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A_especificidade_e_autonomia_da_religiao

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DE LUTERO A OTTO: 
o Protestantismo e a Ciência da Religião 
 
Joe Marçal G. Santos 
Arnaldo Érico Huff Júnior 
Organizadores 
 
 
	
SUMÁRIO 
Sobre	os	autores	 6	
Apresentação	 9	
Introdução	 12	
1	 Conexões	de	sentido	e	horizontes	entre	a	Reforma,		
o	protestantismo	e	a	Ciência	da	Religião	como	meio	de	humanização	 20	
2	 Protestantismo:	em	teoria,	religião	 35	
3	 O	ideal	humanista	como	base	para	compreensão	da	Ciência	da	Religião		
e	reflexões	relacionadas	à	obra	de	Filipe	Melanchthon	 46	
4	 Calvino	antes	do	calvinismo:	alguns	apontamentos	sobre	João	Calvino		
antes	do	calvinismo	ou	a	reinvenção	da	igreja	na	perspectiva	calviniana	 67	
5	 A	dialética	entre	Lei	e	Evangelho	quinhentos	anos	depois:		
uma	releitura	em	chave	kierkegaardiana	 81	
6	 Rudolf	Otto	e	o	mistério	de	seu	legado	para	as	ciências	da	religião	 94	
7	 A	especificidade	e	autonomia	da	religião	em	Rudolf	Otto	 113	
8	 De	Naturalismo	e	Religião	a	O	Sagrado:	contribuições	do	pensamento		
de	Rudolf	Otto	em	duas	épocas	de	mentes	secularizadas	 133	
9	 Teoria	da	religião:	questões	epistêmicas	e	traços	históricos	 152	
 
 
 
 
	
SOBRE OS AUTORES 
Joe Marçal G. Santos (Organizador) 
Professor no Núcleo de Ciências da Religião da Universidade Federal de Sergipe, vinculado ao 
Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião e ao Programa de Pós-Graduação 
Interdisciplinar em Cinema da mesma universidade. Bacharel em Teologia pela Faculdade 
Luterana de Teologia (1997, com o título de graduação integralizado em 2009, pela Escola 
Superior de Teologia), Mestre (bolsista CNPq) e Doutor (bolsista CAPES) em Teologia pelo 
Instituto Ecumênico de Pós Graduação. Pós-doutor (bolsista PDJ-CNPq) no Programa de Pós-
Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Rio Grande do Sul 
(PPGAS/UFRGS), na linha de pesquisa Antropologia da Religião. Área de interesses: Teologia da 
Cultura e Filosofia da Religião em Paul Tillich; Religião, Arte, Cinema e Literatura; temas teórico-
metodológicos na Pesquisa em Ciências da Religião. E-mail: jmgsantos@yahoo.com.br. Lattes: 
http://lattes.cnpq.br/5359207133765624. 
 
Arnaldo Érico Huff Júnior (Organizador) 
Possui graduação em Teologia pelo Seminário Concórdia (1993), mestrado pela Escola Superior de 
Teologia (1996), graduação em História pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio 
Grande do Sul (2001), doutorado em Ciência da Religião pela Universidade Federal de Juiz de 
Fora (2006), com período sanduíche no Departamento de Antropologia da Vrije Universiteit 
Amsterdam, e doutorado em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2012). 
Atua na área de Ciência da Religião, com foco nos seguintes temas: protestantismo, teoria da 
religião e religião e arte. É professor no Departamento de Ciência da Religião (graduação e pós-
graduação) e no Bacharelado Interdisciplinar em Ciências Humanas da Universidade Federal de 
Juiz de Fora, além de editor de Plura, Revista de Estudos de Religião, periódico eletrônico da 
Associação Brasileira de História das Religiões. Coordenador do NEPROTES, Núcleo de Estudos 
em Protestantismos e Teologias. E-mail: arnaldo.huff@ufjf.edu.br. Lattes: 
http://lattes.cnpq.br/1338130517240143. 
 
Eduardo Gross 
Possui graduação em Teologia pela Escola Superior de Teologia de São Leopoldo, RS (1989) e 
doutorado em Teologia também pela Escola Superior de Teologia (1997), tendo realizado parte dos 
estudos do doutorado na Lutheran School of Theology at Chicago (EUA). Atualmente é professor 
titular da Universidade Federal de Juiz de Fora. Sua tese para promoção a professor titular da 
UFJF, Proposta de Edição Crítica e Tradução dos Loci Theologici (Tópicos Teológicos) de Filipe 
Melanchthon, de 1521, foi aprovada em banca pública em fevereiro de 2017. É professor 
permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Religião da UFJF desde 1998, tendo 
	 7	
sido coordenador do programa entre 2007 e 2010. Desde 2017, é professor permanente também no 
Programa de Pós-Graduação em Filosofia da UFJF. Atua ainda, desde 2014, como professor 
colaborador no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Universidade Federal de 
Sergipe. Na graduação, ensina primordialmente no Bacharelado Interdisciplinar em Ciências 
Humanas e na graduação em Ciência da Religião da UFJF. Tem experiência nas áreas de Teologia, 
Ciência da Religião e Filosofia, com ênfase em Religião e Hermenêutica, atuando principalmente 
nos seguintes temas: filosofia da religião, religião e hermenêutica, religião e literatura, religião e 
cultura. E-mail: eduardo.gross@ufjf.edu.br. Lattes: http://lattes.cnpq.br/2654429053268264. 
 
Zwinglio Mota Dias 
Possui graduação em Teologia pela Faculdade Evangélica de Teologia de Buenos Aires, 
Argentina(1963) e doutorado em Teologia - Universitat Hamburg, Alemanha (1978). Professor 
associado da Universidade Federal de Juiz de Fora, aposentado em 2011. Exerce atualmente suas 
atividades docentes e de pesquisa na condição de professor-convidado do Programa de Pós-
Graduação em Ciência da Religião da UFJF. Tem experiência na área de Teologia, com ênfase em 
Missiologia, atuando principalmente nos seguintes temas: teologia, política, ecumenismo, direitos 
humanos, eclesiologia e pentecostalismo. Coordenador do NEPROTES, Núcleo de Estudos em 
Protestantismos e Teologias. Pastor-emérito da Igreja Presbiteriana Unida do Brasil e colaborador 
de “KOINONIA – Presença Ecumênica e Serviço”. E-mail: zwli@powerline.com.br. Lattes: 
http://lattes.cnpq.br/1271353912950240. 
 
Jonas Roos 
Possui Licenciatura Plena em Filosofia - Universidade do Vale do Rio dos Sinos (1999), Mestrado 
em Teologia - Instituto Ecumênico de Pós-Graduação das Faculdades EST (2003), Doutorado em 
Teologia - IEPG/EST (2007) com doutorado sanduíche (CNPq) realizado no Søren Kierkegaard 
Research Centre, Copenhague, Dinamarca, e Pós-Doutorado em Filosofia - Unisinos (2009), com 
bolsa do CNPq. Professor Adjunto do Departamento de Ciência da Religião da Universidade 
Federal de Juiz de Fora. Tem experiência nas áreas de Filosofia e Teologia, com ênfase em 
Filosofia da Religião, Teologia Sistemática e Antropologia Filosófica. E-mail: 
jonas.roos@ufjf.edu.br. Lattes: http://lattes.cnpq.br/1088757246032009. 
 
Carlos Eduardo Calvani 
Possui graduação em Teologia pelo Seminário Teológico de Londrina e pela Faculdade Unida de 
Vitoria (ES), Mestrado em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (1993) 
com dissertação sobre o movimento evangelical no protestantismo brasileiro. Doutorado pela 
Universidade Metodista de São Paulo (1998) com tese sobre Teologia e MPB a partir do referencial 
de Paul Tillich. Tem experiência na área de Ciências da Religião e Teologia. Atualmente pesquisa 
as relações entre Teologia, Cultura e Artes, Fenomenologia da Religião e Protestantismo no Brasil. 
Professor do Núcleo de Ciências da Religião e do Programa de Pós-Graduação em Ciências da 
Religião da Universidade Federal de Sergipe. E-mail: cecalvani@hotmail.com. Lattes: 
http://lattes.cnpq.br/7850710818370320. 
	 8	
 
Frederico Pieper 
Possui graduação em História e em Filosofia pela Universidade de São Paulo e graduação em 
Teologia pelo Instituto Concórdia de São Paulo. Mestrado (2003) e doutorado (2007) em Ciências 
da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo e especialização na Harvard University - 
Cambridge (MA). É também doutor em Filosofia pela a Universidade de São Paulo (USP). É 
professor do Programa de Pós-gaduação em Ciência da Religião da Universidade Federal de Juiz 
de Fora, na área de Filosofia da religião. Tem experiência na área de Filosofia com ênfase em 
filosofia contemporânea e filosofia da religião. E-mail: fredericopieper@gmail.com. Lattes: 
http://lattes.cnpq.br/4770309851004817. 
 
Humberto Araújo Quaglio de Souza 
Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora (2001), licenciado em História pela 
Universidade de Uberaba (2009) e licenciado em Filosofia pelo CentroUniversitário Claretiano 
(2015). Pós-graduado (especialização) em Direito Civil e Processo Civil pela Universidade Estácio 
de Sá (2002), pós-graduado (especialização) em Ciência da Religião pela Universidade Federal de 
Juiz de Fora (2010). Mestre em Ciência da Religião pela Universidade Federal de Juiz de Fora 
(2013), tendo sido bolsista do CNPq durante o mestrado. Doutor em Ciência da Religião pela 
Universidade Federal de Juiz de Fora (2017), tendo sido bolsista da CAPES durante o doutorado. 
Fellow da Hong Kierkegaard Library, St. Olaf College, Northfield, MN, Estados Unidos da 
América (2014) e pesquisador visitante na Universidade de Copenhague (Søren Kierkegaard 
Forskningscenteret ved Københavns Universitet), Dinamarca (2016). Atualmente é professor 
substituto no Departamento de Filosofia do Instituto de Ciências Humanas da Universidade Federal 
de Juiz de Fora. E-mail: hquaglio@terra.com.br. Lattes: http://lattes.cnpq.br/3086534580687197. 
 
