Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
marina albuquerque 1 Insuficiência Cardíaca INTRODUÇÃO A IC é definida como uma síndrome em que o coração é incapaz de ofertar fluxo sanguíneo adequadamente aos tecidos por redução ou limitação para aumentar o débito cardíaco diante de aumento da necessidade, e/ou o faz à custa de elevação da sua pressão de enchimento. Geralmente, a IC resulta de disfunção estrutural ou funcional do coração, que compromete a sua capacidade de se encher de sangue e/ou de ejetá-lo. Pontos-chave: Insuficiência miocárdica: ocorre quando a função miocárdica é comprometida primariamente Insuficiência circulatória: se dá quando uma anor- malidade de algum componente da circulação secundariamente compromete o coração e é responsável pela manifestação da IC RELEVÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA Nos Estados Unidos, aproximadamente 5 milhões de pacientes apresentam IC. Na América Latina, incluindo o Brasil, a IC devida à doença de Chagas tem importante prevalência. No Brasil, estima-se que cerca de 300 mil internações ocorrem por conta da IC, consumindo milhões de reais por ano, sendo a primeira causa de internação pelo SUS por doença cardiovascular, e principal causa nos pacientes acima de 60 anos de idade. A incidência e a prevalência da IC aumentam com o crescimento da população acima dos 65 anos. A IC com fração de ejeção preservada é responsável por aproximadamente metade dos casos, acomete preferencialmente mulheres, pessoas de faixas etárias mais elevadas e hipertensos. A IC com fração de ejeção preservada é responsável por aproximadamente metade dos casos, acomete preferencialmente mulheres, pessoas de faixas etárias mais elevadas e hipertensos. Na América Latina, a prevalência de IC com fração de ejeção de ventrículo esquerdo reduzida é de 64 a 69%. TIPOS DE IC A IC pode ser classificada de várias formas. Essa classificação pode ser de acordo com o tipo de insuficiência cardíaca considerando condição clínica, hemodinâmica, funcional ou a etiologia. DURAÇÃO Aguda, subaguda ou crônica. IC aguda quando de recente começo e crônica de longa duração. Quanto maior a duração, mais completo o remodelamento (modificação do coração), com manifestações mais típicas de retenção hídrica periférica. Inversamente, na forma aguda, por exemplo, após um infarto agudo do miocárdio (IAM), pode não haver as manifestações crônicas, mas pode haver congestão pulmonar. O tratamento e o sucesso do tratamento são diferentes entre as duas formas. IC DE VENTRÍCULO DIREITO OU ESQUERDO OU MISTA Clinicamente, a IC esquerda caracteriza-se pela presença de sinais e sintomas de congestão pulmonar (dispneia aos esforços, tosse noturna, dispneia paroxística noturna, ortopneia, crepitações pulmonares). A IC direita está relacionada aos sinais e sintomas de congestão sistêmica (estase jugular, edema de membros inferiores, hepatomegalia dolorosa, ascite), ambas podem ter baixo débito cardíaco. A disfunção do ventrículo esquerdo pode causar disfunção do ventrículo direito. Essa classificação tem importância no diagnóstico diferencial de certas causas de IC em que pode predominar umas das manifestações. Por exemplo, a doença de Chagas tem manifestação de esquerdo e direito; a doença restritiva, com frequência, tem ascite; cor pulmonale apresenta manifestações de ventrículo direito comprometido. No entanto, pode haver congestão sistêmica sem disfunção importante de ventrículo direito por conta de retenção de sódio e água em razão da ativação do sistema renina-angiotensina--aldosterona. DÉBITO CARDÍACO Débito alto (rara) ou reduzido. Como exemplo, pacientes com tireotoxicose, fístula arteriovenosa, beribéri ou anemia importante e/ou doença de Paget podem apresentar débito cardíaco com valores elevados associadamente a sinais e sintomas de IC, caracterizando uma síndrome de alto débito. Nesse caso, a estratégia terapêutica é totalmente diferente da de baixo débito, que se caracteriza por sinais de má perfusão (pele fria, sudorese) e congestão. REDUÇÃO DE FRAÇÃO DE EJEÇÃO DE VENTRÍCULO Redução de fração de ejeção de ventrículo esquerdo (FEVE) ou direito (FEVD): quando a marina albuquerque 2 fração da FEVE e/ou FEVD é reduzida, é chamada sistólica ou mais comumente IC com fração de ejeção reduzida (IC FEVEr, sistólica); inversamente, é chamada de IC com FEVE preservada (FEVEp) (diastólica), quando a FEVE não é comprometida. Na IC com FEVEp, há dificuldade de enchimento do coração ou enchimento com pressões elevadas, mas o volume sistólico em repouso é preservado. CLASSE FUNCIONAL Correntemente utilizada na prática clínica, a classificação proposta pela New York Heart Association (NYHA) avalia a limitação de esforço em pacientes com IC. É útil na prática diária por ser de fácil aplicação e apresentar valor prognóstico. ESTÁGIOS Baseada na evolução e na progressão da IC, essa forma de estadiamento reflete o modelo fisiopatológico da IC, que considera essa síndrome como a via final comum a diferentes doenças cardíacas em indivíduos com fatores de risco. Essa representação da IC com caráter contínuo possui implicações preventivas, prognósticas e também terapêuticas. ESTABILIDADE De acordo com a estabilidade e as manifestações clínicas, a IC pode ser compensada, des- compensada (ou crônica que descompensou) ou persistentemente descompensada, quando os sinais/sintomas de descompensação persistem. Entende-se por descompensação o apareci- mento de sinais/sintomas, como edema ou hipoperfusão ou hipotensão, que determinam uma nova estratégia terapêutica de ambulatório ou a partir de admissão hospitalar. PERFIL HEMODINÂMICO A partir da presença de congestão e da hipoperfusão, foi desenvolvida a classificação clínico-hemodinâmica, sendo dividida em quatro situações distintas que apresentam implicação terapêutica e prognóstica. Conforme o perfil do paciente, o médico poderá escolher diferentes medicações e procedimentos terapêuticos como diurético ou volume ou drogas inotrópicas ou drogas vasodilatoras, ou combinação. OBSTRUÇÃO MECÂNICA Tem importância no diagnóstico e tratamento reconhecer se há obstrução ou disfunção marina albuquerque 3 mecânica que pode ser corrigida nas válvulas cardíacas, como estenose aórtica, estenose mitral, insuficiência aórtica, mitral, obstrução, tromboembolismo pulmonar agudo ou crônico. INTERMACS *INTERMACS = Interagency Registry of Mecha- nically Assisted Circulatory Support O objetivo do INTERMACS é classificar pacientes com IC para indicação do melhor tratamento, sobretudo quanto ao suporte inotrópico e uso de dispositivos. É uma classificação dirigida principal- mente para IC descompensada. INTERMACS I: O paciente mais grave é INTERMACS I (“crash and burn”): hipotensão importante com hipoperfusão grave, apesar das doses crescentes de inotrópicos, com aumento de lactato e/ ou acidose sistêmica necessitando de intervenção imediata. INTERMACS II: piorando apesar de inotrópicos. INTERMACS III: estável com inotrópicos por via endovenosa com dificuldade para retirar a dependência de inotrópicos. INTERMACS IV: episódios recorrentes de descompensação necessitando diurético por via endovenosa. INTERMACS V: