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Emergências Clínicas Aula 10 - Bradiarritmias

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Marina Ribeiro Portugal 
 
MARINA RIBEIRO PORTUGAL 
 
AULA 10: BRADICARDIAS 
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1. Pontos importantes 
 O eletrocardiograma (ECG) é o exame de eleição inicial para o diagnóstico de bradicardias. 
 Maior prevalência em idosos. 
 Não necessariamente têm significado patológico. 
 Bradicardias de etiologia supra-hissiana podem não necessitar de conduta emergencial, ao 
contrário das etiologias infra-hissianas. 
 Condição comumente encontrada no departamento de emergência e que pode resultar 
em instabilidade hemodinâmica, necessitando de rápido diagnóstico e intervenção. 
 Raramente é a queixa do paciente que procura a emergência, mas sim o resultado de uma 
condição clínica subjacente e muitas vezes merece investigação complementar. 
 O paciente pode apresentar-se à emergência com queixa de confusão mental, síncope, 
tontura, dor torácica ou dispneia. 
2. Introdução e conceitos 
 As bradicardias ou bradiarritmias caracterizam-se por frequência cardíaca (FC) baixa. Pode 
ser considerada absoluta quando menor do que 60 bpm ou relativa quando o paciente 
apresenta necessidade de débito cardíaco aumentado e frequência cardíaca inapropriada 
à sua condição clínica (p. ex., em torno de 60 bpm no choque séptico ou hipovolemia). 
 A bradicardia pode ser considerada normal em pessoas jovens com bom condicionamento 
físico. Atletas comumente apresentam frequência cardíaca abaixo de 50 bpm sem 
repercussão hemodinâmica. Também pode ser considerada normal em algumas situações 
de tônus vagal excessivo, como no pós-prandial de refeições copiosas, durante o sono, 
durante a passagem de sonda nasogástrica ou durante situações de estresse (por exemplo, 
coleta de sangue em alguns indivíduos). 
 A bradicardia é considerada patológica apenas quando há sintomas secundários a 
repercussões hemodinâmicas na condição do paciente. 
3. Fisiologia 
 Todos os miócitos têm capacidade de despolarização 
espontânea, conhecida por automatismo. Há, no entanto, um 
grupo de células do coração diferenciadas nas quais o 
automatismo é maior, conhecido por sistema de condução, 
que é constituído pelo nó sinoatrial (NSA) e nó atrioventricular 
(NAV) e sistema His-Purkinje (SHP). O NSA localiza-se no teto 
do átrio direito, próximo à desembocadura da veia cava 
superior e é o local onde as células cardíacas dispõem de maior 
automatismo. Em condições normais, o impulso elétrico é 
originado no NSA, que envia o impulso ao átrio esquerdo 
através de células denominadas feixes de Bachman. A despolarização segue então por 
células específicas até o NAV e então ao SHP, que se divide em ramos direito e esquerdo. 
Quanto mais próxima do NSA, maior o automatismo de determinada célula cardíaca e 
maior a frequência cardíaca que esta será capaz de gerar. Quando uma região alta do 
sistema de condução é acometida, incapaz de desempenhar sua função, a região 
imediatamente abaixo assume o comando. Assim, quanto mais distante o acometimento 
estiver do NSA, mais acentuada será a bradicardia. A depender da localização da lesão o 
bloqueio poderá ser classificado como supra-hissiano (alto) ou infra-hissiano (baixo). 
 Condução cardíaca 
❖ No sinoatrial está localizado no AD, posterior a veia cava superior; é o principal 
marcapasso cardíaco 
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 Bloqueios 
 
