Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Transtornos Mentais Orgânicos Agudos Caroline Leão Objetivo 01: Principais transtornos mentais orgânicos agudos Tradicionalmente, considera-se que as doenças mentais podem ser causadas por agressão à integridade do sistema nervoso central ou por influências psicológicas e sociais desfavoráveis. Assim, estabelece-se uma dicotomia entre transtornos orgânicos, de um lado, e psicogênicos, de outro. Nesse contexto, a designação de transtornos mentais orgânicos refere- se a um grupo heterogêneo de transtornos com duas características fundamentais: a) um conjunto de sinais ou sintomas psicológicos ou comportamentais; b) uma doença cerebral ou sistêmica, que possa ser considerada sua causa. Para a caracterização de um transtorno mental como orgânico, há a necessidade de que ele seja consequência fisiológica direta de uma condição médica geral. Esse detalhe é de suma importância, pois a simples ocorrência simultânea de uma doença orgânica e de um transtorno mental não significa que este seja de natureza orgânica, pois as duas condições clínicas podem estar ocorrendo ao acaso, e serem, portanto, independentes entre si. Além disso, uma condição médica geral pode precipitar o desencadeamento de um transtorno mental funcional, primário, sem se relacionar etiologicamente através de mecanismos fisiológicos. Por exemplo, a limitação de uma doença incapacitante pode exercer papel importante no desenvolvimento de um transtorno depressivo maior sem que qualquer mecanismo fisiológico direto explique o aparecimento do quadro depressivo. É importante saber se existe evidência na literatura de que a condição médica reconhecidamente costuma causar sintomas psíquicos, se há relação temporal entre a doença física e o início do quadro mental, se o tratamento da doença física melhora os sintomas psíquicos, se a idade de início e os sintomas são atípicos para um transtorno mental primário, se não há história familiar ou história prévia de doença mental, e se a resposta ao tratamento específico dos sintomas psíquicos é ineficaz e inesperada. No DSM-IV, os transtornos mentais orgânicos foram agrupados em três seções: 1) delirium, demência, transtornos amnésticos e outros transtornos cognitivos; 2) transtornos mentais devido a uma condição médica geral; e 3) transtornos relacionados ao uso de substâncias psicoativas. 1. Delirium O delirium pode ser hoje definido como uma síndrome mental orgânica aguda decorrente da quebra da homeostase cerebral. Deve-se, invariavelmente, a perturbações sistêmicas ou do sistema nervoso central, e pode ser comparado a uma "síndrome de insuficiência cerebral aguda” decorrente da quebra da homeostase e da desorganização da atividade neural. Epidemiologia Existe uma grande variedade de dados epidemiológicos por diversos motivos como dificuldade do diagnóstico, falta de sistematização nos relatos de prontuário e diferenças entre as metodologias e populações estudadas, mesmo nos dias de hoje cerca de 67% dos casos são diagnosticados equivocadamente como demência, depressão e até como aspecto normal do envelhecimento. Estima-se que 25 a 60% dos indivíduos idosos admitidos em serviços de emergência apresentem delirium em sua evolução. Portanto, além de ser uma das complicações mais comuns entre pacientes idosos hospitalizados, o delirium é, seguramente, a complicação psiquiátrica mais frequente nessa população. As estimativas de incidência variam de acordo com o motivo e o contexto de internação. Entre idosos clinicamente enfermos em hospital geral, a incidência de delirium varia entre 15 e 20%, e entre os pacientes cirúrgicos, de 25 a 65%. Estima-se que 20 a 60% dos idosos admitidos em serviços de emergência clínica ou cirúrgica e até 80% dos pacientes em unidade de terapia intensiva apresentem delirium. O delirium também ocorre com frequência em associação a intervenções cirúrgicas ortopédicas, muitas vezes na ausência de comorbidades sistêmicas. Admite-se que o delirium associado a intervenções ortopédicas seja tão frequente por se tratar de um procedimento cirúrgico bastante invasivo, levando a uma quebra abrupta da homeostase, com sangramentos expressivos, geralmente em pacientes com idade mais avançada. Além disso, também contribui o fato de cursar com dor e necessitar de imobilização por períodos prolongados. Entre os pacientes ortopédicos que apresentam delirium, também se observa uma pior recuperação motora e funcional, com maiores índices de dependência, anulando os benefícios funcionais que a correção cirúrgica poderia trazer ao pacientes. Fatores de risco Delirium é uma síndrome multifatorial e vários fatores de risco exercem efeito no desencadeamento dessa desordem neuropsíquica. Em contextos clínicos, os fatores mais comumente associados ao delirium são: 1. Idade avançada. 2. Sexo masculino. 3. Presença de doença clínica, particularmente cardiovascular, com comprometimento do estado geral de saúde. 4. Presença de demência, doença cerebrovascular, ou outros acometimentos do sistema nervoso central. 5. Ocorrência de depressão. 6. Polifarmacoterapia, particularmente se, entre as múltiplas medicações em uso, houver drogas com ação anticolinérgica, anti-histaminica, sedativo-hipnóticos ou narcóticos, que conferem risco duas a três vezes maior para o desenvolvimento do delirium. O envelhecimento e o comprometimento cognitivo são, sabidamente, fatores de risco conhecidos para o delirium. Em pacientes idosos, a ocorrência de delirium aumenta o reconhecimento de quadros demenciais preexistentes. Etiologia O delirium ocorre com mais freqüência em pessoas com doenças médicas, cirúrgicas ou neurológicas sérias ou que estão em estado de intoxicação ou abstinência de drogas. Sua presença sempre deve levar a uma busca imediata por uma explicação médica. Sendo o delirium uma síndrome, e não uma doença, é melhor vê-lo como a via final em comum de muitas causas em potencial. Distúrbios metabólicos, como aqueles causados por infecções, doenças febris, hipoxia, hipoglicemia, estados de intoxicação ou abstinência de drogas ou encefalopatia hepática, são causas comuns de delirium. Outras causas comuns com origem no sistema nervoso central (SNC) incluem abscessos