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ABRANGÊNCIA DAS AÇÕES DE SAÚDE CASO 4 OBJETIVO 1: Refletir sobre a segurança do paciente e a qualidade assistencial, por meio do mapeamento das principais causas envolvidas e dos conceitos de erro, segurança e qualidade na assistência dos serviços; ARTIGO: O erro médico e o respeito às vítimas A Medicina é uma das profissões mais antigas do mundo e a incidência do erro de quem a prática também é igualmente antiga. Os povos da Antiguidade e Idade Média já puniam os médicos que cometiam erros. Na Roma antiga, estabeleciam-se alguns delitos específicos dos médicos, como abandono de pacientes e erros, nos quais o médico era obrigado a indenizar por conta desse erro, delineando-se, assim, a responsabilidade civil do médico. Nessa época, também, a responsabilidade já dependia da convicção de culpa e passava por avaliação de um grupo de médicos, que determinavam, se o profissional da Medicina havia tido culpa ou não pelo mal resultado de sua ação (Moraes, 2003; Undelsmann, 2002). O erro médico pode ser entendido e conceituado como "a conduta profissional inadequada que supõe uma inobservância técnica, capaz de produzir dano à vida ou agravo à saúde de outrem, mediante imperícia, imprudência ou negligência" (Gomes, Drumond & França, 2001, p. 27). Giostri (2002, p. 136) entende o erro médico como "uma falha no exercício da profissão, do que advém um mau resultado ou um resultado adverso, efetivando-se através da ação ou da omissão do profissional". Seguindo uma tradição jurídica, Souza (2006, p. 1) conceitua o erro médico como a "responsabilidade civil do médico, por eventuais danos causados ao paciente". O Código de Ética Médica não traz nenhuma definição a respeito do tema, entretanto, o art. 1º do Capítulo III destaca que é vedado ao médico "causar dano ao paciente, por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência". A ocorrência dos erros médicos tem tomado grandes proporções, principalmente pela influência da mídia, que desencadeia uma forte pressão para se descobrir o culpado e a causa do erro (Giostri, 2002; Mendonça & Custódio, 2016; Rosa & Perini, 2003), deixando em segundo plano, ou mesmo de lado, a dimensão experiencial da própria vítima do erro médico. Grande parte dos estudos desenvolvidos pelos Conselhos Regionais de Medicina (CRMs) está voltada para a análise e levantamento do perfil profissional do denunciado e para características relacionadas com o erro médico, como as especialidades envolvidas, processos disciplinares julgados e penas aplicadas. Na verdade, esses estudos oferecem algumas interpretações estatísticas e não aprofundam a busca dos determinantes científicos relativos à incidência do erro médico (Gomes, Drumond & França, 2001; Udelsmann, 2002). Ao se fazer uma análise da relação médico e paciente, é possível perceber que há uma despersonalização nesse processo, haja vista que a Medicina se socializou e ramificou ainda mais suas especialidades na arte médica, desaparecendo a figura cordial do "médico da família", em quem se depositava confiança irrestrita. Não se deve olvidar, entretanto, que a atividade médica é de interesse social, que a proteção da saúde humana se impõe como indispensável e o cidadão, por sua vez, tem o direito de exigir do Estado a adoção de medidas visando à prevenção de doenças e ao tratamento delas. Ainda em relação aos deveres, o profissional médico deve informar, confirmar o esclarecimento e obter autorização do paciente para proceder ao tratamento. Por isso, o médico deve solicitar a autorização da pessoa para a realização de determinada atuação (Callegari & Oliveira, 2010; Kfouri Neto, 2010). O consentimento informado é lei em diversos países. Na Corte de Cassação Italiana, o cirurgião deve obter o consentimento válido do paciente antes de proceder à operação e em palavras acessíveis. Na França, o consentimento é obrigatório, livre e renovado para cada ato médico ulterior, ou seja, o consentimento é um pré-requisito essencial de todo tratamento ou intervenção médica, caso contrário, o médico incorre em responsabilidade, conforme o caso julgado na Corte de Apelação de Rennes no ano de 1994, ao condenar o médico que efetuou colonoscopia para retirada de um pólipo, mas acabou perfurando o intestino, risco do qual a paciente não havia sido previamente informada. Fundamentou-se a condenação na omissão dos dados, pois o profissional tinha a obrigação de informar os riscos do tratamento a ser realizado (Kfouri Neto, 2010). Somado a isso, aqui no Brasil, tem-se a situação de que o Código de Defesa do Consumidor, que entrou em vigor no início dos anos de 1990, conferiu um caráter mais questionador ao paciente, de modo que garantiu um equilíbrio maior na defesa de seus direitos. Sem contar, também, que na Medicina, a responsabilidade civil do médico é disciplinada por esse código, como também, pelo Código Civil, conferindo ao cidadão brasileiro mais segurança para exigir um serviço de qualidade e mais recursos para que ele procure seus direitos, caso sinta-se lesado O erro médico refere-se a circunstância que atinge a pessoa em decorrência de atuação médica baseada em atitude imprudente, negligente ou imperita. No Brasil tem crescido o número de casos, mas a discussão a respeito da vítima é quase inexistente. Este trabalho buscou delinear a perspectiva da vítima de erro médico. Utilizando uma entrevista semiestruturada, foi possível conhecer as experiências das vítimas e perceber de que maneira enfrentaram os desafios impostos. Observou-se a perplexidade ao descobrir-se vítima, e a dificuldade em aceitar-se como tal. As mudanças impostas pelo erro acarretaram transformações comportamentais e de atitudes, como a falta de confiança nos profissionais médicos. Sofrimento e sentimentos negativos passam a fazer parte da vivência dessas pessoas. Dessa maneira, é necessário criar estratégias que permitam auxílio e cuidado da saúde mental das pessoas envolvidas com o erro médico. Palavras-chave: Erros médicos. Estresse psicológico. Narrativa. Mesmo com os números de registro de erros em ascensão, não se sabe o que realmente acontece com as vítimas; os estudos brasileiros dão maior ênfase ao número de denúncias registradas nos conselhos regionais de medicina (CRM), aos processos disciplinares aplicados, ao perfil dos médicos denunciados, e trazem ainda algumas “regras” importantes para que os médicos evitem e previnam o erro e não sofram aborrecimentos . Ou seja, a grande maioria não aborda a subjetividade e questões pertinentes às vítimas. O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) avaliou, entre os anos de 2000 e 2004, denúncias sobre erros de médicos paulistas ao Poder Judiciário. Mesmo com a complexidade do sistema jurídico brasileiro foram encontradas 353 decisões na esfera cível e 23 na esfera criminal. Desse total, cerca de 46% foram favoráveis ao paciente, sendo a indenização por danos morais a espécie mais frequente de condenação aplicada aos médicos denunciados; ou seja, a Justiça constatou que o ato praticado por esses profissionais infligiu dor ou sofrimento à vítima. Hoje, a ocorrência de erros médicos tem tomado grandes proporções, principalmente por influxo da mídia, que desencadeia forte pressão para que se descubra o culpado e a causa do erro. Ainda assim, pode-se afirmar que os casos que ganham notoriedade e chegam ao conhecimento público representam pequena parcela dos muitos outros com prejuízos menores aos pacientes. Muitos médicos nem sequer chegam a ser denunciados ou investigados pelos competentes legais. Embora tal disposição investigativa possa ser considerada o primeiro passo para minorar a dor e o sofrimento do paciente, deixa em segundo plano, ou mesmo põe de lado, adimensão experiencial da própria vítima do erro médico. O erro médico pode ser conceituado como a conduta profissional inadequada que supõe uma inobservância técnica, capaz de produzir dano à vida ou agravo à saúde de outrem, mediante imperícia, imprudência ou negligência. Se o Código de Ética Médica (CEM) não traz nenhuma definição, o artigo 1º do capítulo III destaca que é vedado ao médico causar dano ao paciente, por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência. Há três maneiras de classificar o erro médico: 1) Imperícia – ignorância, incompetência, desconhecimento, inabilidade e inexperiência na arte da profissão. Pode ser entendida como a situação em que o médico realiza um procedimento para o qual não é habilitado, correspondendo ao despreparo técnico e/ou prático por insuficiência de conhecimento; 2) Imprudência – descuido, prática de ação irrefletida ou precipitada, resultante de imprevisão do agente em relação ao ato que podia ou devia pressupor. É quando a conduta médica envolve riscos ao paciente, sem respaldo científico para seu procedimento. Exemplo é o cirurgião que opera sem o diagnóstico correto e sem o preparo adequado do paciente; 3) Negligência – não prestação dos cuidados necessários ao paciente, sugerindo inação, passividade ou ato omissivo, o que implica desleixo ou falta de diligência capaz de determinar responsabilidade por culpa. Esquecimento de gazes, pinças e compressas em cirurgias exemplifica essa ordem. OBJETIVO 2: Discutir sobre os indicadores de qualidade e segurança do paciente na prestação de serviços na saúde; Medir qualidade e quantidade em programas e serviços de saúde é imprescindível para o planejamento, organização, coordenação/direção e avaliação/controle das atividades desenvolvidas, sendo alvo dessa medição os resultados, processos e a estrutura necessária ou utilizada, bem como as