paciente em casa com alguma difi- culdade para ir de uma sala a outra, pode estar congesto e com insuficiência renal. INTERMACS VI: sintoma depois de exercício de alguns minutos, sem congestão. INTERMACS VII: limitado para exercícios leves. FATORES DE RISCO PARA IC FATORES DE RISCO PARA IC FEVEP Idade, sexo feminino, obesidade, hipertensão arterial, diabetes melito, doença coronariana, doença renal e estenose aórtica. FATORES DE RISCO PARA A IC FEVER Idade, sexo masculino, hipertensão arterial, doença coronariana, aterosclerose, diabetes melito, obesidade,doença valvar, reação soroló- gica positiva para doença de Chagas, abuso de álcool/cocaína, uso de cigarro, dislipidemia, doença renal crônica, história de cardiomiopatia familiar, síndrome metabólica, albuminúria, quimioterapia para câncer, anemia, ephe- dra/tiazolidinediona, apneia do sono, vida sedentária, situação econômica desfavorável, estresse psicológico, características genéticas (α2CDel322-325, etc.), frequência cardíaca elevada e aumento dos níveis de homocisteína. QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO Em pacientes com IC, os achados de história e exame físico são de grande valor por fornecerem, além do diagnóstico da síndrome, informações sobre a etiologia e o prognóstico. Contudo, as manifestações não são específicas, podendo ser encontradas isoladamente ou em conjunto em outras doenças e situações (diagnósticos diferenciais). A presença de ortopneia e dispneia paroxística noturna, apesar de não serem patognomônicas, são sintomas mais específicos de IC. Dor torácica e palpitação são também queixas comuns, embora menos específicas. A dor torácica pode ser de característica anginosa, atípica ou ven- tilatório-dependente. Os antecedentes pessoais e familiares, bem como o interrogatório sobre os demais aparelhos, podem acrescentar dados fundamentais para inferência sobre a etiologia e a existência de comorbidades. DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS Doença de Parkinson, sequela de acidente vascular cerebral (AVC), demência/déficit cognitivo, anemia, hipotireoidismo, hipertire- oidismo, síndrome da fadiga crônica, doença pulmonar crônica obstrutiva, outras patologias pulmonares, obesidade, doença hepática, hipertensão pulmonar, infecção, insuficiência renal, tromboembolismo pulmonar agudo e crônico, síndrome da imunodeficiência adquirida (aids), senilidade e retenção hídrica. DIAGNÓSTICO Os critérios mais utilizados para o diagnóstico de IC crônica são os de Framingham e Boston. marina albuquerque 4 *mais recentemente têm sido utilizados outros mé- todos para demonstrar cardiomegalia, como ecocardiograma etc. A presença de dois critérios maiores ou um critério maior e dois critérios menores confirmam o diagnóstico de IC. O critério de cardiomegalia na radiografia de tórax, embora ainda importante, tem sido substituído pelos dados do ecocardiogarma ou de outros exames. Três quesitos são fundamentais para a possibilidade de diagnóstico de IC FEVEp com: 1. Presença de sinais ou sintomas de IC. 2. Presença de função ventricular esquerda normal ou pouco alterada (fração de ejeção > 45 a 50%). 3. Evidências de relaxamento anormal do ventrículo esquerdo ou distensibilidade reduzida com indicador de aumento de pressão de enchimento de ventrículo esquerdo. Na IC FEVEp, embora o padrão seja a comprovação de pressões elevadas intracardía- cas sem coração aumentado, dados ecocardio- gráficos de hipertrofia, associados a informações de Doppler tecidual ou de fluxo mitral e laboratoriais de BNP ou pró-BNP, podem auxiliar no diagnóstico (Figura 4). O Quadro 4 mostra aspectos práticos a serem investigados na diferenciação entre IC com FEVEr e IC com FEVEp. EXAME FÍSICO Os achados incluem manifestações próprias da doença cardíaca no coração e outras manifes- tações sistêmicas secundárias à IC ou à doença de base. marina albuquerque 5 Pontos-chave: IC com FEVEr: sistólica IC com FEVEp: diastólica Salienta-se o desvio do ictus cordis para baixo e para a esquerda quando presente o remodelamento cardíaco, a presença de sopros, elevação de pressão venosa jugular (especial- mente se for superior a 4 cm do ângulo esternal), edema de membros inferiores, hepatomegalia dolorosa, refluxo hepatojugular, estertores pulmonares, derrame pleural, ascite, taquicardia, galope de terceira ou quarta bulhas, pulso alternante, tempo de enchimento capilar lentificado (TEC>2 seg), taquipneia e cianose. A persistência de terceira bulha e de pressão venosa central elevada em pacientes tratados com IC confere pior prognóstico. Pode haver sinais de baixo fluxo sistêmico como palidez, sudorese, hipotensão e oligúria. CAUSAS DE IC A IC é a manifestação inicial ou final de muitas pa- tologias. Pode ser secundária a: 1. Doenças cardiovasculares sistêmicas como hipertensão arterial, aterosclerose (com suas várias manifestações, como infarto do miocárdio, cardiomiopatia isquêmica etc.), doenças das válvulas cardíacas ou doença congênita etc. 2. Cardiomiopatias primárias (de origem genética, mista ou adquirida) ou secundárias (Figura 5 e Quadro 5). marina albuquerque 6 3. Pericardiopatias. 4. Endocardiopatias. As etiologias mais frequentes da IC sistólica são cardiomiopatia dilatada idiopática, isquêmica (aterosclerose coronariana determinando infarto), doença de Chagas, hipertensão arterial, valvar, alcoólica, miocardite de origem indeterminada e periparto. A IC com FEVEp mais frequente está geralmente associada à disfunção diastólica, que, por sua vez, está relacionada à idade avançada, sexo feminino, obesidade, diabete melito, doença coronariana, doença renal e estenose aórtica (quadro 6). APRESENTAÇÃO CLÍNICA E HISTÓRIA NATURAL DA DOENÇA O paciente com IC pode se apresentar pela primeira vez ao médico em qualquer uma das fases da Figura 1. Quando na fase D, a sintomatologia inicial (IC “de novo”) pode ser IC aguda descompensada tendo como exemplo um IAM extenso com congestão (com ou sem edema agudo dos pulmões) (Figura 3); ou congestão associada com hipoperfusão; ou edema agudo dos pulmões secundário à crise hipertensiva; ou evolução progressiva de um qua- dro de redução da fração de ejeção ventricular sem tratamento ou diagnóstico prévio. Além disso, o quadro pode ser evolução progressiva de uma IC a partir da fase C ou piora em razão de um fator de descompensação. Dependendo da gravidade do quadro clínico, esses pacientes podem ser internados ou receber tratamento ambulatorial inicial. Não havendo melhora clínica o suficiente para obterem alta, os pacientes poderão ter indicação de transplante cardíaco, dispositivos de assistência ventricular, outros procedimentos cirúrgicos alternativos ou tratamento paliativo. Se obtêm alta hospitalar, passam por uma fase vulnerável em média até 90 dias da alta com alto risco de reinternação e morte. Depois dessa fase, os pacientes podem entrar numa fase de IC descompensada persistente quando a medicação otimizada não é totalmente efetiva, com maior risco de morte e hospitalização, ou em uma fase crônica compensada estável em que tardiamente poderá ter nova piora clínica em razão da progressão da IC ou piora por algum fator de descompensação, ou pela