cerebrais, acidentes vasculares cerebrais (AVCs), lesões traumáticas e estados pós- ictais. Outras causas vistas com freqüência em idosos são arritmias de início recente (como fibrilação atrial) e isquemia cardíaca. O delirium pode ser influenciado por eventos ambientais, mas esses não causam o transtorno. Por exemplo, antes de o delirium ser bem compreendido, acreditava-se que os pacientes que o desenvolviam após uma cirurgia tinham “psicose de UTI”, presumivelmente causada pela reação psicológica ao ambiente estranho das unidades de tratamento intensivo (UTIs). Fisiopatologia O delirium pode ser considerado um distúrbio reversível de base metabólica. A fisiopatologia do delirium ainda é pouco entendida, mas sabe-se que existe um envolvimento das vias neurais dependentes da transmissão colinérgica. Outros neurotransmissores também estão implicados na fisiopatologia do delir um, como a serotonina, a dopamina, o GABA e a histamina. Evidências menos consistentes também apontam as citocinas (IL-1, IL-II, IL-Vl e TNF), certos hormônios (melatonina, cortisol) e os radicais livres como integrantes da fisiopatologia do delirium. Além disso, a atividade neural depende da reserva de substratos para o metabolismo aeróbio, como oxigênio, glicose e fosfatos. Anormalidades do metabolismo oxidativo comprometem a manutenção dos gradientes iônicos, alterando os potenciais elétricos e a repolarização da membrana neuronal, levando à depressão da atividade cerebral. A síntese de neurotransmissores e a depuração de neurotoxinas são também prejudicadas. Os neurônios mais sensíveis a tais agressões são predominantemente os colinérgicos, histaminérgicos e monoaminérgicos.Desse modo, postula-se que condições que levem ao comprometimento das vias colinérgicas e histarninérgicas exerçam um papel preponderante no desencadeamento do delirium. Os neurônios colinérgicos perfazem 25% das células cerebrais e estão particularmente envolvidos nos processos cognitivos e atencionais. A acetilcolina é o principal modulador das funções dos neurônios corticais e hipocampais. Além dos efeitos decorrentes da baixa disponibilidade sináptica de acetilcolina, no nível do primeiro mensageiro, a disfunção colinérgica está associada ao comprometimento da transdução de sinais no nível pós-sináptico (segundos e terceiros mensageiros), resultando em prejuízos ao metabolismo neuronal e à regulação gênica. Na hipóxia, tanto a síntese quanto a liberação de acetilcolina estão prejudicadas. A histamina é um outro importante modulador das funções neurais. Receptores histamínicos do tipo H 1 e do tipo H2 alteram a polarização e a homeostase elétrica dos neurônios hipocampais e corticais. A ação de drogas anti-histamínicas pode levar ao delirium e, por outro lado, em condições associadas ao excesso de liberação de histamina, como no estresse cirúrgico e na hipóxia, ocorre indução de mecanismos de apoptose neuronal. Assim, acredita-se que tanto o excesso quanto a deficiência de histamina podem estar envolvidos na fisiopatologia do delirium. A hipóxia pode também levar ao aumento da liberação e à diminuição da recaptura da dopamina. Sabe-se que a hiperestimulação dopaminérgica pode exercer efeitos tóxicos ao metabolismo neuronal, pela formação de radicais livres, bem como alterar sua função, por meio da potencialização da atividade glutamatérgica. O glutamato exerce ação central na lesão neuronal mediada por cálcio (excitotoxicidade), mas não é suficiente para precipitar a lesão sem a ação concomitante da dopamina. Um outro mecanismo proposto para a fisiopatologia do delirium envolve os níveis de cortisol. Aumentos agudos (muitas vezes iatrogênicos) do cortisol levam a disfunções hipocampais transitórias. Isso é compatível com o fato de que doenças crônicas que cursam com hipercortisolemia (como a doença de Cushing) levam à redução do volume hipocampal. Esse processo está associado a disfunções mitocondriais e a mecanismos de morte neuronal por apoptose. O aumento de cortisol basal é comum no período pós-operatório; além disso, sugere-se que pacientes com alterações mitocondriais prévias teriam maior predisposição a desenvolverem delirium. Quadro clínico As apresentações clínicas do delirium decorrem primariamente de alterações da consciência e da atenção. Observa-se rebaixamento do nível de consciência, com constrição do campo vivencial e redução da percepção de estímulos presentes no meio. Além disso, ocorre déficit atencional intermitente, comprometendo a habilidade de direcionar, sustentar ou alternar o foco de atenção. O paciente torna-se alheio ao ambiente, com distratibilidade fácil e atenção fatigável. O inicio é geralmente agudo, variando de algumas horas até poucos dias, e sua duração depende da persistência e da gravidade das causas de base, além da rapidez com que é instituído o tratamento. O curso é flutuante ao longo das 24 horas, frequentemente acompanhado de alterações do ciclo sono-vigília. Caracteristicamente, o paciente em delirium apresenta sonolência diurna e agitação noturna. A atividade psicomotora é um outro importante domínio comportamental que se encontra alterado no delirium. O aumento da atividade psicomotora, bastante característico no delirium, leva a inquietação, hiperatividade e agitação. Esta, que em alguns casos pode ser extrema, necessita de medidas enérgicas de contenção mecânica e química a fim de preservar a integridade física do paciente e seus acompanhantes, além de garantir a continuidade das medidas terapêuticas. No polo oposto, as formas hipoativas do delirium podem gerar estados de inibição ou lentificação psicomotora, apatia, ou até mesmo de estupor. Embora existam apresentações polares (delirium agitado ou delirium apático), a maioria dos casos é representada por formas mistas, com flutuação entre aumento e redução da atividade motora. Também são observados outros déficits cognitivos específicos, em grande parte como consequência do comprometimento atencional, como desorientação temporoespacial e comprometimento da memória, disfunções executivas (que comprometem o planejamento e a execução de tarefas) e, eventualmente das demais funções cognitivas superiores (abstração, cálculo, linguagem). A memória recente