Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Cognição social corresponde aos processos cognitivos (como o pensar) por meio dos quais as pessoas compreendem e explicam outras pessoas e a si mesmas. Essa compreensão pode ser desenvolvida de forma automática e instantânea, como também pode envolver considerações e análises lentas. Um destaque da cognição social é a rapidez com que as pessoas compreendem e julgam os outros. Além do pensar, os psicólogos sociais também buscam associar sentimentos e comportamentos à cognição social. A cognição é relacionada ao comportamento, pois as ações são causadas pelos processos mentais envolvidos no pensamento. Pensar sobre os outros é uma atividade central da vida dos seres humanos. Todas as pessoas buscam explicar as próprias ações e as dos demais, por exemplo: se alguém agride o outro verbalmente, há uma tendência de pensar que “a pessoa pode ter se sentido ofendida ou ameaçada pela posição do outro”. Desse modo, há o reconhecimento de uma crença (acreditar que o outro tem alguma intenção) e um desejo (querer evitar algo que considera negativo). A explicação das ações como resultado das crenças e desejos é o que define a “psicologia senso comum” ou “psicologia leiga”. A psicologia leiga é fruto da evolução da espécie humana, em que o ambiente social foi mais importante que o físico. Os seres humanos viviam inicialmente em pequenos grupos – mas que foram ficando maiores com as consequentes estruturas sociais cada vez mais complexas –, nos quais as questões colocadas pelas interações eram tão importantes quanto a sobrevivência aos predadores. Os ancestrais humanos enfrentaram diversos problemas, como os de evitar predadores, achar o alimento correto, entender a mente dos outros, comunicar-se com os demais, selecionar parceiros sexuais etc. Com esses problemas, a psicologia evolucionista atual defende que a seleção natural provocou o surgimento de módulos mentais responsáveis pela superação desses obstáculos. O modelo da mente modular propõe que a mente é composta de vários módulos – os quais não param de evoluir – que se comunicam e interagem como uma estrutura inata que se desenvolveu naturalmente e semelhante aos órgãos biológicos. Os problemas colocados pelo ambiente social foram inicialmente compartilhados pelos humanos assim como por todos os outros primatas. Mas, com o aumento do tamanho dos grupos, criou-se um valor cada vez maior para a estratégia de formação de alianças e coalizões. A associação com os outros em REFERÊNCIA: TORRES, C. V. NEIVA, E. R. Psicologia Social: principais temas e vertentes. Porto Alegre: ed. Artmed, 2011. busca de formações de amizades passou a ter o mesmo grau de importância quanto saber escolher a comida correta ou possuir a habilidade para detectar predadores. Mas a formação de alianças é uma tarefa difícil devido a necessidade da reciprocidade, sem que um membro fique com mais vantagem que o outro. O problema da não reciprocidade é tão grave que a espécie que não desenvolver mecanismos para enfrentá-lo não sobrevive, pois onde só existem egoístas, ninguém ajuda ninguém, fazendo com que as alianças se desfaçam, ficando impossível viver em grupos. Todos os seres humanos são extremamente sensíveis ao altruísmo recíproco e mantem uma “contabilidade social” para cada conhecido ou amigo. Se alguém sente que o outro está fazendo menos por ele, na próxima vez que houver solicitação de ajuda, ele pode se sentir bem menos inclinado a oferecer ajuda. Essa contabilidade social envolve mecanismos mentais complexos. Com o crescimento dos grupos e o surgimento dos módulos mentais, o ser humano desenvolveu o “módulo de leitura da mente”, ou seja, aquele que permitiu que suposições ou inferências sobre o que as outras pessoas estão pensando sejam feitas, tendo por base suas ações, palavras e comportamento. Com o surgimento da teoria da mente, as crianças começam a compreender que outros indivíduos podem manter crenças diferentes das suas e que também podem manter crenças falsas. Quanto maior for o grupo, maior a exigência da capacidade da memória para acompanhar os comportamentos dos outros, bem como capacidades de raciocínio social bem mais sofisticadas, que possibilitem manter equilíbrios delicados entre lealdades e amizades conflitantes. Os