associação de evolução progressiva e fatores de descompensação. Durante sua jornada, os pacientes com IC podem ir a óbito pela cardiopatia de maneira súbita (em geral por arritmia ventricular) ou por evolução progressiva da doença, ou por doença ou comorbidade que seja secundária à IC. A causa mais frequente de óbito na forma mais estável da IC é a morte súbita, enquanto na fase instável é por IC progressiva ou comorbidade ou outra doença (menos frequente). FISIOPATOLOGIA MECANISMOS FISIOLÓGICOS DE ADAPTAÇÃO Dependendo de sua classificação, a IC pode apresentar particularidades na sua fisiopatologia. Ponto-chave: Os mecanismos mais importantes de adaptação do coração são o mecanismo de Frank--Starling, a hipertrofia ventricular, o aumento da frequência cardíaca e ativação neuro-hormonal. No entanto, quando cronicamente ativados, podem contribuir para a progressão da IC. O mecanismo de Frank-Starling é um dos principais mecanismos de adaptação, pois o aumento do retorno venoso permite um aumento do débito cardíaco e vice-versa. Além disso, aação da ativação neuro-hormonal permite um desvio da curva com aumento da contratilidade secundária e do débito cardíaco diante de um mesmo grau de enchimento ventricular. Na IC com FEVEp, o mecanismo de Frank-Starling fica comprometido pela dificuldade de enchimento ventricular. Outro mecanismo a influenciar a função cardíaca e o desenvolvimento ou piora da IC é a pós-carga (“after-load”). A pós-carga caracteriza-se pela força que se opõe à contração ventricular marina albuquerque 7 durante o esvaziamento do coração e obedece à lei de Laplace, em que o estresse parietal é diretamente proporcional à pressão e ao raio intraventricular e este é inversamente propor- cional à espessura da parede. O estresse sistólico é igual a: S = P x r/2h (S = estresse sistólico, P = pressão, r = raio, h = espessura). O estresse sistólico, respeitando a lei de Laplace, é um dos principais determinantes da hipertrofia e dilatação ventricular (remodelamento miocárdico). Quando há aumento da pressão intraventricular com consequente aumento do estresse da parede ventricular, há uma tentativa de adaptação para normalização do estresse com aumento da hipertrofia concêntrica em médio e longo prazo, e consequente tentativa de manutenção do desempenho. Ponto-chave: A ativação neuro-hormonal (figura 7) é um mecanismo agudo de adaptação que busca aumento de contratilidade, retenção de volemia, e redistribuição de fluxo sanguíneo visando à preservação de áreas nobres para o organismo como cérebro e coração. Caracteriza-se por aumento das catecolaminas, ativação do sistema renina--angiotensina-aldosterona, aumento da liberação de vasopressina, endotelina, citocinas inflamatórias e peptídeos natriuréticos (ANP e BNP). Em conjunto, os sistemas adrenérgicos e SRA- A são responsáveis pela preservação da volemia e manutenção da perfusão de órgãos centrais (rim, coração e cérebro) em estados de hipovolemia. Promovem aumento da contratilidade miocárdica, taquicardia, retenção de sódio e água e vasoconstrição sistêmica. O aumento da frequência é um mecanismo importante durante a fase aguda e nos processos de adaptação postural, alterações e retorno venoso, exercício etc., atuando como mecanismo de aumento de débito cardíaco concomitante com o aumento do volume sistólico. FISIOPATOLOGIA DA IC Na IC aguda com FEVEr (p. ex., IAM, miocardite etc.), há uma redução de volume sistólico aguda (volume ejetado) e o organismo se utiliza dos mecanismos de compensação para preservar o fluxo sanguíneo para os tecidos com prioridade para cérebro e coração, com sucesso dependendo do grau de comprometimento e da resposta aos mecanismos de adaptação. Há aumento da frequência cardíaca, ativação marina albuquerque 8 neuro-hormonal e utilização do mecanismo de Frank-Starling. Também a descompensação de quadro crônico pode determinar a piora do desempenho ventricular. O grau de perfusão tecidual poderá determinar lesões de múltiplos órgãos, com insuficiência renal, lesão hepática, lesão miocárdica, isquemia intestinal com translocação de toxinas etc., cujos graus poderão determinar o prognóstico e a sobrevida dos pacientes. A fisiopatologia da IC crônica com FEVEr está rela- cionada ao progressivo remodelamento do ventrículo esquerdo (Figura 8), com consequente dilatação, modificação de forma e redução progressiva da fração de ejeção consequente a uma “agressão” (p.ex.: IAM) inicial regional ou global ao miocárdio, que pode ter reduzido a fração de ejeção da sobrecarga sistólica ou diastólica (p. ex., hipertensão arterial, valvulopatia) ou doença de depósito, ou uma cardiomiopatia. Os mecanismos que foram ativados na fase aguda para adaptar o organismo a redução de desempenho do coração, cronicamente passam a contribuir para a progressão da doença, destacando-se a ativação neuro-hormonal. Cronicamente, as catecolaminas, assim como a angiotensina II e a aldosterona, promovem aumento do gasto energético miocárdico, aumento de pós-carga, aumento de apoptose de cardiomiócitos, aumento da deposição de colágeno no miocárdio e induzem arritmias. A vasopressina e a endotelina são potentes vasoconstritores associados à ativação do sistema adrenérgico e SRAA. O componente inflamatório da IC também tem importância na sua fisiopatologia pela produção de fator de necrose tumoral, interleucinas l e 6 e gamainterferona, promovendo catabolismo proteico, sendo relacionados ao surgimento de caquexia cardíaca. Os peptídeos natriuréticos (tipo A e tipo B, secretados pelos átrios e ventrículos, respectivamente, mediante sobrecarga pressórica ou volumétrica), promovem vasodilatação periférica e natriurese buscando contrabalançar os efeitos do SRAA e adrenérgico, no entanto, são invariavelmente in- suficientes. O aumento do estresse ventricular é que de- termina o aumento do BNP e pró-BNP. Pontos-chave: Do ponto de vista macroscópico, o remodelamento significa a dilatação e a perda da conformação cardíaca. O ventrículo esquer- do perde a forma elíptica e adquire forma marina albuquerque 9 esferoide, dilata-se e tem suas paredes adelgaçadas. Do ponto de vista microscópico, ocorre no miocárdio morte de cardiomiócitos por necrose e apoptose, com deposição de colágeno e fibroblastos; há hipertrofia dos cardiomiócitos remanescentes (a necrose ocorre por privação de oxigênio e energia, já a apoptose é um processo dependente de energia e está relacionada à ação de catecolaminas, angiotensina II, radicais livres, citocinas inflamatórias e sobrecarga mecânica). Outra questão aventada na patogenia da IC é o desequilíbrio entre morte celular e regeneração tecidual, uma vez que foi demonstrada a ca- pacidade de regeneração do músculo cardíaco. A IC com FEVEp aguda geralmente está associada a aumento de carga ventricular, quer seja pré-carga ou pós-carga, com ativação dos mecanismos de compensação como aumento da frequência cardíaca e ativação neuro- hormonal. Cronicamente, é caracterizada pelo remodelamento do ventrículo esquerdo em geral com hipertrofia e/ou fibrose, em geral sem dilatação, exceto para os átrios, que podem remodelar com dilatação. A isquemia, doença infiltrativa, doença de