está mais prejudicada, resultando em amnésia lacunar retrógrada e anterógrada. Como resultado dos distúrbios da atenção e cognição, o paciente se apresenta desorientado, pelo menos, temporalmente. Em casos mais graves, há desorientação em relação a lugares e pessoas, e os doentes tendem a confundir pessoas próximas com familiares e vice-versa. O delirium pode incluir alterações do curso e do conteúdo do pensamento, com desorganização conceituai e conteúdos anormais, não raro associados ao comprometimento do juízo e da critica. Além da cognição propriamente dita, são também frequentes as flutuações do humor, ocasionando comumente labilidade afetiva e irritabilidade, mas também reações de ansiedade, medo, depressão ou euforia. Alterações da sensopercepção são frequentes ( 40- 50% dos casos), cursando caracteristicamente com alucinações ou ilusões visuais e auditivas. Tais fenômenos são geralmente seguidos de interpretação delirante. Nesses casos, erros na atribuição de significados aos fatos e fenômenos ambientais, decorrentes de falsas percepções e/ou lapsos do julgamento, dão origem a ideias delirantes, muitas vezes de cunho paranoide. Quando presentes, as alucinações tendem a ser assustadoras, e o paciente as aceita como reais e invariavelmente tenta escapar delas ou mesmo enfrentá-las, o que pode resultar em acidentes ou agressões. Desse modo, as perturbações da psicomotricidade podem ocorrer como fenômeno primário do delirium, mas também podem ser decorrentes de fenômenos psicóticos concomitantes. Diagnóstico O diagnóstico do delirium é um ato eminentemente clínico, baseado na observação cautelosa do comportamento do paciente, na avaliação de seu estado mental e na valorização dos dados fornecidos pela família e pela equipe que presta assistência ao paciente. Nas práticas clinica e cirúrgica, o diagnóstico do delirium só é feito em 30 a 50% dos pacientes. A flutuação dos sintomas pode ser difícil de se detectar, principalmente por conta do tempo limitado que o médico dispõe para permanecer com o paciente. A equipe de enfermagem, que está em maior contato com o paciente, é que efetivamente documenta a maioria ( 60 a 90%) dos sintomas decorrentes do delirium. Três variantes clínicas do delirium podem ser definidas: hipoalerta-hipoativo, hipcralerta-hiperativo e o misto. Na variante hiperalerta-hiperativo, o paciente fica visivelmente impaciente, excitado e vigilante, gesticula, fala alto. Expressões faciais, posturais e comportamentais refletem o estado de hiperexcitação. Respondem aos estímulos prontamente de forma excessiva e indiscriminada, movem-se constantemente, parecem procurar por alguma coisa, gritam e podem ser combativos. Apresentam alucinações vívidas e assustadoras e ostentam intenso medo e raiva. O tipo hipoativo do delirium é caracterizado por sonolência, letargia, olhar fixo, rebaixamento do nível de consciência, apatia e discurso empobrecido ou lentificado, e foi encontrado em 19% dos pacientes com diagnóstico de delirium. O paciente geralmente mostra-se desatento, indiferente ao meio e quieto (fala pouco; ou ocasionalmente, não fala). Responde demoradamente ao estimulo e exibe atividade psicomotora diminuída, podendo adormecer durante a avaliação. Esse perfil de sintomas está mais sujeito ao subdiagnóstico, pois a ausência de agitação psicomotoraou outras manifestações comportamentais exuberantes geralmente não demanda uma interconsulta psiquiátrica. Na variante mista, a atividade psicomotora do paciente e a vigilância variam irregularmente entre os estados hipo e hiperativo. Essas flutuações podem ocorrer várias vezes ao longo do dia e são imprevisíveis no curso de um episódios. Critérios diagnósticos Os critérios diagnósticos do delirium valorizam, sobretudo, a simultaneidade do déficit atencional e das alterações do ciclo sono-vigília; o quadro deve ter inicio agudo, curso flutuante e estar associado a uma condição clínica de base suficientemente significativa para levar à quebra da homeostase. Médicos não psiquiatras, se atentos à possibilidade de desenvolvimento dessa síndrome, podem fazer um diagnóstico acurado, com sensibilidade comparável ao diagnóstico feito por psiquiatras. Os critérios diagnósticos do Manual de diagnóstico e estatística de transtornos mentais (DSM-IV), da American Psychiatric Association" (Quadro 3), menos restritivos do que os da sua versão anterior (DSM-IUR}, aproximam-se dos critérios diagnósticos da 10° revisão da classificação internacional de doenças-CID- 102.1. 2. Alucinose orgânica A alucinose orgânica caracteriza-se pela presença de alucinações, em geral auditivas ou visuais, persistentes ou recorrentes, em decorrência de um fator orgânico etiológico bem estabelecido. As alucinações são vívidas, com nitidez sensorial, ricas em detalhes e aparecem no espaço objetivo externo. O paciente em geral se encontra perplexo, ansioso, podendo tanto exercer crítica sobre essas vivências alucinatórias como interpretá-las de forma delirante. O pensamento, a afetividade e a volição encontram-se preservados. O nível de consciência também está preservado, permitindo a diferenciação de um quadro de delirium. A principal causa da alucinose orgânica é o alcoolismo. A alucinose alcoólica é mais frequente em pacientes do sexo masculino, com aproximadamente 40 anos de idade, história de consumo excessivo e crônico de bebidas alcoólicas, além de um quadro grave de dependência. As alucinações costumam ser do tipo auditivo, vozes na terceira pessoa do singular, com conteúdos de insultos, ameaças, surgindo após 48 horas de diminuição ou interrupção do consumo de etílicos, embora também possam ocorrer, em alguns casos, após aumento do consumo. Entre outras causas de alucinose orgânica, podem ser citados o uso de alucinógenos como LSD, tumores do sistema nervoso central e epilepsia. A terapêutica consiste em tratar a causa e instituir antipsicóticos incisivos, de alta potência, que, mesmo em baixas doses, obtêm, na maioria dos casos, remissão dos sintomas em curto período de tempo. 