influências e repercussões promovidas no meio ambiente. Indicador é uma unidade de medida de uma atividade, com a qual se está relacionado ou, ainda, uma medida quantitativa que pode ser usada como um guia para monitorar e avaliar a qualidade de importantes cuidados providos ao paciente e as atividades dos serviços de suporte. Os indicadores medem aspectos qualitativos e/ ou quantitativos relativos ao meio ambiente, à estrutura, aos processos e aos resultados. Os de meio ambiente ou meio externo, de acordo com Bittar, são aqueles relacionados às condições de saúde de uma determinada população, a fatores demográficos, geográficos, educacionais, socioculturais, econômicos, políticos, legais e tecnológicos e existência ou não de instituições de saúde. ➢ Artigo: Indicadores de qualidade: ferramentas para o gerenciamento de boas práticas em saúde • Utilização dos indicadores de qualidade no ambiente hospitalar: Essa categoria abordou como as enfermeiras vêm utilizando os indicadores de qualidade no contexto hospitalar. A maioria das participantes trabalha com os indicadores de maneira retrospectiva, pois, no final de cada mês, há uma análise crítica dos resultados e é traçado um plano de ação com a equipe de enfermagem para os indicadores que não atingiram a meta proposta. Cabe destacar que a análise mensal do indicador permite que, prontamente, sejam estabelecidos planos de ação para sanar metas não atingidas, conferindo dinamicidade ao processo. Essa segunda categoria de análise pode ser ilustrada com estes depoimentos: Recolhemos os dados, analisamos, apresentamos e tentamos fazer um plano de ação para tentar corrigir essas deficiências. A gente tem uma meta, quando a meta não é atingida, precisamos rever o processo e tentar discutir com a equipe porque aquilo aconteceu e tentar colocar algum plano de ação. De acordo com os índices, nós trabalhamos com os colaboradores, tentando melhorar esses indicadores, mostrando a necessidade do que eles estão indicando, para que a assistência melhore de maneira geral. Eu utilizo os indicadores na prática assistencial para conhecer o perfil epidemiológico do setor, analisar as infecções, os eventos adversos. No final do mês eu reúno a equipe e mostro os dados e traçamos planos de ações para melhorar o que ficou abaixo do esperado. • Contribuições dos indicadores de qualidade para o gerenciamento de boas práticas em saúde: Quanto aos indicadores de qualidade para o gerenciamento de boas práticas em saúde, as enfermeiras referiram que eles auxiliam no domínio do processo de trabalho, estimulando o pensamento crítico e favorecendo melhor compreensão da assistência, assim como podem propiciar a prevenção de danos e erros futuros dessa prática. Acredito que os indicadores são muito importantes porque fazem a gente pensar e entender o processo de trabalho […] O indicador serve para não sermos apenas tarefeiros, para a gente entender o que está fazendo e o resultado do que estamos fazendo. No momento que eu sei que meu índice de infecção naquele mês aumentou, eu vou descobrir a fonte e vou gerenciar de outra forma o controle de infecção. Onde ocorreu a falha: foi no cuidado direto ao paciente? Foi no preparo de alguma medicação? Foi em algum transporte que aconteceu a falha? Então sempre os indicadores me ajudam a gerenciar desta forma, evitando danos ou erros futuros. Ainda, mencionaram que os indicadores promovem direcionamento ao cuidado, assim como fomentam melhorias no gerenciamento de boas práticas em saúde, uma vez que caracterizam o perfil do paciente e suas necessidades. Eu acho que os indicadores nos dão uma direção para o nosso cuidado, conseguimos ver quem dos pacientes tem risco de aspiração, risco de infecção, risco de queda. Através dos indicadores de qualidade, eu pude capacitar a minha equipe no que se refere à obstrução de sondas enterais; nós tínhamos muitas perdas e fizemos um treinamento e assim conseguimos melhorar o resultado do indicador e da assistência. Os indicadores de qualidade são reconhecidos como ferramenta indispensável para o gerenciamento de boas práticas no ambiente hospitalar. Os valores mensurados demonstram o resultado da assistência e permitem avaliar se as metas assistenciais foram atingidas; auxiliam no conhecimento acerca dos pacientes atendidos, bem como podem sinalizar melhorias na assistência no que tange ao cuidado centrado no paciente, auxiliando no planejamento e na tomada de decisão do enfermeiro para a prática baseada em evidências INFORMAÇÕES DO MEIO EXTERNO E INTERNO Dividem-se as informações como sendo internas e externas à instituição. Meio externo De acordo com Bittar, as informações de meio externo são as de demografia, geografia, economia, política, cultura, educação, psicossocial, tecnologia, existência ou não de outras instituições de saúde e epidemiológicas. A análise dos indicadores de saúde da comunidade deve ser associada a outras para que se possa formar um melhor juízo das condições de promoção da saúde, prevenção da doença, diagnóstico, tratamento e reabilitação das pessoas que compõem determinada comunidade ou, em outras palavras, dos fatores ou influências que formam o perfil epidemiológico dela. Os indicadores constantes da tabela 1 podem ser gerais ou específicos para uma série de variáveis, como doença, idade, sexo, entre outros. A utilização dos mesmos se aplica à perspectiva dos acionistas, governo, comunidades, quando se utiliza o marcador balanceado, ou mesmo o benchmarking para comparação com outras unidades ou programas e serviços de saúde entre regiões. Meio interno (indicadores hospitalares) O meio interno, nas instituições de saúde, é aquele caracterizado pelas estruturas de recursos, visualizados na tabela 2, distribuídos de acordo com Bittar, em áreas e subáreas, de infra-estrutura,ambulatório/emergência, complementar de diagnóstico e terapêutica e internação clínico-cirúrgica. Estes recursos possibilitam a formação de uma série de indicadores importantes para a administração das instituições de saúde, entre eles os constantes da tabela 3. Inúmeros são os indicadores da parte estrutural das unidades de saúde e que têm importância na avaliação das mesmas, principalmente quando da utilização do marcador balanceado, propiciando uma visão global da sua participação no mercado. Alguns deles podem também ser utilizados na avaliação da perspectiva interna dos negócios. Indicadores que medem a produção são importantes, tanto para os diversos tipos de benchmarking, como perspectiva dos negócios internos, na utilização do marcador balanceado. Entre eles, temos os que se encontram na tabela 4, ressaltando, porém, que lista mais completa pode ser encontrada nas referências bibliográficas citadas neste artigo. Partindo-se da produção, podemos agregar uma série de indicadores de produtividade, que também se fazem imprescindíveis na perspectiva dos negócios internos e nos vários tipos de benchmarking e se encontram na tabela 5. Quanto à perspectiva financeira, pode-se trabalhar com indicadores econômico-financeiros propriamente ditos e com alguns dos indicadores de economia da saúde, tabelas 6 e 7, respectivamente. Alguns destes últimos se aplicam também à avaliação da qualidade em saúde, como é o caso do QALY (Quality adjusted life years). INDICADORES ECONÔMICO-FINANCEIROS Indicadores como os de qualidade hospitalar têm sua importância tanto na perspectiva dos negócios internos como na perspectiva do cliente e dos acionistas, governo e comunidade, já que os resultados obtidos com os indicadores da tabela 8 têm utilização interna para avaliação da qualidade resultante dos processos, como também influencia na escolha do cliente por determinado hospital ou na liberação de recursos por parte de entidades compradoras de serviços. O mesmo se aplica aos indicadores componentes da tabela 9, já que medir satisfação, conhecer a imagem perante o público, a fidelidade dos clientes, o número de inserções positivas na mídia e, atualmente, do balanço social assinalar o que a instituição está retornando à comunidade, tem importância nas perspectivas dos clientes, acionistas e dos negócios internos. Finalmente, a perspectiva da inovação e do aprendizado, em que é fundamental conhecer aspectos. OBJETIVO 3: Discutir sobre a autonomia/responsabilidade do médico; O Estado é responsável pela manutenção e fornecimentos de aparelhos, instalações, fiscalização dos serviços fornecidos e não pelos procedimentos profissionais dos médicos, apesar de que, caso ocorra um dano material, estético ou moral em um hospital público, o Estado deve fazer reparação à vítima e depois acionar o médico responsável, caso ele tenha agido com dolo (intenção) ou culpa (imprudência, negligência ou imperícia) - a chamada ação regressiva. Tanto na responsabilidade objetiva quanto na responsabilidade subjetiva o dever de reparação à vítima pode ser afastado em duas hipóteses: caso fortuito ou força maior. O caso fortuito é um evento da natureza. Um exemplo disso é quando um raio adentra por uma janela e atinge um paciente em seu leito, matando-o. Já a força maior é um evento ocorrido devido a uma conduta humana inesperada. Um exemplo da situação é um roubo dentro do hospital em que, em um tiroteio entre a segurança e os ladrões, acontece a morte de um paciente. Além da culpa dos médicos, verificamos que outros fatores também são causadores do aumento das ações envolvendo responsabilidade civil dos médicos. A falta de estrutura no serviço público médico, a carência de médicos em diversas localidades, principalmente nas mais afastadas das metrópoles, profissionais ambiciosos despreparados