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Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB Regência: Luís Menezes Leitão História ......................................................................................................................................................... 5 PRINCÍPIOS GERAIS dos Direitos Reais ........................................................................................................ 6 1. Princípio da Tipicidade ........................................................................................................................ 6 2. Princípio da Especialidade .................................................................................................................... 6 3. Princípio da Elasticidade ...................................................................................................................... 7 4. Princípio da Transmissibilidade ............................................................................................................ 7 5. Princípio da Publicidade ....................................................................................................................... 8 6. Princípio da Boa Fé ............................................................................................................................... 8 CONCEITO e ESTRUTURA dos Direitos Reais ............................................................................................... 8 Teoria Clássica ou Realista ....................................................................................................................... 8 Teorias Modernas ou Personalista ........................................................................................................... 8 Teoria do Poder Direto e Imediato sobre uma Coisa........................................................................... 8 Teoria do Poder Absoluto .................................................................................................................... 9 Teorias Mistas ...................................................................................................................................... 9 Orientações Doutrinárias Portuguesas .................................................................................................... 9 CARACTERÍSTICAS dos Direitos Reais ........................................................................................................ 10 I. Caráter Absoluto ................................................................................................................................. 10 II. Inerência ............................................................................................................................................ 10 III. Sequela .............................................................................................................................................. 11 IV. Prevalência ........................................................................................................................................ 11 Objeto dos Direitos Reais: COISAS ............................................................................................................ 13 Situações Jurídicas Propter Rem ............................................................................................................... 18 Obrigações Propter Rem ........................................................................................................................ 18 Ónus Reais .............................................................................................................................................. 19 Pretensões Reais .................................................................................................................................... 20 CLASSIFICAÇÕES dos Direitos Reais........................................................................................................... 22 Direitos Reais de Gozo, de Garantia e de Aquisição .............................................................................. 22 Direito Real Maior e Menor ................................................................................................................... 22 Direitos Reais sobre Coisa Própria e Coisa Alheia .................................................................................. 23 Direitos Reais de Proteção Definitiva e Proteção Provisória ................................................................. 23 Direitos Reais Simples e Complexos ....................................................................................................... 23 Direitos Reais Autónomos e Subordinados ............................................................................................ 24 Direitos Reais de Titularidade Imediata e Titularidade Mediata ........................................................... 24 POSSE .......................................................................................................................................................... 25 Fundamento da Proteção Possessória ..................................................................................................... 25 POSSE E DETENÇÃO ................................................................................................................................ 27 Solução da Lei .................................................................................................................................... 28 Âmbito da Posse ..................................................................................................................................... 30 Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 2 Direitos abrangidos pela Tutela Possessória ...................................................................................... 30 Concurso de Posses ............................................................................................................................ 31 Classificações da Posse............................................................................................................................ 32 Vicissitudes da Posse ............................................................................................................................... 34 Constituição da Posse – art. 1263º..................................................................................................... 34 Manutenção da Posse ........................................................................................................................ 36 Modificação da Posse ......................................................................................................................... 36 Sucessão na Posse .............................................................................................................................. 36 Acessão na Posse ............................................................................................................................... 36 Perda da Posse – art. 1267º ............................................................................................................... 37 Efeitos da Posse ...................................................................................................................................... 38 Direitos do Possuidor ......................................................................................................................... 38 Deveres do Possuidor ......................................................................................................................... 39 Defesa da Posse ...................................................................................................................................... 39 Regime específico das Ações Possessórias ......................................................................................... 40 Natureza da Posse ...................................................................................................................................42 Conteúdo dos Direitos Reais ..................................................................................................................... 43 Limitações aos Direitos Reais ....................................................................................................................... 45 Limitação da Propriedade pela sua função social: o Abuso do Direito ................................................... 45 1. Limitações de Direito Público ............................................................................................................. 46 2. Limitações de Direito Privado ............................................................................................................. 48 A. Deveres de Abstenção de certas condutas ...................................................................................... 49 B. Dever de Tolerar o exercício de poderes sobre o prédio ................................................................. 51 C. Deveres de Prevenção do perigo para o prédio vizinho ................................................................... 51 D. Deveres de participar em atividades de interesse comum .............................................................. 53 Contitularidade dos Direitos Reais ............................................................................................................ 54 COMPROPRIEDADE – art. 1403º e ss. .................................................................................................... 54 CONTITULARIDADE DAS ÁGUAS – art. 1398º e ss. ................................................................................. 