. ↪ No bebê, tais funções estão embrionárias, mas ele apresenta predisposição genética para desenvolvê-las. ↪ É recomendável que a criança seja avisada, 1 a 2 dias antes da entrevista, da sua ida ao médico e sobre o motivo da consulta. As explicações deverão ser simples e claras, levando em conta a idade dela. Os pais deverão também acrescentar que se trata de uma consulta diferente, que o médico estará interessado essencialmente em conhecê-la para ajudá-la nas dificuldades que, porventura, existam. ↪ Para tanto, o médico colocará à disposição da criança jogos, material de desenho e brinquedos, os quais ele poderá usar, ou, caso prefira, irá conversar. ↪ Para crianças maiores e adolescentes, o profissional deve assinalar o caráter confidencial da entrevista, explicando que tudo o que for dito ali ficará entre eles, cabendo ao paciente a decisão de contar ou não aos pais sobre o conteúdo da entrevista. ↪ Para isso, é muito importante que, principalmente com o adolescente, os contatos seguintes com os pais sejam feitos na presença dele para manter o c l ima de confiança estabelecido entre ele e o médico. FUNÇÕES PSÍQUICAS ↪ A fragmentação da vida psíquica em funções é utilizada na descrição dos sinais e sintomas psicopatológicos. Assim, estudam-se os distúrbios da consciência, da orientação, da memória etc. c o m o s e f o s s e m p r o c e s s o s i s o l a d o s , independentes uns dos outros. ↪ No entanto, a divisão da vida psíquica em funções isoladas é artificial, pois, na verdade, elas se superpõem, constituindo um todo indivisível. Medicina - 5º P Layssa Ravelle Gomes Silva Andrade ESQUEMA PARA INVESTIGAÇÃO DAS FUNÇÕES PSÍQUICAS ↪ Os seguintes itens têm como objetivo lembrar os pontos a serem observados e pesquisados, como também orientar o registro do exame psíquico: avaliação geral, relação com o entrevistador, consciência, atenção, orientação, p e n s a m e n t o , m e m ó r i a , a f e t i v i d a d e , sensopercepção, vontade, psicomotricidade e atividade motora e inteligência. Avaliação Geral ↪ Deve-se observar o paciente desde sua entrada na sala de exame, verificando se veio sozinho ou acompanhado. • Como foi sua entrada na sala? Entrou de maneira tímida, desconfiada, desafiante ou arrogante? Senta-se espontaneamente ou espera que seja convidado a fazê-lo? Como se senta? Joga-se na cadeira, senta-se de modo confortável ou tenso (na "ponta da cadeira”')? Permanece sentado na mesma posição ou a modifica constantemente? Com o decorrer da entrevista, sua atitude e postura foram sofrendo modificações? Tranquilizou- se, permaneceu inquieto? • Como são suas vestes? Encontram-se limpas e em alinho? Como está seu asseio corporal? Apresenta barba por fazer? Está penteado(a)? Usa maquiagem? Mostra-se silencioso(a) ou falante? Qual seu ritmo, sua intensidade e seu tom de voz? Fala espontaneamente ou só responde às perguntas? Como as responde: lentamente, de maneira clara, confusa, prolixa, perseverante? Relação com o Entrevistador ↪ Toma a iniciativa de cumprimentar o entrevistador ou aguarda que ele o faça? Como é seu aperto de mão (firme, vacilante, oferece as pontas dos dedos)? Apresenta sudorese palmar, tremor? Mãos frias ou quentes? ↪ Que sentimentos o paciente desperta no examinador (compaixão, raiva, medo, estranheza, simpatia)? Adota uma atitude sedutora, irônica, desrespeitosa, hostil ou cooperativa? Consegue- se estabelecer aliança terapêutica? Consciência ↪ Deve ser registrado o nível de consciência do paciente, que vai desde o estado de consciência plena (percebe o que ocorre a sua volta e responde à essa percepção) até o coma (não responde à estimulação em diferentes graus). Esta avaliação decorre do contato com o paciente durante a entrevista. Algumas alterações de consciência são descritas abaixo: • Sonolência: lentificação geral dos processos ideacionais, com predisposição para dormir, na ausência de estimulação. • Obnubilação da consciência: diminuição do nível de vigília, acompanhado de dificuldade em focalizar a atenção e manter um pensamento ou comportamento objetivo. • Estupor: permanece em mutismo e sem movimentos, com preservação relativa da consciência. • Delirium: quadro agudo caracterizado por diminuição do nível de vigília, acompanhado de alterações