Davison Schaeffer de Oliveira 
Possui licenciatura em Filosofia (2007) e doutorado em Ciência da Religião (2015), na área de 
concentração em Filosofia da Religião, ambos realizados na Universidade Federal de Juiz de Fora 
(UFJF), Minas Gerais. Durante o doutorado realizou pesquisa na Alemanha em duas 
oportunidades: primeiro, como pesquisador visitante na Humboldt-Universität em Berlim 
(DAAD/2012); em seguida, realizou estágio doutoral (sanduíche) na Martin-Luther-Universität em 
Halle (CAPES/2014). Concluiu recentemente pesquisa de Pós-doutorado (PNPD/CAPES) no 
Programa de Pós-graduação em Ciência da Religião da UFJF (2016-17). É membro da 
Internationale Schleiermacher-Gesellschaft, da Associação Brasileira de Filosofia da Religião 
(ABFR), assim como integra o Núcleo de Pesquisas sobre Filosofia Clássica Alemã (NUFCAL / 
UFJF). Tem experiência, sobretudo, nas seguintes áreas: filosofia da religião, teoria da religião e 
epistemologia da ciência da religião. E-mail: davisonschaeffer@yahoo.com.br. Lattes: 
http://lattes.cnpq.br/9341691846588745. 
	 9	
APRESENTAÇÃO 
O presente livro1 sela uma parceria entre dois grupos de pesquisa: o Núcleo de 
Estudos em Protestantismos e Teologias (NEPROTES), do Programa de Pós-Graduação 
em Ciência da Religião da Universidade Federal de Juiz de Fora, MG, e o Grupo de 
Pesquisa Correlativos – Estudos em Cultura e Religião (GPCOR), do Programa de Pós-
Graduação em Ciências da Religião da Universidade Federal de Sergipe. Ambos com 
interesses que convergem em torno da questão comum, acerca do repensar o Ocidente (ou 
aquilo que nos ocidentaliza) a partir do tema da religião, aproveitando a comemoração, em 
2017, dos 500 anos da Reforma religiosa na Europa. 
Mais que comemorar, trata-se de refletir e reconhecer, na religião e na teologia 
cristãs, elementos que tecem essa grandeza tão difusa chamada modernidade, cujo um dos 
traços mais significativos justamente tem sido querer-se distinta, separada, emancipada da 
religião. Refazer esses itinerários significa reconstruí-los. Porque temos poucas chances de 
sustentar um discurso teoricamente responsável acerca do mundo em que vivemos, 
recorrendo à confortável visão binária do século XIX, em que a emergência do Estado 
sugeria fronteiras institucionais duras e objetivas com a religião. 
Algo sintomático é, portanto, reconhecer o locus em que tais questões são 
postas, desde o qual os autores reunidos nessa obra tem desenvolvido suas pesquisas sobre 
religião, Cristianismo e Protestantismo, a saber, o Brasil desses 500 anos depois, que são 
também outros 500: é oportuno lembrar que a herança teológica, ética e política da 
Reforma do século XVI chega ao Brasil aos trancos e barrancos, assim como a 
modernidade. Os Huguenotes franceses no Rio de Janeiro, em 1557, mal se estabeleceram, 
foram perseguidos e expulsos sem deixar marcas significativas; na Bahia e em 
Pernambuco, entre 1624 e 1654, protestantes holandeses tiveram cerca de três décadas para 
deixar sementes, antes de sua expulsão por Portugal e Espanha. Depois disso, apenas a 
																																								 																					
1 Reunião de textos baseados nas conferências do evento De Lutero a Otto: perspectivas protestantes para a 
Ciência da Religião, realizado nos dias 19 e 20 de abril de 2017, na Universidade Federal de Juiz de Fora 
(UFJF), Juiz de Fora, MG. 
	 10	
partir de 1811 (e ao longo do século XIX) foi aceita a presença herética em terras 
brasileiras, disciplinada por regras de sutileza (templos sem torre e sino, por exemplo), 
pela própria restrição linguística e, em alguns casos, por certo confinamento geográfico. 
Apenas a partir do fim do século XIX e no decorrer do século passado, por meio da 
empresa missionária norte-americana e europeia, vamos ter um protestantismo dando as 
bases do ethos evangélico que hoje ganha corpo em nosso país – que já tem, 
evidentemente, suas próprias distâncias daqueles elementos fundantes do Protestantismo 
forjado nos séculos XVIII e XIX. 
Daí que o protestantismo abordado nessa obra dista significativamente do que 
representa ao senso comum (também no âmbito acadêmico) a noção de protestantismo no 
Brasil. Para dois Grupos de Pesquisa situados no Sudeste e no Nordeste brasileiros, essa 
percepção não é gratuita. De modo geral, a tradição da Reforma é completamente ignorada 
na Universidade, ainda que essa mesma tradição esteja na base de pensamento das 
Ciências Humanas! 
Uma ressalva que bem poderia ser examinada em profundidade, mas aqui se 
basta como mera nota metodológica. Os capítulos que seguem falam por si mesmos. Basta 
notar suas referências, que passeiam numa literatura fundamentalmente em língua alemã, 
cujas suas próprias referências vêm desde o século XVI. Trata-se da repercussão, tradução 
e interpretação da Reforma e seus desdobramentos (guerras religiosas do século XVII, Paz 
de Vestefália, Iluminismo e Idealismo alemão etc.) no que constituiu a modernidade. Isso, 
no mínimo, aponta a uma estrutura de pensamento particular, talvez algo estranho às 
referências canônicas das Ciências Humanas que atualmente se pratica. 
Os textos aqui reunidos, por sua vez, consideram de modo significativo a 
recepção dessa tradição teológica e filosófica no Brasil e na América Latina, 
especificamente relativa à área da(s) Ciência(s) da Religião. Nesse sentido, dão testemunho 
de uma reflexão em profundidade, feita a um modo nosso, acerca das bases do pensamento 
moderno (também pós-moderno). E nisso está a contribuição mais significativa dessa 
coletânea. Se ela não estabelece, de imediato, relação com a empiria religiosa de nosso 
contexto, é justamente nessa condição mediativa que provê deslocamentos e 
distanciamentos importantes. De certo modo, estamos lidando aqui com uma primeira 
	 11	
alteridade. Algo do que somos e, ao mesmo tempo, com que temos estranhamentos 
constitutivos. Nisso reside seu limite e seu potencial heurístico. 
Joe Marçal G. Santos 
Aracaju, SE, julho de 2017 
	
INTRODUÇÃO 
O ano de 2017 comportou duas datas significativas no contexto dos estudos do 
protestantismo: os 500 anos da Reforma e os 100 anos da publicação do livro Das Heilige, 
de Rudolf Otto. Tais datas são também significativas para a Ciência da Religião enquanto 
disciplina acadêmica. 
Em 31 de outubro de 1517, o monge agostiniano Martinho Lutero2 publicava, 
em Wittenberg, Alemanha, sua Disputatio pro declaratione virtutis indulgentiorum: as 95 
teses, como se tornou conhecido o texto. Nele, Lutero criticava ideias e práticas que 
envolviam a venda de indulgências por parte da cúria romana. Apareciam no debate temas 
como a penitência, a autoridade eclesiástica, a autoridade papal e a doutrina dos 
sacramentos. Ainda que originalmente Lutero pretendesse apenas esclarecer algumas 
ideias que afligiam a piedade das pessoas cristãs em sua paróquia e na Alemanha, as 95 
teses causaram grande comoção e ulteriormente acarretaram aquilo que Steven Ozment 
entendeucomo “o nascimento de uma revolução”3. 
A partir dali, cindida em seu centro, a igreja como uma unidade sob o papa não 
seria mais possível. Lutero, Zwinglio, Calvino e a ala radical da Reforma, constituem 
nuances de um movimento que ganhou o mundo. Autores como Ernst Troeltsch e Max 
Weber, entre outros, entendem o nascimento do mundo moderno como estreitamente 
relacionado à Reforma Protestante do século XVI4. 
Ao passo que o indivíduo fez-se autônomo em sua relação com Deus, o que se 
concretiza na doutrina do sacerdócio universal de todos os crentes, e passou a encontrar 
																																								 																					
2 LUTERO, Martinho. Obras Selecionadas. Vol. 1. Porto Alegre: Concórdia, São Leopoldo: Sinodal, 1987. 
3 OZMENT, Steven. The birth of a revolution. New York: Doubleday, 1992. 
4 TROELTSCH, Ernest. El Protestantismo y el mundo moderno. México: Fondo de Cultura Económica, 
1983; WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Pioneira, 2000. 
 
	 13	
sua vocação religiosa em cada atividade cotidiana – a ascese intramundana de Weber5 – 
também a religião pôde tornar-se, paulatinamente, um campo de estudos independente, o 
que se evidencia na própria história de diversas faculdades, cadeiras ou departamentos de 
Teologia, Ciência(s) da Religião e Estudos de Religião em universidades na Europa e na 
América do Norte. 
De fato, relativamente ao campo da Ciência da Religião, a constituição da 
disciplina traz as marcas do protestantismo. É reconhecida, nesse sentido, a formação de 
uma tradição interpretativa compreensiva da religião que remonta a Friedrich 
Schleiermacher. De Martinho Lutero a Rudolf Otto há uma gama de intelectuais 
protestantes que foram fundamentais para o surgimento do que Ninian Smart chamou de 
“moderno estudo da religião”6. 
É internacionalmente reconhecida a influência por sobre a Ciência da Religião 
da ideia de sagrado, como formulada por Otto7. Mircea Eliade afirmou alhures que “um 
bom livro de história das religiões deveria produzir no leitor uma ação de despertamento” 
como a produzida pela leitura de O Sagrado, equiparando o escrito de Otto e o poema “Os 
deuses da Grécia”, de Friedrich Schiller8. Conceitos formulados por Otto, como numinoso 
e mysterium tremendum et fascinans, tornaram-se estruturantes à nascente disciplina. Quer 
seja para apropriar-se de tais conceitos, quer seja para afastar-se deles ou superá-los, o 
cientista da religião deverá passar pelo Sagrado de Otto. 
Na primeira metade do século XX, em busca de distanciamento da antiga 
teologia liberal, a chamada teologia dialética, eventualmente também adjetivada como neo-
ortodoxa, enfrentou em novos termos os problemas de seu tempo. Karl Barth, Emil 
Brunner, Dietrich Bonhoeffer, Reinhold Niebuhr e Paul Tillich, os grandes nomes desse 
período, a seu modo, buscaram responder às questões do mundo moderno e secularizado 
desde a teologia cristã. Foram todos, também, fundamentais nos processos de formação do 
movimento ecumênico internacional, matriz do atual Conselho Mundial de Igrejas. 
																																								 																					