57 Constituição dos Direito Reais ................................................................................................................... 58 Por Negócio Jurídico .............................................................................................................................. 58 Por Lei .................................................................................................................................................... 58 Por Sentença Judicial ............................................................................................................................. 58 USUCAPIÃO – art. 1287º e ss. ................................................................................................................ 58 Capacidade para a Usucapião ........................................................................................................... 58 Direitos que podem ser objeto de Usucapião .................................................................................. 58 Requisitos da Posse necessária para a Usucapião ........................................................................... 59 PRAZOS .............................................................................................................................................. 59 Invocação da Usucapião ................................................................................................................... 60 Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 3 ACESSÃO ................................................................................................................................................ 61 Distinção das Benfeitorias ................................................................................................................ 61 Art. 1326º tem as espécies de acessão ............................................................................................. 62 Formas de Atuação da Acessão ........................................................................................................ 63 Transmissão dos Direitos Reais ................................................................................................................. 65 Contratos Reais...................................................................................................................................... 65 Modificação dos Direitos Reais ................................................................................................................. 66 Defesa dos Direitos Reais .......................................................................................................................... 67 Extinção dos Direitos Reais .......................................................................................................................... 69 REGISTO – Publicidade dos Direitos Reais ................................................................................................ 73 Princípios do Registo Predial ................................................................................................................. 73 Modalidades de Atos de Registo .......................................................................................................... 75 Processo do Registo............................................................................................................................... 76 Efeitos do Registo .................................................................................................................................. 76 PROPRIEDADE ............................................................................................................................................. 81 Art. 1305º - Conteúdo do Direito de Propriedade .................................................................................. 81 Características do Direito de Propriedade .............................................................................................. 81 Formas de Aquisição da Propriedade ..................................................................................................... 81 Propriedade sobre as Águas – art. 1385º e ss. ....................................................................................... 82 Natureza do Direito de Propriedade ....................................................................................................... 83 PROPRIEDADE HORIZONTAL ........................................................................................................................ 84 Requisitos Legais e Partes Comuns do Prédio ........................................................................................ 84 Constituição da Propriedade Horizontal ................................................................................................. 85 Título Constitutivo ............................................................................................................................ 85 Condomínio ............................................................................................................................................ 86 Poderes .............................................................................................................................................. 86 Limitações aos Poderes – art. 1420º ................................................................................................ 86 Obrigações ......................................................................................................................................... 87 Administração das partes comuns ................................................................................................... 87 Modificação e Extensão .......................................................................................................................... 88 Natureza da Propriedade Horizontal ...................................................................................................... 89 USUFRUTO ................................................................................................................................................. 90 Características e Objeto .........................................................................................................................90 Constituição do Usufruto – art. 1440º ................................................................................................... 91 Poderes do Usufrutuário – art. 1446º .................................................................................................... 91 Obrigações do Usufrutuário ................................................................................................................... 92 Direitos do Proprietário de Raiz ....................................................................................................... 93 Extinção do Usufruto – art. 1476º ......................................................................................................... 93 Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 4 Tipos Especiais do Usufruto ................................................................................................................... 94 Natureza ................................................................................................................................................. 95 Uso e Habitação ......................................................................................................................................... 95 Conteúdo e Regime ................................................................................................................................ 96 Tipos Especiais de Uso e Habitação ....................................................................................................... 96 Natureza ................................................................................................................................................. 96 SUPERFÍCIE .................................................................................................................................................. 97 Objeto e Duração ................................................................................................................................... 97 Constituição do Direito de Superfície – art. 1528º ................................................................................. 98 Poderes e Direitos do Superficiário ........................................................................................................ 98 Poderes e Direitos do Proprietário do Solo ............................................................................................ 99 Extinção da Superfície – art. 1536º ...................................................................................................... 100 Natureza ............................................................................................................................................... 101 SERVIDÕES PREDIAIS ................................................................................................................................. 102 Características das Servidões Prediais .................................................................................................. 102 Modalidades de Servidões .................................................................................................................... 103 Servidões Legais ............................................................................................................................... 104 Constituição, Conteúdo e Mudança ..................................................................................................... 