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PRISCILA FAGUNDES INTRODUÇÃO Essa síndrome acompanha a mulher em toda sua vida reprodutiva, manifestando-se desde a adolescência com distúrbio menstrual e hiperandrogenismo cutâneo, em geral, passando por infertilidade na idade adulta e podendo evoluir para maior risco de desenvolvimento de doenças cardiometabólicas antes e após a menopausa. EPIDEMIOLOGIA Conforme o critério utilizado no diagnóstico, a incidência da SOP pode variar de 4% a 20% durante o período reprodutivo. O consenso de Rotterdam ainda é o que tem maior abrangência e, portanto, o mais aceito. Inclui, além de mulheres com anovulação crônica, aquelas que ovulam normalmente, com hiperandrogenismo e imagens ultrassonográficas sugestivas de ovários policísticos. Tal diversidade de característica pode trazer grande dificuldade para a exata epidemiologia dessa afecção. No entanto, a maioria dos estudos estima sua prevalência por volta de 5% a 10% da população feminina. FATORES DE RISCO Estudos sugerem a existência de predisposição genética, a qual acaba se manifestando em decorrência do estilo de vida e obesidade. Em relação ao fator genético ou hereditário, como principal agente, os dados epidemiológicos sugerem que filhas de mães com SOP têm risco elevado de desenvolvê-la. Estudos de associação genótipo-fenótipo (GWAS) realizados por meio de sequenciamento de nova geração (NGS) trouxeram alguns dados importantes. O caráter poligênico da SOP geram uma gama de genótipos e fenótipos possíveis na manifestação da doença, o que se constitui em uma dificuldade para o estabelecimento de critérios diagnósticos claros e consensuais. Obesidade - A gordura visceral ou abdominal pode envolver glândulas endócrinas como o pâncreas, interferindo na reserva funcional das células beta ou na sensibilidade tecidual à insulina. E também órgãos como o fígado podendo causar esteatose (infiltração gordurosa) e até mesmo a esteato- hepatite ( acúmulo de gorduras com inflamação do fígado) Provavelmente, o fator gênico isoladamente não seja suficiente para desencadear a SOP. O conjunto de fatores ambientais, comportamentais e psíquicos, associado com a predisposição genética, seriam os determinantes para o surgimento dessa síndrome, principalmente para as formas mais exacerbadas. Portanto, isso pode sugerir que essa doença seja evolutiva durante a vida da mulher, piorando com o ganho de peso e a idade. FISIOPATOGENIA Na SOP, a biossíntese aumentada de andrógenos está relacionada ao aumento da expressão do gene CYP17 e à maior estabilidade do seu RNA mensageiro nas células da teca. Além de uma anormalidade no eixo hipotálamo-hipófise-ovários, onde o aumento da freqüência de pulsos do hormônio hipotalâmico liberador de gonadotrofinas (GnRH) favorece a transcrição da subunidade β do hormônio luteinizante (LH) sobre aquela do hormônio folículoesti- mulante (FSH). A relativa diminuição do hormônio folículo-estimulante circulante (FSH) em algumas mulheres com SOP advém do aumento dos níveis de inibina B, produzida nos pequenos folículos, e pelos altos índices de estrona, consequentes à maior produção de androstenediona (Rodrigues de Lima, 2015). O aumento relativo da secreção hipofisária de LH ocasiona aumento de produção de androstenediona pelas células da teca, a qual é convertida pela 17β-hidroxiesteróide desidrogenase do tipo 5 (17β- HSD) em testosterona ou aromatizada em estrona (E1). Nas células da granulosa, estrona é convertida em estradiol (E2). Além disso, a produção abundante de androgênios é responsável pelo hirperandrogenismo cutâneo. Outra hipótese seria a de que as mulheres com SOP teriam estruturalmente maior população folicular do que apenas uma disfunção hormonal (Maciel et al., 2004). Esse fato poderia propiciar maior produção de esteroides sexuais, consequentemente de androgênios, que interfere na retroalimentação do eixo hipotalâmicohipofisário- ovariano. No hipotálamo, os androgênios proporcionam maior produção de estrogênios pela ação da aromatase, que tem grande interferência local, tanto nos neurônios produtores de kisspeptina como nos de GnRH (hormônio liberador de gonadotrofinas) do núcleo arqueado. SÍNDROME DOS OVÁRIOS POLICÍSTICOS Além dessa globulina, há queda da síntese de outras proteínas carreadores de fatores de crescimento, favorecendo maior ação nos tecidos periféricos, como o endométrio, o que pode dificultar a implantação embrionária e também aumentar o risco do surgimento de lesões precursoras do câncer endometrial. Na verdade, a paciente estaria mais predisposta também a outros tipos de câncer, como o mamário, de pâncreas, hepático, entre outros. Além disso, esse estado favorece a disfunção endotelial e o maior risco de doença cardiovascular, obesidade, apneia do sono e doença hepática gordurosa não alcoólica. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS As manifestações clínicas dermatológicas do hiperandrogenismo incluem: hirsutismo, acne, seborréia, alopecia e, nos casos mais graves, sinais de virilização. Existe considerável heterogeneidade nos acha- dos clínicos, assim como pode haver variação na mesma paciente com o tempo. Por outro lado, o hiperandrogenismo pode não determinar manifestações periféricas como observado principalmente nas mulheres asiáticas. - HIRSUTISMO O hirsutismo é definido como crescimento excessivo de pêlos terminais em áreas andrógeno- dependente das mulheres. É um dos critérios clínicos mais utilizados para o diagnostico do excesso de andrógeno, sendo observado em 50-80% das pacientes que apresentam hiperandrogenismo. A escala Ferriman-Gallwey é utilizada para diagnóstico do hirsutismo, considerado presente quando o escore é ≥ 8. Porém, este escore é avaliador dependente e não considera o impacto do hirsutismo no bem estar da paciente. Não há correlação do escore com os níveis de andrógenos, uma vez que a resposta da unidade pila - sebácea aos andrógenos varia consideravelmente. FORMAÇÃO DOS FOLÍCULOS PILOSOS A formação dos folículos pilosos ocorre durante o desenvolvimento fetal e sua concentração reflete as diferenças étnicas. A velocidade de crescimento do pêlo varia de acordo com diferenças genéticas na atividade da enzima 5α-redutase que converte a testosterona em dehidrotestosterona (DHT), que é o metabólito mais potente. Existem duas isoenzimas da 5alfa- redutase: tipo 1, presente nas glândulas sebáceas e pele da região pubiana e o tipo 2, encontrada nos folí- culos pilosos, região genital e couro cabeludo. A diferença de atividade entre elas determina a variação de apresentações clínicas nas mulheres com hiperandrogenismo. Está estabelecido que as mulheres hirsutas possuam atividade aumentada da 5a-redutase nos folículos pilosos. A atividade da 5a-redutase é estimulada tanto pelo hiperandrogenismo, quanto pelo fator de crescimento insulina-like (insulin-like grow factor-, IFG)e pela própria insulina. A testosterona e DHT determinam alterações no pêlo e em seu ciclo. Transformam o pêlo vellus em terminal, mais espessos e pigmentados, nas áreas andrógeno-sensíveis (face, pescoço, tórax e região pubiana), após meses ou anos de exposição e é irreversível. - ACNE A acne é uma desordemda unidade pilo-sebácea, com lesões na face, pescoço, dorso e região peitoral. Inúmeros estudos tentam correlacionar a apresentação clinica da acne com marcadores de hiperandrogenismo. Embora alguns tenham demonstrado correlação entre acne e níveis elevados de sulfato de dehidroepiandrosterona (DHEA-S), DHT, androstenediona, testosterona e do IFG, outros não comprovaram este achado. - ALOPECIA ANDROGENÉTICA A alopecia androgenética na mulher é caracterizada pela perda de cabelo na região central do couro cabeludo, com repercussão psico-social importante. Na presença de andrógenos, níveis elevados de 5-alfa-redutase, maior concentração de receptores androgênicos e níveis mais baixos da enzima citocromo p450, a fase anágena é encurtada e os folículos ter- minais sofrem miniaturização, transformando-seem pêlos vellus. As alterações podem ocorrer de maneira difusa, mas geralmente são mais evidentes nas regiões frontais e parietais. - ACANTOSE NIGRICANTE A acantose nigricante é caracterizada por placa acastanhada e aveludada com acentuação dos sulcos da pele. É mais comumente observada no pescoço e áreas intertriginosas como axilas, virilhas e região inframamária. É relatada em 5% das pacientes com SOP. A ligação excessiva da insulina sérica aos receptores de IGF-1 nos tecidos periféricos determina a proliferação de queratinócitos e fibroblastos e assim a acantose nigricante é manifestação cutânea da hiperinsulinemia, e não somente de obesidade. Histologicamente há papilomatose, hiperceratose