5 Ibid. 
6 SMART, Ninian. Worldviews: crosscultural explorations of human beliefs. 2ª ed. New Jersey: Prentice 
Hall, 1995, p. 20. 
7 OTTO, Rudolf. O sagrado. São Leopoldo: EST/Sinodal, Petrópolis: Vozes, 2007. 
8 ELIADE, Mircea. Origens: história e sentido da religião. Lisboa: Edições 70, 1989. 
	 14	
Particularmente Tillich, com sua definição de religião como uma “preocupação última”9, 
constitui-se como referência necessária para os estudos de religião no extra-muros da 
teologia eclesiástica institucional. A pesquisa sobre religião beneficiou-se de todos esses 
processos. 
No Brasil, o fenômeno de alguma forma se repete. A constituição da área 
passa, no país, pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Universidade 
Metodista de São Paulo que, concomitante às articulações na PUC-SP, nos anos 1980, 
aglutinou um grupo de pesquisadores protestantes do calibre de Jaci Maraschin, Antonio 
Mendonça, Julio de Santa Ana, Prócoro Velasques Filho e Milton Schwantes. Merece 
menção também a luterana Escola Superior de Teologia, de São Leopoldo, cujo programa 
de pós-graduação tem ajudado a formar quadros de inúmeras instituições de ensino 
superior, inclusive do departamento de Ciência da Religião da Universidade Federal de 
Juiz de Fora e, mais recentemente, do Núcleo de Ciências da Religião da Universidade 
Federal de Sergipe. 
Temos, assim, um escopo de temas que envolvem a herança protestante da 
Ciência da Religião. As datas comemorativas em questão ensejam, nesse sentido, um 
interessante debate. Dois tipos de questões emergem à vista. De um lado, elas demandam a 
compreensão das conexões entre a teologia da Reforma Protestante e o estudo acadêmico 
da religião na modernidade. De outro, convidam a pensar criativamente, em diálogo com 
essa tradição, novos horizontes para o estudo da religião na universidade. 
Considerando, ainda, o recorrente argumento de que a Ciência da Religião é a 
filha emancipada da Teologia, que acarreta o mais das vezes a simples negação materna, 
como se a Teologia fosse uma dinossáurica habitante da pré-modernidade, compreender 
tais processos pode colaborar na construção lúcida da identidade do cientista da religião, 
em um processo criativo, hermenêutico e dialógico com uma das influentes correntes 
intelectuais que formaram a disciplina. 
O esforço conjunto desta obra se constrói nesse horizonte. Nos dias 19 e 20 de 
abril de 2017, reuniu-se, em Juiz de Fora, MG, um grupo de pesquisadores vinculados aos 
programas de pós-graduação em Ciência da Religião da Universidade Federal de Juiz de 
																																								 																					
9 TILLICH, Paul. A dinâmica da fé. São Leopolodo: Sinodal, 1985. 
	 15	
Fora e em Ciências da Religião da Universidade Federal de Sergipe, em um simpósio que 
teve como tema “De Lutero a Otto: perspectivas protestantes para a Ciência da Religião”. 
O evento foi organizado pelo Núcleo de Estudos em Protestantismos e Teologias 
(NEPROTES/UFJF) e pelo Grupo de Pesquisa Correlativos: Estudos em Cultura e Religião 
(GPCOR/UFS). Os textos apresentados nas mesas do simpósio estão reunidos neste 
volume. 
Os primeiros cinco capítulos tratam de temas mais diretamente conexos à 
questão da Reforma e de seu significado hodierno, principalmente para a reflexão acerca 
da religião no contexto da universidade. Os capítulos finais, por sua vez, lidam com a 
questão da obra de Otto, o contexto de sua produção e tratam de seus limites e 
possibilidades para a pesquisa em Ciência da Religião. 
No texto de abertura, “Conexões de sentido e horizontes entre a Reforma, o 
Protestantismo e a Ciência da Religião como meio de humanização”, Arnaldo Huff levanta 
a questão da liberdade de investigação da religião, no contexto da Reforma, aliada a um 
profundo entranhamento nos problemas mais prementes de então. O surgimento da Ciência 
da Religião na Europa do século XIX é, em alguma medida, consequência da possibilidade 
do estudo autônomo da religião no ambiente da universidade, que foi potencializado no 
contexto da Reforma. O vigor atual da Ciência da Religião, todavia, queda prejudicado 
pela timidez dos pesquisadores e seu foco quase exclusivo nos esforços de análise, em 
detrimento das sínteses. A ideia de humanização é, então, desenvolvida pelo autor, a fim 
de apontar rumos para a recuperação do sentido no estudo acadêmico da religião, 
animando seu potencial imaginativo, criativo e transformador. 
Em seguida, o prof. Joe Marçal dos Santos, no texto “Protestantismo: em 
teoria, religião”, trata da dimensão propriamente religiosa da Reforma em seu legado à 
modernidade – distanciando-se das apropriações que simplesmente creditam à Reforma o 
nascimento da individualidade moderna. A antropologia luterana supõe, nesse sentido, umsujeito em arrependimento (methanoia) ante uma instância absoluta. Tal conexão com uma 
exterioridade constitui uma subjetividade em relação, não simplesmente autônoma. É o que 
Lutero chamava de vontade cativa, cativa da palavra de Deus, algo distinto da aspiração 
autônoma moderna. Trata-se de uma vontade que supera as formas de heteronomia, mas 
que possui um referencial externo, o qual serve como critério de julgamento das realidades 
	 16	
humanas e como horizonte para a ação. Tal instância substantiva constitui-se como 
simultaneamente misteriosa e revelada (absconditus e revelatus) e permite, nas palavras de 
Santos, uma compreensão “crítico-negativa da subjetividade humana”. 
O terceiro capítulo comporta, por sua vez, o texto do prof. Eduardo Gross, “O 
ideal humanista como base para compreensão da Ciência da Religião e reflexões 
relacionadas à obra de Filipe Melanchthon”. Gross parte do ideal humanista do 
Renascimento e, a partir dele, constata a fragmentação atual das Ciências Humanas, 
também da Ciência da Religião, e a perda que se impõe à medida que as mesmas assumem 
um viés explicativo e historicista, inspirado nas Ciências Naturais. O ímpeto de retorno às 
fontes originárias do estudo da religião no contexto humanista leva Gross à vida e obra de 
Filipe Melanchthon. Após breves notas biográficas, Gross concentra-se nos Loci 
Theologici de Melanchthon, contextualizando as transformações do texto em suas várias 
edições, pela revisão crítica do próprio autor. Em um passo seguinte, trata da leitura e da 
apropriação que Ernst Troeltsch fez em Razão e revelação em Johann Gerhard e 
Melachthon. A intenção de Gross, a partir de Troeltsch, é demonstrar o fôlego de um 
intelectual que era ao mesmo tempo teólogo, filósofo e historiador das religiões, debruçado 
sobre um período importante da história da teologia protestante. O esforço de Troeltsch 
sobre Melanchthon, simultaneamente crítico e compreensivo, indica caminhos para a 
retomada dos ideais humanistas por parte dos cientistas da religião. 
O capítulo seguinte é dedicado a João Calvino. Em “Calvino antes do 
Calvinismo”, o prof. Zwinglio Mota Dias elenca, a partir principalmente das “Institutas da 
Religião Cristã”, três faces olvidadas do reformador genebrino, por parte de um calvinismo 
recente de matizes fundamentalistas. Segundo Dias, Calvino como teólogo afirmou, 
primeiramente, um Deus “totalmente outro”, impossível de ser apreendido pelos seres 
humanos; um Deus soberano que, todavia, revela-se em Cristo aos humanos, no que se 
sublinha a fragilidade da vida terrena. Calvino foi, ademais, também pastor. Assumia, 
porém, a distinção entre a igreja dos cristãos, histórica, visível e a igreja como “a 
verdadeira esposa de cristo”, comunidade invisível, conhecida apenas por Deus. Na igreja 
visível, a fim de que seja reconhecida como tal, deve haver a pregação da Palavra de Deus 
e a correta administração dos sacramentos. Na condução dessa igreja visível, todavia, “a 
severidade deve ser moderada pela misericórdia”, afirmava Calvino. Por fim, Dias destaca 
ainda Calvino como homem público. Segundo o autor, a visão calviniana assegurava a 
	 17	
participação do cristão na vida pública como parte de sua vocação no mundo. Calvino, 
nesse sentido, buscou responder às grandes mudanças que abalaram o velho mundo, 
tratando sobre temas sociais diversos. Para Dias, justamente esta verve atenta à história foi 
perdida por uma teologia compreendida como ciência abstrata, especulativa e técnica. A 
crítica, transportada da igreja para a academia, é válida também para a Ciência da Religião. 
A dialética entre lei e evangelho é abordada pelo prof. Jonas Roos no capítulo 
que segue, a partir de uma chave kierkegaardiana. O autor sustenta que a relação entre lei e 
evangelho constitui, em Lutero, um modo de ler o texto bíblico, de pensar o cristianismo e 
de fazer teologia, sendo, portanto, fundamental para entender sua teologia. Em seu texto, 
Roos, após estabelecer os contornos da relação entre lei e evangelho em Lutero, trata da 
apropriação que dela fez Kierkegaard, no século XIX. Em destaque, a analogia entre a 
dialética luterana de lei e evangelho e a relação socrática entre ironia e subjetividade: para 
que surja a subjetividade/graça, a ironia/lei tem um papel fundamental. A própria obra de 
Kierkegaard é passível de apreensão nessa mesma duplicidade. Por fim, Roos, 
aproximando o tema de nosso contexto, lança mão de outro paradoxo fundamental, a saber, 
a questão do desespero e da ausência de sentido em sua relação com a graça e a construção 
de sentido. Para o autor, em sua convergência entre Lutero e Kierkegaard, o sentido se dá, 
se oferece, trata-se de algo substancial que permite a fundamentação dos sentidos 
particulares. Extraindo consequências para se pensar um conceito de religião, o autor 
assegura que é nessa dinâmica simbólica paradoxal que a religião desafia à compreensão 
do eterno no temporal, do infinito no finito. 
O prof. Carlos Calvani, no capítulo seguinte, abrindo a sequência de textos 
voltados à obra de Otto, trata do que chama de “o mistério do legado de Otto para as 
ciências da religião”. Calvani principia levantando a polêmica instaurada na recepção de 
Otto no Brasil, inclusive a acusação de criptoteologia que lhe é dirigida e sua inadvertida 
associação à fenomenologia da religião. Sustenta, nesse contexto, que, embora o nome de 
Otto seja famoso, o conjunto de sua obra é pouco conhecido no Brasil. A questão passa, 
para Calvani, por onde se situa a obra de Otto, se na teologia, na filosofia ou na 
fenomenologia da religião. Para o autor, o que Otto faz é uma filosofia religiosa da 
religião. Era teólogo e seus interesses filosóficos passavam por questões de ordem 
religiosas e existenciais. A contribuição de Otto é melhor apreendida nessa chave. Nesse 
sentido, a repulsa à teologia existente nos meios acadêmicos dificulta a recepção e a 
	 18	
compreensão das ideias de Otto. Para Calvani, todavia, Otto ainda tem o que dizer àqueles 
interessados no estudo da religião. Afinal, questiona o autor, se recusamos o específico da 
religião, seu a priori, qual o sentido de se estudar os fenômenos religiosos? 
Em sequência, no capítulo intitulado “A especificidade e autonomia da religião 
em R. Otto”, o prof. Frederico Pieper Pires desvela o contexto das ideias centrais de Das 
Heilige em sua relação com obras de Otto não tão conhecidas no Brasil. A partir da análise 
de Naturalismo e Religião, obra escrita em 1904, e de Filosofia da religião baseada em 
Kant e Fries, de 1909, Pieper aclara a construção, em Otto, da relação entre racional e 
irracional na religião, as apropriações que faz de Schleiermacher, Kant e Fries, o traço 
transcendental de sua filosofia, bem como a noção de a priori. Tece, por fim, suas 
considerações críticas a Otto, perguntando pela validade de sua filosofia para a 
constituição da Ciência da Religião. 
O prof. Humberto Quaglio, no texto que segue, trata do desenvolvimento do 
pensamento de Otto, considerando o período que se estende da publicação do texto de 
1904 (Naturalismo e Religião, tratado por Pieper no capítulo anterior) até a publicação de 
Das Heilige, em 1917. Conforme Quaglio, entre as últimas décadas do século XIX e as 
primeiras do século XX, asseverou-se o espírito de confiança nas ciências da natureza, 
entendidas como instrumento principal para a compreensão do mundo. Tal ambiente 
favoreceu a secularização das mentalidades, o que pode ser percebido até os dias atuais. 
Também as cosmovisões materialistas tomaram assento nesse contexto, instaurando uma 
percepção segundo a qual o fenômeno religioso torna-se algo sem relevância. De fato, 
Naturalismo e Religião foi escrito em um ambiente de aversão à metafísica e constitui um 
debate do autor com seu entorno intelectual. Otto, todavia, acreditava ser possível 
harmonizar as duas concepções de mundo. Não havia, paraele, uma cisão de princípio 
entre o racional e o irracional. Em Das Heilige, todavia, o lado irracional da experiência 
religiosa ganha maior atenção, sublinhando-se os limites da razão nesse âmbito. Conforme 
Quaglio, em sintonia, portanto, com os capítulos que o precedem neste livro, o pensamento 
de Otto é melhor compreendido quando suas outras obras são conhecidas e consideradas. 
Encerra esta coletânea o texto “Teoria da religião: questões epistêmicas e 
traços históricos”, de autoria do prof. Davison Schaeffer de Oliveira. O capítulo discute o 
papel da teoria da religião para a Ciência da Religião, considerando tanto aspectos 
	 19	
epistemológicos, quanto traços históricos da formação da disciplina. Partindo do locus da 
teoria da religião na Ciência da Religião, o autor dedica-se à recorrente controvérsia acerca 
da definição de seu objeto, para então conectar tal discussão com a questão da 
fenomenologia da religião. Surge, como nos capítulos precedentes, o problema da 
resistência em relação à teologia e à filosofia no tocante ao estudo da religião, por parte 
daqueles que pretendem diminuir o risco de interferências teológico-apologéticas no 
trabalho científico. O argumento levanta, por fim, a discussão em torno do uso do conceito 
de sagrado, particularmente com referência a Rudolf Otto. Segundo o autor, a diluição do 
fenômeno religioso em conceitos como os de cultura, homem, sociedade, espiritualidade, 
igualmente problemáticos e genéricos, não resolve a questão e aponta para a renovada 
necessidade de se repensar o objeto de nossa disciplina: a religião. 
O conjunto dos textos aqui elencados dispõe, assim, abordagens que, por um 
lado, permitem discutir as conexões genéticas entre a Reforma, o protestantismo e o 
surgimento da Ciência da Religião; e que, por outro, vislumbram novas possibilidades para 
a disciplina em diálogo com interpretações protestantes da religião. O leque de autores 
discutidos vai de Lutero, Melanchthon e Calvino, passando por Kierkegaard, 
Schleiermacher, Otto e Tillich, até Richard Shaull e Rubem Alves, compondo, assim, um 
panorama amplo de ideias protestantes acerca da religião, de seu estudo e de seu lugar na 
vida humana. Espera-se que as ideias aqui convergidas possam de alguma forma colaborar 
no necessário debate acerca da constituição e dos fundamentos de nossa disciplina. 
Arnaldo Érico Huff Júnior 
Juiz de Fora, MG, julho de 2017 
 