cognitivas (desorientação,déficits de memória) ou perceptuais (ilusões e alucinações). • Estado crepuscular: estreitamento da c o n s c i ê n c i a , p o d e n d o m a n t e r comportamentos motores relativamente organizados, na ausência de um estado de c o n s c i ê n c i a p l e n a . O c o r r e , predominantemente, em estados epilépticos. Atenção ↪ É a capacidade de concentrar a atividade psíquica em um determinado setor do campo da consciência. ↪ Alterações da atenção. O paciente tende a se voltar para a sua vida interior de maneira que atenda com dificuldade (ou não atenda) aos estímulos exteriores. Ele pode desviar sua atenção de um ponto para outro, sem conseguir fixar-se em nenhum; ou, ainda, concentrar-se em determinado ponto, mas por apenas poucos minutos. Em todos esses casos, diz-se que há diminuição da atenção. Orientação ↪ A avaliação envolve aspectos auto e alopsíquicos. • Autopsíquica: se caracter izam pelo reconhecimento de si envolvendo: a) saber o próprio nome; b) reconhecer as pessoas do seu meio imediato, através de seu nome ou de seu pape l soc ia l e saber quem é o entrevistador. • Alopsíquica: são avaliados: a) a orientação no tempo, englobando saber informar - o ano, o mês, o dia da Medicina - 5º P Layssa Ravelle Gomes Silva Andrade semana, o período do dia, ou ainda a estação do ano, ou marcos temporais como Natal/ Carnaval/ Páscoa; b) a orientação no espaço envolve saber informar onde se encontra no momento, nomeando o lugar, a cidade e o estado. Pensamento ↪ É um conjunto de funções integradas, capazes de associar conhecimentos novos e antigos, estímulos internos e externos, analisar, abstrair, julgar, sintetizar, bem como criar. ↪ No funcionamento do pensamento, outras funções psíquicas estão, particularmente, envolvidas: consciência, orientação, atenção, memória, inteligência e percepção. Qualquer alteração em uma delas trará consequências ao funcionamento global do pensamento. ↪ Os distúrbios do pensamento são observados por meio da linguagem, que não é nada mais do que uma expressão simbólica do pensamento destinada à comunicação. ↪ São exclu ídas desses distúrbios as perturbações da linguagem resultantes de lesão cerebral (afasias, agrafias, alexias e suas variantes), as dificuldades de articulação da fala (disartrias), as afonias e disfonias, resultantes de problemas da laringe e respiratórios. ↪ Normalmente, essas alterações próprias da linguagem podem ser diferenciadas sem maiores dificuldades dos distúrbios do pensamento. ↪ Como recurso didático, podem-se dividir os distúrbios do pensamento em: distúrbios formais do pensamento, caracterizados principalmente pela forma (e não pelo conteúdo) do pensamento; perturbações do conteúdo, em que um pensamento aparentemente normal quanto à forma encerra ideias de cunho patológico – delírios, obsessões e fobias. Memória ↪ A memória começa ser avaliada durante a obtenção da história clínica do paciente, com a verificação de como ele se recorda de situações da vida pregressa, tais como, onde estudou, seu primeiro emprego, perguntas sobre pessoas significativas de sua vida passada, tratamentos anteriores, etc. ↪ A memória pode ser avaliada, também, através de testes específicos, alguns deles bastante simples, e que podem ser introduzidos numa entrevista psiquiátrica habitual. ↪ A investigação da memória é, particularmente, importante quando se suspeita de quadros de etiologia orgânica. Habitualmente, divide-se a avaliação da memória em três tipos: • Memória Remota: avalia a capacidade de recordar-se de eventos do passado. • Memória Recente: avalia a capacidade de recordar-se de eventos que ocorreram nos últimos dias, que precederam a avaliação. Para esta avaliação o examinador pode perguntar sobre eventos verificáveis dos últimos dias, tais como: o que o paciente comeu numa das refeições anteriores, o que viu na TV na noite anterior, etc. • Memória Imediata: avalia a capacidade de recordar-se do que ocorreu nos minutos precedentes. Pode ser testada, pedindo-se ao paciente que memorize os nomes de três objetos não relacionados e depois de 5 minutos, durante os quais se retomou a entrevista normal, solicitando-se que o paciente repita esses três nomes. ↪ Ao observar-se uma deficiência de memória