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CASO CLÍNICO A Larissa de Souza e Freitas Vinícius Gustavo de Carvalho Moura Um homem de 50 anos, com diagnóstico de cirrose hepática de etiologia alcoólica, chegou ao pronto socorro relatando aumento do volume abdominal e edema dos MMIIs, acompanhado de desconforto abdominal e diminuição do volume urinário. Nega febre. Paciente cooperativo, lúcido e orientado no tempo e espaço. Relata uso de espirolactona 100 mg/dia e furosemida 40 mg/dia. Ao exame físico: ictérico ++/+4 e piparote positivo. Exames complementares bilirrubina total= 3,5 mg/dl, ureia 74 mg/dl, creatinina 1,4 mg/dl, liquido ascítico = proteína= 1,2 g/dL, glicose 85 g/dL, HDL 186 mg/dL, leucócitos 400/ml ( 70% neutrófilos, 20% linfócitos e 8% monócitos) células mesoteliais = 4% e hemácias= 200/ml. Cultura sem crescimento bacteriano. A) Cite 3 condutas imediatas para este pacientes: 1. Internação com espironolactona 400 mg e suspensão da furosemida. 2. Pedir os seguintes exames: TP, RNI, albumina e íons K e Na. 3. Antibiótico + infundir albumina + lactulose No quinto dia de internação o paciente apresenta melhora do estado geral e mostra no exames complementares creatinina de 2,8 mg/dL B) nesta situação qual a conduta deve ser instituída. O paciente se encontra em um quadro de Síndrome Hepatorrenal (SHR). A SHR representa o estágio final de uma série de reduções na perfusão renal induzida por lesão hepática grave. O DIAGNÓSTICO é feito na presença de uma lesão renal aguda (Cr>1,5 ou aumento de pelo menos 0,3 em 48 horas), sem melhora após expansão com albumina e descartando doenças renais crônicas. No caso em questão, o paciente tinha uma Creatinina de 1,4 e, cinco dias depois, a creatinina se encontrava em 2,8 mg/dL. O transplante hepático é considerado a única terapia que aumenta efetivamente a sobrevida, enquanto isso não acontece a conduta é baseada no controle do fator precipitante (cessar álcool, hemorragia, infecção...) + vasoconstrictor esplâncnico (TERLIPRESSINA 1-2mg a cada 4-6 horas) + ALBUMINA (20-40g/dia após a expansão com 1g/kg nas primeiras 48 horas). No décimo dia melhorou e recebeu alta hospitalar. C) Quais as medidas medicamentosas e orientações gerais que mudarão a sobrevida do paciente? Pacientes que desenvolvem complicações de cirrose, como hemorragia varicosa, ascite, peritonite bacteriana espontânea, carcinoma hepatocelular, síndrome hepatocelular, síndrome hepatopulmonar, síndrome hepatorrenal rapidamente progressiva e admissão à unidade de terapia intensiva por complicações de doença hepática juntamente com hipotensão que requer suporte pressórico, creatinina sérica> 1,5 mg/dL ou icterícia são considerados como tendo cirrose descompensada e têm pior prognóstico do que aqueles com cirrose compensada. Um fator importante relacionado à sobrevivência é a pressão arterial média. Em uma série de 139 pacientes com cirrose e ascite, uma pressão arterial média de ≤82 mmHg foi um importante preditor de sobrevida. Pode-se realizar hemodiálise nesses pacientes. Pacientes com cirrose descompensada geralmente requerem transplante de fígado, sendo essa a única medida de tratamento definitivo, considerada a única terapia que aumenta efetivamente a sobrevida. Para aqueles que não são candidatos, cuidados paliativos podem ser considerados para pacientes com sobrevida prevista de ≤6 meses. ESTUDO DIRIGIDO • GASA (Gradiente Albumina Sérica e albumina do líquido Ascítico). Como analisar? O GASA é um parâmetro que compara as concentrações de Albumina no soro e no líquido ascítico e, por isso, ambas as amostras devem ser colhidas simultaneamente. Seu cálculo é obtido pela subtração da concentração sérica pela do líquido ascítico. Se esse gradiente for: > 1,1g/dL é sugestivo de hipertensão portal porque pelo fato de haver mais proteína no soro do que no líquido ascítico, inferimos se tratar de um transudato. Porém esse gradiente é inespecífico, podendo representar: hepatite alcoólica, insuficiência cardíaca, síndrome de Budd-Chiari, trombose de veia porta, fibrose portal idiopática. Existem, ainda, evidências de que se a proteína total for >1,1g/dL até 2,5g/dL há maior probabilidade de se tratar de um quadro de cirrose. Caso seja > 2,5g/dL a causa mais provável é a cardíaca. < 1,1g/dL indica outras causas que não a hipertensão portal porque sugere um exsudato, já que a albumina está maior no líquido ascítico, podendo indicar: carcinomatose peritoneal, tuberculose peritoneal, pancreatite, serosite, síndrome nefrótica. Existem, ainda, evidências de que se a proteína total for >1,1g/dL até 2,5g/dL há maior probabilidade de se tratar de um quadro nefrótico. Caso seja > 2,5g/dL as causas mais prováveis são a Tuberculose Peritoneal, neoplasia ou causa pancreática. • Paracentese terapêutica - definição e como realizar. A Paracentese consiste na punção e esvaziamento do líquido ascítico na cavidade peritoneal. É terapêutica quando se objetiva aliviar os sintomas do paciente, principalmente naqueles casos de ascite volumosa ou de repetição. Após paramentar de forma