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1 EFEITOS NEGATIVOS DA ESPECIALIZAÇÃO PRECOCE NO ATLETISMO SOBRE O DESENVOLVIMENTO MOTOR E PSICOLÓGICO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES Andrade, Claudio J. E. de Bacharel em Educação Física pela UNIP Projeto de Pós-Graduação / Especialização Em Treinamento Desportivo pela FAMART Sorocaba-SP/Jul-2021 RESUMO A atividade física tem uma grande importância na vida das pessoas atualmente, e o atletismo é um esporte que vem crescendo a cada dia, fazendo com que a busca pela inserção das crianças no esporte seja constante. Com isso, nos traz a preocupação de que as crianças sejam inseridas precocemente no esporte, adiantando fases de seu desenvolvimento motor, físico e psicológico. Essa revisão de literatura, cujo objetivos de estudo foram os Efeitos Negativos da Especialização Precoce no Atletismo sobre o desenvolvimento motor e psicológico de crianças e adolescentes, trouxe à luz a preocupação do educador físico em respeitar as fases de desenvolvimento, seja ele motor, físico ou psicológico do jovem talento, ao mesmo tempo em que deve incentivá-lo à prática esportiva. Foram analisados alguns tópicos importantes com a ajuda da literatura existente, tais como: Aspectos motores durante o crescimento e desenvolvimento da criança, A importância da atividade física e do esporte para o desenvolvimento infantil – a participação do Atletismo, Iniciação esportiva – como adaptar no atletismo e Treinamento e especialização precoce no atletismo e suas consequências psicológicas. Com isso, foi possível identificar que a prática da atividade física é importante na vida da criança e é possível realizá-la de uma forma harmoniosa e sem cobranças, para que suas habilidades motoras sejam aproveitadas em outras modalidades esportivas. É um forte desejo que esse estudo possa conscientizar os profissionais da área da educação física sobre a importância de se respeitar todas as fases de desenvolvimento, e, na mesma via, também relatar a importância da prática da atividade física desde a infância. Palavras-chave: Atletismo. Desenvolvimento Infantil. Iniciação Esportiva. Especialização Precoce. 2 ABSTRACT Physical activity is of great importance in people's lives today, and athletics is a sport that is growing every day, making the search for the insertion of children in sport a constant. With this, it brings us the concern that children are inserted early in the sport, advancing phases of their motor, physical and psychological development. This literature review, whose study objectives were the Negative Effects of Early Specialization in Athletics on the motor and psychological development of children and adolescents, brought to light the concern of the physical educator to respect the stages of development, whether motor, physical or psychological support of the young talent, while encouraging him to practice sports. Some important topics were analyzed with the help of the existing literature, such as: Motor aspects during the child's growth and development, The importance of physical activity and sport for child development - the participation of Athletics, Sports initiation - how to adapt in athletics and Early training and specialization in athletics and its psychological consequences. Thus, it was possible to identify that the practice of physical activity is important in the child's life and it is possible to perform it in a harmonious way and without charges, so that his motor skills can be used in other sports. It is a strong desire that this study can raise the awareness of professionals in the field of physical education about the importance of respecting all stages of development, and, in the same way also report the importance of practicing physical activity since childhood. Keywords: Athletics. Child Development. Sports Initiation. Early Specialization. INTRODUÇÃO Quais os principais problemas que o treinamento precoce, na prática do atletismo, pode trazer para as crianças e adolescentes? Essa é a problemática central e a principal razão que instigaram a pesquisa nesta área. Entre os pesquisadores e suas vivências na área, percebeu- se a importância da iniciação e do treinamento correto da infância até a fase adulta, respeitando as fases de desenvolvimento da criança e do adolescente. O tema escolhido visa auxiliar e conscientizar educadores e treinadores a respeitar todas as fases de desenvolvimento da criança e do adolescente no que diz respeito à iniciação esportiva no atletismo e em outras áreas, no mesmo momento que também deve enfatizar a importância da prática da atividade