e acantose com mínima ou nenhuma hiperpigmentação da camada basal. - PAPEL DA INSULINA NA SOP A nível central, a insulina parece estar envolvida na secreção anormal do LH. A nível periférico, promove a secreção ovariana de andrógenos, através do aumento da expressão do gene CYP17 e da atividade do citocromo P450c17, tendo ação sinérgica com o LH, tanto diretamente como através do estímulo da secreção do fator de crescimento símile à insulina 1 (IGF-1). A insulina diminui a síntese hepática de IGFBP-1 e da globulina ligadora dos hormônios sexuais (SHBG), aumentando os níveis de andrógenos livres. Além disso, também pode potencializar, in vivo, a produção androgênica adrenal estimulada pelo hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) e aumentar o metabolismo do cortisol (aumento da atividade da 5α-redutase do tipo 1 no fígado e na pele) O mecanismo da resistência à insulina na síndrome parece estar relacionado com defeito pós-receptor de insulina, envolvendo deficiência do substrato 1 da tirosina. O resultado desse processo seria maior fosforilação nos resíduos de serina do receptor de insulina ou de proteínas dessa via de sinalização, bem como a queda do número de proteínas GLUT- 4 na superfície da membrana plasmática, dificultando o ingresso de glicose para o meio intracelular. Concomitantemente, há maior hiperinsulinismo compensatório, como resposta do pâncreas a essa situação, o que pode predispor à intolerância à glicose ou até ao diabetes. DIAGNÓSTICO O diagnóstico da SOP é eminentemente de exclusão. Nem sempre é fácil, devido à grande heterogeneidade da síndrome, principalmente durante a adolescência. Em geral, o diferencial deve ser feito com a imaturidade do eixo hipotálamo-hipofisário-ovariano, que seria um processo fisiológico e transitório de anovulação nessa fase da vida. A hiperandrogenemia ou o hiperandrogenismo cutâneo podem ser vistos em muitas mulheres com SOP, mas há outras entidades que também podem ter quadro clínico semelhante. Portanto, o diagnóstico só será firmado após a exclusão destas afecções: disfunção da tireoide, hiperprolactinemia, tumor ovariano ou da suprarrenal, defeitos de síntese da suprarrenal, síndrome de Cushing e uso de substâncias androgênicas (anabolizantes). A suspeita da SOP é feita quando houver queixas de pelos excessivos pelo corpo, associados à irregularidade menstrual, em geral, ciclos alongados ou períodos de amenorreia. Na adolescência, a imaturidade de eixo hipotalâmico-hipofisárioovariano também pode determinar disfunção menstrual, entretanto com ciclos mais curtos do que a que ocorre na SOP. Todavia, isso não é regra em todos os casos, o que sugere acompanhamento para fechar o diagnóstico. O antecedente de pubarca precoce excessiva pode ser um indicativo de que adolescente tenha predisposição à SOP. A ultrassonografia, em muitos casos, não é de muita ajuda, pois os ovários, em geral, são maiores e muitas vezes multifoliculares quando há imaturidade do eixo, o que pode levar a fazer o diagnóstico errôneo de SOP durante a adolescência. Infelizmente, há casos em que o diagnóstico será feito tardiamente, quando a mulher procura assistência médica por desejo reprodutivo, passando o diagnóstico despercebido durante a adolescência. O exame físico pode auxiliar no diagnóstico, portanto devemos procurar sinais clínicos de hiperandrogenismo, como acne e hirsutismo. A simples presença de hipertricose não significa aumento da ação dos androgênios, pois são pelos do tipo lanugem que aparecem em geral no ombro e na fronte. A hipertricose pode ser causada por uso de fármacos, como glicocorticoides, ciclosporinas, progestagênios ou valpronatos, minoxidil, ou estar presente em algumas doenças, como hipotireoidismo, anorexia nervosa, porfiria e dermatomiosite. Em relação à resistência insulínica, o sinal clínico mais importante a ser avaliado é a presença de acantose nigricante, que é um espessamento com escurecimento da pele em região de dobras. É determinada pela ação da insulina no tecido cutâneo. Contudo, aparece apenas em aproximadamente 18% das mulheres com resistência insulínica. Todavia, esse sinal não é relevante para o diagnóstico de SOP. O exame de ultrassom pélvico das mulheres com SOP pode mostrar imagens de ovários com volume aumentado, em geral, acima de 10 mL com mais 12 microcistos, de