é importante, para alguns diagnósticos diferenciais, verificar-se como o paciente lida com ela, ou seja: tem uma reação catastrófica, diante da deficiência; nega ou tenta não valorizar o déficit de memória; preenche lacunas de memória com recordações falsas. Afetividade ↪ A avaliação do afeto inclui a expressividade, o controle e a adequação das manifestações de sentimentos, envolvendo a intensidade, a duração, as flutuações do humor. ↪ Considera-se humor a tonalidade de sentimento mantido pelo paciente durante a avaliação. Para a avaliação desta função considera-se: a) o conteúdo verbalizado; b) o que se observa ou se deduz do tom de voz, da expressão facial, da postura corporal; c) a maneira como o paciente relata experimentar os próprios sentimentos, e d) o relato de oscilações e variações de humor no curso do dia. • To n a l i d a d e e m o c i o n a l : a v a l i a - s e p re d o m i n a n t e d u r a n t e a e n t re v i s t a , observando-se a presença e a intensidade de manifestações de: ansiedade, pânico, tristeza, depressão, apatia, hostilidade, raiva, euforia, elação, etc. Medicina - 5º P Layssa Ravelle Gomes Silva Andrade • Modulação: Refere-se ao controle sobre os afetos. • Associação pensamento/afeto: constitui-se em ponto importante, devendo-se considerar: o nível de associação / dissociação e a adequação / inadequação das manifestações, para tal deve-se levar em conta a temática e o contexto na qual ela está inserida. • Equivalentes orgânicos: devem ser avaliados com base nas alterações do apetite, peso, sono e libido. ↪ É importante observar na avaliação desta função, a presença de manifestações ou risco de auto e heteroagressividade, tais como idéias ou planos de suicídio, ou ainda idéias ou projetos de homicídio ou agressão voltada para o meio. ↪ Deve-se considerar, ainda, na avaliação desta função as manifestações relativas a auto-estima, e a volição, enquanto a energia que a pessoa está investindo e a disposição com a qual está se envolvendo na realização de seus projetos pessoais. Sensopercepção ↪ O examinador deverá avaliar se as sensações e percepções do paciente resultam da estimulação esperada dos correspondentes órgãos do sentido. ↪ Para isso, pode valer-se de relatos espontâneos de percepções alteradas; da observação de comportamentos sugestivos de percepções, na ausência de estímulos externos (conversar consigo mesmo, rir sem motivo); ou, ainda, pode formular perguntas diretas sobre tais alterações (p.ex., “Você já teve experiências estranhas, que a maioria das pessoas não costumam ter?” “Você já ouviu barulhos ou vozes, que outras pessoas, estando próximas, não conseguiram ouvir?”). ↪ As principais alterações da senso-percepção são: • Despersonalização: refere-se à sensação de estranheza, como se seu corpo, ou partes dele não lhe pertencessem, ou fossem irreais. • Desrealização: o ambiente ao redor parece estranho e irreal. • Ilusão: interpretação perceptual alterada, resultante de um estímulo externo real. • Alucinações: percepção sensorial na ausência de estimulação externa do órgão sensorial envolvido. As alucinações podem ser: auditivas, visuais, táteis, olfatórias e gustativas. As alucinações que ocorrem no estado de sonolência, que precede o sono (hipnagógicas) e no estado semiconsciente, que precede o despertar (hipnopômpicas) são associadas ao sono normal e não são, necessariamente, patológicas. Vontade ↪ É a disposição que uma pessoa tem para a ação, a partir de uma escolha ou decisão sua. ↪ Distúrbios da vontade. Na diminuição davontade, o paciente deprimido relata, em geral, perda da vontade. Nada lhe interessa, sente-se, às vezes, incapaz de realizar as mais simples tarefas (tomar banho, trocar de roupa). Por mais que seja estimulado, permanece sem disposição para qualquer ação. Em pacientes esquizofrênicos, a vontade pode estar comprometida em nível da iniciativa (pragmatismo). ↪ Negativismo é um termo que denomina as situações nas quais o paciente não atende ao que lhe é pedido. Essa oposição pode ser de maneira ativa, quando tende a fazer o contrário daquilo que lhe foi solicitado, ou, de modo passivo, quando, simplesmente, abstém-se de colaborar. Pode o c o r re r e m d i v e r s o s d i s t ú r b i o s , c o m o