humanos adquiriram a capacidade para usar linguagens complexas e sofisticadas antes de deixarem a África há cerca de 100 mil anos. As crianças só aprendem uma determinada língua porque nascem pré-programadas para esse tipo de aprendizagem – é impossível aprender de forma tão rápida considerando apenas os estímulos dados pelos pais e pelo ambiente cultural. A teoria de maior destaque diz que a linguagem é um sistema de comunicação que evoluiu para ajudar os ancestrais humanos na caça e na defesa contra predadores. De acordo com essa teoria, a função da linguagem era a troca de informações sobre o ambiente físico e ecológico. Entretanto, Robin Dunbar contestou essa teoria e propôs que a função básica da linguagem é a troca de informações sobre o ambiente social. Sem a linguagem os grupos não podem crescer, ficando bastante limitados no número de membros. REFERÊNCIA: TORRES, C. V. NEIVA, E. R. Psicologia Social: principais temas e vertentes. Porto Alegre: ed. Artmed, 2011. A linguagem evoluiu para ajudar os ancestrais humanos na obtenção de informações sobre quem merece ou não confiança, por isso que existe um grande fascínio humano pela fofoca: ela é a forma mais eficaz de comunicação para se obter informações sobre a confiabilidade dos outros. O indivíduo como um avarento cognitivo: as pessoas não gostam de pensar muito, exceto quando acham que é necessário. Elas procuram render o máximo o poupo do esforço cognitivo que conseguem exercer. Por conta disso, Fiske e Taylor definiram as pessoas como “avarentas” no uso de seus recursos cognitivos. Os indivíduos realizam trabalhos cognitivos complexos quando são importantes. Mas o mundo é complexo, e, frente a essa realidade, é melhor utilizar “atalhos cognitivos”, buscar simplificações e aproximações, em vez de utilizar análises bem fundamentadas. Orientação para processos: os processos cognitivos são descritos como processos computacionais – as pessoas recebem informações (input), codificam o que receberam, armazenam na memória, recuperam da memória para realizar inferências e para gerar produtos (output). A psicologia cognitiva tende a definir os processos cognitivos como formados por estágios sequenciais Pessoas como agentes causais: as pessoas são agentes causais, sendo impulsionadas internamente em direção a suas ações e objetivos. Os outros percebem que aqueles com quem convivem tem “agendas internas”, não observáveis. E, isso faz com que as pessoas fiquem bem mais interessantes e complexas como alvos de oercepção e julgamento. Percepção mútua: outra característica que torna as pessoas interessantes, é que elas também retornam à percepção afetando o observador. Nossos impulsos naturais para compreender e explicar os outros se misturam com o que percebemos como a percepção e o julgamento deles a nosso respeito. A cognição social é um processo de mão dupla. Centralidade do eu: uma das consequências do processo de mão dupla mencionada no item anterior é que a percepção de outra pessoa envolve o eu de quem percebe. O observador olha para outra pessoa e termina também por perceber a si próprio. As reações que a pessoa julga perceber nos outros também define o que ela é: a adequação de seus comportamentos, opiniões e crenças, da maneira de vestir etc. Orientação pragmática: um dos lemas enfatizados na cognição social é que o pensamento tem por objetivo a ação. O indivíduo é um tático-motivador ao pensar para agir, escolhendo entre várias estratégias políticas e sociais que garantam suas alianças e reciprocidade mútua. Predominância dos processos automáticos: o indivíduo também é considerado como um ator-ativado,ou seja, há uma predominância de processos afetivos e comportamentais automáticos. REFERÊNCIA: TORRES, C. V. NEIVA, E. R. Psicologia Social: principais temas e vertentes. Porto Alegre: ed. Artmed, 2011. As pessoas usam suas estruturas cognitivas para chegar a uma compreensão rápida e bastante satisfatória a respeito dos outros e de si mesmas. São dois elementos básicos que preenchem as estruturas cognitivas dos seres: Schemas: são estruturas cognitivas compostas de conhecimentos sobre conceitos, objetos ou eventos, representados por seus atributos e pelas relações entre esses atributos, os quais expressam pré-concepções ou teorias sobre