até 9 mm de diâmetro, na periferia do ovário. Há vários estudos atuais que propõem um número maior de microcistos para fazer o diagnóstico, mas atualmente o critério mais aceito ainda é o do Consenso de Rotterdam. Contudo, a característica mais marcante é a hiperecogenicidade central que reflete a hiperplasia estromal, porém a reprodutibilidade desse achado é baixa e a variação inter e intraobservadores é elevada. Essa característica não é vista nas adolescentes com imaturidade do eixo. Contudo, o ultrassom isoladamente não faz o diagnóstico de SOP. Outro ponto importante é afastar afecções que podem ter as mesmas manifestações clínicas pelas dosagens hormonais: hormônio tireoestimulante (TSH) e T4 (disfunção da tireoide), testosterona total (tumor ovariano ou suprarrenal), 17- OHprogesterona (deficiência enzimática da suprarrenal da 21-hidroxilase) e cortisol (síndrome de Cushing). Contudo, nem sempre o diagnóstico é fácil, necessitando do uso de critérios de diagnóstico. A avaliação deve incluir história menstrual detalhada, informações sobre inicio e duração dos sinto- mas sugestivos de hiperandrogenismo e história familiar de doenças metabólicas e SOP. Alterações abruptas no padrão menstrual ou nos sintomas de hiperandrogenismo devem nos alertar para outras etiologias. O quadro clínico mais freqüente inclui: Irregularidade menstrual ou amenorréia, que pode ser mascarada pelo uso de anticoncepcionais orais (ACO). Contudo, algumas mulheres com SOP apresentam ciclos ovulatórios regulares. O exame da região genital pode ser realizado utilizando a escala de Tanner, que analisa o desenvolvimento das características sexuais primárias e secundárias, e deve identificar sinais de virilização. A clitoriomegalia e alterações na voz são achados raros e sugestivos de tumores adrenais. CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS Foram realizados vários consensos para estabelecer critérios para o diagnóstico da SOP, entre eles salientamos o do National Institutes of Health (NIH), o de Rotterdam e o da Sociedade de Excesso de Androgênio – Síndrome dos Ovários Policísticos (AES-PCOS) (Azziz et al., 2006; Fruzzetti et al., 2015; Katulski et al., 2015; Amsterdam ESHRE/ASRM, 2012; Rotterdam ESHRE/ASRM, 2004b) (Tabela 39.1). O mais utilizado atualmente é o Consenso de Rotterdam (2003) (Rotterdam ESHRE/ASRM, 2004b). Para o diagnóstico de SOP na adolescência, deve-se ter os três critérios de diagnóstico: hiperandrogenismo clínico ou laboratorial, disfunção ovulatória e imagens de ovários policísticos ao ultrassom pélvico. Além disso, esse critério cria quatro fenótipos de mulheres com SOP: A – clássico ou completo, que é muito semelhante ao quadro clínico descrito por Stein e Leventhal com as três características; B – anovulação com hiperandrogenismo sem as imagens de ovários policísticos; C –hiperandrogenismo com imagens de ovários policísticos, mas a paciente tem ciclo regular (ovulatório);D – a paciente não tem hiperandrogenismo (Tabela 39.1). Os fenótipos mais comuns são o A e o B, correspondendo a quase 80% das mulheres com SOP. Assim, o diagnóstico final é baseado nos critérios de Rotterdam, afastando as afecções com quadro clínico semelhante (Figura 39.1). DISTÚRBIOS DO METABOLISMO DE CARBOIDRATOS – RISCO DE DIABETES MELITO A identificação de resistência insulínica, intolerância à glicose ou diabetes melito não faz parte do diagnóstico da SOP, mas, quando houver a associação com esses distúrbios do metabolismo dos carboidratos, deve-se também identificar e tratar adequadamente para evitar a síndrome metabólica e a doença cardiovascular. Recomenda-se a avaliação da insulina e glicemia de jejum com o cálculo do HOMA-IR, bem como a realização da sobrecarga glicêmica com 75g de glicose e dosar glicemia após 2 horas. Serão consideradas com resistência insulínica quando o HOMA-IR for maior do que 3 e com intolerância à glicose quando a glicemia de jejum for superior à 100 mg/mL ou, após 2 horas após a sobrecarga, os valores forem superiores a 140 mg/mL. PARA DIAGNÓSTICO DE SÍNDROME METABÓLICA, SUGEREM-SE OS CRITÉRIOS DO ATP-III: a) aferição da cintura abdominal maior que 88 cm; b) HDL menor do que 50 mg/dL; c) triglicerídeos superiores a 150 mg/dL; d) pressão arterial sistêmica maior do que 135/85 mmHg ou uso de anti-hipertensivos; glicose superior a 100 mg/dL. É preciso