esquizofrenia, depressão, mania, síndrome cerebral orgânica, neurose e simulação. ↪ Os pacientes esquizofrênicos costumam apresentar outros distúrbios da vontade, bastante sugestivos da doença, que são: automatismo ao comando (o paciente obedece instantaneamente ao que lhe é ordenado, como um autômato, sem o controle de sua vontade); ecolalia (repete por imitação as palavras que lhe são dirigidas. ↪ Aumento da vontade ocorre, sobretudo, na fase maníaca da psicose maníaco-depressiva, ocasião em que o paciente experimenta uma grande disposição para realizar tarefas, mas de maneira desordenada e sem persistência. ↪ Atos impulsivos são aqueles que não passam pela vontade do paciente ou que ele, em que pese a sua intervenção, não consegue controlá-los. ↪ Os distúrbios da sexualidade são incluídos, geralmente, dentro da visão psicopatológica clássica, como alterações dos instintos. Psicomotricidade e Atividade Motora ↪ A vida psíquica do paciente tem a sua expressão objetiva no conjunto de seus gestos e movimentos, a que se denomina psicomotricidade. Medicina - 5º P Layssa Ravelle Gomes Silva Andrade ↪ Os distúrbios da psicomotricidade têm grande valor semiológico em psiquiatria. Muitas vezes, fornecem pistas seguras em direção a uma determinada afecção psiquiátrica. ↪ O aumento da psicomotricidade pode ocorrer em situações normais, como a atividade frenética de uma pessoa dinâmica, passando pela inquietação do ansioso, até as graves agitações dos pacientes psicóticos (síndromes cerebrais orgânicas, esquizofrênicos e maníacos). ↪ A diminuição da psicomotricidade oferece um quadro exatamente oposto – em vez de mímica rica, alternante, há uma expressão pobre, parada. ↪ Um grau extremo de diminuição da psicomotricidade é o estupor, no qual, além de inibição completa da psicomotricidade, há diminuição da resposta aos estímulos dolorosos. Nesses casos, a expressão facial tem valor semiológico: sonolência e torpor no paciente orgânico, tristeza no paciente deprimido e alheamento no esquizofrênico. ↪ O examinador pode notar, em algumas situações, que os gestos do paciente não lhe dizem nada e não têm as características de uma expressão normal, mostrando um caráter afetado e antinatural. Pode ocorrer na esquizofrenia, na neu rose h i s t é r i ca e nos d i s tú rb ios de personalidade. ↪ Quando a essa afetação de gestos e posturas juntam-se movimentos absurdos e reiterados, trata-se de estereotipias. Se a repetição for de uma expressão facial, denomina-se mímica estereotipada. Na ausência de causa neurológica (tiques faciais), as estereotipias podem sugerir esquizofrenia. Inteligência ↪ É a capacidade de adaptar o pensamento às necessidades do momento ou de adquirir novos conhecimentos. Pressupõe três t ipos de inteligência: uma abstrata (capacidade de compreender e lidar com ideias abstratas e símbolos); uma mecânica (capacidade de compreender, inventar e manipular aparelhos) e uma social (capacidade de atuar adequadamente nas relações humanas e situações sociais). ↪ A inteligência do paciente pode ser avaliada, por seus conhecimentos gerais (p. ex., nome do país, da capital e do governador do seu estado, do Presidente da República), pelo seu vocabulário (número de vocábulos e de que maneira os emprega), sempre de acordo com sua idade, condições socioculturais e nível de escolaridade. Pode-se, ainda, recorrer a testes simples, como a interpretação de provérbios e os testes das similaridades. ↪ Observando um déficit intelectual, devem-se procurar dados, no sentido de esclarecer se tal deficiência sempre existiu (oligofrenia) ou se surgiu na fase adulta (demência). E X A M E F Í S I C O ↪ O exame físico deve ser parte integrante do exame psiquiátrico, mesmo quando o paciente apresenta apenas sintomas psiquiátricos. ↪ Nem sempre o paciente psiquiátrico permite que o médico faça o exame físico. Alguns se mostram pouco cooperativos, outros desconfiados com a aproximação física do médico, outros hostis ou apresentam atitude francamente agressiva. ↪ Nessas situações, não é aconselhável insistir, postergando-se o exame para um momento mais adequado. ↪ Quando não é possível realizá-lo por completo e não se têm maiores dados sobre o paciente (situação relativamente frequente nas emergências psiquiátricas), a