3. Transtorno catatônico orgânico Descrita inicialmente por Kahlbaum, a catatonia é uma síndrome que se caracteriza por prejuízo na atividade motora e na linguagem (Altshuler, 1986). Sua ocorrência pode ser secundária a doenças orgânicas intra ou extracerebrais, drogas e quadros psiquiátricos funcionais, como esquizofrenia, transtornos do humor e estados dissociativos. As causas orgânicas da síndrome catatônica podem ser classificadas em cerebrais e extracerebrais. Entre as causas cerebrais estão principalmente as doenças que acometem os gânglios da base, o sistema límbico e os lobos frontal e temporal. Quanto às causas extracerebrais, podem ser citados hipercalcemia, encefalopatia hepática, porfiria, diabete melito, pelagra e uso de medicamentos como ácido acetilsalicílico, ACTH, dissulfiram, anfetaminas, fluoretos orgânicos e, principalmente, antipsicóticos. Os principais sintomas da catatonia são mutismo, negativismo, rigidez muscular, flexibilidade cérea, estupor, ecolalia, ecopraxia, estereotipias e verbigeração. Para o diagnóstico de transtorno catatônico orgânico deve haver evidência, a partir de história, exame físico e alterações laboratoriais, de que a catatonia é consequência fisiológica direta de uma condição médica geral, e não de um transtorno psiquiátrico funcional. Quadro catatônico de início agudo e que aparece em paciente que não tem história prévia de transtorno psiquiátrico sugere causa orgânica. A catatonia é uma condição clínica de urgência. O paciente pode evoluir com desidratação, alterações hidroletrolíticas, sendo que o risco de apresentar complicações médicas e óbito é alto. A taxa de mortalidade pode chegar a 20% nos casos de catatonia decorrente de síndrome neuroléptica maligna. Na abordagem de um paciente catatônico, é importante não só realizar o diagnóstico sindrômico de catatonia, mas também estabelecer a sua causa. Frequentemente é difícil diagnosticar a causa da catatonia com base apenas no exame do paciente. É importante, portanto, obter, por intermédio dos familiares, dados de história, como caracterização do início do quadro, natureza da sintomatologia inicial psíquica e física, história prévia de transtorno psiquiátrico, uso de drogas e antecedente familiar de transtorno mental. A investigação laboratorial complementa a realização do diagnóstico etiológico. O diagnóstico diferencial de transtorno catatônico orgânico deve ser realizado em relação aos transtornos psiquiátricos funcionais, como esquizofrenia, depressão e quadros dissociativos. Na esquizofrenia, além dos sintomas característicos, como embotamento afetivo, discurso desorganizado, delírios e alucinações, geralmente se observa início insidioso de sintomas psicóticos antes do estabelecimento da catatonia. Outro dado clínico que auxilia nesse diferencial é a história prévia de sintomas compatíveis com quadro de esquizofrenia. Em relação à depressão, é importante a constatação de história prévia de episódios depressivos e antecedente familiar de transtorno do humor. Observam-se, ainda, nesse quadro, sintomas característicos da depressão, como expressão facial de sofrimento e tristeza, humor depressivo, pensamentos pessimistas, de culpa, de ruína, entre outros. Nos transtornos dissociativos o quadro é uma resposta a um evento estressante recente. Nesses casos, o início é agudo e existe ganho secundário. 4. Transtorno delirante orgânico O delírio é um sintoma inespecífico, que denuncia a existência de um transtorno subjacente. O transtorno delirante orgânico caracteriza-se pelo aparecimento de delírio decorrente de etiologia orgânica específica. As alucinações, quando presentes, costumam ser menos proeminentes que os delírios. O nível de consciência encontra-se preservado, pois, do contrário, o diagnóstico seria de delirium. Os delírios tendem a ser grosseiros e pouco elaborados, embora possam ser extremamente sistematizados em alguns casos. Os delírios mais elaborados e sistematizados tendem a ser mais crônicos e estáveis e ocorrem com maior frequência em pacientes com pouco comprometimento cognitivo. O conteúdo mais comum é o persecutório, mas os temas podem ser de qualquer natureza, religiosa, grandiosa e somática. Também podem ocorrer delírios bizarros e ideias de influência. O transtorno delirante orgânico é muito frequente, ocorrendo em 50% dos casos de doença de Huntington, em 25% dos casos de doença de Parkinson pós-encefalítico, em 15 a 56% dos pacientes com doença de Alzheimer e em 27 a 60% dos casos de demência vascular. Qualquer doença capaz de provocar alterações no funcionamento do sistema nervoso central pode propiciar o aparecimento de delírios. Entre as inúmeras causas de transtorno delirante orgânico, podem ser citados o uso de drogas ou medicamentos, endocrinopatias, distúrbios metabólicos, deficiência nutricional, doenças inflamatórias e transtornos do sistema nervoso central, como distúrbios extrapiramidais, doenças degenerativas, doenças cerebro-vasculares, epilepsia, infecções, traumatismo cranioencefálico. Uma das principais causas de transtorno delirante orgânico é o uso de drogas. O quadro inicia com ideaçãopersecutória vaga e ilusões: o paciente enxerga um vulto na janela e julga estar sendo vigiado ou perseguido. Em seguida, passa a apresentar convicção delirante de estar sendo perseguido e alucinações vívidas de qualquer modalidade sensorial. O quadro é dependente da dose, e com a continuação do uso da droga, os delírios tendem a surgir com doses cada vez menores, o que sugere a participação de efeito kindling. A interrupção do uso da droga leva à remissão do problema em dias ou semanas. Outro transtorno delirante orgânico que é importante destacar é o quadro delirante alucinatório, às vezes indistinguível da esquizofrenia, que pode ocorrer em pacientes epilépticos. Esses pacientes apresentam ideação delirante, alucinações e alterações do pensamento. A afetividade tende a estar preservada, o que auxilia na distinção em relação à esquizofrenia. O quadro surge, em média, após 14 anos do início das crises convulsivas e é mais frequente em pacientes com quadro de epilepsia mal controlado. O tipo de epilepsia mais comumente implicado é a parcial complexa, seguido pelo grande mal. 5. Transtorno orgânico do humor A relação entre uma doença orgânica e depressão pode se dar de diversas formas. Uma doença orgânica pode conduzir à depressão pela própria alteração fisiológica, pelos