105 Extinção das Servidões – art. 1569º ..................................................................................................... 107 Natureza ............................................................................................................................................... 108 DIREITO REAL DE HABITAÇÃO PERIÓDICA .................................................................................................. 109 DL 275/93, de 5 de agosto .................................................................................................................... 109 DIREITOS REAIS DE GARANTIA ................................................................................................................... 111 Consignação de Rendimentos (art. 656º-665º) ..................................................................................... 111 Penhor (art. 666º-685º) ........................................................................................................................ 113 Hipoteca (art. 686º-732º) ...................................................................................................................... 115 Privilégios Creditórios (art. 736-753º) ................................................................................................... 117 Direito de Retenção (art. 754º-761º) .................................................................................................... 118 Penhora ................................................................................................................................................ 118 DIREITOS REAIS DE AQUISIÇÃO .................................................................................................................. 119 Promessa Real ....................................................................................................................................... 119 Preferência Real .................................................................................................................................... 119 Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 5 História Origem na categoria de ações romanística: • Actio in personam – formulavam pretensão contra pessoa, não podendo a pretensão extravasar a relação obrigacional. o Deu origem ao iura in personam • Action in rem – formulavam pretensão contra uma coisa, visando estabelecer a sua defesa contra qualquer pessoa que de alguma forma perturbasse o aproveitamento pelo titular, podendo este perseguir a coisa onde quer que ela se encontrasse. o Deu origem ao iura in rem – Direitos Reais, que incidem sobre coisas, tendo eficácia real1. Os Direitos Reais são um ramo do Direito Civil. Desde a pandectística alemã e a partir da classificação germânica do Direito Civil – instituída por Savigny. • Livro III do CC de base estrutural – sempre que surja estruturalmente a atribuição de coisas corpóreas2 a determinada pessoas, essa situação jurídica3 é potencialmente regulada pelo Direito das Coisas. o Os direitos reais de gozo estão no Livro III; os direitos reais de garantia estão no Livro II; os direitos reais de aquisição estão no II e no III. • É o direito que regula a atribuição das coisas corpóreas com eficácia real, i.e., eficácia absoluta perante terceiros. Gomes da Silva: não há dois direitos reais iguais ➢ Daí que não seja possível estabelecer uma teoria geral dos Direitos Reais, pois há uma diferença vasta entre os vários direitos reais o ML: é vantajoso pensar-se numa teoria geral dos Direitos Reais em que se estude, a um nível mais geral e abstrato, todas as características comuns a essa categoria (como o é a eficácia real). o Não havendo uma parte geral o Direito Real paradigmático é a Propriedade, que está regulado no CC e se aplicará a outros direitos reais (como servidões, superfície, usufruto e etc.) Tutela Constitucional dos Direitos Reais Garantia constitucional da propriedade -> art. 62º CRP: permite aos cidadãos um espaço de liberdade, no âmbito do qual eles podem desenvolver livremente a sua vida, através do pleno aproveitamento dos bens de que são titulares. • Extensiva a todos os Direitos Reais • Análoga aos DLG – tese do TC, desde 1984, por força do art. 17º CRP • Limites do art. 18º/2 e 18º/3 CRP. Jurisprudência do TC tem reiterado que propriedade deve ser entendida amplamente – componente estática de proteção e componente dinâmica da tutela dessa propriedade.1 Eficácia do direito contra qualquer pessoa – direito de cariz absoluto 2 Havendo semelhança de consequências jurídicas geradas a partir da atribuição de direitos reais sobre coisas corpóreas. 3 Situações da vida humana valoradas pelo Direito – aquelas situações da vida às quais o Direito confere relevância para os fins próprios do Direito Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 6 PRINCÍPIOS GERAIS dos Direitos Reais Ideias gerais subjacentes a este ramo do Direito4, cuja doutrina discute. • Henrique Mesquita: tipicidade, consensualidade, causalidade • Carlos Mota Pinto: especialidade, transmissibilidade, elasticidade, tipicidade, publicidade, consensualidade • José Alberto Vieira: tipicidade (numerus clasus), inerência, especialidade, consensualidade, causalidade e unidade, territorialidade, publicidade. o Menezes Leitão: muitos destes são características dos direitos reais e não princípios, que correspondem aos fundamentos dogmáticos específicos do Direito das Coisas. 1. Princípio da Tipicidade Numerus clausus dos direitos reais – art. 1306º CC ➢ Proíbe a inexistência de direitos reais que não se encontrem previstos na lei. o Se as partes quiserem criar novos direitos reais, ao abrigo da sua autonomia privada, a lei nega-lhes a pretendida eficácia real, atribuindo-lhes apenas natureza obrigacional – vincula inter partes. ➢ Limitação do número de realidades que podem ser qualificadas como direitos reais. o Infração a esta regra leva a conversão legal. ▪ OA: apenas as restrições ao direito de propriedade estão sujeitas a conversão legal; constituição de figuras parcelares é nula nos termos gerais. ▪ ML: não há base para estabelecer essa distinção e estando em causa a criação de um novo direito real, o tratamento dado é o mesmo. Justificação do princípio: cariz absoluto dos direitos reais pode ser entrave à circulação dos bens (o titular pode opô-lo eficazmente a qualquer adquirente de boa fé); sobreposição sucessiva de direitos pode dar origem a litígios, afetando a possibilidade de exploração dos bens; Estado deve criteriosamente instituir a ordenação jurídica dos bens. Críticas: parte mais rígida e menos mutável do Direito Privado patrimonial – congelado e cristalizado na forma clássica 2. Princípio da Especialidade Tem que ser possível individualizar concretamente a coisa que constitui o objeto do direito real: coisas corpóreas, determinadas, com existência presente e autónomas de outras coisas. • Subprincípio da determinação: a coisa tem de estar determinada – se o titular tiver direito a receber coisas genéricas não tem direito real e sim direito de crédito (art. 539º). o Só há direito real a partir do momento em que as coisas sejam determinadas (art. 408º/2). o Não há direitos reais autónomos sobre universalidades, incidindo o direito individualmente sobre cada uma das coisas que compõe a universalidade. 4 JAV: a autonomização de um ramo do Direito depende da existência de princípios jurídicos próprios que lhe permitam constituir um subsistema autónomo dentro do sistema geral da ordem jurídica. Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 7 • Subprincípio da atualidade: coisa tem de ter existência presente – se o titular tiver direito a coisa futura, então isso não é direito real e sim direito obrigacional a uma prestação futura. o Não existe também direito sobre coisas passadas (perdidas ou cujo direito sobre a mesma se extinguiu). • Subprincípio da autonomização/totalidade: coisa tem de ser autónoma, não havendo direito real sobre partes de uma coisa. o Não dá direito real de coisas ligadas materialmente a outras. o Se coisa separada for unida e incorporada noutra coisa, há extinção do direito e sua aquisição ex novo por acessão (art. 1325º e ss.) – não é possível manter a reserva de propriedade a partir do momento em que as coisas passem a constituir partes integrantes dos prédios.5 o Consequência de os negócios sobre direitos reais serem de disposição e não obrigacionais. 3. Princípio da Elasticidade Admissibilidade das compressões e expansões dos Direitos Reais, em virtude da constituição de um novo Direito Real que onere a coisa ou extinção posterior desse Direito. ➢ Conteúdo do direito não é imutável – varia conforme se vão constituindo e extinguindo os direitos reais que incidem sobre a coisa – pode haver mudanças no conteúdo do direito real. ➢ Em consequência da extinção do direito real menor, o direito real maior pode retomar o seu conteúdo originário. No caso de sobreposição de direitos sobre a mesma coisa há necessidade de harmonizarem-se, havendo mecanismos de compressão, na lei. Não se podem constituir sucessivamente 2 propriedades sobre a mesma coisa, mas tal resulta da falta de legitimidade para a realização de uma segunda disposição do mesmo direito e não da falta de compatibilidade dos direitos entre si. 4. Princípio da Transmissibilidade Comum aos outros direitos patrimoniais – mais importante nos direitos reais, tendo mesmo garantia constitucional. ➢ Implica que os direitos reais possam ser objeto de sucessão por morte e que possam ser transmitidos por ato inter vivos. o Mas há direitos reais que não podem exceder a vida do titular (art. 1444º) e outros inalienáveis (art. 1488º). Princípio da Consensualidade: para a constituição ou transmissão do direito real basta o acordo das partes – celebração do contrato acarreta a transferência do direito real (art. 408º/1 e 1317º/a – quod constitutionem). ➢ Portanto, transferência do direito real é imediata e instantânea, apenas com o acordo das partes. 