física desde a infância. Portanto, o objetivo geral aqui é analisar os 3 efeitos negativos da especialização precoce, onde os treinos intensos, com inúmeras repetições do mesmo movimento e com o objetivo de aprimorar a técnica deste movimento, leva, inevitavelmente, ao esgotamento prematuro, causando danos no desenvolvimento da criança e desânimo na prática do esporte. De modo específico, vamos identificar as fases do desenvolvimento da criança e do adolescente, pesquisar métodos de trabalho para iniciação do atletismo e verificar os principais problemas do treinamento precoce. O estudo trata-se de uma revisão bibliográfica baseada na literatura especializada entre janeiro de 2001 e dezembro de 2019, no qual, utilizando-se das palavras-chaves supra citadas, realizou-se uma consulta a livros periódicos e em artigos científicos selecionados através de busca no banco de dados do SciELO, Edf Esportes Google Acadêmico, Repositório da produção Científica e Intelectual da Unicamp, Repositório de outras coleções abertas (ROCA) e monografias. DESENVOLVIMENTO O atletismo é a modalidade esportiva mais antiga da história; os homens primitivos utilizavam movimentos naturais como correr, saltar e lançar, para se locomover e também para se manterem vivos, caçando e escapando de predadores. Com o passar do tempo, homens e mulheres adquiriram habilidades que foram aprimoradas, adaptadas e passaram a ser utilizadas em provas de competições (ROJAS, 2017). Antigamente disputado como prova de corrida, o atletismo tornou-se “esporte base” para prática de outras modalidades esportivas; por ser um esporte popular e atrativo, novas competições e provas foram surgindo. Com isso, houve o aumento da procura pela modalidade ainda na fase da infância e, devido a esta procura, as maneiras de se trabalhar com a iniciação esportiva foram superadas (MATTHIESEN,2012). Entende-se por “iniciação esportiva” o momento em que um esporte junto com seus fundamentos básicos é apresentado à criança. Os princípios e regras, tendo como base o aprendizado de uma determinada modalidade, são expostos de maneira que sejam respeitadas todas as fases e etapas, fazendo com que os níveis de exigência sejam moderados (FERREIRA, 2001). Quando a criança é introduzida no esporte desde cedo, o principal objetivo é fazer com que haja um amplo desenvolvimento motor, que irá auxiliar no desenvolvimento global da mesma. Desta maneira, essas habilidades podem ser introduzidas em um contexto mais 4 competitivo, sendo essa criança inserida ou não em uma prática de alto rendimento, podendo acontecer até uma especialização precoce (GALLAHUE e OZMUN, 2005). Portanto, este estudo se torna pertinente uma vez que cada vez mais modalidades esportivas estão sendo apresentadas à crianças e adolescentes, entretanto, observa-se um interesse na pratica de alto rendimento é quase que automaticamente apresentado a elas também. O objetivo deste estudo é entender melhor como essa perspectiva de caráter competitivo impacta no desenvolvimento motor na infância. É importante compreender melhor como como o profissional de educação física pode trabalhar com as crianças dentro de cada contexto e sobretudo, respeitar as suas fases de desenvolvimento.ASPECTOS MOTORES DURANTE O CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE De acordo com Gallardo (2000, p. 55): O desenvolvimento humano tem sido entendido como mudanças que ocorrem no indivíduo desde sua concepção até sua morte. A palavra desenvolvimento em si implica mudanças comportamentais e estruturais dos seres vivos no tempo. Essas mudanças contínuas ocorrem de acordo com o estímulo que cada indivíduo tem ao longo da vida, Para Golomazov (1996, p. 26): A precisão dos movimentos bem como outras característi- cas, depende do amadurecimento da pessoa, quer dizer, da idade. A criança, com o aparelho locomotor ainda em desenvolvimento não pode executar igualmente bem todos os movimentos. Por isso o desenvolvimento motor é apresentado por Gallahue e Ozmun (2001) em forma de ampulheta para elementar as fases de desenvolvimento da criança e adolescente. 