	
1 CONEXÕES DE SENTIDO E HORIZONTES ENTRE A 
REFORMA, O PROTESTANTISMO E A CIÊNCIA DA RELIGIÃO 
COMO MEIO DE HUMANIZAÇÃO 
Arnaldo Érico Huff Júnior 
1.1 Introdução 
Tratar das conexões entre a Reforma, o protestantismo e a Ciência da Religião 
é levantar um assunto que pode ser espinhoso. O problema de fundo é o da relação entre 
religião e ciência, subentendidas como esferas independentes e sem contato, o que 
constitui uma das questões mais naturalizadas e fundantes da modernidade. Tal polêmica, 
neste texto, pode se instaurar, ao passo que o tema tratado pretende indicar e, nesse caso, 
acolher justamente os pontos de contato entre ciência e religião. 
É bem conhecido o argumento que sustenta que a Ciência da Religião é a “filha 
emancipada da Teologia”. Trata-se de ideia propalada e comumente aceita de modo 
acrítico. A afirmação indica o desejo de que a Ciência da Religião seja ciência, não 
religião. A exacerbação de tal ponto de vista gera uma postura de distanciamento ante a 
religião, entendida como objeto empírico, talvez mesmo de pretensa neutralidade. Uma das 
consequências de tal entendimento, e seu consequente foco na leitura da “realidade 
objetiva”, é a absoluta multiplicação fragmentada de trabalhos analítico-empíricos, 
concomitante à quase inexistência de esforços de síntese interpretativa. Estes demandam 
envolvimento, não distanciamento. Falta a pergunta: “o que significa isso em termos 
humanos? O que hoje significa, por exemplo, o crescimento e o vulto sociológico que toma 
o pentecostalismo ao redor do mundo?”. Os trabalhos se concentram em interesses de voto, 
bancada evangélica, intolerância etc. São questões importantes, sem dúvida. Mas quem 
fará a pergunta pelo sentido da religião? Pergunta que teima em se impor sempre 
novamente. Tal tarefa poderia ser em parte cumprida pela Ciência da Religião. Ao se 
aproximar dessa questão, obviamente, a isenção religiosa pretendida pela cientificidade da 
	 21	
Ciência da Religião encontra suas fronteiras borradas. Assim também, quanto mais 
próximo das fronteiras, mais se impõe a questão da relação da Ciência da Religião com a 
Teologia.10 
Partimos, notadamente, de um entendimento de religião como um algo anterior 
às religiões e religiosidades, às tradições religiosas e às culturas. Acompanhando Tillich 
(2009, p. 83), estamos interessados na substância religiosa que fundamenta as expressões 
religiosas culturais. Olhar a religião “de fora” permanece, é claro, uma alternativa válida e 
acadêmica. Talvez necessária em diversos sentidos e momentos. Não é este, porém, o 
caminho aqui tomado. Posicionamo-nos no limite, perguntando pelas origens teológicas da 
Ciência da Religião a fim de aventar, a partir destas, horizontes para o estudo e a pesquisa 
na disciplina. A aposta deste texto é de que a aproximação hermenêutica da religião, 
interessada na questão do sentido, instaura um processo pedagógico de humanização. 
1.2 O estudo da religião no contexto da Reforma e alguns desdobramentos para a 
Ciência da Religião 
Três pontos serão aqui, inicialmente, destacados: a independência e a liberdade 
no estudo da religião no ambiente da Reforma; sua conexão com as questões mais 
prementes de seu tempo; e os fundamentos de um estudo compreensivo da religião 
construídos no contexto do protestantismo. 
Gerhard Ebeling, em seu livro sobre o pensamento de Lutero, entende a 
atividade do reformador como um acontecimento linguístico. Foi, afinal, o trato e o 
cuidado com a palavra por parte de Lutero que gerou o movimento reformatório. Ebeling 
(1988, p. 13) não titubeia em concluir que “nunca na história das universidades, o mundo 
foi tão direta e amplamente atingido e modificado pela atividade conjugada de escritório e 
sala de aula”. Por isso mesmo, continua, “se a Universidade quer refletir sobre as suas 
potencialidades máximas, ela é remetida a Lutero”. Nessa perspectiva, colocar a Ciência da 
Religião em diálogo com a Reforma e o protestantismo indica uma expectativa no sentido 
de contribuir, por um lado, para a compreensão da constituição da Ciência da Religião 
																																								 																					