4. BAV de primeiro grau 
 É um intervalo PR prolongado 
 
*P----QRS 
 Bloquei simples 
 Presença de intervalo PR superior a 200 ms. Ocorre um atraso na condução do NAV, mas 
sem repercussão patológica 
 Significado clínico → Geralmente assintomáticos e sem repercussão clínica importante, 
exceto se o intervalo PR for extremamente prolongado 
 Tratamento → Apenas se bradicardia com repercussão clínica; Atropina (0,5mg IV; repetir 
a cada 5 minutos com dose máxima de 3mg) 
5. BAV de segundo grau 
 Mobitz I → Há um aumento progressivo do intervalo PR até que uma onda P não é 
conduzida por QRS (fenômeno de Weckebach). É considerado um bloqueio “alto” e sua 
ocorrência não gera repercussões hemodinâmicas. O aumento progressivo do intervalo PR 
não é uniforme batimento a batimento. De maneira prática, o Mobitz 1 tem intervalo PR 
que precede a onda P bloqueada maior que o intervalo PR posterior ao bloqueio. 
 
*P—QRS, P----QRS, P--------QRS, P, P—QRS, P----QRS, P--------QRS, P 
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* Fenômeno de Wenckebach onda P amputada sem o QRS 
❖ Significado clínico 
➢ Associa-se a IAM de parede inferior (normalmente o bloqueio é transitório e secundário 
a vagotomia das primeiras seis horas de IAM – reflexo de Bezold-Jarisch) 
➢ No IAM o BAV de segundo grau Mobitz I pode evoluir para um BAVT que pode ser 
transitório e causar repercussão hemodinâmica no paciente 
❖ Tratamento → Apenas se houver sintomatologia associada a bradicardia; Atropina 0,5mg 
IV (repetir a cada 5 minutos com dose máxima de 3mg); Dopamina 2-10mcg/Kg/minuto 
IV 
 Mobitz II → Ocorre uma súbita interrupção da condução atrioventricular, a qual não é 
precedida pelo aumento progressivo do intervalo PR. É considerado um bloqueio “baixo” 
e pode evoluir para o bloqueio atrioventricular total. É necessário buscar causas reversíveis 
associadas (isquemia, distúrbio eletrolítico ou uso de medicação cronotrópica negativa), 
está indicado o implante de marca-passo definitivo, independentemente de instabilidade 
hemodinâmica. 
 
*P, P—QRS, P, P—QRS, P 
❖ Tratamento → Marcapasso – obrigatório 
➢ Tipo → Transcutâneo (implante as pás do DEA) 
➢ Realize analgesia adequada no paciente → Morfina em bomba ou Fentanil em dose 
baixa 
➢ Adicionar modo marcapasso 
➢ Selecione o modo do marcapasso → Sincronizado ou não sincronizado 
➢ Programe a FC e corrente elétrica 
➢ Avalie a resposta hemodinâmica → Não deixe o marcapasso transcutâneo por mais de 
uma hora no paciente 
*O marcapasso transvenoso é melhor, mas é mais caro 
*Se o paciente sustentar com o uso da Dopamina aguardar para passar transvenoso ou método 
definitivo. A ampola tem 50mg/10mL; a solução padrão utilizada na infusão contínua tem 5 
ampolas + 200mL de SG 5% equivalendo a 1000mcg/mL. A concentração é soluto/solvente = 
5x50mg/50mL+200mL = 250mg/250mL = 1mg/mL = 1000mcg/mL. Lembrando que a dose é 2-
10mcg/kg/min. Acima de 10mcg vira DVA (vasoconstrictora). 
Calcula-se a vazão (mL/h) = doesse (mcg/kg/min) 
Vazão (ml/h) = 5 (mcg/kg/min) x 70 (kg) x 60 / 1000 
Vazão (ml/h) = 21 ml/h 
 Nenhum bloqueio que tenha QRS largo responde bem a Atropina ou Dopamina 
6. BAV de terceiro grau 
 É também conhecido por bloqueio atrioventricular total (BAVT), caracteriza-se pela 
completa dissociação entre a onda P e o QRS. O ritmo de escape ventricular costuma ser 
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em menor frequência do que a frequência das ondas Ps. Os intervalos P-P e R-R são 
regulares, mas podem ser diferentes e são dessincronizados. 
 Não tem nenhum estímulo do nó sinusal 
 