observação cuidadosa e atenta do paciente passa a ter uma importância crucial. ↪ No exame físico geral, têm grande importância para o diagnóstico diferencial psiquiátrico: ➡ Estado geral do paciente. Se está aparentemente saudável ou demonstra sinais físicos de doença crônica ou aguda. ➡ Estado de nut r ição . Se aparen ta emagrecimento ou obesidade. ➡ Pele. Coloração e eventuais lesões; observar cicatrizes e equimoses que estejam relacionadas com auto-agressão, crises epilépticas e uso de drogas; icterícia. ➡ Estatura e constituição. Observar se o paciente é excessivamente alto ou baixo, se apresenta simetria e proporção corporais e presença de deformidades. ➡ Caracteres sexuais secundários. A voz, a implantação dos cabelos, o tamanho dos seios, se estão de acordo com a idade e o sexo do paciente. ➡ Postura, atividade psicomotora e marcha. Sinais de desconforto, cansaço e dor. Sudorese, dispneia. Medicina - 5º P Layssa Ravelle Gomes Silva Andrade ➡ Odor do corpo e da respiração. Pode fornecer importantes dados diagnósticos. Falta de higiene corporal, perda do controle esfincteriano, hálito cetônico, alcoólico são dados importantes. ↪ No exame físico do paciente psiquiátrico, a avaliação neurológica tem particular importância, sobretudo quando há comprometimento das funções psíquicas: consciência, atenção, orientação, memória, inteligência; e determinados distúrbios da sensopercepção. ↪ Por motivos práticos e terapêuticos, o psiquiatra talvez prefira que o exame físico seja feito por outro médico. ↪ A perda da capacidade de palpação, percussão e auscultação pelo psiquiatra pode ser justificada, mas não a da sua capacidade de observação. Assim como a apreensão de dados psicológicos não verbais, a percepção de indícios de doença somática, dos mais claros aos mais sutis, é parte fundamental de sua função. OBJETIVO 02 ↪ O conceito de estresse foi apresentado inicialmente por Hans Selye em 1936, tendo havido posteriormente um crescente interesse dos pesquisadores quanto à identificação dos agentes estressores, bem como dos eventos fisiológicos envolvidos na resposta ao estresse. ↪ O estresse é comumente definido como uma condição ou estado em que a homeostase do organismo é perturbada, como resultado de estímulos estressores. ↪ É uma constelação de eventos, envolvendo a participação de diferentes sistemas do organismo em resposta a agentes estressores, como fatores climáticos, hiperpopulação, infecções, exercício físico intenso, desnutrição, ruído, odor, entre muitos outros. ↪ Em resposta à condição de estresse, Selye denominou como “Síndrome Geral de Adaptação” os eventos de resposta ao estresse que ocorrem em três importantesfases: 1. a reação de alarme, na qual o organismo percebe o estímulo estressante; 2. a fase de resistência, que consiste na tentativa de adaptação do organismo frente ao estímulo; 3. a fase de exaustão, quando o organismo perde a capacidade de adaptação. ↪ O estresse é uma resposta adaptativa fundamental à sobrevivência, e os mecanismos básicos e as moléculas envolvidas na resposta ao estresse são similares e bem preservados ao longo da evolução das espécies. ↪ Diversos autores têm investigado as variações hormonais durante o estresse as quais preparam o organismo para reagir frente à condição de estresse. Estas variações incluem: 1. aumento da secreção das catecolaminas (epinefrina e norepinefrina) pelo sistema nervoso autônomo; 2. l iberação hipotalâmica do hormônio liberador de corticotropina (CRH) na circulação e, após poucos segundos, o aumento da secreção do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) pela pituitária; 3. diminuição da liberação do hormônio liberador de gonadotrofinas (GnRH) do hipotálamo e das gonadotrofinas da pituitária; e 4. aumento da secreção de prolactina, de hormônio do crescimento (GH) e de glucagon. ↪ Dois componentes que estão bem distinguidos e envolvidos na ativação da resposta ao estresse são o eixo HPA e o SNA. Assim, a resposta do organismo ao estresse está associada à sua a t i v a ç ã o , a c a r r e t a n d o m u d a n ç a s n a s concentrações de vários mediadores relacionados ao estresse. ➡ A ativação do eixo HPA inicia-se através dos impulsos nervosos originários do estresse que são transmitidos para