10 Refiro-me aqui à teologia acadêmica, não àquela determinada por interesses eclesiásticos e institucionais. 
	 22	
enquanto disciplina acadêmica e, por outro lado, para a ampliação do entendimento de seu 
lugar no mundo. 
A primeira questão que merece destaque no contexto da Reforma, seguindo 
Ebeling, é o traço constitutivo, em relação ao movimento como um todo, do mandato do 
Dr. Lutero na Universidade de Wittenberg. Este foi, na verdade, a sustentação de todas as 
demais esferas em que esteve envolvido. “Durante tal atividade docente, perdi o papado”, é 
o que dizia o próprio Lutero, sublinhando o traço acadêmico da Reforma (EBELING, 
1988, p. 11). Naquele contexto, a atividade acadêmica, e com ela a teologia, estiveram 
diretamente conectados com a vida comum e os rumos sociais. Aliás, talvez orgânica seja 
uma boa palavra para definir a atividade acadêmica da Reforma. 
De fato, às voltas de 1517, as principais dinâmicas do movimento que abalaria 
a cristandade estiveram umbilicalmente ligadas à Universidade de Wittenberg. Lutero, 
Melanchthon e Karlstadt eram lá professores. O traço acadêmico da teologia protestante 
pode, na verdade, ser percebido ainda nos dias atuais. E considere-se que algumas das mais 
tradicionais universidades do mundo possuem background protestante: Marburg, Genebra, 
Amsterdam, Leiden,Oxford, Cambridge, Harvard, Princeton, Columbia, dentre outras. 
Na verdade, um dos significativos resultados da Reforma foi a reestruturação 
do ensino. Isso significa que a Reforma foi também uma reforma universitária, implicando 
na reorganização do currículo da universidade e no despertamento de um novo espírito 
acadêmico. O estudo da Bíblia, de Agostinho e dos demais pais da Igreja deveria, para 
Lutero, ter precedência a Aristóteles (EBELING, 1988, p. 13). Tratava-se, portanto, das 
implicações, para a Reforma, do espírito humanista de retorno às fontes. 
Vislumbra-se, assim, o surgimento de um tipo de estudo autônomo da religião 
no ambiente universitário, não mais subjugado à autoridade papal e eclesiástica romana, 
porém buscando seus próprios fundamentos. Nesse sentido, a possibilidade de uma Ciência 
da Religião universitária deve algo à ruptura eclesiástico-institucional que a Reforma 
instaurou. Movimentos posteriores internos ao protestantismo representaram retrocessos 
nesse sentido, como se pode notar em certas apreensões ortodoxas e fundamentalistas já 
institucionalizadas da Bíblia. A despeito disso, todavia, como bem indicou Tillich, a 
liberdade de Lutero levou o protestantismo a aceitar o tratamento histórico da literatura 
	 23	
bíblica. E, por conseguinte, a “aplicação do método histórico aos livros sagrados de 
qualquer religião” (TILLICH, 2000, p. 242). 
Mas esse já é, como se sabe, o contexto da modernidade, à qual o surgimento 
da Ciência da Religião esteve obviamente amarrado. Em termos sociológicos, as 
implicações dizem respeito ao que Weber (2004, p. 96) chamou de desencantamento do 
mundo e Berger (1985, p. 117) de processo de secularização. E novamente estamos às 
voltas com o protestantismo. Ou seja, à medida que o universo protestante deixou de ser 
perpassado por seres e forças sagradas, a radical transcendência sobrenatural de Deus foi 
contraposta a um mundo imanente, despido de seus atributos sagrados. Nessa cosmovisão, 
o homem, terrenal, aparece como dependente da intervenção sobrenatural de Deus e dos 
céus. O protestantismo, nesse sentido, antecipou arquetipicamente a secularização. Berger 
inclusive assevera, sublinhando o traço linguístico do processo, que 
o protestantismo reduziu o relacionamento do homem com o sagrado ao 
canal, excessivamente estreito, que ele chamou de Palavra de Deus (que 
não se deve identificar com uma concepção fundamentalista da Bíblia, 
mas com a excepcional ação redentora da graça de Deus – a sola gratia 
das confissões luteranas). [...] bastava romper esse estreito canal de 
mediação para se abrirem as comportas da secularização (BERGER, 
1985, p. 125). 
Com o processo de secularização, setores da cultura se tornam mais 
independentes dos símbolos e instituições religiosas, assim também a universidade. A 
religião, por sua vez, que passou a ser entendida como uma das esferas da cultura, tornou-
se um campo cada vez mais livre para o estudo e a investigação acadêmica. A 
conformação do estudo da religião na universidade do século XIX aconteceu em meio a 
esses processos. 
Pensando retrospectivamente, essa saída de cena dos símbolos e instituições 
religiosas para um papel coadjuvante constituiu uma situação de crise, cujo resultado que 
aqui mais interessa foi justamente a busca por uma percepção da religião em novos termos 
e a pergunta acerca de seu lugar no mundo moderno.11 Se tomarmos a publicação, em 
																																								 																					
11 Note-se a questão posta por Rubem Alves (1984b, p. 37): “A secularização não foi a morte dos deuses mas 
antes a promoção, ao status de deuses, de certos fatores do nosso mundo que se pretendiam secularizados. 
Será possível tomar o lugar dos deuses sem se tornar um deus? Ora, foi isto exatamente que a ciência, a 
tecnologia e certas ideologias fizeram”. 
	 24	
1799, de Über die Religion, Reden an die Gebildeten unter ihren Verächtern (Sobre a 
Religião, discursos aos cultos dentre seus menosprezadores) de Friedrich Schleiermacher 
(1768-1834), como um marco de uma nova percepção da religião, a questão queda mais 
clara. Ante os desprezadores esclarecidos da religião, dentre os quais tinha seu próprio 
círculo de amizades, quando capelão de um hospital reformado em Berlin, Schleiermacher 
afirmava sua compreensão da religião como uma intuição integradora do todo, do universo 
e, portanto, anterior e maior que Deus e que as culturas, tradições e instituições religiosas. 
A percepção da religião que se instaurava possibilitava novamente a discussão significativa 
sobre o sentido da religião na modernidade. 
Assim, ao que parece, as noções de religião como “sentimento e intuição do 
universo”, de Schleiermacher; como “experiência do numinoso”, de Rudolf Otto (1869-
1937); como “preocupação última”, de Paul Tillich (1886-1965); como “presença da 
ausência”, de Rubem Alves (1933-2014);12 constituem um campo de entendimento da 
religião que lega à Ciência da Religião uma apreensão compreensiva do fenômeno 
religioso e que busca seu espaço no mundo moderno. Em comum, pode-se argumentar, tais 
perspectivas possuem a ideia de que a religião está relacionada a uma experiência pessoal 
de (re)conexão com Deus, com o sagrado, com o fundamento do ser etc., e que perpassa a 
vida espiritual da humanidade. Assim, em termos modernos, a estrutura de fundo do 
problema não era, todavia, estranha à Reforma do XVI – basta pensar, em Lutero, a relação 
feita entre graça, palavra e fé. 
De qualquer forma, não parece ser coincidência a presença maciça de 
intelectuais de formação protestante nas dinâmicas que envolveram o nascimento da 
Ciência da Religião. Sabe-se que o surgimento de uma tal tradição compreensiva da 
religião deve algo a Schleiermacher, e desde lá a Otto e a Tillich, por exemplo. Ligados à 
Ciência da Religião de modo mais direto estariam ainda Cornelils Tiele (1830-1902); 
Pierre Chantepie de la Saussaye (1848-1920), Ernst Troeltsch (1865-1923), Nathan 
Söderblom (1866-1931), Gerhardus van der Leeuw (1890-1950), Friedrich Heiler (1892-
1967) e Joachim Wach (1898-1955), alguns dentre os renomados estudiosos da religião de 
pertença protestante, na virada para o século XX. Também o que chamamos de 
fenomenologia da religião, à medida que pressupõe algo essencial que se manifesta na 
																																								 																					
12 Friedrich Schleiermacher (1990); Rudolf Otto (2007); Paul Tillich (2009); Rubem Alves (1984b). 
	 25	
forma religiosa e que requer empatia para ser apreendido, aproxima-se desse mesmo 
ambiente de interesses e de estudo. 
Afirmar, nessa perspectiva, que a Ciência da Religião surge na modernidade e 
se produz em certa medida sobre bases de alguma maneira relativas à Reforma e ao 
protestantismo, significa sublinhar o fato de que intelectuais que participaram de sua 
formação estavam lidando com algo que lhes dizia respeito fundamentalmente, uma 
questão ontológica. A essência da religião, afinal, como dizia Rubem Alves (1984b, p. 39), 
“não é um objeto, mas uma relação”. 
Vejamos, a título de exemplo, um pouco da biografia do sueco Nathan 
Söderblom (1866-1931), teólogo luterano e arcebispo de Uppsala, pioneiro do movimento 
ecumênico internacional e historiador das religiões – praticamente desconhecido à Ciência 
da Religião brasileira. Filho de pastor, Söderblom advinha da formação pietista, ainda que 
a teologia liberal o tivesse levado a outros horizontes. Estudou teologia na Universidade de 
Uppsala, foi ordenado pastor em 1893 e, em 1901, obteve seu doutorado em teologia na 
Sorbonne, com tese sobre a religião persa antiga. Em Paris, durante os estudos de 
doutorado, também pastoreou uma igreja sueca. Entre 1901 e 1912, Söderblom ensinou na 
Escola de Teologia da Universidade de Uppsala, pesquisando e publicando nas áreas de 
História das Religiões, psicologia e filosofia da religião; momento em que aquela 
universidadeexperimentou uma intensificação dos estudos de religião e teologia. Entre 
1912 e 1914, atuou como professor de História das Religiões na Universidade de Leipzig. 
Seu interesse acadêmico girava ao redor da relação entre religião e revelação, de uma 
leitura cristã das religiões não-cristãs e dos estudos da vida e da obra de Lutero. Em 1914, 
foi surpreendido com a indicação de seu nome para o arcebispado da Igreja Luterana da 
Suécia, atividade que exerceria ao longo dos dezessete anos seguintes, até seu falecimento. 
Internacionalmente, Söderblom tornou-se mais conhecido como militante do movimento 
ecumênico. Participou do movimento estudantil cristão, esteve à frente da Conferência de 
Vida e Ação e colaborou com a Comissão de Fé e Ordem, peças-chave na fundação do 
Conselho Mundial de Igrejas, em 194813. Pouco antes de morrer, em 1930, Söderblom foi 
																																								 																					