em áreas como as cirurgias estéticas/corretivas e a proliferação dessas respectivas cirurgias, chegando-se ao ponto do próprio Conselho Federal de Medicina, por meio de uma resolução, proibir que médicos tenham qualquer ligação com empresas de consórcios de cirurgias. Acredita-se que, apesar desse aumento significativo de ações judiciais envolvendo a responsabilidade civil por erros médicos, esse número possa ser reduzido significativamente com ações governamentais como o aumento do orçamento destinado à saúde, incentivos aos médicos que trabalham em localidades mais distantes, melhoria na capacitação dos profissionais, que pode ser obtida desde o início da carreira do profissional com um melhor ensino nas faculdades e, consequentemente, uma melhor formação dos profissionais. É preciso alertar que também há a necessidade da obrigatoriedade do exame para a obtenção da licença para ser médico, similar ao exame para a obtenção da carteira da Ordem dos Advogados e demais profissões. Por fim, é perfeitamente viável que cheguemos a um patamar mais avançado em saúde que, sem sombra de dúvida, é um dos pilares de um país desenvolvido. Autonomia: “O médico exercerá sua profissão com autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência”. Partindo dessa premissa, assegurada no Código de Ética Médica, os palestrantes conduziram os debates da tarde do segundo dia do I Encontro dos Conselhos de Medicina 2019. O tema foi abordado pelas perspectivas dos Sistema Único de Saúde (SUS) e também da Saúde Suplementar. Na visão do coordenador da Comissão Nacional Pró- SUS, Donizetti Giamberardino, a autonomia é a capacidade de pensar, decidir e agir, de modo livre e independente. Apesar disso, ele pontuou uma série de condições que impõem limites ao exercício da medicina na rede pública. “Muitas vezes a imprensa nos coloca como vilões, como se as condições da assistência fosse médico dependente. Como o médico pode exercer plenamente suas atividades sob má gestão dos recursos, corrupção e em contexto de total adversidade?”, ponderou. MEDICINA E AUTONOMIA Estabelecemos a idéia de autonomia associada à de tomada de decisões no processo de trabalho. Tendo descrito os limites estruturais à amplitude das decisões tomadas, que residem nas suas dimensões de trabalho social e de profissão inserida no mercado de trabalho, a necessidade de decidir condutas pode ser considerada como uma decorrência dos esforços dos médicos em garantir sua independência técnica. Quando falamos em poder decisório, reconhecemos que o processo de trabalho é uma construção histórica e que se realiza a cada instante. A autonomia, dessa forma, seria distintiva da prática médica quando a outras atividades intelectuais, onde a independência técnica se apresenta em níveis menos marcantes, como é o caso de outras atividades em saúde. A auto nomia assim considerada se aproxima do modelo definido por Offe, necessária aos serviços, de modo a viabilizar o processo de sintetização entre a norma e o caso. A independência técnica pode abranger este aspecto, o que subentende a incidência de fatores subjetivos na definição de técnica. Fatores estes, como experiência, empatia, confiança, capacidade discursiva, agilidade etc. Assumir sobretudo o contexto assinalado por Offe, leva-nos a, por exemplo, tomar nutrição e enfermagem, enquanto serviços que lidam no geral com a mesma categoria autonomia que os médicos, qualificando-se como serviços bastante próximos e assemelhados. Tal não ocorre quando nos remetemos a Freidson (1978, 1989), que destaca a capacidade de auto-regulação da profissão enquanto a prova básica da autonomia e, logo, da identidade profissional, o que, segundo este autor, distinguiria o trabalho do médico de outros trabalhos em saúde. Por isso devemos introduzir na complexa questão da autonomia, sua face tambémmercantil. Desta perspectiva, há um limite estrutural para a mercantilização do trabalho médico, sob pena de compreender drasticamente a sua eficácia em virtude de "perdas excessivas de autonomia". O modelo típico de prática médica implica na relação entre portador de saberes e de necessidades. Como já assinalado, o termo da relação médico-paciente não se resume ao de duas pessoas sozinhas. Os insumos consumidos no processo de trabalho médico são constituídos em escala industrial, a organização dos serviços é expressão dos mercados e os mecanismos múltiplos de geração de demanda por serviços médicos só podem ser compreendidos mediante o entendimento da localização do indivíduo em sociedade. Por outro lado, a Medicina é uma atividade tradicional e, como tal, tem uma longa maturação histórica, que precede a organização capitalista da sociedade. Assim, convivem no presente da Medicina padrões históricos que influenciam as estruturas de escolha no âmbito de seu processo de trabalho. Haveria para Laín Entralgo (1982) permanência de características antigas materializadas em um hipocratismo lato sensu na Medicina contemporânea (decorrente da permanência de um enfoque cosmológico fundado na física e na química e pelo reconhecimento ético da máxima hipocrática de "favorecer ou não prejudicar"), que teriam sobrevivido à incorporação maciça de tecnologia. No entanto, ao assinalar tais "permanências", como faz Laín Entralgo, cumpre sempre destacar o essencial — a prática médica do século XX é qualitativamente distinta da hipocrática e representa uma ruptura tecnológica por referência a qualquer técnica anterior. Lembra Freidson (1978) que a profissão médica, dentre as profissões tradicionais, foi a que melhor preservou seus atributos e definiu os das atividades correlatas a partir do século XIX. O caráter oficial, adquirido pelas Associações Médicas para regulamentação profissional, levou a que todas as demais atividades fossem consideradas como paramédicas e, portanto, conformadas a um papel acessório. Este aspecto da autonomia vincula-se ao corporativismo enquanto recurso institucional para garantia de privilégios e atitudes normativas. O seu sucesso, no caso dos médicos, foi ter suas associações sido publicamente reconhecidas como capazes de ordenar a sua própria atuação. Este processo de aquisição de status público, estabelecendo uma articulação de caráter neocorporativo entre Estado e organizações de interesse foi bem caracterizado por Offe (1989), e a ação corporativa dos médicos nos parece assentar bem em tal modelo. Para Larson (1980), o capitalismo, em seu estágio atual, origina tendências que atuam sobre o processo de trabalho de profissões vinculadas a treinamentos de alto nível. Seriam três as principais: incremento e consolidação da divisão do trabalho (levando ao aumento da transferência de tarefas rotinizadas para trabalhadores de nível inferior e proliferação de especializações laterais); intensificação do trabalho (redução dos períodos de inatividade e de ociosidade de produtores independentes em prol de processos mais uniformes); e rotinização das tarefas de alto nível (tendência mais intensa quanto mais simples forem as tarefas passíveis de rotinização. Assim, haveria perda de autonomia e tendência à proliferação, caracterizada pela perda de controle sobre o processo de trabalho. Sobre isto diz Freidson: "A teoria da proletarização assinala que há uma nítida tendência aos médicos tornarem-se assalariados em vez de auto-empregados, uma tendência que pode se acelerar nas próximas décadas... A questão é o que a tendência significa. Certamente não pode significar perda de status profissional por si, pois a maioria das profissões tem sido sempre de empregados em vez de auto-empregados". (Freidson, 1989: 186) Ao recusar, com razão, a tese da proletarização, aponta Freidson que a situação de empregado não implica, por si só, enfraquecimento no mercado, pois, conforme o caso, a situação de um empregado pode ser mais forte que a de um auto-empregado. Quanto à questão da subordinação à lógica burocrática das administrações, que tem no hospital seu tipo-ideal na Medicina, e seu poder de enfraquecer a autonomia profissional, assinala que este fato em si não transforma os médicos em trabalhadores alienados quanto ao domínio do processo de trabalho. Ao descrever o trabalho em hospitais americanos, aceitos como modelo de racionalização burocrática, Freidson lembra situações facilmente identificadas como familiares por médicos que atuam nos grandes hospitais privados no Brasil. Tais situações não permitem que se considere os médicos como empregados comuns: "Eles dependem do hospital para o cuidado de alguns de seus pacientes e a realização de parte de seu trabalho, mas o hospital também depende deles para prover pacientes. É apenas o médico que tem o direito de internar pacientes no hospital e escolher e responsabilizar-se pelo seu tratamento..." (Freidson, 1989: 188-189) A forte posição econômica dos médicos em hospitais lhes confere poder de barganha pela própria base legal de serem os únicos capazes de admitir pacientes, ou seja, de viabilizar o próprio hospital privado enquanto uma empresa lucrativa. Isto já basta para lhes conferir um lugar especial nesta organização, a distingui-los "do trabalhador de colarinho azul ou de colarinho branco em fábricas ou empresas" (Freidson, 1989: 189). A posição no interior das organizações associa-se à exclusão de terceiros na regulação técnica, um privilégio em três argumentos: "Primeiro, o grau de perícia e conhecimento implícito no trabalho profissional é tal, que os não profissionais não estão equipados para avaliá-los ou regulá-los. Em segundo lugar, se reivindica que os profissionais são responsáveis, que se deve confiar em que eles