o hipotálamo. O hipotálamo, por sua vez, secreta o CRH, o qual passa pelo sistema porta hipotálamo-hipofisário, chegando até a hipófise anterior. Neste local, o CRH induz a secreção do ACTH, que flui pela corrente sanguínea até o córtex da adrenal, induzindo a secreção de glicocorticóides como o cortisol e aldosterona. ➡ Nem sempre os níveis de ACTH e de glicocorticóides encontram-se elevados durante o estresse. ➡ Ostrander et al. observaram que animais s u b m e t i d o s a e s t r e s s e c r ô n i c o apresentaram menor concentração de ACTH liberado do que de corticosterona. ➡ Embora a produção de glicocorticóides seja estimulada através da liberação de ACTH, estudos sugerem que sua produção Medicina - 5º P Layssa Ravelle Gomes Silva Andrade t a m b é m p o d e s e r m o d u l a d a p o r mecanismos ACTH-independentes. ➡ Já o SNA ativado resulta na secreção de acetilcolina, que induz a medula da adrenal a liberar epinefrina e norepinefrina na corrente sanguínea. Uma vez liberadas, as catecolaminas induzem aumento da frequência cardíaca, do fluxo sanguíneo para os músculos, da glicemia e do metabolismo celular, na tentativa de favorecer um melhor desempenho físico e mental durante o estresse. ➡ A ativação do SNA, que ocorre em segundos, permite a resposta adaptativa ao estressor, enquanto que o eixo HPA, por sua vez, apresenta uma resposta mais lenta, envolvendo a liberação dos glicocorticóides, os quais, dependendo da quantidade em que são secretados, podem levar à imunossupressão. ➡ A ativação sustentada ou frequentemente repetitiva dos dois eixos, sem a presença de recuperação (relaxamento), resulta em desenvolvimento de doenças. Essa ativação sustentada é o resultado da prolongada exposição ao estressor, ao qual o indivíduo não consegue se adaptar. ➡ Elevada pressão sanguínea pode ser considerada sinal de desregulação do SNA, enquanto que a hiper ou hiposecreção de cortisol é um indicativo da desregulação do eixo HPA. ➡ Por outro lado, as respostas desencadeadas pelo est ímulo estressor podem ser reguladas por complexos mecanismos de f e e d b a c k f r e n t e a o s m e d i a d o r e s neuroendócrinos. ↪ O feedback negativo é um mecanismo regulatório que inibe a liberação exacerbada dos hormônios pituitários-adrenais durante a ativação do eixo HPA induzida pelo estresse. A inibição do eixo HPA pelo feedback negativo é mediada pelos glicocorticóides e por seus receptores no hipocampo, hipotálamo e na pituitária. ➡ E s t e f e n ô m e n o e x e r c i d o p e l o s glicocorticóides sobre a secreção de ACTH e de CRH limita a duração da exposição t o t a l d o o rg a n i s m o a o s p r ó p r i o s glicocorticóides, inibindo deste modo seus efeitos imunossupressores. ➡ Os receptores envolvidos nesta ação inibitória sobre eixo HPA incluem o receptor mineralocorticóide (MR), que responde a níveis basais de glicocorticóides, e o receptor para glicocorticóide (GR) que responde a concentrações mais altas, devido a diferenças na sensibilidade destes receptores a estes hormônios. ➡ O feedback negativo pode ser tardio, q u a n d o o e f e i t o i n i b i t ó r i o d o s glicocorticóides leva horas para ocorrer, ou rápido (após segundos ou minutos), dependendo do tipo de estresse ao qual o indivíduo está submetido ou da resposta adaptativa do mesmo frente ao agente estressor. ➡ Por outro lado, quando o mesmo estressor é repetido, a resposta do eixo HPA pode se dessensibilizar, o que é denominado de “habituação”. A habituação acarreta decréscimo gradual na atividade do eixo HPA, o que se deve, pelo menos em parte, a alterações na inibição causada pelo feedback negativo. ➡ O efeito da habituação frente ao estresse crônico foi observado em nossos estudos. Camundongos submetidos a estresse crônico por 7 dias consecutivos não apresentaram diferenças significativas na produção de corticosterona plasmática em comparação ao grupo controle. ➡ A a d m i n i s t r a ç ã o s u b c u t â n e a d e antagonistas de MR ou de MR e GR pode prevenir a habituação das respostas do eixo HPA ao estresse repetitivo por imobilização. ➡ A administração apenas do antagonista do MR também foi capaz de bloquear o efeito de habituação induzida pela corticosterona. Por outro lado, o antagonista de GR por si