ter três dos cinco critérios. Essas pacientes são de alto risco para doença hepática e cardiovascular. Portanto, avaliações das enzimas hepáticas e da ultrassonografia de abdome superior, bem como cardiológicas, são necessárias. Dentre os andrógenos, a testosterona é o principal na avaliação do hirsutismo e SOP. No entanto, a maioria dos métodos disponíveis não tem boa acurá- cia, e portanto sua analise deve ser cautelosa. A testosterona livre é o exame mais sensível para a detecção do hiperandrogenismo. Isto porque a Globulina Ligadora dos Hormônios Sexuais (SHBG), que é a principal determinante da porção bioativa da testosterona plasmática (testosterona livre ou biodisponível), está reduzida nas pacientes com hiperandrogenismo. Não estão disponíveis ensaios para a dosagem direta deste hormônio (testorena) o melhor método é calcular é através do produto da testostero- na total e função da SHBG (por exemplo, Testosterona livre = testosterona total x percentagem da testosterona livre). Estes exames devem ser rea- lizados no inicio da manhã, entre o 4-10o dia do ciclo menstrual (mulheres com ciclos regulares) ou em mulheres amenorréicas. Outros andrógenos são poucos úteis na sua dosagem, mas são usados para exclusão. O teste de tolerância a glicose deve ser solicitado em mulheres obesas e fatores de risco para diabetes tipo 2, como história familiar positiva. A avaliação periódica do perfil lipídico é recomendada, assim como a função hepática deve ser avaliada quando há fatores de risco para esteatose hepática (doença hepática gordurosa não alcoólica). Avaliação Radiológica A indicação da ultrassonografia pélvica ainda é controversa. A apresentação clássica da SOP caracteri- za-se por ovários com aparência policística, com mais de oito cistos subcorticais menores que 10 mm e/ou aumento do volume ovariano (>10ml)2 . O exame deve ser realizado no inicio da fase folicular do ciclo (terceiro ao quinto dia). Nas pacientes oligo/amenor- réicas, pode ser realizado ao acaso ou após 3-5 dias do sangramento induzido por prostógenos. No entanto, 20% das pacientes não apresentam alterações na ultrassonografia6 . Além disto, muitas mulheres saudá- veis ou com outros distúrbios relacionado ao excesso de andrógenos podem apresentar ovários policísticos ao exame, sem, no entanto, apresentarem os demais achados da síndrome CONDUTA O primeiro passo no tratamento da SOP é a mudança de estilo de vida, ou seja, diminuir o sedentarismo e melhorar a dieta nutricional. ORIENTAÇÕES A conduta inicial na síndrome metabólica pode ser expectante, principalmente na adolescência quando o diagnóstico for duvidoso. Sugere-se aumentar a atividade física, de preferência diariamente ou pelo menos três vezes por semana, com atividades anaeróbicas e aeróbicas. Concomitantemente, há necessidade de acompanhamento por nutricionista para a redução calórica e a adequação da dieta. Recomenda-se, ainda, acompanhamento psicológico de suporte para redução do estresse, bem como de ansiedade/depressão nas mulheres com baixa estima e autocontrole. Em geral, a queda de 5% a 10% do peso corporal pode melhorar o padrão menstrual, reduzir a resistência insulínica e atenuar os efeitos do hiperandrogenismo cutâneo. Na disciplina de Ginecologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Curi et al. (2012) sugerem que atividade física moderada por 40 minutos por dia, repetida durante três vezes por semana, conjuntamente com dieta nutricional adequada, teria efeito semelhante ao do emprego da metformina, tanto clinicamente como nos parâmetros laboratoriais estudados. Além disso, essa conduta apresenta um benefício adicional: redução da circunferência abdominal, portanto da gordura visceral, que está relacionada com resistência insulínica e doença cardiovascular. TRATAMENTO MEDICAMENTOSO Deve ser prescrito conforme a clínica da mulher. É importante lembrar que uma das grandes consequências da SOP e da obesidade é o risco de diabetes melito. Portanto, o primeiro passo é o tratamento da resistência insulínica, quando o tratamento não medicamentoso não surtiu efeito. RESISTÊNCIA INSULÍNICA Quando a resposta pode ser inadequada (sem perda de peso ou piora da resistência insulínica ou intolerância à glicose), está indicado o emprego de fármacos. Recomenda-se, ainda, em mulheres com acantose nigricante ou obesas com