5 STJ decidiu assim, em 1996, em relação aos elevadores – a partir do momento que estão incorporados no prédio faze parte dele e não podem haver direitos reais autónomos sobre o elevador. Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 8 5. Princípio da Publicidade Factos jurídicos relativos aos direitos reais devem ser dados a conhecer ao público em geral. • Forma mais comum de assegurar a publicidade dos direitos reais: Posse (art. 1268º/1) • Forma mais perfeita de assegurar a publicidade dos direitos reais: Registo 6. Princípio da Boa Fé Princípio geral do Direito Civil. • Aplicação mais restrita do que no Direito das Obrigações – não há princípio que protege o possuidor de boa fé contra a reivindicação de móveis. o Mas releva para efeitos da posse, usucapião e acessão industrial. CONCEITO e ESTRUTURA dos Direitos Reais Teoria Clássica ou Realista Relação entre Pessoa e Coisa Grotius: direito real é um direito de propriedade entre uma pessoa e uma coisa, sem relação necessária com outra pessoa. Natureza ontológica das relações: direitos reais estruturam-se com base na relação de uma pessoa com uma coisa, através da qual esta era afetada ao sujeito – tutelada pela actio in rem e dirigida contra qualquer pessoa. Teorias Modernas ou Personalista Criticam a Teoria Clássica: • Pufendorf – jusracionalistas concluíram que as relações jurídicas só se podem estabelecer entre pessoas; propriedade das coisas resulta de convenção, expressa ou tácita, entre pessoas. • Kant – o que existia era uma vinculação dos outros para com o proprietário da coisa. • Thibaut – direito absoluto pois era tutelado por uma ação absoluta. • Feuerbach – direito real era direito sobre determinado objeto, que teria validade contra todas as pessoas, mediante o qual o seu titular poderia ser considerado em relação com todos os outros seres humanos; qualquer pessoa teria o dever de reconhecer esse direito, não perturbar o seu titular e não limitar por qualquer forma o seu exercício. Após a pandectística alemã surgiram várias teses: Teoria do Poder Direto e Imediato sobre uma Coisa O que caracteriza o direito real consistena circunstância de ele recair direta e imediatamente sobre uma coisa corpórea, ou seja, não necessitar da colaboração de ninguém para ser exercido. Defensores: Wäcther, Guilherme Moreira, Pessoa Jorge e etc. Críticas: excessivamente empírica e não explicativa da forma como são juridicamente atribuídos ao titular os poderes que sobre ela tem. Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 9 Teoria do Poder Absoluto O que caracteriza o direito real não é a relação com a coisa, mas antes a relação com os outros sujeitos da ordem jurídica, através da qual o titular teria a faculdade de exigir dos outros sujeitos que se abstenham de, por alguma forma, perturbar o exercício de poderes sobre a coisa. ➢ Relação entre o titular do direito real e todos os outros sujeitos da ordem jurídica, ou com todos aqueles que se encontrem em condições de lesar o seu gozo sobre a coisa, sendo essa relação que explicaria juridicamente os seus poderes sobre a coisa. ➢ Relação de uma pessoa (lado ativo) com todas as outras (lado passivo = universalidade de sujeitos) Críticas: direito real não estabeleceria poderes para o titular e apenas deveres de abstenção a terceiros, sendo um dever universal de respeito ou obrigação passiva universal (Windscheid); é muito abstrata e faz esquecer o núcleo fundamental do direito que é precisamente a relação com a coisa. Teorias Mistas Conjugam as duas conceções, considerando que o direito real tem: • Lado interno – poder direto e imediato sobre a coisa • Lado externo – relação com todos os outros sujeitos da ordem jurídica o Jaime de Gouveia: é a relação jurídica que se estabelece entre o titular do direito e todas as outras pessoas que se obrigam a respeitar o poder que o titular tem de tirar da coisa, objeto do direito, todas as utilidades que a ordem jurídica consente. Defensores: Pires de Lima, Galvão Telles, Henrique Mesquita, Antunes Varela, Mota Pinto, Santos Justo. Críticas: estão sujeitas às críticas de qualquer uma das anteriores. Orientações Doutrinárias Portuguesas Gomes da Silva: “Só pode ser direito real o que representa a afetação da coisa a um fim. Neste sentido temos a inerência do direito à coisa. O bem afetado pela lei à realização do fim é a própria coisa.” Oliveira Ascensão: “Direitos absolutos, inerentes a uma coisa e, funcionalmente dirigidos a outorgar vantagens intrínsecas desta ao titular.” ➢ Direitos erga omnes inerentes a uma coisa numa relação tão intensa que leva o direito a perseguir a coisa. Menezes Cordeiro: “Permissão normativa específica de aproveitamento de uma coisa corpórea.” José Alberto Vieira: “Direito real é aquele que atribui um determinado aproveitamento de uma coisa corpórea.” Menezes Leitão Direito Real: direito absoluto e inerente a uma coisa corpórea, que permite ao seu titular determinada forma de aproveitamento jurídico desta. Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 10 Permissão normativa específica de aproveitamento de uma coisa corpórea existe nos direitos reais mas também noutros, tendo que se acrescentar outros traços distintivos como o caráter absoluto e a inerência. ➢ É um direito absoluto porque pode ser oponível a qualquer pessoa e incide sobre uma coisa corpórea, à qual é inerente. CARACTERÍSTICAS dos Direitos Reais ≠ Princípios – que são os fundamentos dogmáticos específicos. As características dos Direitos Reais são analisadas numa ótica do direito subjetivo. JAV: eleva algumas destas características a princípios (a absolutidade e a inerência) e não autonomiza a Sequela. I. Caráter Absoluto Consiste no facto de os direitos reais não se estruturarem com base em qualquer relação jurídica, sendo oponíveis erga omnes. ➢ MC discorda pois também entende os direitos de crédito como oponíveis a terceiros.6 Consequência é a 1) existência dum dever genérico de respeito desse direito por parte dos outros sujeitos, aos quais o 2) titular do direito pode sempre opor eficazmente o seu direito. 1) Atribuem ao titular um domínio reservado de atuação, que todos os outros sujeitos têm de respeitar. 2) Oponíveis a qualquer pessoa que se pretenda ingerir no domínio reservado ao seu titular – grande potencial de reação Direitos reais de gozo – propriedade pode constituir-se por ocupação (art. 1318º); ação de reivindicação (art. 1311º a 1315º). Direitos reais de garantia – faculdade da satisfação do crédito a partir dos rendimentos da coisa ou do produto da sua venda. Direitos reais de aquisição – aquisição pode ser desencadeada independentemente do atual titular do bem/feita contra qualquer pessoa. II. Inerência Consiste no facto de os direitos reais estabelecerem com a coisa uma ligação especialmente intensa, não podendo ser dela separados, designadamente para passarem a ter outra coisa como objeto. Carvalho Fernandes: O interesse do titular é realizado pela coisa. Estão de tal forma ligados à coisa que é o seu objeto que a ela inerem e não podem ser desligados – coisa tem de ser existente, certa e determinada para poder ser objeto do direito real. 6 Fala também em direitos reais relativos, como a servidão de vistas. JAV discorda pois a servidão de vistas é oponível a terceiros. Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 11 ➢ Não podem ser separados da coisa nem passarem a ter outra coisa como objeto – é juridicamente impossível transmitir o direito da coisa sem a própria coisa. o Transmissão do direito para outra coisa é juridicamente impossível. Ex: alguém tem usufruto do prédio X e quer que esse usufruto passe antes a incidir sobre o prédio Y – não o pode fazer; tem de extinguir o usufruto sobre X para constituir um novo sobre Y ➢ Também não permite alargar o direito a uma realidade sobre a qual não incidia. Manifestação positiva no art. 1545º/2 Implica que as vicissitudes da coisa se reflitam no direito real que incide sobre as mesmas – manifestando a inerência dos direitos reais (art. 730º/2, 1485º, 1535º/e). Questão da sub-rogação especial é controvertida. • Sub-rogação legal especial real – caso de quando desaparece a coisa que é objeto de direitos reais e há transmissão desses direitos para outra coisa (como uma indemnização) – art. 1480º o ML, JAV: não está em causa a inerência, pois passa é a haver outro direito real. Extingue-se o direito sobre a coisa destruída e surge um novo direito real, sobre uma nova realidade. Extinção do direito real, com a extinção do objeto, constituindo-se um novo direito real sobre outro objeto. III. Sequela Constitui uma manifestação dinâmica da inerência7 – titular pode ir buscar a coisa, independentemente de qual o seu atual possuidor, mesmo que ela venha a ser objeto de uma cadeia de transmissões (ubi rem invenio, ibi vindico). ➢ Características dos direitos reais e apenas destes – res perit domino ➢ Permite ao titular do direito atuar sobre a coisa para realizar o seu direito Direitos reais de garantia: possibilidade de executar o direito e ser-se satisfeito com a venda Direitos reais de aquisição: possibilidade de fazer sua a coisa (art. 1410º) IV. Prevalência Significa que o direito real que primeiro se constituir prevalece sobre todos os direitos reais de constituição ou registo posterior, bem como sobre todos os direitos de crédito que se venham a constituir. • Maior força dos direitos reais sobre os direitos de crédito – confrontando direitos de crédito com direitos reais, prevalece o real mesmo que os de crédito tenham sido constituídos primeiro. Direitos reais que não se compatibilizem sobre a mesma coisa são hierarquizados por uma ordem de precedência, que pode ser conferida pela prioridade na constituição ou pela prioridade no registo. • Direitos reais, no confronto com outros direitos reais incompatíveis, prevalecem se setiverem constituído/registado primeiro. 