adequada e separar todos os materiais necessários do procedimento em si. Orienta-se o esvaziamento vesical, para reduzir o desconforto do paciente durante a realização do exame. Para identificar o local de punção, devemos traçar uma linha imaginária no paciente, que vai da espinha ilíaca ânterossuperior até a cicatriz umbilical. Feito isso, dividimos essa linha em 3 terços iguais, e a punção será realizada na junção do terço médio com o terço inferior. O lado mais seguro é o esquerdo, porém nas grandes ascites e/ou quando guiado por ultrassom é seguro fazer do lado direito ou até em outros sítios. Devemos proceder, então, à paramentação, antissepsia do local de punção e colocação dos campos. Antes de iniciar a paracentese, é ideal que façamos uma anestesia local antes, em geral, com Lidocaína a 1%. Após anestesiado, introduzimos o jelco (16 ou 18 geralmente) pelo mesmo orifício onde foi realizada a anestesia. À medida que avançamos com o jelco, devemos ir aspirando para avaliar se houve perfuração de algum vaso. Caso não haja, ao atingir a cavidade peritoneal, boa quantidade de líquido ascítico começará a refluir. Nesse momento, retiramos a agulha e deixamos apenas o cateter que deve ser, tão logo, conectado ao equipo. Nesse momento, devemos oportunamente enviar amostras do líquido para análise laboratorial e fixar o cateter, evitando a sua saída espontânea. • Quando indicar e como analisar uma Paracentese de Controle ? A paracentese de controle deve ser realizada 48h após início dos antibióticos. Caso não ocorra um declínio no número de PMN de no mínimo 25%, deve ser considerada falha terapêutica e utilizados outros esquemas antibióticos, além de excluir a possibilidade de peritonite secundária. • Quando indicar a profilaxia para Peritonite Bacteriana Espontânea? A profilaxia primária aguda é indicada após qualquer hemorragia por varizes esofagogástricas em um paciente cirrótico com ascite. Esses pacientes têm risco elevado de PBE. Ela é feita pela administração de: - Norfloxacina 400mg 12/12h por sete dias; - Alternativa: Ceftriaxone 1 g/dia, de preferência pela via IV, pelo mesmo período. Já a profilaxia primária crônica é geralmente utilizada em pacientes cirróticos com níveis de proteína total no líquido ascítico < 1,0 g/dl. Alguns autores recomendam a profilaxia primária crônica também nos pacientes com insuficiência hepática avançada, com bilirrubina sérica > 2,5 mg/dl. Além disso, todos os pacientes que desenvolveram PBE devem receber profilaxia secundária com: - Norfloxacina 400 mg/dia, - Ciprofloxacina 500 mg/dia ou - Sulfametoxazol/trimetoprim (800/160mg/dia) até o desaparecimento da ascite. Vale lembrar que, quando estes pacientes desenvolvem novo episódio de PBE durante o uso de norfloxacina, a chance de que um germe Gram-positivo ou um Gram-negativo resistente às quinolonas é muito maior. • Como caracterizar pelo GASA uma ascite de origem peritoneal? ● PERITONITE BACTERIANA ESPONTÂNEA/PBE: ○ PMN > 250/mm³ ○ Culturapositiva, tipicamente monomicrobiana ● PERITONITE BACTERIANA SECUNDÁRIA: ○ PMN >>>> 250/mm³ ○ Proteína total > 1g/dL ○ Glicose < 50 (consumida pelas bactérias) ○ DHL alto ○ Cultura polimicrobiana • Como utilizar albumina na paracentese terapêutica? Devido à alta probabilidade de síndrome hepatorrenal, orienta-se realizar albumina intravenosa profilática, a dose preconizada é 1,5g/kg no D1 e 1,0g/kg no D3. • Como analisar a glicose do líquido da ascite? Normalmente, as concentrações no líquido ascítico são similares às do soro. Na presença de leucócitos e bactérias, há consumo da glicose e redução dos níveis, como ocorre em peritonites bacterianas espontâneas, bacteriana secundária, peritonite tuberculosa e carcinomatose peritoneal. Os neutrófilos podem consumir grandes quantidades de glicose e a concentração de neutrófilos têm correlação inversa com a concentração de glicose. Na PBE a concentração de glicose permanece acima de 50 mg/dl, mas em casos de peritonite secundária à perfuração intestinal, a glicose pode ser indetectável. • O controle do peso no tratamento da ascite é importante. Como devemos proceder? Recomenda-se que o tratamento diurético para a ascite promova uma redução em torno de 0,5 kg/dia no peso do paciente e de 1 kg/dia se, além da ascite, houver também edema de membros inferiores... • Prescreve uma dieta para o paciente com ascite com os seguintes exames bioquímicos: creatinina 2,5 mg/dl; ureia 90 mg/dl; sódio 125 mEq/dL ; potássio 6,5 mEq/dL. Recomendação nutricional para hepatopatas: dieta normoglicídica, normoproteica, hipolipídica e hipossódica. - Proteica: 1,5 a 2,0 g/Kg. -Glicídica: sem restrição, monitorizar glicemia. -Lipídica: 20 a 40% das Calorias Totais. -Sódio: 40 a 60 mEq/dia segundo retenção de fluidos. -Cálcio: 800 a 1200 mg/dia. -Água livre: 1000 a 1500 mL/dia, avaliar ascite. -Potássio: evitar alimentos com altas concentrações deste íon -Magnésio, Zinco, Cobre, Fosfato: Controle no uso de diuréticos; Medir níveis séricos; Suplementar com alimentos fontes.
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