*P—QRS, P, P----QRS, P, QRS, P-QRS, P---QPRS, P, P----QRS 
 
 
 Significado clínico 
❖ Doença de Lenégre → Doença fibro-degenerativa da junção AV; é a causa mais comum 
de bloqueios infranodais 
❖ IAM de parede inferior → É a segunda causa mais importante destes bloqueios 
❖ Endocardite infeciosa, amiloidose e sarcoidose 
 Tratamento → Algoritmo 
 
7. Achados clínicos 
 A bradicardia desencadeará sintomas normalmente quando a FC estiver abaixo de 50 bpm. 
 O paciente pode apresentar-se ao pronto-socorro com queixa de confusão mental, 
síncope, pré-síncope, fraqueza inespecífica, dispneia ou dor torácica. 
 A história clínica direcionada é importante e o uso de medicações deve ser detalhado. 
 Também é importante questionar condições clínicas subjacentes como disfunção renal ou 
intervenção cardíaca prévia. 
 A bradicardia também pode não ser a causa nem a consequência da procurado paciente 
ao serviço de saúde, sendo incidentalmente diagnosticada ao exame físico. 
 Em todas as circunstâncias faz-se necessário exame físico cuidadoso, o qual deve incluir 
palpação de pulsos, medida da pressão arterial, avaliação da perfusão periférica, ausculta 
cardíaca e exame neurológico sumário. 
Possui maior 
pico, pois a 
onda P ocorre 
simultaneam-
ente 
Patognomônico quando depois do QRS surge o P antes do T 
Sinais de instabilidade → RNC; dispneia; hipotensão; 
precordialgia 
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 O exame físico, a história clínica e os exames complementares devem ser direcionados 
para a identificação da etiologia da bradicardia e, após estabilização hemodinâmica do 
paciente, direcionar o seu tratamento. 
8. Exames complementares 
 Na emergência, certamente o ECG de 12 derivações é o exame de maior valia. Rápido, de 
baixa complexidade e acessível, permite a rápida identificação de um BAV avançado e 
possibilita o início de seu tratamento. 
 Já as bradicardias estáveis encaminhadas para avaliação cardiológica ambulatorial podem 
requerer avaliação complementar através de outros exames como Holter, monitor de 
eventos, teste de ergométrico, tilt-test e até mesmo estudo eletrofisiológico. 
 Na emergência, além da realização do ECG, outros exames podem também ser necessários 
de acordo com o quadro clínico do paciente: eletrólitos, hemoglobina/hematócrito, função 
renal, gasometria, troponina, função tireoidiana, ecocardiograma e dosagem de 
antiarrítmicos, conforme a suspeita clínica. 
9. Diagnóstico diferencial 
 Bradicardia do atleta → Atletas com bom condicionamento físico podem apresentar 
bradicardia. A bradicardia mais comum nesse grupo é a bradicardia sinusal, mas arritmia 
sinusal, marca-passo atrial mutável, pausas sinusais, BAV de 1º grau e até BAV de 2º grau 
são descritos em maior frequência nesse grupo de pessoas. Deve-se partir para a 
investigação de diagnósticos diferenciais e investigação detalhada apenas quando há 
presença de sintomas associados (p. ex., síncope, pré-síncopes e tonturas). 
 Medicamentos → Betabloqueadores; bloqueadores de canais de cálcio (diltiazem, 
verapamil); digoxina; antiarrítmicos (amiodarona, propafenona, procainamida); 
antidepressivos tricíclicos; lítio. 
 Distúrbios eletrolíticos → A bradicardia pode ser consequência de distúrbios eletrolíticos. 
Hipercalemia e hipercalcemia quando acentuadas podem levar a esse quadro. Nesses 
casos, além da correção do distúrbio hidroeletrolítico de base, aconselha-se também a 
correção de eventual hipomagnesemia associada, pois se trata de um íon essencial para a 
manutenção da estabilidade da membrana miocárdica. 
 Hipoxemia → Trata-se de uma causa comum de bradicardia. Nesse caso, o objetivo do 
tratamento deve ser a correção da insuficiência respiratória. 
 Hipertensão intracraniana → Pacientes com hipertensão intracraniana rapidamente 
progressiva podem evoluir com síndrome de Cushing, que consiste em bradicardia, 
hipertensão e arritmia respiratória. A bradicardia costuma ser sinusal e nesse caso serve 
de alerta para aumento importante da pressão intracraniana de pacientes com substrato 
para tal (hemorragia subaracnóidea, acidente vascular encefálico, trauma, tumor do 
sistema nervoso central [SNC], meningite etc.). 
 Reflexo vagal → Situações que cursam com aumento do tônus vagal podem associar-se 
com bradicardia, por exemplo no pós-prandial de refeições copiosas, durante o sono, 
durante a passagem de sonda nasogástrica, vômitos, tosse intensa ou em situações 
consideradas estressantes para o indivíduo. Pode estar associado ou não à ocorrência de 
síncope vaso-vagal. Compressão extrínseca do seio carotídeo em alguns indivíduos com 
hipersensibilidade do seio carotídeo (HSC), acidental ou provocada, também pode 
associar-se à ocorrência de bradicardia. A HSC ocorre predominantemente em indivíduos 
com mais de 50 anos de idade. 
 Isquemia miocárdica → O infarto de parede inferior com acometimento de coronária 
direita pode gerar bradicardia por isquemia do sistema de condução, situação revertida 
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espontaneamente em até 90% dos casos em até 15 dias após o evento. Também pode 
estar presente nos infartos de parede anterior extensa, mas nesse caso ocorre devido ao 
acometimento miocárdico extenso. Outra causa de bradicardia associada à isquemia 
miocárdica é o aumento transitório do tônus vagal, denominado reflexo de Bezold-Jarisch, 
que também pode estar associado a hipotensão transitória. 
 Lesão mecânica do sistema de condução → Em caso de lesão mecânica das fibras do NSA 
e NAV, assume o ritmo mais baixo e não raro a consequência é o BAVT. Pode ocorrer após 
cirurgias cardíacas, implante de valva aórtica transcateter (do tipo autoexpansíveis), 
ablação em estudo eletrofisiológico ou endocardite infecciosa com formação de abscesso 
perivalvar. 
 Doença degenerativa do sistema de condução → Acometem principalmente idosos, 
normalmente mulheres acima dos 65 anos, e constituem-se na fibrose e/ou substituição 
por células gordurosas de parte dos miócitos do sistema de condução. Essa condição 
geralmente evolui com doença do nó sinusal e o tratamento definitivo será o implante de 
marca-passo cardíaco. 
 Causas de disfunção de nó sinusal 
 