depósito, doenças do en- docárdio com fibrose e doença pericárdica com constrição e tamponamento também podem ser causas de alteração de função diastólica. A hipertrofia ventricular pode cronicamente se associar com redução de contratilidade, o que é chamada de hipertrofia desadaptada. Na disfun- ção diastólica, existe desvio da curva pressão- volume para cima e para a esquerda (o aumento da pressão diastólica ocorre sem aumento do volume diastólico) e não há mudança do volume sistólico ejetado (Figura 9). Contudo, enquanto uma hipótese sugere que as duas sejam entida- des diferentes, outra supõe que a IC com FEVEr seja evolução da IC com FEVEp. Na IC com FEVEp (diastólica), outros mecanismos podem estar envolvidos, como alterações do relaxamento e da complacência, redução da reserva de débito cardíaco, incompetência do aumento da frequência cardíaca, anormalidades extraventriculares, como disfunção de átrio esquerdo (com ou sem fibrilação atrial), rigidez arterial e redução da vasodilatação. A ativação neuro-hormonal geralmente está presente, mas o remodelamento só ocorre nas formas que evoluem tardiamente com dilatação. No entanto, na IC com função comprometida, a função diastólica também pode estar alterada. ETIOPATOGENIA Sobretudo nas formas adquiridas mais comuns, em que há agressão miocárdica com perda celular (p. ex., IAM) e sobrecarga hemodinâmica de células restantes ou na sobrecarga (p. ex.,HAS), há a ativação de diferentes vias de sinalizações intracelulares e mediadores, gerando um fenótipo específicoda IC que inclui hipertrofia do miócito, re-expressão de um padrão de genes de embrião (aumento da expressão de genes estruturais fetais, e diminuição da expressão de genes adultos estruturais) e remodelamento da matriz extracelular (Figura 8), resultando no remodelamento miocárdico com dilatação e fibrose. marina albuquerque 10 Na cardiomiopatia chagásica, importante causa de IC sistólica em nosso meio, a persistência do T. cruzi, associada a miocardite e fenômenos imunológicos, tem importância no desenvol- vimento da IC (Figura 11). Nas formas genéticas, genes resultantes de mutações ou transmitidos familiarmente podem codificar diferentes proteínas do sarcômero cardíaco, com mudanças macro e microestrutu- rais/ funcionais do coração (p. ex., cardiomiopatia hipertrófica, displasia de VD, ventrículo esquerdo não compactado, cardiomiopatia dilatada, cardiomiopatia restritiva não hipertrófica etc.). Nas cardiomiopatias secundárias e geralmente associadas à IC com FEVEp, há mecanismos pe- culiares, como infiltração ou depósitos de substâncias no miocárdio ou fibrose localizada. PROGNÓSTICO E ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO A IC apresenta mortalidade elevada, relacionada a inúmeros fatores clínicos, hemodinâmicos e laboratoriais, podendo ser reduzida mediante a instituição de tratamento adequado. Ocorre em razão de eventos arrítmicos (morte súbita) ou associados à progressão da doença. Escores para estratificar o risco dos pacientes com IC foram desenvolvidos. Entre os mais utilizados destacam-se o Heart Failure Survival Score (HFFS) e o Seattle Heart Failure Model (este último define o risco de mortalidade em 1, 2 e 5 anos, mediante os achados clínicos, funcionais, laboratoriais, eletro e ecocardiográficos, inclusive após instituição da terapêutica). INVESTIGAÇÃO DIAGNÓSTICA Apesar de o diagnóstico de IC poder ser realizado, na maior parte dos pacientes, com base em dados de anamnese e de exame físico, exames complementares são importantes, pois, além de confirmarem o diagnóstico, fornecem dados sobre o grau de remodelamento cardíaco, ativação neuro-hormonal, prognóstico, etiologia, existência de comorbidades, estratificação de risco e presença de disfunção sistólica e diastólica. ELETROCARDIOGRAMA Não revela alterações específicas que sejam indicativas da existência de disfunção ventricular, no entanto, um ECG normal torna pouco provável o diagnóstico de IC. Alguns achados podem sugerir etiologias específicas: 1) presença de ondas Q, ausência de progressão de onda R nas derivações precordiais e alterações de repolarização, especialmente do segmento ST, sugerem isquemia; 2) a associação de bloqueio de ramo direito e bloqueio divisional anterossuperior esquerdo sugere doença de Chagas; 3) baixa voltagem no plano frontal sugere doença de depósito e derrame pericárdico; A presença de bloqueio de ramo esquerdo, além de apresentar valor prognóstico, é fator de risco para a presença de dissincronia interventricular. As bradiarritmias e taquiarritmias podem ser a causa marina albuquerque 11 da IC, contribuir para seu agravamento e ter implicações prognósticas. RADIOGRAFIA DE TÓRAX Permite definir a forma do coração, bem como sugerir as câmaras envolvidas e mais acometidas; além disso, fornece informações sobre o pa- rênquima e a vasculatura pulmonares (presença de doença pulmonar primária, grau de congestão); A presença de índice cardiotorácico > 0,50 define cardiomegalia e favorece o diagnóstico de disfunção sistólica, O achado de área cardíaca normal sugere IC com função sistólica preservada (IC diastólica). ECOCARDIOGRAMA Método de eleição para documentação da disfunção cardíaca, uma vez que fornece in- formações anatômicas e funcionais, além de ser de acesso fácil, rápido e seguro. Permite definir o tamanho das câmaras (na sístole e na diástole), a espessura das paredes, a massa ventricular, a contração segmentar, a presença de trombos, o pericárdio, a definição das disfunções valvares de maneira anatômica e funcional, a medida in- direta da pressão sistólica do ventrículo direito, a avaliação da fração de ejeção e o grau de dissincronia. Por meio do Doppler pulsátil com medida do fluxo de enchimento do ventrículo esquerdo, define disfunção diastólica que, associada aos sintomas de IC e à função sistólica normal, proporciona o diagnóstico de IC diastólica. De acordo com o padrão de fluxo pela valva mitral durante diástole marina albuquerque 12 ventricular, a disfunção diastólica pode ser graduada em leve (onda E < A), moderada (padrão pseudonormal) e acentuada (padrão restritivo). O ecocardiograma pode apresentar limitações técnicas relacionadas à janela acústica inadequada, principalmente em pacientes com alterações de conformação torácica, obesos e com hiperinsuflação pulmonar. O método transesofágico pode ser utilizado nos pacientes com limitação técnica ao ecocardiograma convencional e, em especial, nos pacientes com cardiopatias congênitas e valvares complicadas (prótese, endocardite) e também para avaliar a presença de trombos atriais. Para avaliação de coronariopatia, incluindo extensão de isquemia e viabilidade miocárdica, existe a opção do estresse com dobutamina. MEDICINA NUCLEAR A ventriculografia radioisotópica (gated blood- pool) permite estimar, de maneira altamente reprodutível, as funções ventriculares esquerda e direita, bem como a motilidade regional (pode ser um método alternativo ao ecocardiograma para definição de função ventricular nos pacientes com janela acústica inadequada). A cintilografia de perfusão miocárdica (tálio ou sestamibi-Tc) com estresse físico ou farmacológico (adenosina, dipiridamol ou dobutamina) permite avaliar a presença de coronariopatia. Além disso, tálio e tomografia de emissão de prótons (PET) podem ser utilizados também para pesquisa de viabilidade miocárdica. A cintilografia com gálio permite avaliar a presença de inflamação, sendo indicada para pesquisa de miocardite. RESSONÂNCIA MAGNÉTICA Avaliação da anatomia cardíaca, incluindo função biventricular, contratilidade segmentar (áreas de discinesia, acinesia ou hipocinesia), espessura miocárdica, dissincronia intra e interventricular, cavidades e pericárdio. Pode ser utilizada para pesquisa de isquemia e viabilidade. ERGOESPIROMETRIA Método de avaliação da capacidade funcional por meio da análise de gases respiratórios. Define os limiares ventilatórios, a resposta ventilatória e o pico de consumo de oxigênio (VO2). Tem valor prognóstico, e pacientes com VO2 abaixo de 10 mL/kg/min têm alta mortalidade. Além disso, permite diferenciar a causa da dispneia (cardíaca ou pulmonar), avaliar a resposta a intervenções terapêuticas e auxiliar na prescrição de exercício. Outro parâmetro que parece demonstrar valor prognóstico é a inclinação da curva (slope) da relação ven- tilação/minuto e consumo máximo de CO2 (VM/VCO2). AVALIAÇÃO HEMODINÂMICA E CORONARIOGRAFIA Permitem a análise direta das pressões intracardíacas e intravasculares, oximetria, ventriculografia e cineangiocoronariografia. Dessa forma, fornecem dados importantes à definição etiológica e também à orientação da terapêutica. Suas indicações específicas incluem: definição da anatomia coronariana, na suspeita de etiologia isquêmica, avaliação de presença de doença arterial coronariana obstrutiva, quando os métodos não invasivos não permitiram o diag- nóstico; avaliação de pacientes candidatos a transplante cardíaco; discriminação da disfunção diastólica (especialmente nas doenças pericárdi- cas e de depósito). A avaliação hemodinâmica pode também ser realizada à beira do leito com o cateter de artéria pulmonar, e utilizada para manuseio de pacientes com choque cardiogênicoe avaliação da resistência vascular pulmonar para indicação de transplante cardíaco. Não se recomenda avaliação hemodinâmica rotineira para acompanhamento, bem como para tratamento da IC descompensada. BIÓPSIA ENDOMIOCÁRDICA Pode ser útil em casos de IC de etiologia indefinida, particularmente em suspeita de doenças de depósito e inflamatórias (amiloidose, hemocromatose, sarcoidose, miocardite) ou com bloqueio atrioventricular total. Seu uso rotineiro não está indicado em pacientes com IC, contudo, pode ser considerada em pacientes com deterioração da função cardíaca de origem desconhecida que não respondem à terapêutica médica. Utilizada para o diagnóstico e controle de rejeição em pacientes transplantados. PEPTÍDIO NATRIURÉTICO * Tipo B (BNP) ou NT pro-BNP Produzido pelos ventrículos mediante aumento do estresse. Está elevado na insuficiência sistólica e diastólica, hipertrofia ventricular esquerda, valvopatias, isquemia aguda ou crônica, hipertensão e embolia pulmonar. Relaciona-se diretamente ao prognóstico e à gravidade da doença e pode ser utilizado para monitorar a resposta ao tratamento. Uma concentração de BNP normal ou baixa torna pouco provável o diagnóstico de IC, sendo método interessante para o diagnóstico diferencial de dispneia na sala de emergência. marina albuquerque 13 POLISSONOGRAFIA Útil para o diagnóstico dos distúrbios respiratórios do sono, especialmente as apneias, que têm relação direta com algumas comorbidades cardíacas, como coronariopatias, arritmias e hipertensão arterial, além de serem consideradas preditoras de mau prognóstico na IC. ECG DE 24 HORAS (HOLTER) Importante para investigação de pacientes com queixa de palpitações ou história de síncope. Permite diagnosticar arritmias intermitentes (atriais ou ventriculares), apresentando implicação terapêutica e prognóstica. O achado de extrassístoles ventriculares, especialmente acima de 10/hora aumenta o risco de morte, assim como presença de taquicardia ventricular não sustentada ou sustentada. Permite avaliar a variabilidade da frequência cardíaca (marcador de equilíbrio autonômico, reduzido na IC), que apresenta valor prognóstico sobretudo nos isquêmicos (risco de arritmias ventriculares). Seu uso rotineiro na IC não está recomendado. EXAMES LABORATORIAIS A avaliação laboratorial inicial dos pacientes com IC tem por objetivo identificar a gravidade e a presença de condições clínicas associadas (anemia, policitemia, dislipidemia, sobrecarga de ferro, insuficiência renal, diabete melito, tireoidopatias). Rotineiramente, recomenda-se a coleta de hemograma, eletrólitos, função renal, glicemia, função hepática, uroanálise e perfil lipídico, além de perfil tireoidiano, especialmente em idosos e na presença de fibrilação atrial. A sorologia para doença de Chagas deve ser realizada em pacientes com epidemiologia positiva, uso prévio de hemoderivados e possível transmissão vertical. O acompanhamento do tratamento medicamentoso com diuréticos, inibidores da ECA, antagonistas dos receptores da angiotensina, antagonistas da aldosterona e betabloqueadores deve incluir a avaliação periódica de eletrólitos (em especial o potássio) e função renal. COMORBIDADES Para melhor prognóstico, é necessário o controle das comorbidades presentes. As comorbidades mais comuns que coexistem nos pacientes com IC são: anemia, disfunção erétil, apneia do sono, depressão, caquexia cardíaca, insuficiência renal (síndrome cardiorrenal), angina, hipertensão arterial, osteoartrite, distúrbios da tireoide, doença pulmonar obstrutiva crônica, fibrilação atrial e diabetes. TRATAMENTO TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO Nutrição, sal e água Recomenda-se restrição hídrica e salina, dependendo do sódio plasmático e da tolerância do paciente para se alimentar com dieta pobre em sal. Em relação ao sal, não existe definição do grau de restrição, que está intimamente relacionado ao grau de descompensação (dieta de aproximadamente 3 a 6 g/dia de cloreto de sódio para pacientes com IC leve a moderada e 2 g para IC grave sem hiponatremia); também é variável o grau de restrição hídrica, orientando-se o paciente na prática clínica conforme a gravidade da IC (600 a 1.000 mL/dia para pacientes mais graves). Uma vez que o álcool deprime a contratilidade miocárdica, sua utilização deve ser evitada. Exercício Promove aumento da atividade vagal, di- minuição da atividade simpática e mobilização de células progenitoras endoteliais. A realização de um programa regular de exercícios físicos apresenta efeitos benéficos principalmente sobre a tolerância ao esforço e melhora da qualidade de vida. Na cardiomiopatia isquêmica, foi ainda observada redução de mortalidade. A atividade física pode ser indicada na IC compensada. Vacinação Nos pacientes com IC, recomenda-se a profilaxia contra influenza (anualmente) e pneumococo (reforço após os 65 anos). Clínicas de IC As clínicas de IC são unidades especializadas no seu tratamento e constituídas por cardiologista, enfermeiro especializado em IC, equipe multidisciplinar (nutrição, psicologia, fisiologia do exercício, psicologia e assistência