5 Figura 1. Fases do desenvolvimento motor (GALLAHUE e OZMUN, 2001) O Desenvolvimento motor, de acordo com a ampulheta de Gallahue e Ozmun (2001), acontece em várias fases ou estágios, sendo elas: fase motora reflexiva, fase rudimentar, fase fundamental e fase motora especializada. O presente trabalho enfatizará a fase motora fundamental e fase motora especializada. Fase fundamental: “As crianças que estão desenvolvendo padrões fundamentais de movimento estão aprendendo a reagir com controle motor e competência motora a vários estímulos.” (GALLAHUE; OZMUN, 2003, p.103). “Essas habilidades motoras formam a base sobre a qual cada criança desenvolve ou refina os padrões motores fundamentais do início da infância e as habilidades motoras especializadas da infância posterior e da adolescência.” (GALLAHUE; OZMUN, 2001, p. 257). De acordo com Gallahue e Ozmun (2001), durante o desenvolvimento da criança, as habilidades motoras que compreendem a fase fundamental passam por três estágios distintos, sendo eles: Estágio Inicial: Por volta de dois ou três anos de idade a criança começa suas primeiras tentativas de executar um padrão de movimento fundamental. As integrações dos movimentos espaciais e temporais são poucas. 6 Estágio Elementar: A criança já possui maior controle e melhor coordenação dos movimentos, se dá por volta de quatro ou cinco anos de idade. Estágio Maduro: Caracteriza-se com uma coordenação e execução mais controlada do movimento, a criança já tem grande avanço para estar no estágio maduro, acontece por volta de seis a sete anos. De acordo com Gallahue e Ozmun (2001), as habilidades motoras especializadas podem ser divididas em três categorias: Habilidades transitórias: As habilidades transitórias são o conjunto dos movimentos fundamentais em brincadeiras e em situações da vida diária, como correr, pular, saltar. Este estágio transitório é complexo para professores, pais e inclusive para as crianças, pois estas passam por exploração e combinação de vários padrões motores. É preciso, que todos neste estágio, se empenhem na expansão do controle motor da criança para que possam realizar diversas atividades motoras, pois restringir a criança a apenas um, acarretará em efeitos negativos para os estágios mais avançados. Estágio de aplicação: Essa fase acontece por volta dos 11 aos 13 anos e já ocorrem alterações no desenvolvimento das habilidades do indivíduo; as crianças começam a se interessar por diversas atividades e é nesta fase que a criança tem um aumento cognitivo significativo, já possuem ampla bagagem motora; É um período para que o adolescente possa refinar e utilizar suas habilidades mais complexas dentro do esporte escolhido. Estágio de utilização permanente: Essa fase acorre por volta dos 14 anos até a vida adulta é ocorre um avanço significativo no processo de desenvolvimento motor, tendo uma ampla bagagem motora conquista ao longo de sua vida até aqui. Vários fatores como tempo, condições financeiras, estruturas, limitações físicas e mentais afetam gradativamente esse estágio; a participação em atividades dependerá de seu talento para executar tal movimento, ou seja, este estágio é o conjunto de todos os estágios e fases do desenvolvimento passadas da vida desse jovem indivíduo. Desta forma, de acordo com a ampulheta de apresentado, podemos compreender que “O desenvolvimento motor é uma alteração contínua no comportamento motor ao longo do ciclo 7 da vida. ” (GALLAHUE; OZMUN, 2003, p.22). Essas alterações ocorrem desde o período neonatal até a fase adulta. É necessário que se respeite todas as etapas de desenvolvimento do indivíduo para que sejam fornecidos à criança e adolescente todo suporte, promovendo uma ampla bagagem motora, pois “Crianças mais velhas, adolescentes e adultos devem ser capazes de desenvolver formas maduras de movimentos fundamentais” (GALLAHUE; OZMUN, 2003, p. 433). A IMPORTÂNCIA DA ATIVIDADE FÍSICA E DO ESPORTE PARA O DESENVOLVIMENTO INFANTIL – A PARTICIPAÇÃO DO ATLETISMO Com o surgimento da revolução industrial, no séc. XIX, houve um grande crescimento e deslocamento de pessoas das zonas rurais para zonas urbanas, acarretando diversas mudanças na vida das crianças, pois atividades simples, que antes eram praticadas, foram deixadas de lado, diminuindo, assim, as atividades físicas (FARIA; BROLO et al, 2010). Na sociedade pós-industrial e devido ao grande aumento da violência nas ruas, as crianças foram perdendo cada vez mais seus espaços de lazer e brincadeiras nas ruas com jogos infantis(pega-pega, esconde-esconde, etc.) praticamente desapareceram. O resultado disso foi a multiplicação das horas dedicadas a internet, videogames e televisão; todos estes fatores contribuíram para a diminuição da prática de atividades físicas e, com isso, “a rotina inadequada em atividades físicas altera e interfere nas possibilidades de desenvolvimento da criança” (FARIA; BROLO et al, 2010). Estudos relatam que hábitos de atividade física praticados na infância e adolescência podem ser levados para a vida adulta (GUEDES et al., 2001). Entretanto alguns estudos mundiais, que incluem o Brasil, revelam um elevado índice de sedentarismo e obesidade em todas as faixas etárias, que variam de 50% a 80%, em toda população mundial; por isso, a prática da atividade física regular é importante e traz diversos benefícios ao organismo e à saúde (MENDES et al., 2006). Com isso, a participação de crianças nas práticas e eventos esportivos proporciona grande oportunidade de divertimento, interação social e desenvolvimento das suas habilidades motoras; isso contribui significativamente para o crescimento e desenvolvimento motor, além de prevenir várias doenças como obesidade, diabete e hipertensão arterial (RAYA et al, 2007). 