 Diagnóstico diferencial dos bloqueios atrioventriculares 
❖ Idiopático 
❖ Degenerativo 
❖ Doenças infiltrativas → Amiloidose; sarcoidose 
❖ Isquemia → Isquemia do NSA; reflexo de Bezold-Jarisch 
❖ Medicações → Betabloqueadores; bloqueadores de canais de cálcio; digoxina; 
antidepressivos tricíclicos; lítio; antiarrítmicos 
❖ Infecções → Doença de Chagas; endocardite infecciosa com abscesso perivalvar 
❖ Trauma → Cirurgia cardíaca; ablação em estudo eletrofisiológico; pós-colocação de valva 
aórtica via transcateter 
❖ Doenças neuromusculares 
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❖ Congênitas → BAVT congênito; transposição das grandes artérias; isomerismo atrial 
esquerdo 
❖ Condicionamento físico 
❖ Condições de aumento do tônus vagal 
❖ Dissociação atrioventricular 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Referências bibliográficas 
Aula de Dr. Murilo Ramos (08/09/2021) 
Medicina de emergência: abordagem prática / editores Irineu Tadeu Velasco ... [et al.]. - 14. ed., 
rev., atual. e ampl.-Barueri [SP] : Manole, 2020.: il Melgar-Melgar, A., Ruiz-Salas, A., & Jiménez-
Navarro, M. F. (2019). Bradiarritmias. Medicine-Programa de Formación Médica Continuada 
Acreditado, 12(89), 5212-5225.

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