só não alterou os níveis do hormônio quando os animais foram estressados pela primeira vez. ➡ Contrariamente, a resposta do eixo HPA pode ser desinibida, sendo um possível resultado da redução da ocupação dos recep to res MR. Esse f enômeno é denominado “facilitação ou sensibilização” do eixo HPA. ➡ Assim, o eixo HPA pode novamente responder ao estresse do mesmo modo ou até mesmo mais intensamente do que inicialmente. ↪ Evidências relatam fortemente a existência da correlação entre os sistemas neuroendócrino e imunológico, podendo este último ser em parte Medicina - 5º P Layssa Ravelle Gomes Silva Andrade regulado pelo eixo HPA e pelo SNA. Como essa interação é de caráter bidirecional, o sistema imune também pode enviar mensagens ao SNC, através das citocinas pró-inflamatórias. ➡ A s c i t o c i n a s s ã o i m p o r t a n t e s n a investigação dos mecanismos da resposta ao estresse, uma vez que são polipeptídeos produzidos pelas células imunológicas em resposta a qualquer desequilíbrio da homeostase, como injúrias, inflamações e infecções. ➡ Além disso, elas também podem ser expressas pela maioria dos tipos celulares de regiões do cérebro. ➡ Citocinas presentes na circulação sanguínea podem ativar o SNC ao atravessar a barreira hematoencefálica. Também induzem a produção de óxido nítrico sintase e ciclooxigenase por células endoteliais cerebrais, estimulando, indiretamente, as atividades do SNC. ➡ Como exemplo, pode-se citar a IL-1β, que a tua no núc leo paravent r icu la r do hipotálamo, onde os neurônios que contêm o CRH estão localizados. Deste modo, o CRH é liberado, resultando na secreção do ACTH, que por sua vez, induz o córtex da adrenal a liberar os glicocorticóides. ➡ As citocinas derivadas do cérebro também ativam o eixo HPA. A IL-1 induz a expressão gênica de CRH, enquanto a IL-2 estimula a secreção de AVP (arginina vasopressina). ➡ Já IL-6 e TNF-α estimulam a secreção de ACTH. No entanto, as citocinas cerebraisexercem principalmente o papel de fatores de crescimento para as células nervosas, protegendo-as ou induzindo-as à morte celular. ➡ Várias citocinas, principalmente as pró- inflamatórias (IL-1β, TNF-α e IL-6), podem ativar o eixo HPA e produzir outros efeitos no sistema nervoso, como o aumento da temperatura corporal e a indução do sono. De fato, os sintomas relacionados ao “comportamento doentio” desencadeado durante o estresse são mediados por tais citocinas. ➡ Estudos envolvendo a administração de LPS (lipopolissacarídeo) ou de citocinas pró- inflamatórias como IL-1(α ou β) e TNF-α têm demonstrado que tais citocinas provocam direta ou indiretamente efeitos psicológicos e comportamentais, como febre, ativação do eixo HPA, redução de apetite, depressão, dentre outros. ➡ Contrariamente, ao administrar citocinas ant i- inflamatór ias como a IL-10 ou antagonistas de receptores para citocinas pró-inflamatórias (como o IL-1ra), pode-se induzir a diminuição destes efeitos. ↪ Dependendo da sua intensidade e tempo, o estresse pode ser considerado agudo ou crônico. ESTRESSE AGUDO ↪ O estresse agudo pode ser entendido como uma ameaça imediata, a curto prazo, comumente conhecida como resposta à luta ou fuga. A “ameaça” pode ser qualquer situação considerada como perigosa e, após o evento (que dura de minutos a horas ) , há uma resposta de relaxamento. ↪ Em geral, como consequências fisiológicas imediatas devido a alterações hormonais na resposta ao estresse, ocorre aumento do ritmo cardíaco e frequência respiratória, ativação da resposta imune, mobilização de energia, aumento do fluxo sanguíneo cerebral e da utilização da glicose, perda de apetite, do interesse sexual e maior retenção de água e vasoconstrição (para o caso de perda de fluidos). Estes fenômenos ocorrem em períodos que vão de segundos a poucos minutos. ↪ O estresse relativamente agudo parece favorecer as funções imunológicas.Tanto os experimentos em animais quanto em humanos demonstram que a exposição aos estressores agudos pode aumentar a resposta imune a patógenos. ↪ Indivíduos vacinados contra o vírus influenza apresentaram aumentada produção de anticorpos após serem submetidos a estresse agudo. Ademais, o estresse psicológico agudo pode induzir a resposta imune celular, através do aumento do