trabalham conscientemente sem supervisão. Em terceiro lugar... deve-se confiar em que a própria profissão tome a si as ações reguladoras correspondentes nas raras ocasiões nas quais um indivíduo não desempenha seu trabalho competente ou eticamente... Sua autonomia é justificada e provada pela sua auto-regulação". (Freidson, 1978: 145) A nosso ver, entretanto, a questão da autonomia deve ser enfocada ainda com relação à independência técnica no âmbito de um serviço que se cristaliza numa relação interpessoal. A auto-regulação, embora seja também vinculada à questão técnica, vai mais além devido à "exclusão de terceiros". O trabalho médico tende a ser cada vez mais avaliado socialmente pela ação de grupos organizados. Isto tende a enfraquecer a instância de auto-regulação, recolocando a questão da independência técnica em níveis de troca de saberes e interesses entre grupos sociais e entre indivíduos envolvidos na relação médico-paciente. Nesta dimensão, ainda que não analisemos aqui, há que se lembrar estudos de corte cultural, em que os modos de ação (do médico e do paciente) podem ser vistos como produto de uma "cultura médica" (Starr, 1982). Mesmo enfraquecida a auto-regulação, por ação de outros grupos sociais, a autonomia tende a ser preservada no âmbito da independência técnica. Isto não só pela sua característica de serviço em geral, mas especialmente pela forte presença das incertezas e da subjetividade observada na relação médico-paciente. O "cenário em aberto" que esta relação representa é a garantia da preservação da autonomia, mesmo nas situações mais restritivas. Alguns autores têm feito importantes contribuições ao estudo da autonomia médica no Brasil. Donnangelo (1975, 1979) assinalou que a prática médica se fortaleceu com os novos meios diagnósticos e terapêuticos, o que gerou uma demanda social pela extensão de seus benefícios. Ocorreu, como definiu, uma politização da questão da oferta de serviços — ouseja, desenvolveu-se uma demanda social pela extensão dos benefícios da Medicina tecnológica à sociedade. Aliado a isto, vieram também à tona temas vinculados às preocupações quanto aos danos possíveis dos novos instrumentos e acerca dos mecanismos de defesa social frente à tão intensa penetração da Medicina na vida humana. Ao estudar o mercado de trabalho médico, demonstrou a ampliação do assalariamento e de formas de trabalho em grupo. Tais agrupamentos privados foram acompanhados pela especialização e uma diminuição do controle dos médicos sobre parcelas de seu processo de trabalho, como definição de clientela e de ganhos. Ou seja, apontou um quadro de constrangimento à tradicional autonomia médica e a importância progressiva dos serviços estatais de saúde como fonte de assalariamento. Estariam assim enfraquecidos os principais pilares da "medicina liberal". Sua pesquisa, por outro lado, revela uma persistência de formas autônomas completas no mercado e, o mais importante, o desenvolvimento de relações de mercado autônomas "atípicas". Estas seriam situações onde os médicos, por exemplo via convênios, preservariam determinado grau de ganho proporcional à produção e à escolha da clientela. Outra constatação é quanto à sólida persistência do "ideal de autonomia" dentre os médicos. Este aspecto sobressai não apenas pelo relato dos profissionais, mas pela profusão de situações em mercado onde estes combinam diversas formas de vínculos, buscando situações de maior autonomia, em geral através da associação do assalariamento com uma autonomia tida como atípica, que nos parece mais uma busca por situações de auto-emprego. Uma leitura mais atenta do trabalho de Donnangelo revela questões preciosas. Em especial, os dados que refletem as tensões na organização profissional quanto às tendências apontadas como limitadoras de autonomia e que podem ser inferiores pelo exame das tabelas e pelos comentários mais laterais da autora. Observa-se a persistência da concepção entre os médicos de que o exercício independente da medicina corresponde à sua otimização. Mais que isto, transparece a idéia de que os arranjos de mercado tenham sido instituídos não apenas pelas tendências inerentes ao capitalismo (incorporação de tecnologias, especialização progressiva, formação de estruturas burocráticas de gerenciamento), mas também como resposta a tentativas dos médicos em realizar, no mercado, o seu "ideal de autonomia". Mais recentemente, Schraiber (1991, 1993) discutiu o trabalho médico à luz da incorporação tecnológica e dos reflexos desta na autonomia profissional. Destaca a perda relativa de autonomia que a subordinação às políticas públicas e aos arranjos empresariais provoca na profissão médica, gerando uma tensão constante e intensa entre o ideal de autonomia plena e os ditames das novas imposições de mercado (subordinação hierárquica, perda do controle sobre preços e clientela, necessidade de associação e parceria com outros médicos, progressiva especialização e vinculação às dinâmicas de setores industriais e financeiros). A base dominante do trabalho médico migra do consultório para os hospitais e clínicas. Nota-se uma prática tensionada que cursa com a perda do monopólio médico sobre itens cruciais de sua prática, fruto da articulação entre a Medicina e o capitalismo em seu estágio atual. Tamanha tensão entre restrições à autonomia via mercado e percepção coletiva de padrões profissionais ideais entre os médicos, ocasiona estratégias diferenciadas entre estes profissionais (também bastante heterogêneos) no sentido de articular projetos individuais e situações de mercado. O essencial, nos parece, está em se reconhecer que o processo de incorporação tecnológica dá-se, na prática médica, em combinação com uma base heterogênea de situações de trabalho que tende a fazer valer o "ideal de autonomia". Como enfatiza Schraiber, o ideal de autonomia serve de meditação ao processo de incorporação tecnológica, influenciando a sua concretização no mercado. Não seria compre ensível a forte incidência deste ideal profissional, sem que o próprio processo de trabalho fornecesse bases para a sua preservação. O ideal de autonomia entre os médicos influencia a sua própria organização política, em consonância com os arranjos no mercado, como bem lembrado por Campos (1988). AUTONOMIA, TOMADA DE DECISÕES E RESPONSABILIDADE A articulação entre autonomia, tomada de decisões e responsabilidade individual do médico, deveria compor uma última questão na análise acerca do trabalho médico contemporâneo. Ela constitui uma espécie de conclusão do que vimos refletindo sobre sua qualidade de trabalho autônomo. De saída diremos que acerca deste aspecto pouca produção intelectual específica existe. Além disso, justamente por ser conclusão, emerge necessariamente como ponto de partida para um estudo que a considere em particular, permitindo que se defina mais completamente a noção de autonomia no trabalho médico, contribuição ao conhecimento que o presente texto apenas inicia. Isto posto, neste artigo nossa abordagem limita-se a assinalar dois pontos relacionados à responsabilidade, os quais mereceriam estudos ainda por se fazer. A responsabilização profissional acompanha a questão da tomada de decisões e incide sobre a independência técnica, de um lado, e de outro incide sobre a auto- regulação e a representação de interesses. Logo, responsabilidade individual é uma questão conexa ao controle social da prática médica, fazendo parte da agenda democrática. Desse modo, como assinalamos, nos parece imprescindível vincular e examinar mais profundamente a autonomia da perspectiva de independência técnica, mais próxima da tomada de decisões e, portanto, da aproximação da prática enquanto ação de sujeito; perspectiva que permite articular a técnica com a liberdade e a responsabilidade individuais. O controle democrático da prática médica, com a participação de não-médicos, não implica, a nosso ver, perda radical de autonomia, devido à posse do conhecimento e às particularidades do objeto para a Medicina. Esses dois referenciais (questão democrática e auto-regulação) são os que elencamos como também necessários a um aprofundamento da autonomia médica no plano da responsabilização profissional, aparecendo esta última, então, como uma produtiva abordagem para, inscrevendo a dimensão ético-moral desta prática, conectar a dimensão técnica e a dimensão política do trabalho médico. Responsabilidade médica: O tema responsabilidade civil, em especial nos últimos anos, vem sendo objeto de diversas alterações. E essa mutação decorre de diversos fatores, os quais não serão minunciosamente abordados aqui, a fim de não perder a finalidade deste artigo. Contudo, há uma informação que o médico precisa estar ciente: o número de demandas tendo como pedido a condenação de médicos à reparação de danos, propostas por pacientes, pelos mais diversos motivos, cresceu de maneira vertiginosa. E a prova incontestável desse fato é vivenciada por esses profissionais e sentida no bolso, uma vez que tem crescido a contratação de seguros de RCP (Responsabilidade Civil Profissional), objetivando o pagamento de valores no caso de serem condenados em juízo pela ocorrência do denominado "erro médico". Diante desse quadro, esse artigo se propõe a expor, de maneira sucinta, o cenário da responsabilidade civil nas mais variadas áreas da medicina, bem como apresentar as medidas preventivas a serem adotadas pelos médicos, a fim de reduzir o risco de sofrer uma demanda dessa natureza. A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO NA LEGISLAÇÃO ATUAL Antes de adentrar nos casos mais específicos, é preciso