13 Mais sobre a formação do movimento ecumênico internacional e o CMI em Zwinglio M. Dias (1998). 
	 26	
ainda agraciado com o Prêmio Nobel da Paz (KRÜGER, 1991, p. 938-939).14 Vejamos o 
que Jacques Waardenburg compreendeu do esforço intelectual de Söderblom. 
Em sua atividade acadêmica, Söderblom recusou-se a se confinar a uma 
explicação ou a uma teoria acerca da origem da crença humana em Deus, 
mas, utilizando um método tipológico, pretendeu demonstrar que o 
animismo, a crença no ‘mana’ e a crença no ‘Deus superior’ eram três 
tipos diferentes e paralelos de experiência e desenvolvimento religioso. 
Acentuava a importância da categoria do sagrado [holiness] como sendo 
chave no estudo da religião mesmo antes de Otto. Arquitetou uma 
tipologia da religião antes de Heiler, distinguindo religião étnica, 
misticismo do infinito e revelação profética. Em toda sua obra sublinhou 
a luta e a busca religiosa comum à humanidade (WAARDENBURG, 
1999, p. 381). 
Note-se a proximidade desta com as perspectivas até aqui elencadas acerca do 
estudo da religião. Mas este não é um texto comemorativo ou laudatório. Para lá de apontar 
algumas conexões genéticas entre a Reforma, o protestantismo e o nascimento da Ciência 
da Religião, pretendo problematizar uma questão específica, a saber, a da relação da vida 
universitária, e nesse caso específico da Ciência da Religião, com a vida comum e os 
rumos da humanidade. É nesse sentido que a obra de Söderblom é aqui evocada, junto aos 
demais intelectuais mencionados. É claro que as fronteiras entre ciência e religião nesse 
caso não são aquelas esperadas por certo realismo ou cientificismo moderno. 
1.3 Uma perspectiva de humanização para Ciência da Religião 
Experimentamos atualmente uma erosão e uma encruzilhada de sentido. O 
avultamento de tendências conservantistas, por exemplo, é visível e ganha força ao redor 
do mundo. A situação é, novamente, de crise. A universidade, por sua vez, e com ela a 
Ciência da Religião, pode exercer, como na Reforma, um papel fundamental na 
reconfiguração das formas de pensar a vida humana. Para isso, todavia, precisa vencer sua 
situação fragmentária, bem como alguns dualismos que se lhe tornaram estruturantes: 
ciência vs. religião; razão vs. fé; Estado vs. Igreja; política vs. religião etc. 
																																								 																					
14 Tb. em NATHAN SÖDERBLOM – BIOGRAPHICAL, disponível em: 
<http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/peace/laureates/1930/soderblom-bio.html>, acesso em 07/04/2017. 
	 27	
Retomemos um texto conhecido de Mircea Eliade, Crise e renovação, em que 
lamenta a timidez dos historiadores da religião de seu tempo. Conforme ele, em digressão, 
a expectativa de um “segundo Renascimento” gerado pelo conhecimento da espiritualidade 
indiana através da atividade de Max Müller fora frustrado por duas razões: (I) a eclipse da 
metafísica e o triunfo de ideologias materialistas e positivistas e (II) a concentração da 
primeira geração de indianistas na edição de textos, vocabulários e nos estudos filológicos 
e históricos, tendo como consequência a ausência de trabalhos de síntese (ELIADE, 1989, 
p. 74). Tal contexto ajudaria a entender a inexpressividade cultural da História das 
Religiões – talvez também nos ajude atualmente. 
Vale notar que o que Eliade entende por História das Religiões é o que no 
Brasil e em outros países, como a Alemanha e a Holanda, chamamos ciência(s) da religião. 
Em suas palavras: 
Entende-se geralmente por “história das religiões” ou “religião 
comparativa” o estudo integral das realidades religiosas, quer dizer, as 
manifestações históricas de um tipo particular de “religião” (tribal, étnica, 
supranacional) bem como as estruturas específicas da vida religiosa 
(formas divinas, concepções da alma, mitos, rituais etc.; instituições etc.; 
tipologia das experiências religiosas etc.) (ELIADE, 1989, p. 73). 
A formulação é originalmente atribuída a Joachim Wach, que separava em dois 
momentos a atividade da Ciência da Religião, um histórico e um sistemático, e tornou-se 
conhecida no Brasil através da publicação do livro de Hans-Jurgen Greschat (2005), O que 
é Ciência da Religião.15 Aliás, compreender o que é “História das Religiões” para Eliade 
como sendo o que chamamos “Ciência da Religião” ajuda a evitar uma série de erros e 
críticas mal formuladas, que partem da confusão entre a História das Religiões de Eliade e 
a História enquanto disciplina acadêmica. Eliade mesmo, sublinhando o problema que 
pretendo destacar, indica que, enquanto disciplina independente: 
A história das religiões não é uma mera disciplina histórica como, por 
exemplo, a arqueologia ou a numismática. É igualmente uma 
hermenêutica total, já que é chamada a decifrar e explicar todo o tipo de 
encontro do homem com o sagrado, da pré-história até aos nossos dias. 
Ora, por razões de modéstia, ou talvez por uma timidez excessiva 
(provocada acima de tudo pelos excessos dos seus eminentes 
																																								 																					
15 Greschat nomeia as duas esferas de atividade como “trabalho com o específico” e “trabalho com o geral”. 
	 28	
predecessores), os historiadores das religiões hesitam em valorizar 
culturalmente os resultados das suas investigações. De Max Müller e 
Andrew Lang a Frazer e Marett, de Marett a Lévy-Bruhl e de Lévy-Bruhl 
aos historiadores das religiões dos nossos dias nota-se uma progressiva 
perda de criatividade acompanhada de uma perda de sínteses culturais 
interpretativas em favor da investigação analítica fragmentada (ELIADE, 
1989, p. 77-78). 
A superação da situação de falta de criatividade e de fragmentação analítica, na 
direção de trabalhos de síntese, se dá, portanto, através da formulação da ideia de uma 
hermenêutica total. “A mente humana só funciona desta maneira compartimentada à custa 
da sua própria criatividade”, afirmava Eliade (1989, p. 79). Por sua vez, a construção de 
uma disciplina humanista que aceita o desafio do esforço de síntese imbrica-se na atividade 
hermenêutica. Segundo Eliade, todavia, no tocante à História das Religiões a questão é 
mais complexa, visto que não se trata apenas de compreender e interpretar os fatos 
religiosos, uma vez que, “em razão da sua natureza, estes fatos religiosos constituem um 
material sobre o qual se pode pensar – ou até se deve pensar – e pensar de uma maneira 
criativa” (ELIADE, 1989, p. 79-80), como o fizeram Montesquieu, Voltaire, Hegel e 
Nietzsche, quando se puseram a pensar sobre as instituições e a história humana. 
Nesses termos, estamos muito próximos à frustração do “segundo 
renascimento” dos tempos de Max Müller. A fragmentação analítica nos cobra o preço da 
criatividade. O horizonte comunicativo da Ciência da Religião é ainda uma promessa. À 
medida que se adequa à “cientificidade” de certa apreensão realista das ciências sociais, a 
Ciência da Religião incorre em timidez, o que se atesta na enxurrada de trabalhos 
analíticos mais ou menos “curiosos” sobre os “nossosnativos”. Seguindo Eliade, isso, 
todavia, não precisa ser assim. As disciplinas humanistas não devem se conformar à logica 
das ciências naturais. 
Antes disso, as fontes dinâmicas da cultura nos são ainda facultadas à luz da 
atividade hermenêutica. Na Grécia antiga, no Renascimento italiano, na Reforma e na 
Contra-reforma algumas das mais significativas dinâmicas foram fundamentalmente 
hermenêuticas (ELIADE, 1989, p. 80). Nessa perspectiva, a hermenêutica desvela 
significados outrora não percebidos, colocando-os de modo que a consciência não pode 
mais ser a mesma depois de conhecê-los. “No final, a hermenêutica criativa muda o 
homem; é mais do que instrução; é também uma técnica espiritual susceptível de modificar 
	 29	
a qualidade da própria existência. Isto é verdadeiro, sobretudo para a hermenêutica 
histórico-religiosa” (ELIADE, 1989, p. 81). Ao desvelar situações religiosas que 
correspondem a situações existenciais antes desconhecidas, o historiador das religiões põe 
em movimento forças de transformação humana. Ele mesmo sofre, nesse sentido, as 
consequências de sua atividade hermenêutica. Na percepção de Eliade, a História das 
Religiões, assim compreendida, afirma-se como uma pedagogia, porque é capaz de causar 
transformação, como uma fonte de criação de valores culturais. Mas admite que tanto 
cientistas quanto teólogos podem encarar esse potencial com suspeição. 
Demos a esse potencial de transformação criativa o nome de “humanização”. 
Essa expressão foi, na verdade, também evocada por Udo Tworuschka ao elucidar sua 
compreensão do que chama de “Ciência Prática da Religião”, na seção dedicada à Ciência 
da Religião Aplicada no Compêndio de Ciência da Religião, editado pelos profs. João 
Decio Passos e Frank Usarski. Para Tworuschka (2013. p. 579), a expressão ciência prática 
da religião refere-se a “um modelo de Ciência da Religião ilimitado, inter e 
transdisciplinar, que incentiva e promove uma ação orientada, crítica, comunicativa, 
político-social da Ciência Prática da Religião”. Com isso, segundo o autor, pretende-se 
“facilitar ‘melhores’ realidades no futuro”. A Ciência da Religião, nessa perspectiva, 
assume o papel de mediação nos processos de comunicação, com interesses marcadamente 
“pacificadores, humanizadores e conciliadores”. Avalizando sua construção teórica, além 
de remeter ao já mencionado Eliade, Tworuschka refere-se também à participação de Otto 
na Liga Religiosa das Nações, bem como ao Projeto Ética Mundial de Hans Küng, como 
exemplos de mesma intenção prática. A ideia de humanização aliada à Ciência da Religião 
Aplicada abre um novidadeiro e interessante horizonte de discussão; ainda que não seja 
desejável limitar o uso da ideia de humanização ao interesse de aplicação prática da 
Ciência da Religião.16 
Para desenvolver a ideia pensando nos horizontes da Ciência da Religião, 
pedirei o auxílio de outros dois eminentes protestantes: Richard Shaull e Rubem Alves. 
Seus nomes, quando colocados assim lado a lado, são normalmente usados para referir à 
face protestante do que Michel Löwy (2000) chamou de “cristianismo da libertação”. 
Shaull, inclusive, é lembrado, às vezes, como uma espécie de “avô da teologia da 
																																								 																					