8 Ainda sobre a prática de esportes nessa tenra idade, é essencial pois é a partir daí que a criança começa a sua ampla bagagem motora; segundo Barbanti (2012), o esporte é uma atividade cuja participação é motivada por uma combinação de fatores intrínsecos e extrínsecos que envolve grande esforço físico e habilidades motoras bem complexas. O desenvolvimento motor, de acordo com Gallahue et al (2005) é entendido como “alterações progressivas do comportamento motor, no decorrer do ciclo da vida, realizadas pela interação entre as exigências da tarefa, a biologia do indivíduo e as condições do ambiente.” De acordo com Vieira (2009): É um ciclo de aprendizagem do nascimento até a morte, de um modo crescente nos aspectos: físico, mental e social “cada momento da vida é uma continuação do momento anterior, embora modificado”. É durante o período da infância que ocorrem o desenvolvimento das habilidades motoras fundamentais, sendo de grande importância para o desenvolvimento global da criança e que servirão de base para uma habilidade mais específica que o indivíduo utilizará nas atividadesdo cotidiano, lazer ou esportivas (GALLAHUE; OZMUN, 2003, 232); A prática da atividade física sempre esteve presente na vida humana, desde os primórdios, sendo utilizada, basicamente, para a sobrevivência da espécie; ela pode ser relacionada com o atletismo, o que corrobora com o mencionado por Gonçalves (2007) que disse que “o Atletismo é estritamente ligado aos movimentos naturais do ser humano de correr, marchar, lançar, arremessar e saltar, e, por isso, é chamado de esporte base”. O atletismo é chamado de esporte base pois tem um papel importante no desenvolvimento motor cognitivo e psicológico das crianças e adolescentes, pois trata-se de uma modalidade com uma ampla diversidade de movimentos, e contribui para a prática esportiva em outras modalidades (NASCIMENTO, 2005). INICIAÇÃO ESPORTIVA E ADAPTAÇÃO PARA O ATLETISMO Iniciação esportiva é o período no qual a criança “começa a prática regular e orientada de uma ou mais modalidades esportivas” de modo que consiga dar prosseguimento ao seu desenvolvimento completo (RAMOS, NEVES, 2008). Embora o conceito de iniciação 9 esportiva seja relativamente simples, o sistema no qual ela está inserida é consideravelmente complexo. Santana (2002) construiu um esquema dentro do qual estão presentes várias unidades que interferem nesse processo da iniciação esportiva, conforme é possível visualizar na figura abaixo (figura 2): Figura 2- Unidades relacionadas a iniciação esportiva Fonte: (SANTANA 2002). Essa fase de iniciação esportiva é importante para o desenvolvimento afetivo, cognitivo, social e motor da criança; porém é necessário que respeite a individualidade biológica do indivíduo e, com isso, o professor ou treinador conseguirá despertar na criança o interesse pela prática do atletismo e de outros esportes. Quadro 1. Comparação de conceitos da iniciação esportiva 10 Quadro 2. Comparação de objetivos da iniciação esportiva “A iniciação da criança na prática desportiva deve seguir uma progressão pedagógica, lógica e natural, através de atividades livres, e de Caráter natural sem a exigência de competição propriamente dita" (NAHAS apud PAES, 1992, p. 25-40). 11 Além dos aspectos motores, a iniciação esportiva pode ensinar valores éticos, sociais e morais por meio das inúmeras possibilidades que o esporte envolve, auxiliando na formação de um indivíduo preparado para enfrentar as diferentes situações do cotidiano e permitindo que a criança viva bem, indiferente da modalidade escolhida no futuro (SCAGLIA, 1996). Na prática do Atletismo, o professor pode utilizar jogos lúdicos como uma alternativa para a criança interagir, com a adaptação e manipulação de materiais alternativos começando, por exemplo, com recicláveis, proporcionando aos alunos verificar a relação com o seu cotidiano. Nesta situação, é possível ver resultados satisfatórios no campo motor, afetivo, social e cognitivo, permitindo à criança instigar a sua imaginação, e construção