número de células natural killer (NK) e de granulócitos. ESTRESSE CRÔNICO ↪ Por outro lado, o estresse é denominado crônico quando persiste por vários dias, semanas ou meses. ↪ Há evidências de que as respostas ao estresse crônico possam causar, clinicamente, relevante imunossupressão, embora nem sempre haja concordância entre os pesquisadores quanto ao t ipo, duração e intensidade do estresse psicológico. Medicina - 5º P Layssa Ravelle Gomes Silva Andrade OBJETIVO 03 ↪ No dinâmico processo saúde-doença a condição de adoecimento, acompanha a humanidade e necessita do cuidado à saúde para que seja estabelecida a condição de saúde e equilíbrio do individuo e coletividade. Muitas vezes, este cuidado não pode ser auto-realizado e surge o importante papel do cuidador. ↪ O cuidador é a pessoa, membro da família ou não que se dispõe a cuidar da pessoa doente ou dependente auxiliando a execução de atividades cotidianas da vida, com ou sem remuneração para, tais como: higiene pessoal, alimentação, administração de medicamentos, ida a consultas, bancos ou farmácias, independente da gravidade da doença e fluxo de cuidado. ↪ Estes cuidadores podem ser formais ou i n f o r m a i s . O s c u i d a d o re s f o r m a i s s ã o representados pelas equipes de profissionais de saúde entre os quais a enfermagem possui suas competências centradas na manutenção deste cuidado. ↪ Os cuidadores informais são, muitas vezes, familiares, principalmente do sexo feminino, não remunerados, pouco assistidos e orientados pelos serviços de saúde, que auxiliam no cuidado em saúde mental em suas residências. ↪ O cuidado prestado varia desde intervenções simples até cuidados intensivos e especializados. Dependendo das características do cuidador, necessidades de cuidado, condições para oferta do cuidado e fatores sócio-culturais e das necessidades do doente, este cuidado pode se tornar uma fonte estressora e gerar grande sobrecarga ao cuidador. ↪ Sabe-se que o adoecimento mental é uma das condições mais incapacitantes o que muitas vezes gera necessidade de cuidado constante. Estudos indicam que sem suporte e devida orientação para realizar o cuidado em saúde o cuidador é sobrecarregado e, não raro, também adoece. ↪ A sobrecarga do cuidador pode implicar em graves consequências ao cuidador (formal ou informal) e até mesmo ao doente e sua família. ↪ É importante notar que a sobrecarga do cuidador é um fenômeno facilmente perceptível. ↪ Os cuidadores precisam ficar atentos a alguns sinais de alerta e não hesitar em buscar ajuda de um psicólogo ou psiquiatra. ↪ Entre os sintomas, estão cansaço constante, dificuldades em relaxar e sentir prazer, insônia, desejo de se isolar, dores, sentimentos como raiva e re je ição sem sent ido , pensamento e comportamento suicida. ↪ “O cuidador precisa ter uma vida ativa. É importante que procure centros de convivência pública, para que possa tirar um tempo para si mesmo. Não deve deixar sua vida pessoal de lado, pois isso pode gerar sério adoecimento mental”. CUIDADOR PROFISSIONAL X FAMILIAR ↪ Quando o cuidador é um profissional treinado, ele tem conhecimento sobre o trato e manejo do doente. Assim, consegue, na maioria das vezes, evitar problemas impactos à sua saúde mental. ↪ Mesmo assim, deve de tempos em tempos buscar novos aprendizados, seja por leituras, seja por cursos de treinamento e capacitação para se atualizar. ↪ Entretanto, muitas famílias não podem arcar financeiramente com os custos de um cuidador profissional, e o trabalho fica sob responsabilidade de algum familiar, em geral o cônjuge ou um filho. ↪ “As cuidadoras familiares não têm um horário de trabalho definido e é frequente que não possuam tempo para o seu descanso. De modo geral, não têm oportunidades de acesso a uma qualificação para o desempenho das tarefas de cuidar. Além disso, são mais vulneráveis à sobrecarga”. FONTES: • Semiologia Médica, 8º Edição - Porto & Porto • Artigo - Perspectivas atuais sobre a sobrecarga do cuidador em saúde mental, 2011 - Lucilene Cardoso • Artigo - Estresse: revisão sobre seus efeitos no sistema imunológico, 2009 - Ana Carolina Pagliarone Data: 03/08/2021 Coordenadora: Juliana Fernandes Secretária: Moarah Tutora: Kaline
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