dar uma visão panorâmica da responsabilidade civil do médico na legislaçãoatual. Então, para entender a responsabilidade civil do médico, primeiro é preciso firmar algumas premissas básicas (são conceitos eminentemente jurídicos, mas essenciais para a compreensão do tema) inerentes à relação jurídica entre médico e paciente: a) A relação jurídica entre médico e paciente é, em regra, uma relação de natureza contratual – é regida por um contrato, que confere a cada uma das partes direitos e deveres; b) A violação desses deveres contratuais pode gerar danos de 3 (três) naturezas: b.1) Danos materiais; b.2) Danos morais; b.3) Danos estéticos. c) A obrigação do profissional de saúde, como regra, é de meio e não de fim; d) Regra geral, a responsabilidade civil do médico é de natureza subjetiva, fazendo com que a culpa desse profissional precise ser provada por aquele que alega ter sofrido o dano. A responsabilidade civil, em regra, é regida por dois sistemas distintos, mas que dialogam constantemente, quais sejam: a) o sistema do Código de Defesa do Consumidor – lei 8.078/90 –; b) o sistema do Código Civil – lei 10.406/02. Esse é o quadro geral, que tem fundamento na legislação em vigor. Nesse sentido, o Código Civil, no art. 951, e o Código de Defesa do Consumidor, no art. 14, § 4º, dispõem que a responsabilidade civil do profissional liberal é de natureza subjetiva, já que exige a prova do elemento subjetivo "culpa". Essas são as balizas mestras da responsabilidade civil no tocante à atividade médica. Mas, para compreender as novas tendências, é preciso um aprofundamento ainda maior acerca do tema. Note que as duas leis (Código Civil e Código de Defesa do Consumidor) já estão em vigor há bastante tempo e, ainda assim, essa matéria continua sofrendo constantes modificações. Uma das razões dessa mutação decorre da interpretação feita pelo Poder Judiciário da norma positivada. Isso porque, para se aplicar uma norma jurídica em um caso concreto, o aplicador do direito deve interpretá-la, a fim de buscar o seu sentido e alcance. Essa mutação acerca do tema tem uma causa determinante, que é o fato da relação jurídica entre médico e paciente ser regida, eminentemente, pelo sistema do consumidor, isto é, pela lei 8.078/90. Por seu turno, a doutrina e a jurisprudência pacificaram o entendimento no sentido de que essa relação jurídica possui, em regra, natureza consumerista. A razão de ser desse posicionamento está no objeto dessa relação jurídica, que vem a ser uma prestação de um serviço especializado por um profissional liberal (médico) ao tomador do serviço (paciente). Esses elementos amoldam-se aos conceitos legais de consumidor e fornecedor expressos nos arts. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor. Logo, fica claro que o médico, ao prestar o serviço aos pacientes, o faz na figura de fornecedor de serviços. Essa mudança relativa ao sistema normativo regente da matéria, em razão da migração da sua disciplina do Código Civil para o Código de Defesa do Consumidor, originou diversas transformações 4. Mas, a mais relevante deu-se no campo hermenêutico (interpretativo). Isso decorre do fato de que o Código de Defesa do Consumidor parte de uma premissa básica, no sentido de que o consumidor é a parte vulnerável no mercado de consumo. Isto encontra-se expresso no art. 4º, I, da lei 8.078/90 5. Com efeito, ante essa vulnerabilidade, a legislação apresenta normas de cunho protetivo ao consumidor, tendo como base axiológica a cláusula geral da boa-fé objetiva, que cria para o fornecedor do serviço, ao lado da obrigação de adimplir com a prestação do serviço contratado, uma série de deveres jurídicos anexos ou laterais. De acordo com a literatura jurídica, o princípio da boa- fé objetiva, no caso de responsabilidade civil médica, é particularizado como um "dever de tutela do melhor interesse do paciente”. Esse dever significa, em última análise, a interpretação da relação jurídica médico- paciente visando a proteção da parte vulnerável, que é o paciente. Como consequência dessa premissa interpretativa, a lei impõe aos médicos um dever de conduta. É com base nesse valor que a doutrina e a jurisprudência vêm ressaltando que um dos principais deveres do médico é o dever de transmitir a informação de forma precisa e clara ao paciente acerca da patologia, caso existente, bem como dos tratamentos existentes, de qual tratamento o especialista acredita ser o mais recomendado para aquele caso, além de quais riscos isso acarretará (dever de informação). A partir dessa informação, caberá ao paciente a escolha pelo tratamento, dando o seu consentimento para qualquer intervenção, porventura, necessária. Essa é a regra geral, pois é certo que em situações de urgência, quando há risco de morte, o profissional de saúde não pode aguardar o consentimento por parte do paciente, tendo o dever profissional de atuar. A prova de que todas as informações foram devidamente prestadas ao paciente e que este consentiu com o tratamento proposto recai sobre o médico. Por isso, muitos médicos têm optado, ou ao menos deveriam fazê-lo, em entregar aos seus pacientes um documento escrito contendo essas https://www.migalhas.com.br/depeso/269074/responsabilidade-civil-medica-breve-analise-do-cenario-atual-e-medidas-preventivas https://www.migalhas.com.br/depeso/269074/responsabilidade-civil-medica-breve-analise-do-cenario-atual-e-medidas-preventivas informações, bem como formalizar seu consentimento para os procedimentos a serem adotados. A isso se dá o nome de "termo de consentimento informado". A maioria já deve ter conhecimento desses termos. Mas o mais impressionante é a resistência do médico em utilizá-lo no dia a dia do consultório. O médico tem que ter em mente que essa é uma medida preventiva extremamente importante, que pode, em muitos casos, afastar o dever de reparar um dano. Basta pensar no paciente que ajuíza uma ação reparatória, sob o fundamento de que, em decorrência do procedimento cirúrgico realizado pelo médico, surgiu determinada sequela. No entanto, ao ser citado no processo, o médico apresenta defesa, trazendo aos autos o termo de consentimento informado, contendo em uma de suas cláusulas a possibilidade da ocorrência daquela implicação a sua saúde, ou seja, fica comprovado que o paciente tinha total conhecimento da probabilidade daquele evento secundário vir a ocorrer e, ainda assim, fazendo uma ponderação, entendeu pela realização do procedimento. Neste exemplo, se o médico observou o dever de informação, bem como atuou em conformidade com os protocolos e melhor técnica, não há razão para se falar em dever de indenizar o paciente. Mas, é perceptível que aquelas balizas acima dispostas vêm sendo, aos poucos, desfiguradas, com o claro objetivo de colocar o paciente como parte vulnerável da relação jurídica, criando uma série de presunções não prescritas na legislação. Por conseguinte, o que transparece é a tendência, ao menos da jurisprudência, em mitigar certas formalidades exigidas pela lei, tal como a necessidade de prova da culpa pelo paciente, a fim da responsabilização civil do médico, sob o fundamento de proteção da parte mais fraca da relação. Isso fica bastante evidente nos julgados pesquisados acerca da matéria, nos mais diversos Tribunais do Brasil, para a elaboração deste trabalho. Há um movimento que aspira tornar a inversão do ônus da prova como uma regra nas demandas que tem por objeto danos decorrentes da prestação de serviços médicos. CURIOSIDADE: A responsabilidade civil do médico durante a pandemia Em um momento de pandemia, não é difícil supor que um médico se veja compelido a deixar morrer uma pessoa a fim de poder salvar outra, com melhores perspectivas de cura. Neste caso, não se poderá dizer, propriamente, que a morte decorreu de ato seu; terá se dado pelaconjuntura caótica, que não lhe permitia agir de maneira diversa. Tinha o médico que agir desta determinada maneira para evitar um mal ainda pior. Note-se, contudo, que, neste caso, não se estará diante apenas do que dispõe o artigo 188, inciso II, do Código Civil (“Não constituem atos ilícitos (...) a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente”). Assim o fosse, por disposição do artigo 929 do Código Civil (“Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188, não forem culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que sofreram”), o lesado teria direito de indenização contra o médico. Ao que dispõe o artigo 930 do Código Civil (“No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado”), ao médico caberia apenas ação de regresso contra o causador do dano – por exemplo, contra o Poder Público, caso tenha contribuído, ainda que por omissão, para a situação de caos. Tal não se dá, porque, ao agir para evitar o dano, o médico não somente “remove perigo iminente” mas age em “exercício regular de direito reconhecido”, prevista no artigo 188, inciso I, do Código Civil (“Não constituem atos ilícitos (...) os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido”). Mas a situação vai além. Poderá inexistir nexo de causalidade, na situação de pandemia, por se estar diante de força maior, que, na dicção do artigo 393, parágrafo único, do Código Civil, se caracteriza pelo “fato necessário, cujo efeitos não era possível evitar ou impedir”. Tal excludente, neste momento extremo, será presumida de maneira muito forte, cabendo não ao médico – mas ao lesado – a prova cabal de que a força maior não ocorreu – em exceção ao que dispõe o artigo 333, inciso II, do Código de Processo Civil (“O ônus da prova incumbe (...) ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor”). https://www.conjur.com.br/2020-abr-30/direito-pos-graduacao-responsabilidade-civil-medico-durante-pandemia#art188 https://www.conjur.com.br/2020-abr-30/direito-pos-graduacao-responsabilidade-civil-medico-durante-pandemia#art188 Conclui-se, assim, que, no cenário atual, de pandemia, presume-se de meio a obrigação do médico, assim como a existência – em seu favor – de causas excludentes de nexo, garantindo-se ampla liberdade para que exerça seu mister em prol de uma sociedade abalada por doença que só ele pode combater. OBJETIVO 4: Abordar os estudos utilizados na Avaliação de Tecnologias em Saúde (revisão sistemática e metanálise). A avaliação de tecnologia em saúde (ATS) pode ser entendida como a pesquisa sistemática da melhor evidência disponível da eficácia ou de efetividade de uma tecnologia em saúde, e dos custos relacionados a ela. O intuito da ATS é permitir que sistemas ou organizações de saúde, como por exemplo, hospitais e clínicas possam aumentar a qualidade e o bem estar do paciente e otimizar a relação de custo-efetividade, ou seja, a eficiência de produtos para saúde (definições na Figura 1). As tecnologias em saúde são definidas como medicamentos, procedimentos médicos, equipamentos e, até mesmo, programas de cuidados para saúde, como por exemplo, aconselhamento nutricional. A avaliação da eficácia, efetividade e eficiência encontram-se atreladas ao desenvolvimento de projetos de pesquisas clínicas, revisões sistemáticas da literatura e metanálise, modelos de decisão clínica ou análises econômicas em saúde. Todavia, a elaboração desses estudos requer inicialmente a apresentação de uma pergunta de pesquisa, ou seja, uma ideia ou questão clínica. Os chamados estudos de síntese do conhecimento, representados pela revisão sistemática (RS) e metanálise (MA). No âmbito atual, ambos representam avanço importante entre os métodos científicos empregados na saúde e em especial na ATS. A RS é um processo objetivo e criterioso de pesquisa que utiliza método de busca compreensiva e extensiva da evidência clínica, sendo totalmente distinto das revisões narrativas tradicionais. A MA é método estatístico que permite a agregação de diversos estudos identificados na RS permitindo, então, aumentar a precisão das estimativas dos desfechos (“outcome variables”) clínicos analisados A revisão sistemática é uma revisão planejada para responde a uma pergunta específica e que utiliza métodos explícitos e sistemáticos para identificar, selecionar e avaliar criticamente os estudos, e para coletar e analisar os dados destes estudos incluídos na revisão. Os métodos estatísticos (meta-análise) podem ou não ser utilizados na análise e na síntese dos resultados dos estudos incluídos. Assim, a revisão sistemática utiliza toda esta estruturação para evitar viés – tendenciosidade - em cada uma de suas partes. A meta-análise, ou metanálise ou ainda, metaanálise é o método estatístico utilizado na revisão sistemática para integrar os resultados dos estudos incluídos. O termo também é utilizado para se referir a revisões sistemáticas que utilizam a meta-análise. Revisão Sistemática: A revisão sistemática tem potencial para minimizar algumas barreiras para a utilização de resultados de pesquisas na prática assistencial. O enfermeiro tem dificuldades no uso de pesquisas devido à falta de tempo, falhas na busca de pesquisas e deficiência de habilidades para avaliar e sintetizar as pesquisas encontradas; assim, a revisão sistemática consiste em solução, pois proporciona uma síntese do conhecimento baseado em pesquisas, relativo a um tópico específico. Outros estudiosos consideram a revisão sistemática como um recurso para guiar a prática profissional e identificar a necessidade de futuras pesquisas. A seguir, apresentaremos de forma suscinta as fases do processo, para elaborar uma revisão sistemática, tendo, como referência, os estudos encontrados na revisão da literatura. Primeira fase: a construção do protocolo A primeira fase do processo para a condução da revisão sistemática consiste na elaboração do protocolo, o qual garante que a revisão seja desenvolvida com o mesmo rigor de uma pesquisa. Os componentes desse protocolo são: a pergunta da revisão, os critérios de inclusão, as estratégias para buscar as pesquisas, como as pesquisas serão avaliadas criticamente, a coleta e síntese dos dados. O planejamento da revisão é cuidadosamente elaborado e recomenda-se a avaliação do protocolo por um profissional competente, anteriormente ao início da revisão. No protocolo, deve constar os recursos humanos e materiais necessários frente aos métodos selecionados para a construção da revisão sistemática. Segunda fase: a definição da pergunta Uma boa revisão sistemática é baseada na formulação adequada da pergunta. A pergunta guia a revisão, pois define quais serão os estudos incluídos, quais serão as estratégias adotadas para identificar os estudos e quais serão os dados que necessitam ser coletados de cada estudo identificado. A definição da pergunta é a atividade mais importante na elaboração da revisão sistemática, proporciona a direção para a execução das outras atividades relativas ao processo. Essa fase inclui a definição dos participantes, intervenções a serem avaliadas e os resultados a serem mensurados. Caso a pergunta seja vaga, frequentemente é pobre a qualidade da revisão. Por exemplo: O que podemos fazer para diminuir as injúrias dos idosos? Essa questão é muito ampla e não especifica claramente o que se quer examinar. Assim, uma pergunta mais específica seria: Os exercícios físicos previnem quedas entre os idosos? Essa pergunta fornece uma intervenção (exercíciofísico), o grupo participante (idosos) e um resultado (prevenção de quedas). Um aspecto importante na formulação da pergunta é a existência de pesquisas sobre o tópico a ser investigado. Embora seja possível sintetizar os resultados de dois estudos, o valor da revisão sistemática fica limitado. Terceira fase: a busca dos estudos A procura dos estudos na literatura é uma fase chave no processo de condução da revisão sistemática. A estratégia utilizada deve ser ampla e incluir material publicado e não publicado. A utilização de uma estratégia ampla de busca dos estudos consiste na procura em bases eletrônicas de dados, na busca manual em periódicos, as referências listadas nos estudos identificados, contato com os pesquisadores e o encontro de material não publicado(14). Ao selecionar as bases eletrônicas de dados, há a necessidade de se considerar quais são os periódicos listados nestas quais publicações são indexadas, a viabilidade do acesso e a implicação de custos. Outro aspecto importante é a necessidade de buscar os estudos em mais de uma base de dados, bem como ter habilidade na forma correta de procurar em cada uma delas. A busca manual de estudos é realizada em periódicos que não estão indexados em base eletrônica de dados, ou foram indexados de tal maneira que a busca não é praticável. O revisor, antes de iniciar esse processo, deve decidir quais são os periódicos que serão pesquisados e qual o período determinado da busca; a resposta dependerá da pergunta selecionada para a condução da revisão sistemática. Após a identificação dos periódicos que podem estar localizados em bibliotecas diferentes, o revisor checa cada volume para selecionar aqueles estudos que estão de acordo com os critérios estabelecidos no protocolo e realiza as fotocópias. Outra forma de busca consiste no seguinte: o revisor checa as referências bibliográficas dos estudos identificados, com o propósito de encontrar outros que tenham os critérios determinados anteriormente. Para identificar estudos não publicados ou em fase de elaboração, o revisor deverá entrar em contato com os pesquisadores por meio de telefone, correio ou e-mail; o retorno desse tipo de busca depende da atitude dos pesquisadores, os quais poderão contribuir positivamente, compartilhando informações valiosas para a revisão sistemática ou não. Na literatura, não existe um método padrão para a identificação do material não publicado. Essa busca pode incluir dissertações, teses e resultados de conferências e/ou reuniões científicas. Esse tipo de busca é uma forma de diminuir o viés da revisão sistemática, pois, geralmente, os editores de periódicos não publicam estudos cujos resultados não são significativos, ou seja, publicam estudos cujos resultados são positivos ou negativos. Caso o revisor inclua na revisão apenas material publicado em periódicos, o viés pode ser potencializado acarretando efeitos nos resultados da revisão sistemática(14). A busca de estudos realizada de forma ampla, sistematizada, com o mínimo de viés, consiste em um dos aspectos para diferenciar a revisão tradicional da revisão sistemática. Quarta fase: a seleção dos estudos A população dos estudos para a condução da revisão sistemática consiste em todas as pesquisas que abordam o tópico a ser investigado. A seleção dos estudos que devem ser incluídos na revisão é guiada pelos critérios determinados previamente no protocolo, os quais devem ser definidos anteriormente à realização da busca dos estudos na literatura, pois isso assegura que os critérios não sejam baseados nos resultados dos estudos que o revisor encontrou. Acrescido a esse fato, protege o revisor de alegações de viés, uma vez que a seleção dos estudos pode ser executada, conscientemente ou não, baseada na experiência profissional do revisor. Os critérios de inclusão determinados pelo revisor devem refletir diretamente a pergunta selecionada para a elaboração da revisão sistemática, incluindo os participantes, a