medicamentos utilizados no seu tratamento, ou pela reação da personalidade ao distúrbio e suas consequências, como, por exemplo, reação ante uma limitação física importante. Além disso, uma doença orgânica pode atuar apenas como um fator precipitante de um quadro depressivo funcional primário. Para diagnosticar um transtorno do humor como orgânico, é necessário que a alteração do humor seja decorrente dos efeitos fisiológicos diretos de uma condição médica geral. O médico deve, através de história, exame físico e exames laboratoriais, estabelecer que a alteração do humor está relacionada etiologicamente com a doença orgânica por um mecanismo fisiológico. A existência de correlação temporal entre a doença orgânica e o início da alteração do humor, a ausência de história prévia ou de antecedente familiar de transtorno primário do humor e resposta inadequada ao tratamento com antidepressivos são dados que sugerem a realização desse diagnóstico. A alteração do humor ocorre mais frequentemente para o pólo depressivo com sintomas como humor depressivo, diminuição de interesse por ou prazer relacionado a quase todas as atividades, apatia, anergia, dificuldade de concentração, insônia, diminuição da auto- estima e da libido, ideação pessimista, de culpa ou ruína, e ideação suicida. Para diagnosticar um transtorno do humor como orgânico, é necessário que a alteração do humor seja decorrente dos efeitos fisiológicos diretos de uma condição médica geral. Entre as principais causas orgânicas podem ser citadas endocrinopatias, neoplasias, infecções, infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral, trauma cranioencefálico, doença de Parkinson, doença de Huntington, esclerose múltipla, epilepsia, colagenoses, hipovitaminoses e uso de drogas. Das doenças endócrinas, hipotireoidismo, diabete, síndrome de Addison e síndrome de Cushing são as mais importantes. Muitas vezes é difícil realizar um diagnóstico diferencial, uma vez que inúmeros sintomas estão presentes tanto na depressão como nas endocrinopatias. Sintomas de depressão funcional, como tristeza, anedonia, aumento de peso, diminuição de apetite, hipersônia, obstipação intestinal, diminuição da libido, anergia, fatigabilidade e dificuldade de concentração, também podem ser encontrados em pacientes com hipotireoidismo. É importante a observação de sintomas clínicos específicos de cada doença para a realização do diagnóstico diferencial. A depressão é muito frequente em pacientes com doença arterial coronariana. Aproximadamente 15 a 25% desses pacientes sofrem de depressão. O risco de depressão está associado à gravidade do infarto e ao grau de comprometimento da função cardíaca. Pacientes que apresentam depressão pós-infarto do miocárdio têm maior risco de mortalidade cardíaca. A depressão é a manifestação neuropsiquiátrica mais comum na doença de Parkinson, ocorrendo em 40% dos casos, mas os relatos variam de 4 a 70%. Em relação aos medicamentos responsáveis por depressão orgânica, os anti- hipertensivos destacam-se pela frequência de seu uso. Destes, os mais importantes são a reserpina, o alfa-metildopa, os tiazídicos, o propranolol e a clonidina. Também contribuem frequentemente para a instalação da depressão, os corticosteróides, os hormônios à base de estrógeno e progesterona, os quimioterápicos, a cimetidina, a cinarizina, entre outros. O uso de álcool, sedativos ou estimulantes é mais frequente entre deprimidos, podendo anteceder a instalação do quadro ou sucedê-la, em uma tentativa de “automedicação”. De modo geral, a suspensão das drogas é suficiente para a remissão dos sintomas depressivos em 15 a 30 dias. A persistência dos sintomas depressivos após esse período levanta a suspeita de um transtorno depressivo funcional. O manejo do transtorno orgânico do humor consiste em tratar a doença de base, além de introduzir terapêutica psiquiátrica específica. O tratamento da depressão é importante tanto para aliviar o sofrimento do paciente e melhorar sua qualidade de vida quanto para reduzir a morbidade e a mortalidade relacionadas à doença de base. Os antidepressivos são amplamente utilizados. Na escolha do tipo de antidepressivo, deve-se levar em consideração especialmente a natureza da doença de base, as condições clínicas do paciente e as possíveis ocorrências de interações medicamentosas. Intervenção psicoterápica, como, por exemplo, a terapia cognitivocomportamental, associada à psicofarmacoterapia, contribui para aumentar a eficácia do tratamento da depressão. Em alguns casos, a alteração do humor pode se dar para o pólo eufórico, com humor expansivo ou irritável, logorréia, aceleração do pensamento, hiperatividade psicomotora, distratibilidade, sensação elevada de auto-estima e de grandeza. A apresentação psicopatológica pode ser indistinguível dos seus respectivos transtornos funcionais. As principais causas orgânicas de quadros de mania são uso de drogas, problemas endocrinológicos, como hipertireoidismo, hiperparatireoidismo, síndrome de Cushing, e doenças do sistema nervoso central, como tumores, encefalites, acidente vascular cerebral. O uso de estimulantes como cocaína e anfetamina frequentemente leva a sintomas como euforia, hiperatividade, logorréia e agressividade. Na maioria dos casos, tais sintomas duram apenas algumas horas ou dias, mas podem ser intensos o suficiente para necessitarem tratamento. Em relação a medicamentos, hormônios tireoidianos, L-DOPA, bromocriptina e inibidores da monoaminoxidase podem levar a sintomas maníacos. 