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Artropatias Microcristalinas: Causas e Manifestações

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1 Victória Veiga – Medicina UNIFACS 
 
ARTROPATIAS MICROCRISTALINAS 
São as artrites causadas pela deposição de cristal na 
articulação. 
Os mais frequentes cristais envolvidos são: 
o Ácido úrico → Se apresenta na forma de monourato de 
sódio e leva a gota. 
o Cálcio → Se apresenta na forma de pirofosfato de cálcio 
e clinicamente pode levar a um quadro muito 
semelhante a gota (pseudogota) e também pode levar a 
doença por depósito de pirofosfato de cálcio – doença 
crônica que leva a destruição da articulação gerando um 
quadro de artrose (artrose secundária). 
o Hidroxiapatita → Doença por depósito de 
hidroxiapatita. 
o Cristais de oxalato de cálcio → Doença por depósito de 
oxalato de cálcio. 
*Hidroxiapatita e oxalato de cálcio são mais frequentes 
em pacientes renais, principalmente naqueles que 
fazem dialise. 
o Cristais de corticosteroides → Para o corticoide ser 
efetivo ele precisa agir dentro da articulação e para que 
ele não saia dela é preciso que ele seja pouco solúvel, 
então utiliza-se uma infiltração rica em cristais – quanto 
menos solúvel, mais chance de cristalizar. (É uma 
iatrogenia). 
GOTA 
A artrite gotosa é a principal artropatia induzida por cristais. 
É a mais comum artrite inflamatória que acomete a 
população em geral. 
Aumento da incidência e prevalência ao longo da década – 
está diretamente relacionada com a hiperuricemia e 
também com doenças metabólicas (diabetes, dislipidemia, 
obesidade). Tem correlação com hábitos alimentares. 
Decorre da elevação nos níveis de ácido úrico que acarreta a 
formação de cristais de monourato de sódio em diversos 
tecidos, destacando-se, pela frequência, as articulações, as 
estruturas periarticulares, os rins e o tecido subcutâneo. 
Maior predominância no sexo masculino entre os 30 e 60 
anos com pico aos 40. No sexo feminino, ocorre entre 55 e 
70 anos, principalmente após a menopausa pela perda do 
estrogênio que atua com efeito uricosúrico (inibem 
reabsorção tubular renal de urato). 
 
HIPERURICEMIA 
O ácido úrico circula na forma de urato solúvel até ser 
eliminado pelo organismo. 
A solubilidade do ácido úrico é muito pequena, então 
qualquer alteração metabólica pode levar a sua alteração. 
A mudança de pH também influencia, diminuindo a 
solubilidade e podendo levar a formação do cristal. 
Para que o ácido úrico esteja dissolvido no sangue, é 
necessário que o sangue esteja com pH normal (7,4). 
Quando os níveis séricos ultrapassam 7mg/dl diz-se que o 
indivíduo está com hiperuricemia. Praticamente todos os 
indivíduos que possuem gota apresentam hiperuricemia em 
algum momento, no entanto nem todos que tem 
hiperuricemia desenvolve gota (hiperuricemia 
assintomática). 
O ácido úrico é metabolizado a partir da síntese de purinas 
(adenina, guanina e hipoxantina. A enzima xantina oxidase 
metaboliza a hipoxantina em xantina e em seguida em acido 
úrico. 
A maior parte das purinas é sintetizada pelo organismo. 
OBS.: O alopurinol age inibindo a enzima xantina oxidase. 
Cerca de 2/3 do ácido úrico produzido é eliminado pelos rins 
e o resto pelo tubo digestivo. 
NOS RINS: 
Existem 4 etapas: 
- Filtração – quase todo o urato é filtrado pelo glomérulo. 
- Reabsorção pré-secretória – quase todo o urato filtrado 
é reabsorvido na porção inicial do túbulo contorcido 
proximal pela URAT1. 
- Secreção tubular – após ser reabsorvido, cerca de 
metade do total é secretado pelo túbulo proximal. 
- Reabsorção pós-secretória – boa parte do que foi 
secretado é mais uma vez reabsorvido. → no final de 
todo o processo, 10% do urato filtrado será eliminado. 
HIPERURICEMIA PRIMÁRIA 
A maioria dos casos são decorrente de problema na 
eliminação renal do ácido úrico. 
A hiperprodução endógena de ácido úrico só é detectada em 
10% dos casos, e é constatada pela excreção urinária 
espontânea de ácido úrico superior a 800mg/24h. 
Gota 
 