intervenção e os resultados de interesse. O componente adicional desses critérios consiste no tipo de estudos que serão incluídos na revisão. Por exemplo, quando a revisão sistemática é para avaliar a eficácia de uma intervenção, o estudo randomizado controlado é considerado o mais seguro para fornecer as melhores evidências. Entretanto, se a revisão é sobre outro problema, como, por exemplo, o impacto de uma intervenção no paciente, outros métodos de pesquisa podem proporcionar informações mais fidedignas. Nessa fase, o revisor deve também estabelecer os critérios de exclusão, os quais devem estar descritos de forma clara e registrados; por exemplo, caso a revisão sistemática seja sobre o efeito de determinadas drogas, em relação a específicos parasitas em crianças, o revisor pode adotar como critério de exclusão os estudos que retratam os efeitos do número de parasitas encontrados nas crianças. Uma forma de assegurar a qualidade dessa fase do processo de condução da revisão sistemática é a checagem de todos os estudos selecionados por mais de um revisor. Quinta fase: a avaliação crítica dos estudos A utilidade de qualquer revisão sistemática depende largamente da qualidade dos estudos incluídos nela. A avaliação crítica consiste na fase onde todos os estudos selecionados são avaliados com rigor metodológico, com o propósito de averiguar se os métodos e resultados das pesquisas são suficientemente válidos para serem considerados. A avaliação crítica dos estudos é uma fase difícil, pois o revisor necessita avaliar o delineamento de cada pesquisa, sua condução e os resultados encontrados. Na literatura, existem critérios estabelecidos para avaliar a qualidade dos estudos randomizados controlados; entretanto, a literatura é pobre sobre a melhor forma de analisar pesquisas com outros métodos empregados. Sexta fase: a coleta dos dados Os dados utilizados na revisão sistemática são oriundos de cada estudo individual selecionado, os quais são coletados com o auxílio de instrumentos. Esses instrumentos são usados para assegurar que todos os dados relevantes sejam coletados, minimizar o risco de erros na transcrição, garantir precisão na checagem dos dados e servir como registro. A coleta dos dados varia de acordo com cada revisão sistemática e está relacionada com a pergunta determinada no início do processo. A coleta dos dados deve incluir, além daqueles específicos da pergunta inicial (participantes, intervenção e resultados mensurados), o local onde a pesquisa foi realizada, a maneira exata como a intervenção foi executada, dados bibliográficos e resultados atuais. A checagem dos dados coletados por outro profissional, além do revisor, é uma maneira de minimizar a chance da introdução do viés. Sétima fase: a síntese dos dados A finalidade dessa fase da revisão sistemática é sintetizar os dados resultantes de cada estudo para fornecer uma estimativa da eficácia da intervenção investigada. Essa fase permite ao revisor investigar se o efeito é aproximadamente o mesmo nos diferentes estudos, local e participantes; caso o efeito não seja o mesmo, é necessário pesquisar as diferenças evidenciadas. A síntese dos dados pode ser realizada por meio de uma análise descritiva ou metanálise. Quando os dados dos estudos selecionados são sintetizados, mas não estatisticamente combinados, a revisão pode ser denominada de revisão sistemática qualitativa. Uma revisão sistemática quantitativa ou metanálise é uma revisão que usa métodos estatísticos para combinar os resultados de dois ou mais estudos. Metanálise é um procedimento no qual métodos estatísticos são empregados para combinar e resumir os resultados de vários estudos. Esse procedimento é utilizado na abordagem quantitativa quando os estudos apresentama mesma questão de investigação, usam a mesma população, administram a intervenção de maneira semelhante, mensuram os resultados da mesma forma e empregam a mesma metodologia na sua elaboração (delineamento de pesquisa). Quando os estudos diferem em um ou mais desses aspectos a metanálise não é apropriada. O mesmo grupo que definiu revisão sistemática em 1995, considerou metanálise como uma revisão sistemática quantitativa, ou seja, "aquela que emprega métodos estatísticos para combinar e resumir o resultado de vários estudos"(6). Salienta que a metanálise é útil "quando resultados de vários estudos discordam quanto à magnitude ou à direção do efeito, quando os tamanhos amostrais são individualmente pequenos para detectar um efeito e classificar como estatisticamente significativo um trabalho, e quando ensaios para avaliar um determinado assunto são caros ou demandam longo tempo para serem realizados". A síntese dos dados de estudos que empregam a abordagem qualitativa pode ser realizada na forma narrativa e consiste em tarefa difícil, pois vieses podem ser introduzidos na análise; aspecto importante é a definição a priori no protocolo da revisão sistemática da maneira apropriada da coleta dos dados e a comparação dos estudos selecionados. A revisão sistemática permite que estudos que respondem a uma questão clínica específica sejam separados da vasta literatura relativa a área da saúde; assim, o enfermeiro pode empenhar-se na construção de uma revisão e/ou aplicar na prática resultados de revisões já elaboradas. Entretanto, a qualidade da revisão pode variar, havendo a necessidade de o enfermeiro avaliá-la anteriormente à implementação dos resultados na prática assistencial. Na Tabela 1, apresentamos as questões norteadoras para a avaliação da qualidade da revisão sistemática. A qualidade da revisão sistemática dependerá da qualidade dos estudos incluídos na revisão, assim o enfermeiro necessita avaliar se os revisores efetuaram a análise dos estudos individualmente, como foi executada e se incluíram todas as pesquisas ou somente aquelas com metodologia apropriada. Os revisores devem fornecer informações suficientes de cada estudo incluído na revisão, sendo que, no mínimo, os seguintes tópicos devem estar claros: o tipo de pesquisa, o tamanho da amostra, a descrição da intervenção e dos resultados evidenciados. Para finalizar o processo de avaliação da revisão sistemática, o médico necessita avaliar a síntese dos dados coletados nos estudos selecionados realizada pelos autores, em outras palavras, os estudos são suficientemente similares para que a combinação de seus resultados possa ser realizada? O médico pode necessitar do auxílio de um estatístico para uma melhor compreensão dos métodos empregados pelos revisores. Após análise da revisão sistemática, o médico necessita avaliar se os resultados evidenciados podem ser incorporados na sua prática assistencial, ou seja, se, no seu local de trabalho, existem os recursos humanos e financeiros para a implementação das mudanças necessárias e, principalmente, se essas estão de acordo com as preferências do paciente e familiares. Na enfermagem, desde 1967, revisões sistemáticas foram elaboradas; entretanto, nem todas eram relativas à eficácia de intervenções. Na literatura, existe um grande número de revisões, publicadas em periódicos ou outro tipo de publicação, as quais tentam https://www.scielo.br/scielo.php?pid=s0104-11692004000300014&script=sci_arttext&tlng=pt#Tabela1 responder a questões sobre eficácia, sem utilizar métodos para minimizar vieses, ou a síntese dos dados é inadequada, sendo que esse tipo de revisão pode acarretar conclusões que direcionam, de forma errada, a prática profissional. A revisão tradicional da literatura há muito tempo vem sendo criticada, devido à ausência de métodos explícitos e rigorosa padronização das técnicas empregadas. Em resposta a essa situação, o desenvolvimento de métodos seguros para serem utilizados na revisão sistemática tem ocorrido de forma considerável. A metanálise foi proposta por Glass, na metade da década de 1970, e adaptada para a medicina, na década de 1980. O exemplo mais antigo de metanálise na enfermagem consiste em uma tese de doutorado de 1982, e a primeira metanálise publicada na literatura de enfermagem é de 1983. Nas últimas duas décadas, houve uma progressiva evolução na elaboração de revisões sistemáticas; entretanto, na enfermagem, o desenvolvimento dessa metodologia é limitado, e os métodos empregados são derivados de outras disciplinas da saúde, principalmente da medicina. Metanálise: Metanálise é um método estatístico para agregar os resultados de dois ou mais estudos independentes, sobre uma mesma questão de pesquisa, combinando seus resultados em uma medida sumária. Geralmente segue-se à realização de uma revisão sistemática. Metanálise é o uso de métodos estatísticos para sumarizar resultados de estudos independentes. Combinando informações de todos os estudos relevantes, a metanálise pode estimar os efeitos de uma determinada intervenção de forma mais precisa do que cada estudo individualmente. Para a elaboração de uma revisão sistemática, é possível trabalhar com dados de diversas naturezas, contudo, para proceder com a abordagem meta-analítica, o resultado final de cada estudo deve ser expresso em uma medida padronizada, denominada tamanho do efeito. Metanálises que consideram desfechos binários são as mais comuns. Para cada estudo individual é calculada uma mesma medida de associação, sendo mais freqüente o uso do risco relativo (RR) ou da razão de chances (odds ratio – OR), que expressarão o tamanho do efeito. Após, procede-se com a agregação das medidas a partir da ponderação dos resultados dos estudos individuais. Uma vez obtidos esses dados, é possível calcular medidas de impacto e benefício, como o número necessário