6. Transtorno orgânico de ansiedade A ansiedade é um fenômeno inespecífico que frequentemente acompanha um indivíduo acometido de uma doença física. Trata-se de uma reação compreensível e normal. No entanto, a ansiedade que se configura como patológica se diferencia da ansiedade normal pelo fato de os sintomas causarem sofrimento clinicamente significativo, ou prejuízo no funcionamento social, ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Para a caracterização do transtorno orgânico de ansiedade, é necessária a ocorrência de ansiedade proeminente, ataques de pânico ou obsessões e compulsões que sejam consequência fisiológica direta de uma condição médica geral. As causas mais comuns de transtorno orgânico de ansiedade são as doenças endócrinas e metabólicas (como hipertireoidismo, síndrome de Cushing, feocromocitoma, hipoglicemia, hipo e hipercalcemia), as doenças neurológicas (como acidente vascular cerebral, epilepsia, doença de Parkinson, infecções, tumores e traumatismo cranioencefálico), as doenças cardiovasculares(como infarto do miocárdio, angina, arritmia, insuficiência cardíaca), as doenças pulmonares (como asma, doença pulmonar obstrutiva crônica e embolia pulmonar) e as drogas (como hormônio tireoidiano, hidrazida, broncodilatador, bloqueador de canais de cálcio, esteróides, digoxina, álcool e cafeína). Objetivo 02: Diferenciar delírio de delirium. Delirium Apesar da semelhança na sonoridade das palavras o Delirium é bem diferente do Delírio, na psiquiatria o Delirium foi uma das primeiras doenças mentais descritas na literatura médica com trabalhos datados há mais de 2.500 anos, com inúmeras referências ao conjunto de sintomas que hoje é caracterizado de Delirium. Os critérios diagnósticos do DSM-IV (American Psychiatric Association, 1994) compreendem o Delirium como comprometimento da consciência passando considerado-lo como seu aspecto principal. Neste sentido, o Delirium não está associado exclusivamente aos transtornos psiquiátricos, mas também, a outras condições orgânicas crônicas (como, por exemplo, as síndromes demenciais, infecção, encefalopatia hepática, intoxicação por drogas e evento cirúrgico de grande porte. O DSM-IV subdivide o Delirium de acordo com sua etiologia, definindo-o como: (1) delirium por condição médica geral; (2) delirium devido à intoxicação por sustâncias; (3) delirium devido à abstinência de substâncias; e (4) delirium devido a múltiplas etiologias; além (5) delirium sem outras especificações. Os critérios diagnósticos do DSM-IV (American Psychiatric Association, 1994) se aproximam dos critérios diagnósticos da 10ª revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-10) e compreendem o Delirium como uma disfunção cerebral aguda caracterizada por alterações do estado de consciência transitórias e flutuantes, acompanhadas de compromisso cognitivo, apresentando rebaixamento do nível de consciência e consequentemente da atenção com confusão mental, pensamento ilógico e desorganização do discurso, agitação psicomotora, porém, existem casos que podem ocorrer, também, retração, hipersonolência e lentificação motora, além das alterações sono-vigília, como insônia no período noturno e sonolência no período diurno. Seu início é geralmente agudo, variando de algumas horas até poucos dias. Quando associado a condições médicas gerais o Delirium afeta, com frequência, doentes internados em unidades de cuidados intensivos (UCI), especificamente idosos. Muito se sabe dos fatores predisponentes do Delirium, tais como pré-existência de demência, idade avançada e precipitantes comuns. Sendo uma das principais consequências associadas a permanência hospitalar prolongada, aumento nos custos com cuidados médicos e maior morbidade e mortalidade entre idosos. Entretanto, a simples listagem dos fatores de risco, não explica, completamente, por que pessoas idosas são mais vulneráveis em desenvolver Delirium do que indivíduos jovens. Delírio O Delírio é uma alteração relacionada à formação de juízos, sendo um erro do processo de ajuizar que tem origem na doença mental. É o desenvolvimento de um conjunto de juízos falsos em consequência de condições patológicas preexistentes e que não se corrigem por meios racionais. As principais características do Delírio são: (1)uma convicção extraordinária; (2)não são susceptíveis à influência e; (3)possuem um conteúdo impossível. É através dos juízos que discernimos o que é real do que é fruto da nossa imaginação. Neste sentido, compreende-se o Delírio ou idéias delirantes como juízos patologicamente falsos. O Delírio é categorizado em três tipos: delírio primário (ou ideia delirante), delírio secundário (ou ideia deliróide) e idéia sobrevalorada. O delírio primário é caracterizado como juízo falso deve apresentar três características básicas: 1 - deve apresentar-se como uma convicção subjetivamente irremovível e uma crença absolutamente inabalável; 2 - deve ser impenetrável e incompreensível para o indivíduo normal, bem como, impossível de sujeitar-se às influências de correções quaisquer, seja através da experiência ou da argumentação lógica e; 3 - impossibilidade de conteúdo plausível . Todos os casos que não satisfazem essa tríade não podem ser considerados delírios verdadeiros ou delírios primários (podem ser idéias deliróides ou delírios secundários). O delírio secundário ou ideia deliróide tem origem compreensível em estados psicologicamente alterados, como nos transtornos do humor, alterações da sensopercepção e rebaixamento do nível de consciência. Podem também ser compreendidos como equívocos passageiros provocados por percepções enganosas e outras desse tipo. Por exemplo: as idéias de ruína e de culpa na depressão, idéias de perseguição no delirium tremens, as idéias de grandeza na mania. E a idéia sobrevalorada é uma idéia errônea por exagero afetivo em que a carga afetiva muito intensa afeta o julgamento da realidade e a idéia passa a preponderar sobre as demais, de forma pouco racional, afetando o comportamento do indivíduo. Objetivo 03: Melhora no manejo comportamental, ambiental e farmacológico no paciente em internação. 