social). Têm por objetivo o acompanhamento intensivo do paciente mediante orientação continuada sobre a própria doença e a importância do tratamento, além de permitir contato facilitado do paciente com os integrantes da equipe, valorizando os primeiros sintomas de descompensação. TRATAMENTO MEDICAMENTOSO DA IC FEVER (SISTÓLICA) CRÔNICA Diuréticos Sua utilização é indiscutível para melhora dos sintomas de congestão. Atuam mediante a marina albuquerque 14 espoliação de sódio e água e promovem redução do volume intravascular, vasodilatação (pela redução do sódio arteriolar) e aumento na secreção renal de prostaglandinas (vasodilata- doras). Estão indicados em todos os estágios de IC. Existem três classes de diuréticos: de alça, tia- zídicos e poupadores de potássio. Diuréticos de alça Inibem o transporte de sódio e cloro para o espaço intracelular na alça de Henle. Apre- sentam início de ação rápida e meia-vida curta. A forma intravenosa é interessante nos quadros de edema agudo de pulmão (pelo aumento da capacitância venosa com consequente diminuição da pré-carga, mesmo antes do efeito diurético) e em pacientes descompensados com congestão esplâncnica (absorção inadequada de diurético via oral). Seus efeitos colaterais incluem hipocalemia, hipomagnesemia e hipocalcemia; a utilização de diuréticos de alça, mesmo em doses baixas, em pacientes sem hipervolemia, pode levar à desidratação com decorrente piora da função renal e alcalose metabólica (por causa da intensificação do hiperaldosteronismo secundário já presente na IC), devendo ser evitada. Diuréticos tiazídicos Inibem o transporte de sódio e cloro para o intracelular no túbulo contornado distal. Demons- tram potência inferior, início de ação mais tardio e meia-vida mais prolongada quando comparados aos diuréticos de alça. Contraindicações: não devem ser utilizados nas situações de descompensação aguda, exceto em associação com diuréticos de alça. Apresentam efeito reduzido nos pacientes com taxa de filtração glomerular diminuída. Em pacientes com IC avançada, uso de altas doses de diurético de alça e baixa resposta diurética, a associação de um tiazídico mostra-se geralmente efetiva. Os efeitos colaterais dos tiazídicos são sobretudo eletrolíticos (hipocalemia, hipomagnesemia, hipercalcemia) e metabólicos (hiperuricemia, hipertrigliceridemia, hiperglicemia e hipercoleste- rolemia), sendo estes reduzidos com a utilização de doses mais baixas. Diuréticos poupadores de potássio A amilorida e o triantereno inibem diretamente a secreção de potássio no túbulodistal; já a espironolactona é um antagonista da aldoste- rona. Apresentam baixo poder diurético, início de ação tardio e duração de ação mais prolongada. São geralmente utilizados em associação com outros diuréticos. O efeito colateral mais frequente é a hipercalemia, principalmente em pacientes com alteração da função renal e na associação com IECA e/ou BRA. A ginecomastia é relativamente frequente com a espironolactona. marina albuquerque 15 Digitálicos Apresentam efeito inotrópico promovendo aumento do cálcio intracelular mediante a inibi- ção da bomba Na-K-ATPase. Modulam a ativação neuro-hormonal por meio da redução da atividade simpática, estimulando a ação vagal e aumentando a sensibilidade dos reflexos barorreceptores e cardiopulmonares, com consequente diminuição no consumo de oxigênio. Apresentam janela terapêutica estreita (níveis terapêuticos próximos aos tóxicos) e seus efeitos colaterais incluem sintomas gastrintestinais, neurológicos, arritmias atriais, ventriculares e bloqueios atrioventriculares. Nos pacientes com insuficiência renal, a digoxina deve ser utilizada com cautela, bem como na presença de arritmias ventriculares, bradiarritmias, bloqueios atrioventri- culares em idosos e no IAM. A bradicardia associada ao uso dos betabloqueadores pode limitar a utilização dos digitálicos. Atualmente, são preconizadas doses menos elevadas de digoxina (0,125 a 0,25 mg/dia). Os digitálicos estão indicados para pacientes sintomáticos com IC sistólica e nos assintomáticos com fibrilação atrial e resposta ventricular elevada. O uso do digital na IC tem sido cada vez mais contestado. Betabloqueadores O tratamento com betabloqueadores resulta em melhora da função ventricular e dos sintomas, redução das hospitalizações, revertendo o remodelamento miocárdico e diminuindo a mortalidade. Existem quatro betabloqueadores disponíveis para o tratamento da IC com efetividade com- provada: succinato de metoprolol, bisoprolol, carvedilol e nebivolol. Betablock: Succinato de metoprolol Apresenta seletividade para o bloqueio do receptor beta-1, sem ASI, e é de liberação prolongada. Pela seletividade beta-1 e ausência de efeito alfabloqueador, o metoprolol pode ser interessante nos pacientes com antecedente de broncoespasmo e níveis pressóricos mais reduzidos. Betablock: Bisoprolol Alta seletividade para o bloqueio do receptor beta-1, sem ASI. Betablock: Carvedilol Betabloqueador não seletivo de terceira geração com propriedade vasodilatadora moderada (alfabloqueio), sem ASI. Reduz a mortalidade de pacientes com IC em diferentes classes funcionais. Betablock: Nebivolol Foi demonstrada redução de mortalidade ou hospitalização cardiovascular em pacientes idosos > 70 anos com IC. É bloqueador beta-1 seletivo com propriedades vasodilatadoras relacionadas com modulação de óxido nítrico. Pontos-chave: A introdução dos betabloqueadores na IC deve ocorrer na ausência de descompensação clínica, em pacientes normovolêmicos, sem necessidade de inotrópico. Devem ser iniciados em doses baixas, com titulação lenta e progressiva, conforme a tolerância e resposta clínica (dobrar a dose a cada 2 semanas até atingir as doses-alvo) por causa da possibilidade de piora da função cardíaca ao início do tratamento. Em pacientes com maior massa corpórea, podem ser utilizadas doses maiores que as preconizadas, sendo a frequência cardíaca um parâmetro de resposta clínica. As contraindicações aos betabloqueadores incluem bloqueios atrioventriculares avançados, doença arterial periférica grave, asma brônquica e doença pulmonar obstrutiva grave. Os pacientes com cardiopatia da doença de Chagas apresentam maior incidência de marina albuquerque 16 bradicardia, bloqueios e IC direita, dificultando a utilização dos betabloqueadores. Todavia, atualmente tem-se recomendado a tentativa de utilização dos betabloqueadores nos pacientes com cardiopatia da doença de Chagas sintomáticos com disfunção ventricular. Ponto-chave: De maneira resumida, os betabloqueadores succinato de metoprolol, bisoprolol e carvedilol são indicados para o tratamento da IC sistólica em todos os pacientes sintomáticos (CF II a IV) e também nos assintomáticos (CF I), em especial nos pacientes com disfunção ventricular esquerda pós-IAM. IECA: Inibidores da enzima conversora de angiotensina A partir da década de 1980, tornaram-se a base para o tratamento da IC, juntamente aos betabloqueadores. Seu mecanismo de ação baseia-se na inibição da ECA, que propicia a diminuição da síntese de angiotensina II e elevação de bradicininas, gerando alterações hemodinâmicas (redução da pré e pós-carga, vasodilatação da