16 Note-se, por exemplo, que Schleiermacher (1850), ao tratar da configuração disciplinar da teologia, indica 
que toda ela deveria voltar-se à vida da igreja, não apenas o nascente campo da teologia prática. 
	 30	
libertação”. No que aqui nos interessa, todavia, notaremos que há em ambos uma 
apreensão semiótica da religião, um entendimento de que teologia e religião são 
linguagens, sem, todavia, reduzi-las ao conceito antropológico de cultura. Shaull, em seus 
textos dos anos 1950-60 pretendia colaborar na construção de uma linguagem teológica 
para a revolução à luz do Reino de Deus. A ideia de presença da ausência de Rubem Alves, 
por sua vez, é eminentemente simbólico-religiosa. E aqui mantemos a inspiração daquela 
interpretação da Reforma como evento linguístico em seu estrondoso impacto: a relevância 
da Ciência da Religião, nessa perspectiva, depende também de estar formulada 
significativamente. 
Vamos ao assunto. O eticista estadunidense Paul Lehmann, que exerceu forte 
influência sobre Shaull e Alves, dizia que humanização tem a ver com a pergunta sobre “O 
que é preciso para tornar e manter humana a vida humana?” (LEHMANN, 2006. p. 86). 
Richard Shaull e Rubem Alves buscaram responder à pergunta. Em uma série de textos de 
1963, escritos para um evento da Associação Cristã de Acadêmicos de São Paulo e depois 
publicados pela União Cristã de Estudantes do Brasil, Shaull assim colocava a questão: 
Por humanização, entendemos aquela visão de vida realmente humana 
para todos os homens. Assim, falamos da humanização da sociedade. 
Aliás, esta concepção de humanização pode ser usada por nós, os 
cristãos, para falar com tôda a clareza e com certa exatidão do que 
significa o cristianismo para o mundo, do objetivo que o cristão tem no 
mundo, e, diria ainda mais, para falar do que é a essência do evangelho. 
Porque, afinal de contas, o evangelho tem que ver com o fato de Deus se 
tornar homem para restaurar a vida do homem à imagem de Deus. E se 
lemos o Novo Testamento, lemos da obra de Cristo em termos da criação 
do nôvo homem, de uma nova criatura, o reino de Deus como uma nova 
ordem total de vida (SHAULL, 1964, p. 3). 
À luz do Reino de Deus, o processo de criação do novo homem era, para 
Shaull, primeiramente político. Nessa perspectiva, a ação para mudar as estruturas da 
sociedade era o primeiro passo para a humanização da vida. Amor ao próximo, para ele, 
tinha que ver com política. Tratava-se de assumir um lugar de luta. Lutar pela 
humanização era “lutar contra as forças de desumanização na vida e na sociedade” 
(SHAULL, 1964, p. 310). Nesse sentido, além de redefinir a linguagem religiosa, dando 
novos significados a termos antigos, Shaull (1964, p. 319) indicava a urgência do 
	 31	
envolvimento concreto, da constante conversação entre a situação vivida e a tradição da 
teologia, o que necessariamente o levava a falar das realidades da fé em termos seculares. 
A perspectiva de Shaull comportava, portanto, um entendimento escatológico 
da ação e da vida em sociedade. Tratava-se, afinal, de uma ética pensada à luz da ideia de 
Reino de Deus. Os símbolos cristãos atuavam assim em forma de antecipação, tornando 
presentes as esperanças, as utopias, que fundavam o sentido da vida em comum. A política 
por si só não produz sentido, não é capaz de penetrar no mistério da vida. Carece de 
símbolos que a fundamentem. A criação de uma casa conjunta para os humanos demanda 
uma estrutura simbólica consistente. 
Rubem Alves, que foi aluno de Shaull e partia de um mesmo fundamento 
teológico, assumindo, porém, um tom mais palatável ao público secularizado, colocava a 
questão nos termos da relação entre imaginação e criatividade. Assim, isso de que o 
“‘homem velho’ pereça a fim de que surja um novo”, isso que tem de ver com um “novo 
nascimento”, está na essência do ato criativo (ALVES, 1986, p. 78). Na percepção de 
Rubem Alves, o que havia de ser superado era, nesse caminho, a antropologia e a 
metafísica do realismo, ou seja, as ideias de que o sistema é a medida de tudo (metafísica) 
e de que o homem é uma função da estrutura social (antropologia). Analisando tal 
contexto, dizia ainda no começo dos anos 1970, em Tomorrow’s child: 
Apenas uma coisa foi esquecida: que isto chamado realidade é uma 
criação humana. É o homem o criador. O sistema social é tão somente a 
criatura. Portanto é o homem, e não o sistema, a medida de todas as 
coisas. Não é o homem que deve ser julgado tomando-se por base o 
sistema. O sistema é que está sob julgamento humano. Por conseguinte, a 
imaginação não pode ser declarada desequilibrada por não concordar com 
os fatos da “realidade”.É a realidade que deve ser declarada louca 
quando não concorda com as aspirações da imaginação. A moderna 
inversão daquela ordem que deveria ser a apropriada (inversão esta que 
constitui a essência do realismo) é exatamente uma espécie de amnésia 
quanto às origens do mundo humano. Ela ignora totalmente o fato de que 
o mundo humano é o resultado de atos criativos. E não há ato criativo 
sem imaginação. Como pode a criatura se rebelar contra o seu criador? 
Não é esta a essência da idolatria? (ALVES, 1986, p. 83) 
Nessa ótica, uma ciência humana que assuma contornos realistas, ou como 
dissemos antes, cientificistas, parte de pressupostos não humanizadores, porém 
	 32	
apequenantes de seu potencial imaginativo e de sua humanidade. À medida que a Ciência 
da Religião assume perspectivas apenas analítico-descritivas, que se furtam às sínteses e ao 
trabalho hermenêutico criativo e que não acolhem sua dimensão pedagógica, pode estar 
favorecendo um processo de desumanização. A ciência não pode se tornar um fim em si 
mesma, sob pena de idolatria. Quando o sistema se transforma em um fim, “as 
necessidades humanas se transformam em meios” (ALVES, 1984b, p. 107). Ou seja, o 
homem deixa de ser um participante criativo para assumir uma função no sistema. 
Sem preocupar-se em estabelecer um fundamento para a Ciência da Religião, 
Rubem Alves, em sua interpretação da religião, sublinha seu potencial humanizador. Ou 
seja, ao instaurar a imaginação e a criatividade, a religião abre as portas para o novo 
homem, para o renascimento. Como isso acontece? Nas dinâmicas da linguagem 
simbólico-religiosa. Um sacramento, dizia, é o “sinal visível de uma ausência”. Ou, ainda 
de outra forma, “Deus mora na saudade, ali onde o amor e a ausência se assentam” 
(ALVES, 1984a , p. 8, 19). 
O sinal visível religioso, ato simbólico-expressivo humano, presença da 
ausência, o corpo em desejo, indicam que “através da imaginação o homem transcende a 
facticidade bruta da realidade que é imediatamente dada e afirma que o que é não deveria 
ser, e que o que ainda não é deverá ser” (ALVES, 1984b, p. 47). A religião, assim, 
corporifica o desajustamento do homem ante a situação dada, material. Pede para que 
sejam satisfeitas as aspirações do coração. É nesse sentido que a esperança bíblica do 
Reino de Deus atua por sobre a imaginação e a criatividade, possibilitando o nascimento de 
um novo ser humano. A ideia de religião como presença de uma ausência é também, 
portanto, profundamente escatológica: 
Nas linhas de Ernst Bloch, temos então de afirmar que onde quer que 
exista a esperança, ali existe a religião, porque aí se revela a nostalgia 
pelo reino de Deus, o grande projeto utópico que a humanidade não cessa 
de sonhar mesmo quando, de olhos abertos, ela não tenha condições para 
ver (ALVES, 1984b, p. 82). 
Em Rubem Alves não se trata, todavia, apenas de olhar para religião desde fora 
e dela depreender todo este sistema teórico. Como já dissemos, religião demanda 
participação; ela nos põe em relação. O próprio ato da escrita comprometida de Richard 
Shaull e Rubem Alves instaura uma compreensão humanista da religião e da vida. Trata-se 
	 33	
de enfrentar a reflexão sobre a situação existencial que representa a religião. Um processo 
hermenêutico-criativo está aí em movimento. Por isso sempre aprendemos muito com 
autores que assumem esse mesmo desafio. 
1.4 Conclusão 
Estudar religião, fazer Ciência da Religião, é pensar religião. E pensar religião 
é pensar sobre a humanidade. Também sobre a própria humanidade de quem pensa. O 
pesquisador da religião, interpelado pelo símbolo religioso, para além da atividade 
analítica e descritiva – por certo importante, como um primeiro momento – está também 
convidado a uma experiência. Ulteriormente, essa dinâmica pode conduzir ao 
aprofundamento e à expansão do gênio humano. Conhecimento, razão, sabedoria, intuição, 
imaginação e criatividade são elementos permanentemente ativos nesse movimento. Disso, 
espera-se que nos tornemos melhores como seres humanos. 
De Lutero a Otto, passando por Schleiermacher, e de lá a Tillich e Eliade, a 
Shaull e a Rubem Alves, vai, assim, se erigindo um horizonte de interpretação 
compreensiva da religião. Compreender, aqui, significa envolver-se, acolher a situação 
existencial que se está interpretando, bem como a urgência da questão do sentido para a 
humanidade. O legado da Reforma e do protestantismo, por um lado, traz à Ciência da 
Religião uma grande independência ante formas institucionais pertencentes ao passado que 
insistem em barrar o que é novo, verdadeiro e urgente. Por outro, aponta o caminho da 
interpretação criativa da religião como forma de aventar novos horizontes de convivência 
humana. 
1.5 Referências 
ALVES, Rubem. A gestação do futuro. Campinas: Papirus, 1986. 
 . Creio na ressurreição do corpo. 2. ed. Rio de Janeiro: CEDI, 1984a. 
 . O enigma da religião. 3. ed. Campinas: Papirus, 1984b. 
BERGER, Peter. O dossel sagrado. São Paulo: Paulus, 1985. 
DIAS, Zwinglio M. O movimento ecumênico: história e significado. Numen, Revista de 
Estudos e Pesquisa da Religião, v. 1, n. 1, p. 127-163, jul-dez 1998. 
	 34	
EBELING, Gerhard. O pensamento de Lutero: uma introdução. São Leopoldo: Sinodal, 
1988. 
ELIADE, Mircea. Crise e renovação. In: ELIADE, Mircea. Origens: história e sentido na 
religião. Lisboa: Edições 70, 1989. 
KRÜGER, Hanfried. Soderblöm, Nathan, In: LOSSKY, Nicholas; BONINO, José Míguez; 
POBEE, John; STRANSKY, Tom; WAINWRIGHT, Geoffrey; WEBB, Pauline (Ed.). 
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LEHMANN, Paul. Ethics in a Christian context. Louisville/London: Westminster John 
Knox Press, 2006. 
LÖWY, Michael. A guerra dos deuses: religião e política na América Latina. Petrópolis: 
Vozes; Buenos Aires: CLACSO; Rio de Janeiro: LPP, 2000. 
NOBEL PRIZE. Nathan Söderblom – Biographical. [S.l: s.n.], [20--?]. 
SCHLEIERMACHER, Friedrich. Brief outline of the study of theology. Edinburgh: T&T 
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 . Sobre la religión. Madrid: Tecnos, 1990. 
SHAULL, Richard. Community and humanity in the university. Theology today, v. XXI, 
nº 3, p. 307-323, oct 1964. 
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1964. 
TILLICH, Paul. História do pensamento cristão. São Paulo: ASTE, 2000. 
 . Teologia da cultura. São Paulo: Fonte Editorial, 2009. 
TWORUSCHKA, Udo. Ciência Prática da Religião. In: PASSOS, João Décio; USARSKI, 
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577-588. 
WAARDENBURG, Jacques. Classical approaches to the study of religion: aims, 
methods, and theories of research. New York/Berlin: WdG, 1999. 
WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Companhia 
das Letras, 2004. 
	