1. Manejo ambiental e organizacional A instituição de protocolos gerais de segurança pode reduzir agressões contra profissionais de saúde e garantir a segurança do próprio paciente. A prevenção de violência deve começar fora de sala de urgência, nas imediações da entrada para o serviço, sendo recomendado o uso de portas de segurança e detectores de metais. Isto é de grande importância para prevenir a entrada no serviço de saúde de armas trazidas por pacientes e visitantes. Uma limitação desta medida é que muitos pacientes dão entrada no hospital trazidos por ambulância e não passam, assim, pelos detectores de metais. Outra ação que pode minimizar o risco de violência é o uso de um sistema de comunicação rápido e eficiente que alerte a equipe sobre a admissão de um paciente com história de comportamento violento. O espaço físico destinado ao atendimento também deve ser organizado de maneira a aumentar a segurança do paciente e da equipe, ajudar o paciente a controlar seus impulsos violentos e evitar a progressão do comportamento violento. Deve-se atentar, por exemplo, para as características de móveis, objetos ou aparelhos que possam ser quebrados ou mesmo usados como armas. Idealmente, o acesso à porta deve ter a mesma distância tanto para o médico como para o paciente, porque alguns pacientes persecutórios podem sentir-se acuados se não tiverem acesso à saída, o que aumentaria o risco de agressão física. Um paciente potencialmente violento não deve ser atendido por um único membro da equipe, por uma questão de segurança de ambos, caso o paciente entre em agitação ou violência francas, mas a simples presença de outros profissionais de saúde ou mesmo de seguranças no local de atendimento também ajuda a coibir comportamentos violentos. Ao menor indício de hostilidade ou agitação, o paciente deve ser imediatamente avaliado, mesmo que isso implique em interrupção de outra atividade clínica ou desconsideração quanto à ordem de chegada para atendimento. Quanto mais cedo o paciente for abordado, menor é o risco de concretização do comportamento violento. Sempre que possível, um paciente agitado ou potencialmente agressivo deve ser rapidamente acomodado em uma sala mais reservada, evitando-se, assim, a exposição de outros pacientes e acompanhantes à situação de risco. Embora essa medida possa ser questionada por violar direitos individuais dos pacientes, sugerir que, uma vez em atendimento na sala de urgência, o paciente troque suas roupas por vestes hospitalares tem algumas vantagens para a proteção do próprio paciente. Esta ação permite procurar e remover armas que o paciente possa estar portando, diminui a possibilidade de fuga pela fácil identificação pelos profissionais de outras áreas que não conhecem o paciente,e já possibilita um exame físico que possa revelar focos de infecção, trauma ou outros sinais que possam indicar a etiologia da alteração de comportamento. A exposição a estímulos ambientais deve ser reduzida ao máximo e pessoas desestabilizadoras para o paciente – como, por exemplo, um familiar com quem o paciente tem uma relação conflituosa, ou um membro da equipe que o paciente envolveu em seus delírios – devem ser afastadas naquele momento de agitação. 2. Manejo comportamental e atitudinal Tendo-se em vista que, na grande maioria das vezes, num serviço médico, o comportamento violento é decorrente de alguma condição médica subjacente, encarar a agressividade do paciente como mais um sintoma a ser considerado no quadro clínico e como sinal de sofrimento psíquico evita que o médico entenda a situação como ameaça ou coação contra a sua própria pessoa. Isso permite que o profissional de saúde adote uma atitude empática e acolhedora, o que, na verdade, facilita o contato com o paciente e o consequente controle da violência. O objetivo é estabelecer uma relação médico-paciente o mais próxima possível de um vínculo de confiança e respeito no qual o paciente se sinta acolhido e o seu sofrimento reconhecido, levando ao estabelecimento de um esforço mútuo no sentido de controlar a agressividade. A maneira como o médico e os demais profissionais da equipe falam e se comportam pode ter um papel fundamental no controle de comportamento potencialmente agressivo e pode minimizar drasticamente o risco de violência. O médico deve dirigir-se ao paciente de maneira que seja visto por ele, ao mesmo tempo em que se mantém atento aos seus movimentos e fala. Da mesma maneira, não se deve dar as costas para um paciente agitado. Os movimentos devem ser suaves, evitando atitudes corporais de confrontação, tais como elevar a voz ou cruzar os braços, mantendo-se certa distância física do paciente. Isso evita que o paciente agrida o médico, mas também serve para tranquilizá-lo, uma vez que, dependendo da sua sintomatologia psicótica, pode se sentir ainda mais ameaçado pelo contato físico. Deve-se tentar manter o contato visual e evitar fazer anotações. Antes de qualquer intervenção, o psiquiatra deve se apresentar ao paciente, dizendo seu nome e seu papel profissional naquela situação. A fala deve ser pausada, mas firme, tomando-se o cuidado para evitar entonações ou frases hostis ou demasiadamente autoritárias. As intervenções verbais devem ser objetivas e claras. Não se deve barganhar com o paciente, mas é muito importante manter alguma flexibilidade na condução da entrevista e estar atento ao que o paciente tem a dizer ou reivindicar. Os limites quanto aos riscos de agressão física e as regras para atendimento no serviço devem ser claros e objetivamente colocados, sem ameaças ou humilhações. Importante ter em mente que esse não é o momento mais apropriado para confrontações. O paciente deve ser estimulado a expressar seus sentimentos em palavras e o médico deve reforçar a capacidade do paciente de autocontrole. 3. Manejo farmacológico Uma sedação plena já foi considerada como o objetivo principal no manejo de pacientes agitados. Atualmente, considera-se a sedação excessiva como um efeito colateral indesejável, que interfere na avaliação médica inicial, no estabelecimento de aliança terapêutica, na formulação do diagnóstico primário e na observação da evolução do quadro clínico. Portanto, o objetivo do uso de medicações é tranquilizar o paciente o mais rapidamente possível, reduzindo o risco de auto e heteroagressividade e de ocorrência de efeitos colaterais, mas de maneira a permitir a continuidade da investigação diagnóstica e da abordagem terapêutica. Entende-se por tranquilização rápida a obtenção de redução significativa dos sintomas de agitação e agressividade sem a indução de sedação mais profunda ou prolongada, mantendo-se o paciente tranquilo, mas completa ou parcialmente responsivo. Entre as medicações mais utilizadas com a finalidade de controle da agitação psicomotora, estão os antipsicóticos convencionais, como haloperidol e clorpromazina; benzodiazepínicos, como diazepam, lorazepam e midazolam; e, mais recentemente, antipsicóticos de nova geração, como olanzapina, aripiprazol e