arteríola eferente renal) e neuro-hormonais (redução de aldosterona, endotelina, vasopressina, atividade simpática) com consequente redução do remodelamento ventricular e de eventos cardiovasculares. Efeitos colaterais mais frequentes dos IECA incluem tosse seca, hipotensão, piora da função renal e hipercalemia. Outros efeitos colaterais menos frequentes, porém mais graves, e que geralmente indicam a suspensão dos IECA, incluem edema angio-neurótico, hepatite e neutropenia. Contraindicações formais aos IECA incluem: hipersensibilidade, gravidez (teratogenia) e estenose bilateral das artérias renais. O benefício está na utilização das maiores doses (doses-alvo). BRA: Bloqueadores dos receptores da angiotensina II Perfil terapêutico muito semelhante aos IECA. Seu mecanismo de ação está relacionado ao antagonismo dos receptores AT1 da angiotensina II, sem atividade sobre a produção de bradicinina. Demonstram resultados favoráveis para a redu- ção de morbidade e mortalidade na IC, sendo opção interessante para os pacientes que não toleram IECA (principalmente por conta da tosse). Apresentam efeitos colaterais de piora da função renal e hipercalemia e também são contraindicados na gestação. Antagonistas da aldosterona O bloqueio da aldosterona promove experimentalmente a redução da síntese e da deposição miocárdica de colágeno e também da retenção de sódio e água. A administração de 25 a 50 mg de espironolactona demonstrou redução de morbidade e mortalidade em pacientes com IC nas classes funcionais III e IV. A eplerenona apresentou benefício de mortalidade em pacientes assintomáticos com disfunção ventricular após o IAM. Vasodilatadores diretos A associação de hidralazina/nitrato é capaz de reduzir a mortalidade de pacientes com IC, porém seu efeito é inferior ao dos IECA. A hidralazina é um vasodilatador arterial direto que propicia redução da resistência vascular periférica e, consequentemente, aumento do débito cardíaco, diminuindo as pressões de enchimento e aumentando discretamente a frequência cardíaca. Os efeitos colaterais incluem rubor, cefaleia, edema, síndrome lúpus-símile. Os nitratos promovem redução sobretudo da pré- carga, sendo drogas interessantes nos pacientes com descompensação aguda da IC por hipervolemia. Entre as limitações, destacam-se a ocorrência de tolerância (minimizada com maior número de horas livres do uso) e hipotensão postural, principalmente em hipovolêmicos. marina albuquerque 17 A associação de hidralazina/nitrato é indicada em pacientes que apresentam contraindicação a IECA ou BRA sobretudo por hipercalemia e insuficiência renal; torna-se interessante em pacientes que apresentam potencial de vasodilatação após dose máxima de IECA ou BRA. Anticoagulação Indicada como prevenção em pacientes com trombos intracavitários, fibrilação atrial e infarto anterior extenso ou evento embólico pregresso. Antiarrítmicos Os de classe I são contraindicados na IC. Atual- mente, o uso de amiodarona na IC se restringe à manutenção de ritmo sinusale ao controle de frequência em pacientes com fibrilação atrial e na prevenção secundária de morte súbita, geralmente associada a CDI (reduzindo a frequência de choques). Redução da frequência cardíaca A FC de repouso é um marcador de risco na IC. Na IC crônica, quanto maior a FC pior o prognóstico. Em pacientes com IC com FEVEr e FC de repouso maior ou igual do que 70 batimentos por minuto, a ivabradina, um inibidor do nó sinusal que atua reduzindo a FC, reduziu hospitalização e mortalidade por IC. Ômega 3 O uso de ácidos graxos poli-insaturados ômega-3 reduziu a mortalidade de pacientes com IC, em- bora o efeito tenha sido de pouca intensidade. TRATAMENTO CIRÚRGICO DA IC FEVER (SISTÓLICA) Terapia de ressincronização No bloqueio de ramo esquerdo (BRE), existe dissincronia de ativação ventricular com consequente perda do desempenho cardíaco. Indicada em pacientes com disfunção ventricular (FE < 35%), CF III persistentes, na vigência de tratamento clínico otimizado, na presença de bloqueio de ramo esquerdo e duração do QRS acima de 150 msec. Cardiodesfibriladores implantáveis (CDI) Nos pacientes com IC e disfunção ventricular, o CDI está indicado como prevenção secundária da taquicardia ventricular sustentada ou morte súbita revertida. Na prevenção primária de pacientes com FE < 35%, clinicamente otimizados, tanto em isquêmicos (40 dias pós-IAM) como em não isquêmicos, estudos demonstraram benefício de redução de mortalidade. Revascularização miocárdica e aneurismec- tomia/ reconstrução ventricular A revascularização é indicada na presença de angina de peito intolerável e anatomia favorável. Pode ser considerada na ausência de angina de peito, quando há evidência por método com- plementar de áreas significativas de isquemia e viabilidade. Em pacientes com cardiomiopatia isquêmica, áreas discinéticas ventriculares e sintomas de IC refratários ao tratamento clínico ou recorrência de arritmias ventriculares, a aneurismectomia ou reconstrução, associada ou não à revascularização miocárdica, pode ser opção terapêutica. Somente casos selecionados devem ser submetidos à cirurgia de revascularização miocárdica. Correção da insuficiência mitral A insuficiência da valva mitral nas cardiomiopatias dilatadas ocorre principalmente por conta da dilatação do anel atrioventricular. Os resultados desse procedimento na IC demonstram sobretudo a melhora da classe funcional. Dispositivos de assistência ventricular Indicados como ponte para transplante (em pacientes em que o suporte medicamentoso, incluindo drogas vasoativas, não é suficiente para manutenção do estado circulatório), ponte para recuperação do miocárdio (p. ex., miocardites, periparto) ou terapia de destino (IC terminal sem perspectiva de outro tratamento). Os dispositivos de uso de curta incluem o balão intra-aórtico (BIA), ECMO, TandenHeart e CENTRIMAG. Os dispositivos de longa duração em geral são de fluxo contínuo. Os dispositivos de assistência ventricular-ven- trículos artificiais podem ser implantados para destino (definitivos) e suas complicações estão relacionadas principalmente a fenômenos trombo-hemorrágicos e infecção. Cada vez mais o dispositivo tem sido utilizado no tratamento da IC, sobretudo em razão da escassez de doadores, já superando o número de transplantes cardíacos. Eles reduzem a mortalidade na IC avançada. Transplante cardíaco Capaz de aumentar a sobrevida de pacientes com IC avançada ou choque cardiogênico. Suas indicações incluem: CF III e IV refratárias, com tratamento medicamentoso otimizado, VO2 <10 mL/kg/min, na ausência de contraindicações (hipertensão pulmonar, idade acima de 65 anos, insuficiência renal, diabetes com lesão de órgãos- alvo, entre outras). Suas limitações estão relacionadas principal- mente à falta de doadores. Após o transplante, as complicações mais frequentes são rejeição aguda, infecção, doença vascular do enxerto e neoplasias. marina albuquerque 18 TRATAMENTO DA IC CRÔNICA COM FEVEP (DIASTÓLICA) Tratamento da IC aguda ou descompensada As descompensações da IC são muito frequentes, sendo responsáveis pela maior parte dos recursos gastos com IC. Na abordagem do paciente que chega à unidade