para tratar (NNT), assim como em qualquer ensaio clínico individual. Para dados contínuos, utiliza-se a diferença ponderada das médias (weighted mean difference, ou simplesmente, mean difference – MD) entre os dois grupos de comparação quando possuímos as medidas em uma mesma escala. Quando as mensurações são realizadas em escalas distintas, sem a possibilidade de conversão à uma mesma unidade (por exemplo, testes psicométricos diferentes para avaliar um mesmo estado de saúde), utiliza-se a diferença padronizada das médias (standarized mean difference – SMD), que consiste na divisão da diferença das médias dos dois grupos pelo desvio padrão comum a eles, gerando assim um valor correspondente a diferença em desvios padrões entre as duas intervenções avaliadas. Uma alternativa interessante, e que corresponde a um forte nível de evidência, é a elaboração de metanálises utilizando dados de pacientes individuais. Para tal há a necessidade da obtenção dos dados coletados para cada paciente, o que dificulta a utilização desse método. Metanálises envolvendo medidas repetidas, abordagem bayseana e inseridas dentro do contexto de modelos mistos, também podem ser realizadas, contudo o uso destes métodos ainda consiste em prática pouco comum. Meta-análise é a metodologia estatística de combinar resultados de diferentes trabalhos identificados em uma revisão sistemática sobre um tema específico. Esta forma de publicação representa uma importante ferramenta da medicina baseada em evidências, principalmente na ausência de um ensaio clínico de tamanho suficiente para provar eficácia terapêutica. Neste caso, meta-análises de ensaios clínicos pequenos ou médios são utilizadas para responder questões com um poder estatístico compatível com grandes ensaios clínicos. Precisamos então refletir sobre qual o nível de evidência de uma meta-análise dentro da hierarquiacientífica. Uma boa meta-análise substitui um grande ensaio clínico randomizado? Um estudo publicado em 1997 no New England Journal of Medicine por um grupo da Universidade de Montreal ajuda a refletir sobre esta questão: Discrepancies between Meta-analysis and Subsequent Large Randomized Controlled Trials (N Engl J Med 1997;337:536-42). Naquele estudo, foram comparados os resultados de 12 grandes ensaios clínicos randomizados e controlados com as meta- análises que os precederam: as meta-análises não previram corretamente o resultado dos ensaios clínicos em 35% das vezes. Um exemplo clássico em cardiologia foi a expectativa positiva gerada por uma meta-análise sobre o uso de magnésio no infarto do miocárdio. Esta expectativa foi desbancada pelo grande ensaio clínico ISIS-4, que não mostrou benefício do magnésio. Desta forma, embora as meta-análises sejam de grande valor, a palavra final depende de um grande ensaio clínico, com poder estatístico adequado para responder à questão de interesse. OBJETIVO 5: Explicitar as fontes públicas de dados, primárias e secundárias, disponibilizadas pelo Ministério da Saúde e outros órgãos. ➢ As fontes primárias podem ser editadas em papel ou em versões informatizadas. As bases de dados informatizadas e acessadas pela Internet têm se constituído na principal fonte de busca de informação. As fontes primárias são mais úteis para localização de informações no desenvolvimento de trabalhos de pesquisa ou divulgação científica, enquanto as fontes secundárias servem para aplicação prática, economizando o tempo que seria gasto na seleção e avaliação crítica da qualidade das informações. Em outras palavras, as fontes primárias servem primordialmente às atividades de pesquisa, elaboração de diretrizes ou à necessidade de informação mais recente para aplicação clínica, enquanto as fontes secundárias servem primordialmente aos profissionais que exercem atividades clínicas, precisam de informação confiável e usam a maior parte do seu tempo para cuidar da saúde das pessoas. • Existem fontes de informação que antecedem a publicação final de resultados de trabalhos científicos em andamento e poderiam ser classificadas como pré-primárias. É caracterizado por um metabuscador, que recupera ensaios clínicos randornizados em andamento por todo o mundo, e atualizado constantemente, contendo aproximadamente mais de 15 mil registros de ensaios em andamento. Além do próprio registro, oferece mais de 250 conexões, ou links, pela rede da Internet, para outras páginas que registram ensaios em andamento. • Fontes primárias de dados: Os dados provenientes de fontes primárias fornecem evidências diretas de um evento. A coleta de dados pode ser feita de maneiras distintas: censo populacional ou pesquisa nacional ou local (em geral inquéritos, amostrais ou não). Criar um sistema de informação para servir aos objetivos específicos produzirá dados primários. Ou seja, se diz que os indicadores são baseados em dados primários se a fonte de dados foi criada para atingir um objetivo específico. • O objetivo da na maioria dos sistemas de notificação de casos de tuberculose nos países é apoiar a vigilância e o controle da doença. Os indicadores gerados a partir desse sistema de informação são exemplos de indicadores produzidos com dados primários. De modo análogo, uma pesquisa de crianças em idade escolar cujo objetivo é estimar a prevalência de comportamentos de risco em uma amostra da população será considerada uma fonte primária sempre que for usada para esta finalidade. • Fontes secundárias de dados: Os dados de fontes secundárias são aqueles que foram originalmente coletados para outros propósitos. Dados obtidos de fontes existentes são considerados secundários. Embora essas fontes não tenham sido criadas para esta finalidade, facilitam a elaboração dos indicadores necessários. Dados obtidos de censos, pesquisas e sistemas de informação são exemplos de dados de fontes secundárias. ➢ Vantagens da fonte primária: 1. Maior controle da qualidade e coleta mais adequada com a normalização dos procedimentos, melhor definição das variáveis e da população-alvo de interesse, entre outros fatores. 2. Menor dificuldade de estratificar os indicadores em subgrupos populacionais de interesse (contanto que tenham sido coletadas as variáveis para atender aos propósitos de estratificação). 3. Maior comparabilidade dos indicadores no tempo e espaço devido à possibilidade de estabelecer maior normalização das definições e procedimentos usados entre os grupos, bem como à ampliação do período de análise (mais adequado aos objetivos propostos). ➢ Vantagens da fonte secundária: 1. Menor custo e maior senso de oportunidade na obtenção de dados e elaboração de indicadores. ➢ Desvantagens da fonte primária: 1. Maior custo e consumo de tempo para obter o dado, o que pode comprometer o senso de oportunidade do indicador (sobretudo no uso na gestão da saúde) e limitar o potencial de uso. ➢ Desvantagens da fonte secundária: 1. Maior esforço analítico para extração, definição e interpretação dos indicadores de interesse devido a: 1.1 Possibilidade de serem inadequados (quanto aos objetivos e indicadores de interesse) para definir o caso e a população-alvo 1.2 Dúvidas quanto à qualidade dos dados (falta de normalização dos procedimentos e capacitação dos encarregados por gerar os dados). 2. Maior dificuldade de estratificar os indicadores em subgrupos populacionais de interesse por potencial falta de variáveis relevantes que permitam essa estratificação. 3. Maior dificuldade de comparar os indicadores no tempo e espaço por possíveis mudanças nas definições e procedimentos usados. ➢ Atributos para selecionar fontes secundárias de dados: 1. Representatividade populacional: Diz respeito à ausência de viés de seleção da população que se pretende representar com o indicador. Amostras não representativas (por exemplo, amostras por conveniência ou em unidades-sentinela) ou com índice elevado de falta de resposta ou subnotificação dos sistemas de informação podem comprometer a representatividade de determinadas fontes de dados. Por exemplo, o sistema de informação sobre nascidos vivos de um país é um sistema universal porque se supõe que abrange todas as crianças nascidas vivas, em qualquer tipo de estabelecimento ou local onde tenha ocorrido o nascimento. Contudo, sabe-se que o nascimento de crianças em situação de maior vulnerabilidade (oriundas das áreas mais pobres ou zona rural ou indivíduos sem moradia ou indígenas) pode não ser registrado neste sistema. Neste caso, existe um viés na representatividade desses grupos da população. De modo semelhante, as pesquisas sobre vítimas da violência a partir de amostras de unidades- sentinela (serviços de saúde de referência para esse tipo de assistência) podem não ser representativas da população, entre outros porque este tipo de amostragem exclui de forma sistemática as vítimas com ferimentos menos graves ou ferimentos fatais que não chegam a ser atendidas em um serviço de saúde. 2. Periodicidade: Os dados podem ser coletados de forma contínua, como no registro civil, registro de câncer, sistemas de vigilância de doenças de notificação compulsória; de forma periódica, a intervalos regulares (por exemplo, o censo populacional a cada 10 anos e as pesquisas com crianças em idade escolar a cada três anos) ou sem periodicidade predefinida; e de forma pontual, ou uma única vez (por exemplo, os inquéritos de saúde sobre assuntos específicos e as pesquisas acadêmicas). Os estudos pontuais de saúde são reconhecidamente uma fonte útil de informação importante para elaborar indicadores específicos, porém têm utilidade limitada no monitoramento
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