ziprasidona. Os antipsicóticos de baixa potência (ex: clorpromazina) são medicações pouco seguras para serem usadas no manejo de quadros agudos, pois podem provocar sedação excessiva, hipotensão, arritmias cardíacas e diminuição do limiar convulsivo. Já os antipsicóticos de alta potência (ex: haloperidol) apresentam menor incidência de sedação excessiva ou hipotensão, baixa propensão ao efeito quinidina-like-QT (ou seja, menor probabilidade de arritmias cardíacas) e menor efeito na redução do limiar convulsivo. Por outro lado, antipsicóticos de alta potência têm maior chance de provocar sintomas extrapiramidais, como distonia aguda – que causa sofrimento significativo ao paciente, podendo diminuir a adesão ao tratamento de longo prazo –, e acatsia – que pode ser erroneamente interpretada como piora da agitação psicomotora. Os antipsicóticos de nova geração apresentam um melhor perfil de efeitos colaterais, com boa eficácia em reduzir a agitação, sem causar sedação excessiva e com menor risco de ocorrência de sintomas extrapiramidais. Por outro lado, os custos com antipsicóticos de segunda geração são bem maiores, para um perfil de eficácia semelhante, particularmente para o manejo de uma situação aguda. Atualmente, encontram-se disponíveis para uso parenteral, no Brasil: a olanzapina, sendo preconizada dose inicial de 10mg por via intramuscular e dose máxima diária de 30mg, e a ziprasidona, na dose inicial de 10mg e máxima de 30mg ao dia. O uso de olanzapina injetável concomitantemente com benzodiazepínicos deve ser evitado, pelo risco de eventos adversos graves. Antipsicóticos em geral, e ziprasidona em particular, têm sido associados a um risco de aumento do intervalo QT, mas o evento parecer ser raro e associado a doses elevadas (maior que 80mg) de ziprasidona intramuscular. Os benzodiazepínicos têm ação sedativa e ansiolítica, que levam à rápida tranquilização do paciente. Podem causar depressão respiratória, sedação excessiva, ataxia e desinibição paradoxal. Devido ao efeito depressor do sistema nervoso central, devem ser evitados em pacientes intoxicados por outros depressores como álcool, barbitúricos ou opioides. Essa classe de psicofármacos também deve ser evitada em pacientes com função respiratória prejudicada ou com suspeita de traumatismo crânio-encefálico. Os benzodiazepínicos mais utilizados são o diazepam, o lorazepam e o midazolam. O diazepam pode ser administrado por via oral ou endovenosa. Evita-se o uso intramuscular do diazepam por esta via levar a uma absorção errática da droga. Seu rápido início de ação, mesmo por via oral, faz com que seja uma medicação bastante utilizada em emergências. O midazolam é uma medicação que pode ser utilizada por via intramuscular, o que reduz seu potencial de causar depressão respiratória, se comparada à administração endovenosa. Possui rápido início de ação, porém tem meia-vida curta (entre 90 e 150 minutos), o que faz com que esta medicação seja, em geral, utilizada em associação com outras drogas de meia-vida mais longa. O lorazepam pode ser administrado por via oral ou parenteral, mas apenas a formulação oral encontra-se comercialmente disponível no Brasil. Em nosso meio e em outros países em desenvolvimento, o uso do anti-histamínico prometazina, geralmente associado a um antipsicótico de alta potência, é prática clínica comum, embora diretrizes internacionais para manejo de agitação psicomotora não incluam a prometazina como uma das opções farmacológicas. A prometazina é um análogo químico da clorpromazina pertencente à classe das fenotiazínas, cuja indicação clínicaprincipal é o controle de condições alérgicas. Em voluntários saudáveis, seus efeitos colaterais de sedação excessiva e prejuízo de funções cognitivas e motoras são bem demonstrados. Por apresentar antagonismo dopaminérgico e noradrenérgico, a combinação de prometazina com haloperidol pode, na verdade, aumentar o risco de hipotensão e síndrome neuroléptica maligna. Uma possível explicação para a disseminação do uso de prometazina, no Brasil, como droga de escolha para manejo de agitação psicomotora pode ser a indisponibilidade da apresentação para aplicação intramuscular do lorazepam. Outra possibilidade seria o fato de que os antipsicóticos de nova geração não são facilmente acessíveis em todos os serviços de saúde, em função dos custos ainda elevados em comparação com outras drogas. As evidências disponíveis atualmente sugerem que o efeito sedativo da associação da prometazina com haloperidol seria mais pronunciado do que aquele obtido com o uso de olanzapina ou de haloperidol administrado isoladamente. Com relação aos efeitos colaterais, não foram observadas diferenças significativas entre a associação haloperidol-prometazina e olanzapina, mas a ocorrência de distonia foi mais freqüente entre pacientes medicados exclusivamente com haloperidol. De qualquer maneira, os dados disponíveis apontam para um efeito primordialmente sedativo da prometazina. Sempre que possível, é recomendável a tentativa de administração de medicação para controle de agitação por via oral antes de se tentar a via intramuscular. Antipsicóticos de alta potência (ex: haloperidol), benzodiazepínicos de rápido início de ação (ex: diazepam), ou a associação de ambos, são boas opções de medicação por via oral em pacientes apresentando quadro de agitação inicial. Uma alternativa de terapêutica por via oral que demonstrou efetividade, com poucos efeitos colaterais é a associação de risperidona, um antipsicótico de segunda geração, com o benzodiazepínico lorazepam. Tendo-se em vista o objetivo de tranquilização e não sedação profunda, recomenda- se que o manejo de agitação/agressividade seja feito com as menores doses possíveis, ajustadas de acordo com a necessidade clínica. No caso de prescrições adicionais, é recomendado que seja mantida a mesma droga (ou combinação de drogas), tendo-se em vista o aumento do risco de complicações com uso de polifarmácia. Referências: Manejo de paciente agitado ou agressivo – Revista Brasileira de Psiquiatria - 2010 Delirium e delírio – Gustavo Luis Caribé – O portal dos psicologos – 2015. Clínica Médica da USP – Volume 6° - 2016. Psiquiatria Clínica - Louza, Elkis.
Compartilhar