7 JAV não liga à Inerência e sim ao Caráter Absoluto Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 12 MC segue Pinto Coelho e OA e nega que a prevalência seja, em absoluto, uma característica dos direitos reais. ➢ ML discorda: os direitos de crédito não possuem prevalência pois regem-se pela igualdade entre credores – o que não se verifica nos direitos reais, pois aquele que constituiu primariamente o direito tem prioridade (prior in tempore, prior in iure), aproximando-se à noção de prevalência (art. 604º/2). ➢ Ela funciona é em termos divergentes. Direitos reais de gozo: implica que apenas o direito resultante da primeira alienação se constitua, não chegando o segundo direito a constituir-se. O segundo é inválido pois não há legitimidade. Direitos reais de garantia: credores não estão em pé de igualdade e um será satisfeito prioritariamente, tendo em conta a precedência do seu direito real. • Satisfação preferencial do direito real constituído em primeiro lugar. • Se o valor não chegar para satisfazer totalmente o direito que tem preferência, então satisfaz até onde pode e o que não for satisfeito é crédito obrigacional. Direitos reais de aquisição: constituindo-se um direito real, o direito de crédito extingue-se por impossibilidade – essa extinção resulta de ter sido constituído um direito real incompatível, que sobre ele prevalece. Há algumas exceções: privilégios creditórios (art. 745º e ss.); privilégio imobiliário especial (art. 751º) Prevalência pode ser extensiva a direitos não reais: art. 733º, art. 736º, 747º/1/a. Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 13 Objeto dos Direitos Reais: COISAS = BENS8 O conceito de Direito Real pode ser essencialmente delimitado em função do seu objeto: as coisas corpóreas (art. 1302º)9 ➢ Por força do princípio da especialidade, as coisas, para serem objeto de direitos reais, têm que ser corpóreas, com existência presente, autónomas de outras coisas e determinadas. o Sem estas características não têm idoneidade para ser objeto de um direito real. Noção de Coisa – art. 202º “Tudo aquilo que pode ser objeto de relações jurídicas” ➢ A lei não tem que definir, a lei deve regular. A doutrina é que define. ➢ Tem que se entender num sentido mais amplo (leitura atualista) que o da relação jurídica – pode ser uma situação jurídica (ex: direito de propriedade só supõe um sujeito e a coisa) o Neste caso a coisa só existia quando transacionada, conceito de relação (sujeito-sujeito) – aplicam-se as críticas feitas à relação jurídica. ➢ Mas não num sentido tão amplo como o Código de Seabra que definia coisa como “tudo o que carece de personalidade” – se não é pessoa é coisa. Definição pela negativa que gera dificuldades em relação aos cadáveres, nascituros e etc. Delimitação das coisas (MC): 1. Coisa opõe-se a pessoa – as pessoas são sujeitos e não objetos de negócios jurídicos. Pode não ser assim tão evidente, ex: escravos eram coisas 2. Coisa pode ser material ou imaterial 3. Coisa pode ter valor económico ou não – juridicamente é irrelevante 4. Coisa é um conceito jurídico – a realidade “coisa” é uma criação do Direito. Ex: questão dos animais, para nós não são coisas, mas o Direito entende como tal a. Menezes Cordeiro tenta definir como “realidade delimitada pelo Direito a partir do conceito de seres inanimados” Palma Ramalho: fica-se pela definição do CC PPV: Só são coisas jurídicas aquelas que forem pessoalmente apropriáveis e utilizáveis para a realização de fins concretos, que puderem ser pelo Direito especialmente afetas à satisfação de fins. Menezes Cordeiro: as coisas podem ser inalcançáveis Classificação das coisas – art. 203º e ss. Qualquer classificação pode ser sobreponível a outra. O art. 202º precede uma classificação Coisas fora do comércio • Não podem ser objeto de transação (direitos privados) e/ou apropriação individual o Naturais: impossibilidade de apropriação individual. Ex: lua, sol e etc. o Jurídicas: impossibilidade de situações jurídicas privadas, excluem-se do comércio privado e/ou fazem parte do domínio público. Ex: um rim; Torre de Belém, praias, estradas ▪ Na dúvida se está no domínio público ou não, é o Tribunal que decide o A não comercialidade das coisas fora do comércio é tributária da lei e não das próprias coisas. • PPV: As coisas fora do comércio são insuscetíveis de apropriação – logo não são coisas em sentido jurídico. Coisas corpóreas e incorpóreas 8 PPV: tudo aquilo que não seja pessoa e tiver uma utilidade (apto a satisfazer necessidades) 9 Art. 1303º - ML: é muito difícil verificar-se pois o regime dos Reais no CC pressupõe a existência de uma coisa corpórea, não se harmonizando com coisa não corpórea. Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 14 • Coisa Corpórea: existência exterior e apreensível pelos sentidos. Suscetíveis de posse (apropriação física) o Podem sofrer atuação humana direta, no sentido mais imediato de atuação física. o Palma Ramalho: podem ser consideradas Materiais ou Imateriais o Art. 1302º - só das coisas corpóreas se pode ser proprietário. Em qualquer dos estados físicos (gases e líquidos são corpóreos mas envolvem um recetáculo). o PPV: Coisas corpóreas dividem-se em coisas materiais (têm matéria e dimensão) e coisas imateriais (têm realidade e existência na natureza física mas não têm matéria como a eletricidade). • Coisa Incorpórea: produto do espírito (honra, memória, imagem, obras) o Bens Intelectuais ▪ Obras literárias ou artísticas, independente da forma física de que se revestem. Reguladas pelo Direito de Autor. ▪ Inventos, dão lugar a registo e a patente mesmo que impliquem descobertas científicas (que mais facilmente caem no domínio público). Regulados pelo Código da Propriedade Industrial. ▪ Marcas, sinais distintivos (gráficos, desenhos, palavras) de uma coisa ou serviço. Reguladas pelo Código da Propriedade Industrial e Código da Publicidade. o Prestações – conduta humana devida por alguém (Castro Mendes). A prestação em si mesma é um bem jurídico (já o objeto da prestação é corpóreo) ▪ De dare, de facere, de non facere/de pati o Quia Jurídicos – figurações técnicas e sociais relacionadas com uma situação jurídica em que um direito é perspetivado como uma coisa. A ordem jurídica perspetiva os direitos como um bem. ▪ Ex: direitos inerentes aos imóveis (art. 204º/1/d) – pode-se transmitir o direito de usufruto que é um bem mas não deixa de ser um direito; quota dos sócios dá direito a votar e etc. mas ao lhe atribuir valor (para vender) é perspetivada como um bem o Bens de Personalidade – discute-se na doutrina se são bens ou não ▪ Palma Ramalho: é um bem incorpóreo em termos gerais, sobretudo aqueles que podem ser objetos de negócios jurídicos (ao abrigo do art. 81º). Os não passíveis de serem transacionados são realidades intermédias. ▪ Menezes Cordeiro: não são coisas os bens de personalidade – estão ligados intimamente com os direitos de personalidade. Coisas Imóveis – art. 204º É importante esta distinção pois os negócios jurídicos que têm como objeto as coisas imóveis são mais exigentes na forma e pode dar origem a deveres de registo – para tornar a situação conhecida de terceiros e assegurar a segurança jurídica. ➢ Pois sociológica e historicamente dá-se mais valores aos bens imóveis. Hoje em dia há desvios pois há ações (móveis) que podem valer mais que um metro quadrado de terra (imóvel) ➢ O Simplex de 2007 veio simplificar a formalidade dos negócios jurídicos associados a coisas imóveis Não se definem coisas imóveis, nem móveis, devido à sua grande heterogeneidade. O código decide enunciar, quer as de origem natural quer as construções humanas (incluindo as realidades jurídicas).Numeração enunciativa e não taxativa pois há muitas outras coisas imóveis não cobertas pelo artigo – pontes, estradas, aquedutos Núcleo essencial: um bem imóvel é um bem ligado ao solo com caráter de permanência, que dele não se pode desligar – critério de imobilidade material à exceção dos direitos. Pode-se também aplicar, residualmente, um critério da funcionalidade do bem. a) Prédios – noção jurídica – porção de terreno ou construção incorporada num terreno, há sempre um solo. i. Rústico: elemento predominante é o solo, mesmo que lá haja uma construção sem autonomia económica – o elemento do solo é predominante quando a sua afetação económica, a sua utilidade própria, residir principalmente no solo, tendo as edificações que nele existirem uma utilidade apenas instrumental ou acessória. Art. 204º/2 ii. Urbano: elemento predominante é a edificação (edifício incorporado no solo) – utilidade própria é a edificação servindo o solo apenas como suporte físico Art. 204º/2 Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 15 Logradouro – terreno à volta do qual está implantado, sem autonomia e servente às necessidades dos habitantes prédio urbano. Ex: jardim Não se olha para o contexto, mas quando o elemento predominante não chega, olha-se à utilidade económica e à funcionalidade. Pode-se alterar a classificação dos prédios10 com a submissão à Câmara Municipal da alteração do registo – depende apenas do objetivo ou do elemento que agora predomine. iii. Frações Autónomas: decorrem da possibilidade de instituição do regime da propriedade horizontal (art. 1414º) Palma Ramalho -> Para reconhecer as partes comuns em copropriedade (escadas, elevador, garagens) enquadra-se como partes de imóveis mas a fração autónoma é um bem imóvel em si