do seu conhecimento. De acordo com MATTHIESEN (2005), “[...] o resgate do atletismo como conteúdo essencial a ser trabalhado em aulas de Educação Física, recuperando, por meio de jogos pré desportivos, a alegria de brincar ao mesmo tempo em que se corre, se salta, se arremessa e se interage com a multiplicidade de movimentos belos e envolventes que fazem do atletismo o espetáculo que é”. O atletismo ajuda no aperfeiçoamento das habilidades motoras naturais, fazendo com que as crianças utilizem o conhecimento adquirido com a prática esportiva, não apenas em âmbito escolar, mas nos demais âmbitos de suas vidas. Segundo Bento (1987), realizar movimentos diversos é essencial no alargamento do repertório motor, sendo relevante no desenvolvimento de atitudes e hábitos que garantem, com seu prosseguimento, uma cultura de uma vida ativa, colecionando várias experiências motoras no seu cotidiano. A prática do atletismo também contribui na parte fisiológica diminuindo a frequência cardíaca e aumentando o tamanho do coração consequentemente melhorando o fluxo sanguíneo. Os ossos se tornam mais fortes, o percentual de gordura corporal diminui e o sistema imunológico melhora, aumentando desse modo, a resistência às infecções. TREINAMENTO E ESPECIALIZAÇÃO PRECOCE NO ATLETISMO E SUAS CONSEQUÊNCIAS PSICOLÓGICAS A evolução do homem e do esporte, mediante o surgimento de novas modalidades esportivas e o forte instinto de competição que todo ser vivo possui, levam o treinamento a progredir de maneira interdependente e inseparável. Com isso, os grandes resultados esportivos só podem ser alcançados por meio de um planejamento de treinamento (FERNANDES, 1981). 12 São muitos os problemas causados por um treinamento específico precoce, sendo indispensável a consciência de que essa ação tem significância na vida esportiva de uma criança e de um adolescente. O profissional da área de Educação Física há de concordar com Marques (1991) quando ele diz que "Os modelos de preparação para jovens devem ser outros, e não aqueles que são do desporto de alto rendimento". Conforme Balbino (2001): o processo de treinamento para crianças e jovens, quando realizado e conduzido de forma adequada, pode trazer muitos benefícios, por meio das práticas de iniciação e formação esportiva, sendo o esporte em sua forma essencialmente educativo. O autor continua dizendo que temos que permitir ao iniciante a oportunidade de estar sob influência de um ambiente saudável e adequado, sob o ponto de vista biopsicossocial, em que ocorra a otimização do crescimento, da maturação e desenvolvimento, sendo validado pela qualidade de estímulos aplicados (BALBINO, 2001). Cada indivíduo é único e, por isso, cada um traz para o esporte as suas próprias aptidões, capacidades e respostas aos estímulos de cada treino. A iniciação deve trazer possibilidades de estímulos diversificados tanto em nível de ambiente quanto no tocante aos movimentos diversos. Para Thompson (1991), o treinador deve adaptar o atletismo para as crianças, modificando suas técnicas, pois as crianças são mais frágeis; as adaptações devem ser de acordo com o desenvolvimento delas. Deve-se adequar e utilizar equipamentos com tamanho e peso convenientes, pois, o peso e o tamanho dos equipamentos impedirão a aprendizagem correta das técnicas básicas, e também modificar as regras para ajudar as crianças a aprender a melhorar seus resultados, tendo mais prazer em praticá-lo. Com a especialização esportiva ocorrendo cada vez mais cedo, deve-se enfatizar a importância pedagógica e social do esporte para a criança, mas sem promover uma especialização precoce em idades cada vez mais baixas, do mesmo modo, não valorizar apenas os vencedores. Segundo (Marques,1991) a especialização precoce não garante que os atletas serão bem- sucedidos, pois a preparação esportiva especializada exige determinada disciplina e, quanto mais precocemente for efetuada essa relação, menores serão as chances de uma criança ou de um jovem vir a obter altos rendimentos esportivos. Isso ocorre quando a criança é 13 sistematicamente introduzida em uma única modalidade esportiva com aulas/treinamentos não diversificados. O treinamento precoce no atletismo pode prejudicar a criança em vários aspectos, um deles é o aspecto psicológico pois de acordo com Thomas (1983), a psicologia vem estudar e observar no homem a sua percepção, o raciocínio, aprendizagem, memória, sentimento, emoção, motivação, ação e movimento. Gould e Medbery (2000), relata que a criança pode passar por um stress psicológico, devido à preocupação excessiva que acontece durante o período de competições. A