de emergência com descompensação, alguns aspectos importantes incluem as causas de descompensação, função ventricular e forma de apresentação. Fatores de descompensação As causas mais comuns de descompensação estão relacionadas à má adesão ao tratamento (incluindo ausência de restrição hidrossalina e uso inadequado das medicações). A busca pela causa de descompensação é sem- pre muito importante, uma vez que pode implicar terapêuticas específicas (tratamento de infecção, reversão de bradi ou taquiarritmias, estratégias de revascularização nas situações de isquemia miocárdica). Tratamento não medicamentoso A maioria dos pacientes com IC descompensada precisa ser internada para melhora rápida da sintomatologia e pelo risco de óbito. O objetivo inicial é manter saturação de oxigênio arterial acima de 90%, reduzir sintomatogia e manter boa perfusão tecidual. O uso de ventilação assistida não invasiva com pressão positiva pode ser de auxílio nos casos de importante congestão pulmonar ou edema agudo dos pulmões. Intubação orotraqueal pode ser indicada na presença de insuficiência respiratória não responsiva a procedimentos não invasivos. Opiáceos podem ser indicados para diminuir o desconforto e a ansiedade na insuficiência respiratória. Tratamento medicamentoso Com base nos perfis hemodinâmicos (figura 4), utilizando parâmetros de congestão e perfusão, é possível estabelecer um racional para o tratamento das descompensações da IC com o uso de volume, diuréticos, vasodilatadores, inotrópicos ou vasoconstritores com efeito inotrópico. Os pacientes com predomínio de congestão pulmonar e perfusão periférica adequada (padrão “quente e úmido”) representam a maioria dos acometidos por descompensação e seu tratamento se dá com vasodilatadores e diuréticos. Nas situações de congestão associada à má perfusão periférica (padrão “frio e úmido”), os inotrópicos estão indicados, geralmente associados a diuréticos; em condições de monitoração hemodinâmica mais avançada, também é possível a utilização de vasodilatadores endovenosos. O achado de má perfusão sem congestão pul- monar é raro (padrão “frio e seco”) e costuma responder à expansão volêmica (inotrópico pode ser necessário). Inotrópicos Classificados em agentes que aumentam o cálcio intracelular (dobutamina e milrinona) e agentes sensibilizadores do cálcio (levosimendam). Em geral, as medicações inotrópicas estão associadas a aumento de arritmias. Dobutamina: efeito β1 > β2. Está indicada no paciente apresentando má perfusão periférica e congestão pulmonar. No paciente hipotenso por disfunção miocárdica grave, seu uso geralmente promove melhora hemodinâmica sem a necessidade de vasopressores (dopamina e noradrenalina). Milrinona: inibidor da fosfodiesterase, pro-move aumento do cálcio intracelular (independen- temente dos receptores beta-adrenérgicos). Pode ser interessante em pacientes usuários de betabloqueador. Tem efeito vasodilatador pulmonar. Por causa da vasodilatação periférica, deve ser utilizado com cuidado em pacientes hipotensos. Levosimendam: ação dupla, inotrópica e vasodilatadora. Efeito inotrópico aumentando a sensibilidade ao cálcio já existente no intracelular. Deve ser evitado ou utilizado com cuidado em pacientes hipotensos. Dobutamina Tem efeito α1, β1, e dopa 1,2 dependendo da dose. Não é para indicação inicial, e pode ser indicada para pacientes com dificuldade para manutenção de pressão arterial sistêmica para manter perfusão tecidual. Noradrenalina Efeito α1 > β1com potente efeito vascoconstritor com pouco efeito no débito cardíaco, portanto marina albuquerque 19 não é medicação ideal para ser usada prima- riamente na IC. Nos pacientes não responsivos ao uso de outros inotrópicos para manutenção de pressão arterial sistêmica, a noradrenalina pode ser utilizada isoladamente ou em associação ou outras drogas inotrópicas. Vasodilatadores Atuação sobre a pré e a pós-carga do coração, exigindo menor consumo metabólico miocárdico que os inotrópicos, o que acarreta em situação fisiopatológica mais favorável. Nitroglicerina: capaz de diminuir a pressão de enchimento ventricular, aliviando a congestão. Tem sua principal indicação nos pacientes com IC de etiologia isquêmica. A tolerância é um efeito comum na administração prolongada dos nitratos orgânicos. Nitroprussiato de sódio: tem metabolização rápi- da e importante efeito vasodilatador, reduzindo drasticamente a resistência vascular sistêmica e pulmonar. Atua como venodilatador, diminuindo a pressão de enchimento, e arteriodilatador, melhorando a complacência arterial e o acoplamento ventrículo-arterial. É contraindicado em pacientes com isquemia coronariana aguda pela ocorrência de fenômeno de roubo e piora da isquemia. Neseritide É um peptídeo natriurético recombinante tipo-B com importante efeito vasodilatador que pode ser utilizado para tratar dispneia e congestão pul- monar na ausência de hipotensão. Em doses elevadas foi associado ao desenvolvimento de insuficiência renal. Tratamento das obstruções mecânicas ou insuficiências valvares O tratamento cirúrgico ou percutâneo das valvulopatias com obstrução mecânica ou insuficiência valvar tem o objetivo de evitar o desenvolvimento da IC ou evitar a sua evolução progressiva. Geralmente quando a IC aparece, este é um sinal de evolução tardia da doença, ex- ceto na estenose mitral. Como causas mais frequentes estão a estenose aórtica, a insuficiência aórtica, a estenose mitral e a insuficiência mitral. DOENÇA DE CHAGAS SINTOMAS GASTROINTESTINAIS No Brasil, a doença de Chagas é o principal fator etiológico para acalasia, uma vez que o Brasil é considerado um país endêmico para chagas, especialmente nos estados da Bahia, Minas Gerais, São Paulo e Goiás. Estima-se uma população de quase seis milhões de infectados, com uma média de 12.000 mortes anuais pela doença (em 2010). Estima-se que existem hoje entre 70.000 e 170.000 pacientes com a apresentação digestiva da doença de chagas, que tipicamente resulta na esofagopatia chagásica ou no megacólon chagásico. A acalasia resulta da inflamação e degeneração dos neurônios presentes na parede do esôfago. A invasão dos plexos mioentéricos de Auerbach e Meissner pelo Trypanosoma Cruzi, protozoário causador da doença de Chagas, causa disfunção do relaxamento do EEI, ao mesmo tempo em que lesa neurônios importantes para a peristalse do corpo esofagiano. A destruição dos neurônios colinérgicos do plexo mioentérico, bem como dos neurônios que produzem óxido nítrico, afeta o EEI, causando aumento da sua pressão basal e perda da capacidade de relaxamento adequado do esfíncter. Na musculatura lisa da parede do esôfago, a perda desses neurônios inibitórios causa aperistalse. Referências MARTINS, M.D.A.; CARRILHO, F.J.; ALVES, V.A.F.; CASTILHO, E. Clínica Médica, Volume 2: Doenças Cardiovasculares, Doenças Respiratórias, Emergências e Terapia Intensiva. Editora Manole, 2016. 9788520447727. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/book s/9788520447727/. Acesso em: 16 Aug 2021 SANAR. Acalasia: definição, epidemiologia e fisiopatologia. SanarFlix, 2019. Disponível em: https://www.sanarmed.com/acalasia. Acesso em: 16 Aug 2021
Compartilhar