antecedentes familiares de diabetes melito do tipo II. A metformina é uma biguanida utilizada no tratamento de diabetes, melhora o padrão menstrual e diminui os níveis de androgênio. Também parece ter algum efeito positivo na indução de ovulação, porém seus efeitos benéficos são moderados. As pacientes candidatas à utilização da metformina devem ter as funções hepática e renal normais. Com o objetivo de evitar os efeitos colaterais gastrointestinais, a substância deve ser administrada às refeições e deve-se iniciar o tratamento com dose mais baixa (250 a 500 mg por dia) e ir aumentando progressivamente (até 2.500 mg por dia) (Rodrigues de Lima, 2015). A utilização isolada da metformina (de 1.500 a 2.000 mg por dia) promove a ovulação em 78% a 96% das pacientes. Esse ainda é o melhor fármaco. A pioglitazona também é um agente moderador do receptor de insulina, mas tem mecanismos diferentes da metformina e, consequentemente, pode ser eventualmente associado à biguanida nos casos mais difíceis de tratamento (Lord e Norman, 2003). Hoje seu uso é restrito devido à associação com doença cardiovascular. Nas pacientes obesas e com ovários policísticos, há trabalhos clínicos mostrando o benefício da Liraglutida, tanto na perda de peso como na melhora da resistência insulínica. Faltam ainda estudos em adolescentes com esse medicamento, mas na mulher adulta pode ter grandes benefícios, principalmente nas doses de 3 mg ao dia subcutâneo. Entretanto, recomenda-se iniciar com dose de 0,6 mg ao dia e aumentar progressivamente em cada semana, até a dose ideal, para minimizar os efeitos colaterais. Nas adolescentes com obesidade mórbida que não responderam aos tratamentos anteriores, a cirurgia bariátrica pode ser a última opção, pois ainda é considerada como tratamento experimental nessa faixa etária. Além disso, as repercussões dessa cirurgia a longo prazo não são totalmente conhecidas, nem as recidivas, principalmente em adolescentes (Inge et al., 2015). As mulheres adultas melhoram tanto na parte metabólica como na cardiovascular e na reprodutiva. O índice de gestação é mais alto após o primeiro ano da cirurgiabariátrica, mas recomenda-se um método contraceptivo pelo menos dois anos após o procedimento para evitar recidiva da obesidade. Não devemos ainda esquecer de corrigir as dislipidemias das mulheres com SOP. Deve-se salientar também que as estatinas podem piorar a resistência insulínica. Portanto, as mulheres usuárias desses fármacos devem ser orientadas sobre esse efeito colateral, bem como os profissionais de saúde devem acompanhar mais atentamente. DISFUNÇÃO MENSTRUAL Progestagênios A primeira opção das adolescentes que tenham disfunção menstrual sem hiperandrogenismo cutâneo é o emprego dos progestagênios. Além disso, esses fármacos podem ser também usados em pacientes hipertensas. A administração do progestagênio pode ser intermitente: por 10 dias (15º ao 25º dia do ciclo) a 14 dias (15º ao 29º dia do ciclo), visando à normalização do padrão menstrual. Pode ser também realizada de forma contínua. Em ambos os casos, visa à proteção endometrial contra lesões proliferativas. Procura-se prescrever substâncias progestacionais com baixa ação androgênica ou até antiandrogênica, como o desogestrel (75 μg ao dia), que pode auxiliar no combate do hiperandrogenismo leve. Para regularizar o ciclo, pode-se ainda empregar o acetato de diidrogesterona (10 mg por dia), o acetato de medroxiprogesterona (2,5 a 10 mg por dia) e a progesterona micronizada (100 a 200 mg por dia). Outra forma de proteger o endométrio seria o uso do sistema intrauterino liberador de levonorgestrel. Esse dispositivo pode ser alternativa para as mulheres sexualmente ativas que são hipertensas, diabéticas e/ou com risco aumentado de tromboembolismo. - A metformina é a menos potente, porém também pode regularizar o ciclo menstrual. Lembrar que a acne melhora com o uso do medicamento entre 3 e 6 meses, e o hirsutismo pode demorar até 09 meses. A associação com técnicas dermatológicas para abordagem dos pelos, como depilação a laser, produz melhores resultados do que apenas as medicações. ANTICONCEPCIONAIS HORMONAIS COMBINADOS Nas mulheres em que o padrão menstrual não se regularizou com a conduta medicamentosa ou o uso de progestagênios, podem-se empregar os anticoncepcionais hormonais combinados. Esses fármacos