2 Victória Veiga – Medicina UNIFACS 
HIPERURICEMIA SECUNDÁRIA 
Alguns fatores externos relacionados a hiperuricemia: 
Álcool – promove a conversão do piruvato em lactato 
estimulando a reabsorção de urato no túbulo proximal 
(estímulo da URAT1); aumenta a degradação de ATP no 
hepatócito aumentando produção de acido úrico. 
*A cerveja possui quantidade significativa de purinas. 
Obesidade – está relacionada com a redução na excreção 
urinária de ácido úrico. 
Diuréticos tiazídicos – aumentam a reabsorção tubular 
proximal de ácido úrico, induzida pela hipovolemia. 
HAS (os mecanismoa ainda são desconhecidos) 
Hipertrigliceridemia – maior síntese de ácido úrico a partir 
do excesso de acetato vindo da quebra de triglicerídeos. 
Síndrome metabólica (resistência insulínica + 
hiperinsulinemia) – obesidade, has, intolerância a glicose e 
redução de HDL. 
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS 
HIPERURICEMIA ASSINTOMÁTICA 
Aumento dos níveis séricos do ácido úrico, sem sintomas de 
artrite, tofos ou cálculos. Não é identificada nenhuma 
consequência (aguda ou crônica) do seu depósito nos 
tecidos. 
Geralmente permanece por toda a vida sem acarretar 
sintomas, mas o risco de atrite gotosa e nefrolitíase aumenta 
em função do grau e duração da hiperuricemia. 
OBS: O estágio de hiperuricemia termina quando tem início 
a primeira crise de artrite ou nefrolitíase. 
ATRITE GOTOSA AGUDA 
Depende da fagocitose de cristais recém liberados no espaço 
sinovial por neutrófilos. Ao serem fagocitados, os cristais de 
urato provocam ativação dos leucócitos que liberam grande 
quantidade de substâncias pró-inflamatórias na cavidade 
articular. 
A principal manifestação da crise aguda de gota é artrite 
extremamente dolorosa, de início súbito. 
A grande maioria dos pacientes tem uma monoartrite não 
acompanhada de manifestações sistêmicas. 
*O padrão pode se tornar oligo ou poliarticular após 
episódios repetidos. 
Período intercrítico é quando após uma crise o indivíduo 
passa por intervalos assintomáticos. É fundamental na 
caracterização do quadro de gota. 
Pelo menos metade dos casos, a primeira crise se localiza na 
primeira articulação metatarsofalangiana e grande parte 
refere podagra. 
 
Quase sempre se localizam nos MMII sendo os locais mais 
acometidos metatarsos, tornozelos, calcanhares, joelhos, 
punhos, dedos e cotovelos. 
A crise típica tem instalação súbitas, sem sintomas 
prodrômicos. Frequentemente existem fatores prodrômicos 
como traumatismos, consumo de álcool e drogas que afetam 
os níveis séricos de ácido úrico. Geralmente iniciam a noite 
e tem caráter bastante doloroso, ocorrem sinais francos de 
inflamação articular lembrando uma artrite piogênica. 
O primeiro episódio é sinal de que o nível sérico se manteve 
suficiente alto durante um prazo longo. A ponto de permitir 
acúmulo tecidual. 
Geralmente é autolimitada, resolvendo-se 
espontaneamente em 3 a 10 dias. Essa resolução é completa 
e não é observado sequela. 
Com o passar do tempo, as recaídas começam a ser mais 
frequentes e duradouras e as resoluções passam a não ser 
mais totais, deixando comprometimento residual. As crises 
posteriores são mais graves, assumindo caráter poliarticular, 
acompanhadas de febre alta. 
GOTA TOFOSA CRÔNICA 
Quando a hiperuricemia não é tratada por longo prazo, pode 
ocorrer formação e depósito de cristais de urato nas 
cartilagens, articulações, tendões e partes moles. 
Os tofos são acúmulo de cristais de urato cercado por tecido 
granulomatoso que tendem a regredir completamente com 
o tratamento adequado contra a hiperuricemia. 
Pacientes que possuem grande número de tofos tem 
manifestações articulares mais benignas e menos 
frequentes. 
 