modalidade atletismo, por ser praticada individualmente acaba exigindo mais do atleta, e assim quando não consegue bons resultados conclui ser inferir em competições, afetandonegativamente o seu psicológico. Em esportes de competição deve haver uma preocupação nesse sentido, pois acaba gerando esgotamento psicológico destas crianças; isto acontece quando, na maioria das vezes, realiza-se um treinamento muito extenso e intenso, fazendo com que ao longo do tempo a criança acabe abandonando precocemente a modalidade esportiva. Treinadores e familiares, na maioria das vezes, prezam pela vitória somente, e não visam simplesmente na participação da criança, sem cobrança; isso gera grandes esforços, além dos seus limites, com foco apenas no resultado, e não no processo, levando a criança a um grande desgaste psicológico e emocional (Gould e Medbery,2000). De acordo com Gould e Medbery (2000), existem fatores na prática esportiva que estão associados com o abandono precoce da modalidade. São eles: expectativa do atleta é muito alta, quer vencer a qualquer preço, treinos longos com poucas variações, demanda excessiva de viagens e perfeccionismo, muitas vezes a criança também acaba deixando a modalidade por não se identificar com ela, ou por ter uma cobrança exacerbada dos exercícios. Contudo, para que não haja desgaste psicológico e emocional Weinberg e Gould (2001), relatam que é importante encorajar a criança, ter menos cobranças, ou seja, focar menos nos erros, e sim nos acertos; também é necessário fazer com que a mesma venha sentir prazer com a prática esportiva. No período de iniciação esportiva é preciso atenção e paciência do treinador/técnico para corrigir e ensinar, e mostrar para a criança que ela é capaz de aprender, independentemente de qualquer situação. Para Nascimento (2005), é importante que se trabalhe com a criança de uma forma harmoniosa e lúdica, pois quando ela se sente bem praticando o esporte escolhido, se esforça e se dedica muito mais, aumentando assim seu rendimento com êxito. 14 Portanto, podemos facilmente entender que quando a criança é encorajada e elogiada, acaba sentindo prazer pela prática da modalidade, favorecendo os aspectos psicológicos e físicos. Para isso, o profissional deve saber respeitar cada etapa de desenvolvimento do seu aluno, fazendo um bom trabalho na fase de iniciação. Futuramente, esse aluno pode se tornar um atleta de alto rendimento. CONCLUSÃO Foi observado, no presente estudo e segundo GALLAHUE (2000), que a especialização precoce pode causa danos no desenvolvimento motor e psicológico de crianças e adolescentes que ainda não atingiram a fase da puberdade. Nesse aspecto concordam NAHAS apud PAES (2000) que concluíram em seus estudos que a “iniciação da criança na prática desportiva deve seguir uma progressão pedagógica, lógica e natural, através de atividades livres, e de caráter natural sem a exigência de competição propriamente dita". Entendemos, portanto, que a criança tem que ser inserida ao esporte de forma lúdica, tornando a prática esportiva prazerosa, sem muita exigência e exercícios complexos, considerados fortes para sua idade. Conforme analisado na farta revisão bibliográfica realizada, podemos crer que a atividade física e esportes, de modo geral, são extremamente importantes para o desenvolvimento infantil; mas há necessidade de uma iniciação coerente, com adaptações, para que o treinamento e especialização não seja tão precoce a ponto de causar danos, sobretudo, psicológicos. Para um professor obter sucesso no ensino-aprendizagem com crianças e adolescentes, precisa dar atenção e ter paciência com os alunos. Quando o treinador com paciência e atenção ensina e corrigi os erros da criança, ele mostra que a criança tem capacidade para aprender, e com isso acaba estimulando a mesma a se esforçar mais e a criar um afeto com a modalidade, sua dedicação aumenta e seu rendimento também. O treinamento especializado precoce acaba trazendo problemas de má formação escolar, estresse em competições, desânimo com os treinos, enjoos, lesões e traumas com a modalidade. É possível tornar a prática esportiva harmoniosa e sem cobranças, para que suas habilidades motoras sejam progressivamente descobertas e aproveitadas nas mais variadas formas e modalidades esportivas. 15 LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1- fases do desenvolvimento motor** Figura 2- quatro fases do desenvolvimento motor** Figura 3- unidades relacionadas à iniciação esportiva** REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BALBINO, Hermes Ferreira. 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