melhoram a irregularidade menstrual, atenuam o hiperandrogenismo cutâneo moderado e podem evitar uma gravidez não planejada nas adolescentes sexualmente ativas. No entanto, a terapia estroprogestativa não promove melhora da resistência à insulina, normalmente associada à síndrome, e pode, eventualmente, até piorá-la na dependência do tipo de progestagênio utilizado. Em geral, os contraceptivos orais combinados diminuem os níveis androgênicos circulantes por meio da inibição da secreção de gonadotrofinas e pelo aumento dos níveis de SHBG (globulina carreadora de esteroides sexuais), que auxilia na redução dos androgênios circulantes. Contudo, o emprego de dose maior de estrogênio pode ser benéfico no tratamento do hiperandrogenismo cutâneo. Os contraceptivos pela via não oral também podem amenizar o hiperandrogenismo, mas teriam efeito menor do que a via oral devido à primeira passagem hepática, ou seja, menor ação na função hepática e na produção de globulinas. HIPERANDROGENISMO CUTÂNEO Nos casos mais intensos de hirsutismo, os contraceptivos podem não ser suficientes para debelar esses sinais do hiperandrogenismo. Portanto, a associação com substâncias antiandrogênicas deve ser prescrita. O acetato de ciproterona possui ação central e periférica. Bloqueia a liberação de gonadotrofinas hipofisárias, reduzindo a produção androgênica pelo ovário. Perifericamente, atua no folículo piloso impedindo a ligação da diidrotestosterona (DHT) aos seus receptores e também inibe a atividade da enzima 5-alfarredutase reduzindo a produção local de DHT que um androgênio mais potente. A dose inicial recomendada é de 25 a 100 mg diários, via oral, do 5o ao 14o dia do ciclo (esquema sequencial inverso de Hammerstein), por mais de seis meses, podendo estender-se até 24 meses, conforme o quadro clínico da mulher. Recomenda-se o uso concomitante do contraceptivo hormonal combinado para evitar sangramento uterino anormal com o seu emprego ou uma gravidez não planejada. Além disso, essa substância pode ter efeitos antiandrogênicos importantes sobre o feto do sexo masculino, podendo determinar distúrbio do desenvolvimento sexual. A espironolactona, antagonista da aldosterona, tem forte efeito antiandrogênico, pois inibe a síntese de testosterona nas células produtoras de esteroides, tanto na gônada quanto na suprarrenal. - A espironolactona (bloqueia a 5 alfa redutase. Bloqueia o receptor androgênico da pele por isso reduz a acne). Compete, ainda, com os androgênios por seus receptores. Inicialmente, pode ser empregada em doses maiores de 100 a 200 mg ao dia, por período mínimo de seis meses. A manutenção deve ser feita com doses menores de 25 a 50 mg ao dia. Não se esquecer de associar um método contraceptivo. A pílula combinada pode auxiliar a ter efeitos cosméticos mais rápidos e evita a irregularidade menstrual. Outras substâncias antiandrogênicas que podem ser empregadas são a flutamida e a finasterida. FLUTAMIDA não é empregada frequentemente em pacientes com SOP, pois na dose acima de 500 mg ao dia pode produzir dano hepático severo e, às vezes, fulminante. Contudo, em doses mais baixas, pode ser usada para o hirsutismo mais exacerbado e associada ao contraceptivo oral combinado. A finasterida tem poucos efeitos colaterais, sendo bem tolerada pelas pacientes na dose de 2,5 a 5 mg ao dia. Pode ser uma boa opção. Quando o hirsutismo é muito acentuado, o emprego de tratamento tópico conjuntamente ao sistêmico pode auxiliar em resultado cosmético mais rápido. Entre as substâncias que podem ser usadas, salienta-se a eflornitina 13,9%, que é inibidor da Lornitina decarboxilase, enzima que cataliza a conversão de ornitina a putrescina, uma poliamina crítica na regulação do crescimento celular e diferenciação do folículo piloso (Azziz, 2003). Pode-se ainda aplicar cremes com ciproterona ou espirolactona. As medidas cosméticas são sugeridas após três ou quatro meses do inicio do tratamento medicamentoso sistêmico, quando diminui o risco do surgimento de novos pelos. A eliminação definitiva dos pelos poderá ser a mais efetiva. Pode ser usada eletrocoagulação galvânica ou fotoepilação a laser usando alexandrita ou diodo, ou mesmo luz intensa pulsada. É contraindicada em pacientes de pele negra, pois há risco de queimaduras na pele. DESEJO DE GESTAÇÃO Nas mulheres que desejam gestar, caso