3 Victória Veiga – Medicina UNIFACS 
As articulações tornam-se persistentemente edemaciadas – 
há destruição da articulação. Há dor o tempo inteiro, mas é 
uma dor diferente da crise, é menos intensa. 
Os tofos podem se desenvolver em órgãos, como o 
interstício renal (nefropatia crônica porurato). 
NEFROLITÍASE POR ÁCIDO ÚRICO 
Quando a urina é acidificada nos túbulos coletores, o urato 
é convertido em ácido úrico. 
Os principais fatores para a formação de cálculos renais na 
gota são: pH urinário ácido (<5,5) e aumento da eliminação 
urinária de ácido úrico (> 800 mg/dia). 
NEFROPATIA GOTOSA POR URATO 
Os cristais de urato se depositam no parênquima renal sob a 
forma de tofos, provocando distorção, destruição e fibrose. 
O resultado é insuficiência renal crônica de lenta progressão. 
DIAGNÓSTICO 
Deve-se suspeitar de gota aguda em todo paciente que 
desenvolva monoartrite de instalação súbita! 
Nível sérico de ácido úrico: 
→ Homem – até 7mg% 
→ Mulher – até 6mg% (maior depuração de ânions na 
idade reprodutiva). 
O diagnóstico só pode ser confirmado pelo encontro dos 
cristais de urato no interior dos leucócitos do líquido sinovial 
da articulação afetada. Mesmo que os cristais sejam 
encontrados não exclui a possibilidade de outra Artropatia 
associada (afastar sempre artrite piogênica). 
Caso não seja possível fazer a punção, o diagnostico pode ser 
considerado altamente provável se o paciente tiver 
hiperuricemia, quadro clínico característico e resposta 
significativa a administração de colchicina. 
Além disso, episódios anteriores de artrite monoraticular 
aguda de duração autolimitada, presença de tofos, 
alterações no RX* e comprovação de hiperuricemia também 
favorecem o diagnóstico de gota tofosa crônica. 
*Erosões em “mordida/saca bocado”, erosões com margens 
escleróticas e bordas com proeminências ósseas (sinal de 
Martel), preservação do espaço articular e ausência de 
osteopenia justarticular. 
 
TRATAMENTO 
São indicados uso de AINE (primeira linha), colchicina, 
corticoides intra-articulares* e corticoides sistêmicos. 
* A infiltração de corticoide é agressiva por ser um 
procedimento invasivo, mas, em compensação, os efeitos 
sistêmicos são diminutos quando comparados aos efeitos 
dos AINES e da colchicina. 
A colchicina atua na inibição da movimentação e fagocitose 
dos cristais pelos leucócitos sinoviais. Atualmente deve ser 
utilizada em indivíduos que apresentam contraindicações ao 
uso de AINE. 
O AAS é contraindicado por variar abruptamente os níveis 
de urato sérico e articular, podendo exacerbar a crise. 
Medidas não farmacológicas são utilizadas para aliviar o 
desconforto da articulação inflamada, e são elas: repouso 
articular e aplicação de compressas geladas. 
OBS: A redução da hiperuricemia não faz parte do 
tratamento para crise aguda da gota. Alterações bruscas nos 
níveis séricos de ácido úrico podem agravas a artrite. O tto 
da hiperuricemia so deve ser iniciado após controle da 
artrite aguda e após introdução de doses profiláticas de 
colchicina!! 
A profilaxia das crises se dá com a administração profilática 
diária de 1 mg de colchicina, o regime de emagrecimento 
(em obesos), a eliminação de possíveis fatores 
predisponentes e instituição do tto contra a hiperuricemia. 
Essas medidas são capazes de reduzir recaídas após a 
resolução de uma crise aguda. 
OBS: Não existe indicação formal para tratamento 
medicamentoso dos pacientes com hiperuricemia 
assintomática, porém alguns autores recomendam 
considerar o tratamento em pacientes com níveis séricos 
aumentados (> 9mg/dl) ou quando a excreção urinária 
ultrapassa 1.100mg em 24h. 
PREVENÇÃO DAS COMPLICAÇÕES DA GOTA 
CRÔNICA 
 
4 Victória Veiga – Medicina UNIFACS 
Consiste basicamente em tentar manter os níveis de ácido 
úrico abaixo de 7mg/dl/ 
A redução sérica de ácido úrico se dá através da redução na 
síntese (alopurinol) ou estímulo a excreção renal 
(uricosúricos). 
URICOSÚRICOS 
Só podem ser utilizados em paciente com hiperuricemia 
comprovadamente provocada pela redução da excreção 
renal de urato. 
São utilizados a probenecida, sulfimpirazona e 
benzbromarona. 
Num primeiro momento causam aumento importante na 
excreção renal do ácido úrico, então, cerca de 10% dos 
pacientes acabam desenvolvendo cálculos renais. Devem 
então ser utilizadas em doses baixas, aumentando 
gradativamente e sempre com aumento de ingestão hídrica. 
ALOPURINOL 
Diminui a síntese do ácido úrico inibindo a xantina oxidase. 
Dose inicial é de 100mg/dia, devendo ser aumentada até 
atingir níveis séricos de ácido úrico < ou igual a 7mg/dl ou a 
dose máxima dose máxima de 1000 mg/dia. 
A toxicidade é observada em pacientes em uso de 
hidroclorotiazida e em alérgicos a penicilinas e amoxicilina. 
OBS: Em casos que nem o uricosúricos e nem o alopurinol 
conseguem reduzir a hiperuricemia, pode administrar os 
dois em conjunto. 
Antes de prescrever um antiuricêmico é importante que o 
paciente não esteja em crise aguda, pois o tto pode 
precipitar a crise, e que tenha iniciado um tto profilático com 
a colchicina que deve ser mantido por 6 meses após o 
controle dos níveis séricos de ácido úrico.

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