conceitos. Você, por exemplo, provavelmente tem um schema sobre o que é uma pessoa extrovertida, pois tem uma série de pré-concepções sobre alguém com essa característica. Por meio desse elemento imaginamos como um indivíduo se comportará em determinadas situações. Inclusive, existem os schemas do próprio eu, que são a base do autoconhecimento. Os schemas influenciam a maneira como codificamos, relembramos e julgamos as informações que temos acesso sobre conceitos ou eventos – por exemplo: somos apresentados a alguém e, imediatamente, temos reações positivas ou negativas já a partir do momento que começamos a receber informações, como a aparência ou o conteúdo do que essa pessoa diz. Os fatores que podem diminuir a influência dos schemas e estereótipos são mais atenção e mais motivação para que possamos ir além das reações automáticas altamente influenciadas por nossos schemas. Atribuições: as pessoas são percebidas como agentes causais e é importante saber como elas atribuem causas aos comportamentos dos outros e aos seus. Não atribuímos só causas, como essas atribuições têm profundas influências sobre nossas reações afetivas e comportamentos futuros. Quando atribuímos disposições ou traços como causas de comportamentos observados, fornecemos toda informação necessária para ficar armazenada no schema relativo aos traços, comportamentos e reações afetivas em questão. • Teoria da atribuição intrapessoal: o processo de atribuição de causas que o indivíduo realiza para explicar e compreender seu comportamento é desencadeado a partir de eventos considerados negativos, inesperados ou importantes. Nesse modelo, eventos que significam obtenção ou não de algum objetivo provocam automaticamente reações afetivas positivas (alegria, felicidade) ou negativas (tristeza, frustração). Essas emoções ocorrem sem interferência cognitiva. Só a partir dessas atribuições é desencadeado se o evento ocorrido for considerado pelo indivíduo como negativo, inesperado ou muito importante. • Teoria da atribuição interpessoal: os mesmos mecanismos são desencadeados quando ocorre nossa percepção em relação aos outros. O comportamento do outro nos chama a atenção e desencadeia uma busca automática por uma causa. Na atribuição intrapessoal, o indivíduo sempre enquadra o evento como algo que correspondeu ou não a seus objetivos. Os eventos REFERÊNCIA: TORRES, C. V. NEIVA, E. R. Psicologia Social: principais temas e vertentes. Porto Alegre: ed. Artmed, 2011. podem ser resumidos como sucesso ou fracasso provocando reações afetivas positivas ou negativas de imediato e sem a participação de processos cognitivos. O mesmo não acontece na atribuição interpessoal. Atribuição intrapessoal Atribuição interpessoal REFERÊNCIA: TORRES, C. V. NEIVA, E. R. Psicologia Social: principais temas e vertentes. Porto Alegre: ed. Artmed, 2011. Atenção: transformamos toda estimulação que nos atinge por meio dos sentidos em algo que tomamos consciência e guardamos temporariamente ou permanentemente em nossa memória. Corresponde à codificação e à consciência (aquilo que temos conhecimento em um determinado momento) de estímulos internos ou externos a nosso organismo. É importante destacar que a atenção é limitada, pois não podemos atender a todos os estímulos que nos atingem. Desse modo, requer que seja bem seletiva, porque os objetos do pensamento social, os outros e nós mesmos, são muito complexos e multifacetados. Assim, a atenção seletiva estabelece propriedades únicas aos conteúdos de nossa cognição social (schemas e atribuições). Só podemos lidar com aquilo que percebemos e, até certo ponto, com aquilo de que temos consciência. Memória: os objetivos, envolvimento do observador e a impressão geral formada pelo conjunto de informações, têm um grande impacto sobre o quanto nos relembramos posteriormente. Ao tentar memorizar informações sobre uma pessoa é bem mais eficaz tentar formar uma impressão ou descrição geral dela do que tentar gravar pedaços isolados de informação, tais como descrições de traços de personalidade. Inferência: diz respeito ao que fazemos com a informação que obtivemos por meio dos processos de atenção e memória. REFERÊNCIA: TORRES, C. V. NEIVA, E. R. Psicologia Social: principais temas e vertentes. Porto Alegre: ed. Artmed, 2011.
Compartilhar