tenham menos de 35 anos, pode-se liberar a tentativa de concepção espontânea por seis meses, sem investigações adicionais. - Após 35 anos ou após seis meses de tentativa, procede-se a investigação mínima (permeabilidade tubária e espermograma) para se induzir a ovulação. No consenso de indução de portadoras de SOP. indicam-se as seguintes estratégia,: Mudança de estilo de vida, que envolve exercícios, parar de fumar e perda de peso. Essas estratégias podem aumentar a chance de ovulação espontânea. A perda de peso (comentada anteriormente) é abordagem obrigatória, pois a obesidade piora o prognóstico de indução da ovulação, além de acarretar maiores riscos maternos e perinatais. Indução medicamentosa da ovulação: INFERTILIDADE Para o restabelecimento da fertilidade, utilizam-se fármacos indutores da ovulação, como citrato de clomifeno, citrato de tamoxifeno e os inibidores da aromatase, como o letrozol. O clomifeno, modulador seletivo do receptor de estrogênio (SERM), induz a expressão de receptores de FSH e LH, maturação folicular, níveis elevados de estradiol, postura ovular e normalização da retroalimentação acíclica. A posologia inicial deve ser de 50 mg ao dia, durante cinco dias, a partir do terceiro, quarto ou quinto dia do ciclo. O início mais precoce da medicação pode resultar em desenvolvimento folicular múltiplo.Em alguns casos, substâncias sensibilizadoras do receptor de insulina, como metformina e mioinositol, podem diminuir os níveis de insulina e facilitar a ovulação, podendo ser empregadas conjuntamente com o clomifeno, e podem reduzir a resistência desse fármaco, bem como a síndrome de hiperestimulação ovariana. Outra opção é o uso do tamoxifeno, modulador seletivo do receptor de estrogênio, na dose de 20 a 40 mg ao dia, via oral, com esquema semelhante ao do clomifeno, iniciando-se no início do ciclo (terceiro ao quinto dia). O letrozol (inibidor da aromatase) 2,5 mg ao dia, também com o mesmo esquema do clomifeno, está sendo muito investigado, com resposta superior à o clomifeno quando se avaliam gestações a termo. Por essa razão, alguns investigadores creem que esse fármaco pode se tornar a primeira linha da indução da ovulação. Quando os outros medicamentos falharam, as gonadotrofinas podem ser ministradas na dose inicial de 75 UI por dia, iniciando-se nos primeiros cinco dias de sangramento menstrual (natural ou induzido), desde que a ultrassonografia demonstre endométrio fino (menor que 6 mm) e ausência de cistos ovarianos. O ajuste da dose inicial deve ser realizado após, pelo menos, cinco dias de medicação e baseia-se no desenvolvimento folicular ao ultrassom. A ovulação é desencadeada pela gonadotrofina coriônica (de 5.000 a 10.000 UI, em dose única), administrada no dia em que pelo menos um folículo atinja mais de 18/20 mm. Deve-se cancelar o ciclo quando houver mais de quatro folículos com mais de 14 mm de diâmetro médio ou mais de três folículos acima de 16 mm, para evitar a gravidez múltipla e a síndrome de hiperestímulo ovariano. Em ciclos subsequentes, a dose inicial é determinada pela resposta prévia da paciente, podendo ser reduzida ou aumentada. Constitui método racional na terapêutica da anovulia crônica por retroalimentação inadequada. Pesquisas têm utilizado os análogos de GnRH associados às gonadotrofinas com controle melhor do ciclo estimulado. Parece haver benefício com a utilização de análogo do GnRH previamente à indução da ovulação, com aumento das taxas de gravidez e redução das taxas de abortamento. Nesses casos, tornase obrigatória a suplementação hormonal na fase lútea com progesterona ou hCG. A fertilização in vitro (FIV) pode ser utilizada nos casos em que a estimulação ovariana foi exagerada, com o objetivo de evitar o cancelamento do ciclo. Pacientes com SOP parecem ter maior risco de abortamento após FIV. A terapêutica cirúrgica, ressecção cuneiforme, parcial, de ambas as gônadas pela operação de Thaler não é mais indicada. Pode ocasionar aderências pós-operatórias, transformando uma esterilização de causa endócrina em outra, de etiologia mecânica (aderências obstrutivas da tuba). Contudo, a opção terapêutica videolaparoscópica com furos no ovário (drilling) pode ser uma opção quando não houver resposta com as terapias anteriores, mas seu efeito é temporário.
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