mesmo e segue as regras de bens imóveis. iv. CC reconhece que o direito de propriedade sobre um prédio abrange o subsolo e o espaço aéreo respetivos – art. 1344º (desde que não entre numa lógica de abuso de direito e má fé. Ex: espigões para furar os dirigíveis) b) Águas – as águas particulares (art. 1386º CC), nomeadamente as que nascem na nossa propriedade, passam pela nossa propriedade ou estão no subsolo da nossa propriedade, podem ser objeto de direitos privados. c) Árvores, arbustos e frutos naturais enquanto estiverem ligados ao solo – é tido em conta o critério de incorporação no solo. A partir do momento que há autonomia passa a ser uma coisa móvel. d) Direitos ligados aos anteriores – quia jurídico – aplica-se aos direitos sobre os bens imóveis o regime das coisas imóveis. Ex: terreno X tem registo, usufruto de X também está sujeito a registo. e) Partes integrantes – art. 204º/3 – quando uma coisa móvel está ligada materialmente a um prédio com carácter de permanência – coisas originalmente móveis que foram integradas com caráter de permanência numa coisa imóvel e que passaram, assim, a fazer parte dela, perdendo a individualidade e a autonomia. i. Critério da ligação material. Bens que não têm autonomia relativamente ao prédio. ii. Ao estarem separados podem ser tratadas como móveis, mas juntas são parte integrante de um bem imóvel. Ex: azulejos da cozinha, elevador. A escultura do jardim não é vendida juntamente com a casa porque não está a ela ligada materialmente, mas os azulejos estão. iii. O prédio ao ser transmitido, as partes integrantes têm que acompanhar o destino do prédio. Coisas Acessórias – art. 210º = Pertenças • Podem aplicar-se também a bens móveis enquanto as partes integrantes é só a bens imóveis o A doutrina critica e defende uma extensão do regime das partes integrantes. Ex: pneus do carro deviam ser partes integrantes e não acessórias – pois asseguram a funcionalidade da coisa principal o O adquirente da coisa principal deve explicitar quais as pertenças abrangidas pelo negócio. • É meramente ornamental, ao passo que a parte integrante assegura a funcionalidade da coisa. o A coisa acessória não assegura a manutenção da funcionalidade Coisas Móveis – art. 205º Determinadas por exclusão – determinação pela negativa (tudo o que não é imóvel) • A energia, o gás e etc. são também coisas móveis. Devido ao seu valor, há móveis sujeitos a registo e a matrícula – têm garantias do regime dos imóveis. Coisas semoventes – coisas que se mexem, animadas. Ex: animais, carros Coisas Compostas – art. 206º = Universalidades de Facto11 10 Rustico vs. urbano Teoria do valor – será segundo a parcela que tiver maior valor Teoria da afetação económica – se visa o aproveitamento do terreno ou construção Teoria da consideração económica – será o que a comunidade jurídica entender 11 Também pode haver Universalidades de Direito (ex: herança) ou um misto Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 16 Favorece-se o tratamento unitário de um conjunto de coisas conglomeradas – o conjunto é que é objeto de Direito. Individualmente as coisas também podem ser objeto de situações jurídicas. Ex: somos donos de cada livro, mas também da biblioteca • Móveis pertencentes à mesma pessoa com o mesmo destino unitário o Analogicamente pode se aplicar a imóveis • Têm um tratamento jurídico individual autónomo, sem prejuízo da individualidade jurídica dos seus componentes. Coisas Fungíveis – art. 207º Não se determinam pela coisa em si, mas sim pelo género, qualidade e quantidade quando são objeto de relações jurídicas. • Critério não pelas características específicas e que pode ser substituída por outra da mesma espécie. Ex: ao pedir um pastel de nata, não queremos um em específico. Pedimos aquele género e quantidade. O dinheiro é a coisa mais fungível o Manuel de Andrade – coisas fungíveis intervêm não in specie (individualmente determinadas) mas in genere (identificadas através de notas genéricas) • Só se sabe se é fungível olhando para a situação jurídica em questão. Ex: uma moeda pode ser fungível como infungível (se for de coleção) o A infungibilidade pode ser devido a ligações sentimentais • Influencia os contratos em que uns pressupõem a fungibilidade dos bens e outros não o Certas prestações podem ser infungíveis pois dependem das qualidades próprias do devedor Coisas Consumíveis – art. 208º Classificação que pode alargar-se a situações de Direito e não meramente naturalistas. • A vontade das partes pode atribuir a qualidade das coisas consumíveis ou não • Depende da sua utilidade. Ex: vela para iluminação ≠ vela para decoração • A coisa extingue-se ao ser consumida o As não consumíveis podem ser Deterioráveis ou Não Deterioráveis Coisas Divisíveis – art. 209º Não é a divisibilidade natural mas sim jurídica – critério de unidade da coisa reside na sua utilidade. Algo considera-se indivisível quando: 1. A divisão determina uma alteração da sua substância 2. Diminui o seu valor 3. Deixa de ser adequada para o uso a que se destina – prejuízo de utilidade A doutrina considera que prevalece o critério do valor – dependendo da situação jurídica concreta e o negócio jurídico celebrado. Ex: Vaca. 1 – Ao cortar-se uma vaca ao meio ela continua uma vaca. 2 – Se for uma vaca para carne o seu valor pode aumentar; se for para leite pode passar a valer menos. 3 – Se for para carne, não prejudica o uso a que se destinava; se for para leite já prejudica. Uma vaca para carne é divisível. Uma vaca leiteira é indivisível. Coisas Futuras – art. 211º Podem ser futuras por 2 razões: 1. Ainda não existem – objetivamente futuras. Ex: Faz-se um negócio jurídico sobre o quadro que A vai pintar de B 2. Ainda não estão em poder do disponente, mas irão estar – subjetivamente futuras. Ex: bens que C herdará Venda de coisa alheia que se espera vir a ser própria – os efeitos do negócio jurídico dependem da aquisição ou posse por parte de quem negoceia. Coisas alheias são objeto de atos de disposição na expetativada sua futura aquisição pelo disponente. Disponente fica obrigado às diligências necessárias para que as coisas futuras se tornem presentes (art. 880º) – negócio só está concluído quando a coisa estiver junto da pessoa interessada. Frutos – art. 212º e ss. Advêm de coisas frutíferas. O fruto é uma coisa que provém periodicamente de outra e que não altera a substância dessa outra. • Periocidade é importante, regime dos frutos moldado à ideia de que eles vão surgindo Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 17 • Podem ser frutos naturais (frutas das árvores, crias de animais) ou civis (renda que se recebe pelo arrendamento de um prédio) • Na coisa composta, como o rebanho, o excesso é que é o fruto. Não conta os que nascem e compensam os que morrem – só deve ser tido como fruto o que sobrar depois de descontado o necessário para a manutenção da coisa frutífera. o Ao nº3 do art. 212º do CC pode-se aplicar analogicamente para os frutos civis como por exemplo as aplicações de capital, cujos rendimentos só devem ser considerados frutos depois de deduzido o que for necessário à reposição do capital. Ex: juros do depósito após compensar a inflação. Frutos Pendentes: quando ainda estão integrados na coisa principal e não têm autonomia Em princípio os frutos pertencem ao proprietário da coisa frutífera, atendendo ao momento da colheita. As coisas produzidas aleatoriamente e as que sejam com prejuízo ou detrimento da substância da coisa são tidas juridicamente como produtos da coisa principal, não frutos. Benfeitorias – art. 216º Verdadeiramente são uma intervenção sobre uma coisa que existe: gasta-se dinheiro (despesa) com uma coisa para conservar ou melhorar essa coisa. • Envolve o dispêndio de dinheiro. • Envolve a conservação ou melhoramento da coisa. Necessárias: evitam a perda, destruição, deterioração. Ex: quando chove em casa Útil: aumenta o valor da casa. Ex: pinta-se a casa para tirar as manchas de humidade Voluptuária: não aumenta o valor da casa. Ex: não se gosta da cor que se pintou e pinta-se de novo Ex: construiu uma casa num prédio. É benfeitoria porque melhora a coisa e gastou-se dinheiro. É necessária? Não. O prédio não se perdia sem a casa. É útil? Sim. Valorizou o prédio. Colocou-se uma piscina, é útil? Sim. Valorizou o prédio. Colocou-se puxadores topo de gama mas que não trazem valor à casa, é útil? Não, essa despesa é voluptuária. Se se substitui os puxadores porque só assim se vendia a casa então foi útil. Quando as despesas não são feitas pelo proprietário da coisa, quem as faz tem o direito a ser reembolsado se elas forem necessárias mas não se forem voluptuárias. ➢ Regime de benfeitorias serve para saber se se paga a quem fez a benfeitoria Domínio Público Determinado por lei – coisas que são propriedade da nação e todos podem utilizar. O Estado tem poder sobre estas coisas, sendo que esse domínio deve seguir regras mais apertadas daquelas que se aplicam aos privados. Reparte-se em várias esferas nomeadamente o natural, construído, monumental e histórico, militar. Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 18 Situações Jurídicas Propter Rem Efeito resultante dos Direitos Reais Situações jurídicas cujo sujeito ativo ou passivo é determinado em virtude da titularidade dum direito real. ➢ Correspondem a situações em que a existência do direito real atribui ao seu titular direitos ou obrigações em relação a outrem. Obrigações Propter Rem Obrigações em que o respetivo devedor é determinado pela titularidade de um direito real. • Aquelas em que o devedor é devedor em virtude de ser titular de um direito real • Sujeito passivo é variável, correspondendo ao que for titular, naquele momento, de determinado direito real – obrigações ambulatórias. Origem no Direito Romano – situações tuteladas por uma actio in rem scripta, em que o nome do demandado não figurava na intentio pois podia ser dirigida contra qualquer pessoa que se encontrasse em determinada situação. Regime jurídico Existem inúmeras situações em que surgem obrigações propter rem no âmbito dos direitos reais. Comproprietários (art. 1411º/1); Condóminos (art. 1424º/1); Pagamento de impostos e outros encargos anuais (art. 1474º); Usuário e morador usuário (art. 1489º); Canôn superficiário (art. 1530º/1); Servidões prediais (art. 1567º/1) ➢ Casos de obrigações propter rem injuntivas – tendo e conta que elas podem ser convencionais Obrigações propter rem constituem verdadeiras obrigações, sujeitas ao Direito das Obrigações12, mas integram o conteúdo do direito real, não tendo existência isolada do mesmo. Conteúdo positivo – Henrique Mesquita – deveres negativos correspondem a uma delimitação do próprio conteúdo do direito real. Conteúdo negativo – JAV; ML – usufrutuário tem que tolerar as obras e melhoramentos (art. 1471º) e assume obrigação de não semear o terreno a cada três anos para respeitar o pousio – assume caráter de pati e de obrigação de non facere. Não é obrigação propter rem os casos de responsabilidade civil atribuídos ao proprietário que exigem um facto culposo para se poderem constituir – art. 492º e 1348º Fazem parte do conteúdo do direito real uma vez que este, como situação jurídica complexa, além do seu núcleo essencial, que consiste na faculdade de aproveitamento de uma coisa corpórea, pode incluir outros elementos, entre estes se incluindo essas obrigações. 12 Não estão totalmente sujeitas ao regime vindo do Direito das Obrigações, uma vez que há várias exceções – quanto à prescrição Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 19 • Em certos direitos a lei confere uma certa amplitude para a constituição de obrigações propter rem por via negocial – usufruto (art. 1445º), uso e habitação (art. 1485º), superfície (art. 1530º) e servidões prediais (art. 1564º). • Apesar disto, estão sujeitas ao princípio da tipicidade e só se podem constituir nos casos previstos na lei – pois elas vinculam o titular do direito real enquanto tal. Obrigações propter rem acompanham o direito real de que fazem parte nas suas vicissitudes, permanecendo ligadas a este. • São transmitidas caso o direito real também o seja. • Se a obrigação se venceu enquanto a coisa estava na titularidade do alienante, não é transmitida com o direito real pois o vencimento desta implicou que ela passasse a vincular pessoalmente o titular do direito. Ex: adquirente de fração autónoma não está obrigado a liquidar dívidas do anterior proprietário nem a custear obras anteriores à sua aquisição. • Extinguem-se quando se extingue o direito real. o Podem ainda extinguir-se por ter sido constituído, por via negocial ou usucapião, um direito real com elas incompatível (como as servidões desvinculativas)13. Natureza Jurídica • Teoria Realista – correspondem a verdadeiros direitos reais, uma vez que não há obstáculos a que o direito real tenha por objeto um facere, podendo haver direitos reais in faciendo; são geradas pela propriedade e resultam duma oneração dessa propriedade; são inerentes às coisas e não às pessoas – Henrique Mesquita14, JAV • Teoria Personalista – correspondem a verdadeiras obrigações, uma vez que nelas existe o dever de uma pessoa realizar uma prestação, sendo consequentemente submetidas ao regime geral das obrigações; especialidade da pessoa do devedor é determinada através da relação com a coisa, mas, não há direito real pois não há atribuição de direito sobre essa coisa (que serve apenas para determinar o sujeito passivo da obrigação) e sim sobre uma prestação – Antunes Varela, MC, ML • Teoria Mista – têm uma natureza mista pois recolhem elementos dos direitos reais e dos direitos de crédito; relação de natureza complexa – Penha Gonçalves • Teoria Relativa – correspondem a direitos reais ou direitos de crédito consoanteo critério que se adotasse, o da estrutura dos direitos e o da vinculação e pertença do titular em relação a uma coisa determinada - Giorgianni Ónus Reais Constitui uma prestação de dare, em dinheiro ou géneros, única ou periódica, imposta ao titular de determinados bens, que atribui ao respetivo credor preferência no pagamento sobre esses bens. 13 Outros exemplos são as obrigações propter rem relativas à distância de abertura de janelas (art. 1360º) e ao não gotejamento de águas sobre o prédio vizinho – estas extinguem-se se se constituir uma servidão de vistas (art. 1362º) ou servidão de estilício (art. 1365º/2) 14 Para quem o conceito de direito real compreende não apenas os poderes conferidos ao seu titular e as restrições e limites a que está sujeito mas também as vinculações de conteúdo positivo (obrigações reais) que sobre ele recaiam. Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 20 ➢ Direito a certa quantia sobre bens doados (art. 959º); apanágio do cônjuge sobrevivo (art. 2018º); redução das doações sujeitas a colação (art. 2118º) Origem no Direito Romano – surge no Direito Público em virtude da imposição do pagamento de certas prestações (cânones) ao povo romano, representado pelo Senado, ou ao imperador, por parte dos cultivadores de terrenos (fundi) nas províncias senatoriais ou imperiais. Evolução na Idade Média – ocorre a generalização dos ónus reais, dada a organização feudal da propriedade e ausência de registo predial, o que levava à proliferação de vínculos sobre os imóveis para garantia do direito a prestações de certos credores. Abolidos com a Revolução Francesa – inspirou outros códigos, embora os de matriz germânica mantivessem-nos. Em Portugal foi sendo diminuída a sua importância, desde a Revolução Liberal à extinção do censo pelo CC de 1966. Regime Jurídico São, como as obrigações propter rem, constituídos em virtude da titularidade de determinados bens, aos quais permanecem ligados, mas, não fazem parte do conteúdo dos direitos reais. • Adquirentes respondem pelo cumprimento de prestações anteriores pois sucedem na titularidade da coisa a que essa obrigação se encontra unida. • Atribuem preferência no pagamento sobre a coisa que gravam, estando assim acopulados a uma garantia real, enquanto que nas obrigações propter rem não há nenhuma garantia real. o Mas não são meros direitos reais de garantia pois não se limitam a atribuir preferência no pagamento a um credor, vinculando o dono da coisa a uma verdadeira obrigação, que surge da titularidade dessa mesma coisa. Natureza Jurídica • Ónus reais têm a natureza de direitos reais – MC – existe inerência, dado que se produziria uma afetação jurídica de uma coisa a outrem, independentemente das situações jurídicas e materiais que afetem a coisa; têm as características dos direitos reais. • Ónus reais têm a natureza de obrigações propter rem – OA, JAC – são inerentes a uma coisa mas não são funcionalmente dirigidos para o aproveitamento desta; não incidem sobre coisas e sim sobre prestações. • Ónus reais têm a natureza de obrigações propter rem, acopuladas a direito real de garantia – Henrique Mesquita, ML – figura composta entre obrigação propter rem e garantia imobiliária; são créditos constituídos propter rem a que se encontra associada uma garantia real, que incide sobre a coisa gravada com o ónus. • Ónus reais são figura complexa com elementos reais e elementos obrigacionais – Carvalho Fernandes – elementos obrigacionais e reais que reagem uns sobre os outros criando um regime particular. Pretensões Reais Direitos reais têm caráter absoluto mas permitem atribuir pretensões de caráter relativo, com natureza obrigacional. ➢ A partir do momento em que se verifique a violação de um direito real o titular desse direito tem o direito de exigir a cessação da violação. Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 21 Direitos relativos com a especialidade de serem originados pelo direito real, estando, consequentemente, a ele ligados. ➢ Não fazem parte do conteúdo desse direito real. ➢ Estão sujeitas às normas do cumprimento das obrigações o Mas não se aplica art. 798º e ss. – indemnização por incumprimento pressupõe a violação de uma obrigação previamente constituída, enquanto que as pretensões reais surgem diretamente em resultado da violação do direito real. o Pretensões primárias – ação de reivindicação ou ação negatória – não podem ser cedidas a terceiro. Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 22 CLASSIFICAÇÕES dos Direitos Reais Como se dá o aproveitamento da coisa Direitos Reais de Gozo, de Garantia e de Aquisição Direitos Reais de Gozo Atribuem ao titular o aproveitamento da coisa através de conjunto de poderes/faculdades (uso, fruição ou disposição de uma coisa corpórea). • Art. 1305º - poderes paradigmáticos de gozo mas existem mais, como o de transformar e reivindicar o Onde eles se aplicam todos é no Direito de Propriedade, nos outros depende do direito real em concreto. 