2 PROTESTANTISMO: EM TEORIA, RELIGIÃO 
Joe Marçal G. Santos 
2.1 Introdução 
Parece consenso associar a tradição de pensamento da Reforma Protestante ao 
espírito crítico à religião pelo qual a modernidade tem sido caracterizada. O quincentenário 
da Reforma Protestante, comemorado este ano, sob diferentes aspectos, evoca essa 
percepção, com Lutero figurando “pai e precursor” – atributo em si mesmo ambíguo, pelo 
que sugere de “mérito” para uns e “culpa” para outros. 
Mas essa relação merece uma análise atenta: seja em função de uma adequada 
compreensão de Lutero, sua obra e seu efetivo papel para a formação da modernidade, seja 
para preservar uma compreensão adequada também desta última. Além disso, tal análise 
repercute no tema que aqui nos reúne: entre Martinho Lutero e Rudolf Otto há um 
itinerário do qual emerge o Protestantismo, sua reivindicação da herança teológica da 
Reforma e, ao mesmo tempo, seu papel no quadro histórico da modernidade consolidada 
na Europa do século XVII ao XIX. É deste cenário que surgem as bases das teorias dareligião com as quais lidamos em Ciência da Religião atualmente, seja na convergência ou 
na divergência.17 
O título acima – protestantismo, em teoria religião – evoca essas questões por 
motivos ambíguos e correlacionados. Vale mencionar, como sintoma, no clima de 
comemorações, a publicação quase concomitante de Comentários a Romanos, de Karl 
Barth, e do texto programático de Paul Tillich, A ideia de uma Teologia da Cultura, em 
1919 – cada qual a seu modo marcado pelo Das Heilige, de Otto, de 1917. A 
concomitância é sugestiva: são três obras de referência do pensamento protestante, e todas 
protestam – cada qual a seu modo – contra o liberalismo teológico do século XIX: Barth 
																																								 																					
17 Martin Kahler, segundo Tillich, afirmara que “a ortodoxia dos séculos dezesseis e dezessete era o alicerce 
em que repousavam os pilares da ponte de toda a teologia protestante posterior” (TILLICH, 1986, p. 37). 
	 36	
reivindicando a radical distinção entre fé e religião; Tillich defendendo a síntese entre 
ambas; e Otto requerendo que a dimensão irracional da religião seja tomada também como 
objeto de pensamento. 
No que segue, então, a minha intenção é explorar a função crítica inerente ao 
protestantismo – o que para Tillich é o princípio protestante – como uma qualidade 
criativa dessa face do Cristianismo, cujo aspecto moderno e contemporâneo está 
relacionado com suas características mais marcantes: a evocação de sua fonte reflexiva 
literária básica – a Bíblia – a partir de uma renovada hermenêutica da relação entre Deus e 
ser humano que, por sua vez, se desdobra na economia simbólica e na apropriação crítica 
(porque sob protesto) da própria tradição cristã. 
2.2 Aspectos modernos em Lutero: uma teologia crítica à religião 
A teologia de Lutero tem lugar singular, segundo Michael Allen Gillespie 
(1999), no processo histórico-filosófico que define as bases do pensamento político 
moderno, segundo as quais se dão as “origens teológicas da modernidade”. Para o autor, a 
ruína do Escolasticismo – que representa aqui a arquitetura do mundo medieval – se dá 
pelo Nominalismo, que é fundamentalmente orquestrada pela “navalha de Occam”: o 
princípio que põe abaixo o realismo transcendente dos universais e dá relevo à 
singularidade das coisas, resultando em uma nova e desafiante visão de mundo, tão ou 
menos marcado pelo princípio de ordem que pelo de caos. 
A pedra que teria amolado o fio dessa navalha revela a “origem teológica” que 
o autor quer evidenciar: trata-se da radical problematização nominalista da noção de Deus 
(GILLESPIE, 1999, p. 5-6). Assim, todo o histórico que segue, de Occam a Bacon, 
Descartes, Hobbes, Locke e Hume passam por esse “buraco da agulha”: o princípio 
ordenador de onipotência e liberdade divina, levado ao limite pelo nominalismo, dá à luz a 
um Deus absolutamente imprevisível e, por princípio, indiferente ao ser humano e à 
“ordem” em sua criação. Decorre desta visão uma crítica radical a toda relação positiva e 
racionalmente assegurada entre Deus e ser humano (e realidade), tal como a que era 
defendida pela Escolástica e hipostasiada pela Igreja medieval. Resulta disso a redução 
tipicamente franciscana da via de salvação, assentada menos na razão e mais na vontade: a 
imitação de Cristo. 
	 37	
Se o Humanismo foi uma primeira tentativa de responder à profunda questão (e 
revolução) implicada em tal noção de Deus, a partir da idealização de um “novo ser 
humano suficientemente seguro de si no caótico mundo nominalista” (GILLESPIE, 1999, 
p. 14-15), a Reforma Luterana foi a segunda tentativa mais decisiva. Esta se valeu do 
princípio de um “retorno às fontes”, mas em franca oposição ao retorno humanista à 
antiguidade clássica. Lutero retorna às Escrituras (e a Agostinho), e com isso, a dinâmica 
se inverte: a teologia abandona a especulação e surge, com Lutero, de uma renovada 
pergunta acerca da relação entre Deus e ser humano. 
Seguindo o raciocínio do autor, a superação humanista do Nominalismo teria 
se valido da antropologia que este último inaugura, cuja ideia central para a compreensão 
do ser humano e sua relação com Deus é a vontade, não mais a razão (GILLESPIE, 1999, 
p. 11-12). A razão especulativa tipicamente escolástica, no Nominalismo, torna-se alvo de 
suspeita e é circunscrita à particularidade das coisas. A vontade torna-se instância decisiva, 
fundamentada em uma estreita diferença ontológica entre Deus e ser humano 
(GILLESPIE, 1999, p. 13-14): porque permanece uma analogia entre vontade divina e 
humana – de onde certa “positividade”, já que a salvação dependerá agora do agir humano 
“ajudado” pela graça na imitação de Cristo. Dessa positividade vale-se o Humanismo, para 
engendrar a noção de uma nova humanidade expressa no ideal de indivíduo superior, 
heróico e virtuoso. 
Mas a crítica ao Humanismo está presente na novidade que a Reforma traz 
nesse processo e incide justamente na antropologia subjacente à teologia de Lutero. Vale 
ressaltar que a análise de Gillespie foca nas origens teológicas do pensamento político 
moderno. Seria até compreensível se ele, enquanto filósofo político, ressaltasse motivos 
supostamente morais e políticos para a Reforma – interpretando modernamente a crítica de 
Lutero contra a corrupção da Igreja como uma crítica primariamente moral e política, 
tipicamente iluminista. Contudo, a análise de Gillespie concorda que a crítica luterana 
contra a prática de indulgências, a despeito de suas consequências políticas, tem motivação 
antes de tudo teológica (GILLESPIE, 1999, p. 16): ele põe em sua mira a positividade 
pressuposta no mérito das obras da vontade, e tal crítica está assentada na mesma polêmica 
contra a qual Lutero está às voltas naqueles dias de outubro de 1517: contra a Escolástica. 
	 38	
Vale lembrar que Lutero promove uma disputatio contra a Escolástica semanas 
antes ao 31 outubro da publicação das 95 Teses contra a prática de indulgências. Para tal 
disputa, Lutero redige 97 teses que evidenciam, logo de saída, referências tanto à Bíblia 
quanto a Agostinho, em contraste com notas polêmicas à via moderna. O contraste se dá 
em torno do ponto central do debate, exposto já nas primeiras teses e de forma sintética na 
quarta e sétima teses: 
4 - Por isso, é verdade que o ser humano, sendo árvore má [em referência 
a Mt. 7.17], não pode senão querer e fazer o mal; (...) 
7 - Na verdade, sem a graça de Deus, a vontade suscita necessariamente 
um ato desconforme e mau (OS, v.1, p. 15). 
É mister, para Lutero, colocar a vontade humana sob uma diferença negativa e 
insuficiente em relação à vontade divina, boa e justa: mas com que intenção? Para Joachim 
Fischer, Lutero “percebeu que a teologia estava acorrentada no cativeiro da escolástica, 
impossibilitada de articular adequadamente a questão essencial da fé cristã, ou seja, graça e 
justificação” (OS, v.1, p. 13), que se tornam categorias chave para a compreensão da 
relação entre Deus e ser humano. Esta, para Lutero, contraria totalmente à lógica de 
analogia, complementação e compensação entre Deus e ser humano. Onde isso vai se 
revelar é no debate contra as indulgências, cujo ponto fulcral é a teologia que subjaz o 
“esquema” da penitência, que contradiz ao arrependimento em sentido neotestamentário, a 
methanoia – conforme vemos em seu Sermão sobre a indulgência e a graça, de 1518: 
Afirmo, entretanto, que não se pode provar, a partir da Escritura, que a 
justiça divina deseja ou exige do pecador qualquer pena ou satisfação, 
mas sim unicamente sua contrição ou conversão sincera e verdadeira, 
com o propósito de, doravante, carregar a cruz de Cristo e praticar as 
obras acima mencionadas (mesmo que não estejam prescritas por 
ninguém) (OS, v.1, p. 32). 
Em síntese, a vontade, tal como Lutero apreendera com seus professores 
nominalistas e como vivera nos anos de convento, continua no foco de sua

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