6 figuras no CC: Propriedade (art. 1302º a 1413º); Propriedade Horizontal (art. 1214º a 1238º); Usufruto (art. ); Uso e Habitação (art.); Superfície (art. 1524º); Servidão (art. 1543º) 1 figura em legislação avulsa: Habitação Periódica (DL 275/93)15 ➢ Alguma doutrina inclui a Posse – ML discorda que constitua um direito real. Direitos Reais de Garantia Confere ao credor uma preferência no pagamento pelo valor de certa coisa, podendo assim esse credor ser pago à frente dos outros credores, evitando os riscos do património do devedor não chegar para a liquidação de todos os créditos. • Titular do direito garante a realização de determinado valor em dinheiro, com a venda da coisa.16 • Aproveitamento indireto da coisa – apenas no assegurar o cumprimento de obrigação. Direitos Reais de Aquisição Confere ao titular a possibilidade de, pelo exercício desse mesmo direito, vir a adquirir um direito real sobre determinada coisa. • Determina afetação da coisa com destino à aquisição dum direito do titular. o Direito real é a aquisição de outro direito real. Direito Real Maior e Menor Direito Real Maior – atribui ao titular todas as faculdades relativas à coisa – propriedade Direito Real Menor – não atribui ao titular todas as faculdades relativas à coisa – todos os outros Relação entre eles: 1. Teoria do Desmembramento/Clássica – AV / PL – nos direitos reais menores ocorre uma divisão da propriedade em vários direitos distintos. Fragmentação da propriedade em 2 direitos diferentes, sendo uma parte do conteúdo da propriedade transferida para o direito real menor e ficando esta privada desse mesmo conteúdo – 2. Teoria da Oneração – OA, MC, ML – na constituição de um direito real menor não se verifica qualquer desmembramento do direito da propriedade, nem o direito real menor recebe uma parte dos direitos que a lei atribui ao proprietário. 15 Insere-se nos Direitos Reais pois resulta do regime as características dum direito real. 16 Está no Livro das Obrigações mas tem características de direito real. Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 23 • Constituição de um direito real menor implica antes o surgimento de um direito novo em termos de conteúdo, o qual comprime a propriedade, levando a que esta temporariamente se reduza. i. Devido à elasticidade da propriedade, ela pode recuperar o conteúdo primitivo com a extinção do direito real menor. • Enquanto vigorar o direito real menor há uma sobreposição de direitos sobre a mesma coisa, tendo o proprietário que suportar o exercício do direito real menor, mas podendo continuar a aproveitar a coisa em tudo o que não contenda com esse exercício. • Nunca poderia ser um desmembramento pois há aspetos novos do regime, como certas obrigaçõese causas próprias de extinção. Direitos Reais sobre Coisa Própria e Coisa Alheia Depende se a propriedade da coisa está atribuída ao titular ou se lhe está atribuído outro direito real. • Qualquer outro direito real tem de coexistir com a propriedade do titular – direitos reais sobre coisa alheia (iuria in re aliena) • A propriedade consiste num direito real sobre coisa própria Classificação clássica que não se coaduna com a superfície (em que o implante existente em solo alheio não pode deixar de ser visto como coisa própria do superficiário) nem com a propriedade horizontal (em que o direito sobre as frações autónomas incide sobre coisa própria). Direitos Reais de Proteção Definitiva e Proteção Provisória Paulo Cunha: • Proteção provisória = posse formal -> só era tutelada até ao momento em que o verdadeiro titular do direito real o fizesse valer ele próprio, pondo fim à proteção conferida ao possuidor. • Proteção definitiva = todos os outros direitos reais. MC: a proteção da posse é tão definitiva como a de qualquer outro direito real, só cessando essa proteção quando a posse cessa. ➢ ML: a tutela da posse formal é provisória, tendo o possuidor que abandonar a coisa se vier a ser convencido na questão da titularidade do direito real. Classificação só não faz sentido porque a posse não é um direito real. Direitos Reais Simples e Complexos OA: • Simples – se a afetação da coisa é realizada por uma forma determinada • Complexo – se há conjugação de formas de afetação da coisa. Dividir-se-ia em direitos reais coletivos (direitos reais que não perdem autonomia entre si) e compostos (direitos reais em que perdem a autonomia entre si) Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 24 Direitos Reais Autónomos e Subordinados Autónomos – existência não depende de nenhum outro direito. Ex: propriedade e o usufruto. Subordinados – estão dependentes da existência de outro direito. Ex: direitos reais de garantia dependem da existência do crédito que garantem; direitos legais de preferência e etc. Direitos Reais de Titularidade Imediata e Titularidade Mediata Os direitos reais são normalmente de Titularidade Imediata, pois são atribuídos diretamente a sujeitos determinados, que se tornam os seus titulares. ➢ Podem ser de Titularidade Mediata quando a sua atribuição depende da atribuição de outro direito real. Ex: servidões prediais, que só podem ser atribuídas se for dono do prédio, não tenho esse direito como pessoa. Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 25 A Ordenação Jurídica Provisória das Coisas POSSE Art. 1251º CC Posse corresponde à situação em que ocorre o exercício fáctico de poderes sobre as coisas, o que é objeto de proteção pelo Direito, independentemente da averiguação da efetiva titularidade do direito sobre essa coisa. ➢ Tutela-se a exteriorização do direito, independentemente da averiguação da sua titularidade. Razões dessa proteção prendem-se com a defesa da paz pública e da continuidade do exercício das posições jurídicas. ➢ O simples facto de se encontrar a exercer poderes sobre a coisa é suficiente para que a Ordem Jurídica lhe permita exigir a manutenção ou restituição da coisa, independentemente da discussão sobre a efetiva titularidade do direito. Posse Formal – exercício fáctico de poderes sobre a coisa não é acompanhado pela titularidade do direito real. Posse Causal – exercício fáctico de poderes sobre a coisa está a ser realizado pelo titular do direito. ➢ Para efeitos de tutela possessória é irrelevante o facto do possuidor ser ou não titular do direito. o A posse, como situação de facto só pode ter como objeto uma coia, dado que não possuem direitos. o Mas a referência ao direito pode funcionar como delimitação dos termos em que o possuidor possui a coisa, daí que se refira que a coisa é possuída nos termos de um direito – verificar em que termos a posse é exercida tendo em conta o direito. Situação de Facto – está na origem da posse e corresponde ao simples exercício material de poderes sobre a coisa Situação Jurídica – além da situação de facto, atribui-se efeitos jurídicos da posse ao seu titular. ➢ A posse é sempre uma situação jurídica, uma vez que sempre que ocorra o exercício fáctico de poderes sobre a coisa, o titular passa a beneficiar da proteção possessória. Fundamento da Proteção Possessória Teorias sobre a pose sistematizadas por Jhering Teorias Relativas Correspondem àquelas que buscam o fundamento da proteção possessória não na pose em si, mas antes em circunstâncias, objetivos ou proposições jurídicas exteriores a ela, considerando que a posse serve para defender outros institutos que, sem ela, não poderiam ser plenamente exercidos. • Tese da Proibição da Violência o Turbação da posse é delito contra o possuidor (Savigny) – posse não constitui relação jurídica pelo que a sua turbação/esbulho não consiste na violação de Sebenta Direitos Reais – 2017/2018 DNB 26 um direito, mas, como há uma proibição geral da violência o esbulho constitui delito contra o possuidor e pode recorrer aos interditos possessórios que lhe são conferidos com base no direito que o possuidor tem de que ninguém exerça violência contra ele. o Turbação da posse é delito contra a ordem pública (Rudorff) – proteção possessória não reside na tutela do próprio possuidor contra ilícitos mas antes nas consequências públicas da atividade violenta, considerada como violação da ordem pública; é consequência da proibição da autotutela. • Tese da exigência de um fundamento jurídico prevalecente (Thibaut) – ninguém pode ultrapassar juridicamente outrem sem apresentar um fundamento/causa jurídica prevalecente para o seu direito. Alguém que exerce juridicamente um direito deve ser provisoriamente protegido até que alguém, exibindo um direito melhor, o obrigue a abdicar dessa mesma situação fáctica. • Tese da preferência pela ilibação (Röder) – a menos que seja apresentada contraprova em sentido contrário, a posição do possuidor deve ser protegida. Existência de uma relação exterior, que liga uma pessoa à coisa que possui, corresponde possivelmente a um direito para cujo exercício a coisa é necessária, que assim existe por força dessa relação, a qual não é, por isso, ilícita. • Tese da Defesa da Propriedade o Posse constitui propriedade provável (tese clássica: Savigny) – proteção do possuidor resulta do facto de se presumir que quem possui uma coisa é igualmente proprietário dela; vê a posse como uma sombra da propriedade. o Posse corresponde a uma propriedade inicial (Gans) – isto porque a posse pode conduzir à usucapião; justificação da proteção da posse é o facto de ela permitir uma aquisição da propriedade. o Posse existe como interesse necessário num complemento da tutela da propriedade (Jhering) – como a prova da propriedade nem sempre é possível, concede-se um meio de defesa através da posse, o qual obriga a que seja o esbulhador a apresentar um título relativo ao seu direito; é em função da exteriorização do direito de propriedade que se concede proteção Teorias Absolutas Correspondem àquelas em que o fundamento da proteção possessória é encontrado no próprio instituto da posse. • Tese da vontade do possuidor na sua incorporação fáctica (Gans, Puchta, Bruns) – tem que se avaliar se a detenção está de acordo com a vontade universal (lei) ou é ato de vontade individual; existe direito de propriedade protegido por lei ou há proteção legal pois os atos de vontade individual são protegidos até que se demonstre que ofende a vontade universal. • Tese da preservação do controlo fáctico da coisa, atento o valor económico representado pelo mesmo (Stahl) – a proteção possessória constitui uma forma de apropriação das utilidades proporcionadas pelas coisas; estado de facto criador de utilidades que beneficia de
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