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DIREITO DO CONSUMIDOR INTRODUÇÃO Você já ouviu falar da “sociedade de consumo” ? “SOCIEDADE DE CONSUMO” O consumo é uma necessidade biológica de qualquer criatura viva. Vida e consumo são, pois, um binômio indissociável; o consumo humano é mais que impulso fisiológico ou elemento de sobrevivência. Vivemos numa “sociedade de consumo” ou “de consumidores”. O consumo é um dos elementos que compõem a própria condição humana (cultura consumista). As pessoas são mercadorias... “na sociedade de consumidores, ninguém pode se tornar sujeito sem primeiro virar mercadoria, e ninguém pode manter segura sua subjetividade sem reanimar, ressuscitar e recarregar de maneira perpétua as capacidades esperadas e exigidas de uma mercadoria vendável”. (Zigmunt Bauman) “Agora as pessoas exploram a si mesmas e acreditam que estão se realizando”. (Byung-Chul Han) Qual a diferença entre consumismo e consumerismo ? CONSUMISMO VS CONSUMERISMO Denomina-se consumismo a aquisição de bens sem necessidade. No final do século XIX, teve início o movimento consumerista (tendência de proteção jurídica às relações de consumo), como uma reação social de conscientização do consumo que permitiu o surgimento de sistemas normativos de proteção. EVOLUÇÃO DO MOVIMENTO CONSUMERISTA SURGIMENTO Final do séc. XIX, início do séc. XX, na França, Alemanha, Inglaterra e EUA. Lei Sherman (1890, EUA): antitruste. Nascimento do consumerismo. Entre as primeiras leis de proteção ao consumidor, merecem lembrança as seguintes leis francesas: (a) Lei de 22/12/1972, que permitia aos consumidores um período de 7 dias para refletir sobre a compra; (b) Lei de 27/12/1973 - Loi Royer, que dispunha sobre a proteção ao consumidor contra a publicidade enganosa; Leis nº 78, 22 e 23 (Loi Scrivener), de 10/01/1978, que protegiam os consumidores contra os perigos do crédito e cláusulas abusivas (CAVALIERI, Sérgio. Programa de Direito do Consumidor. 4 ed. são Paulo: Atlas, 2014) FASES DO CONSUMERISMO 1ª Fase: pós 2ª GM. Preocupações quanto ao preço; informação; rotulação de produtos. 2ª Fase: a partir dos anos 60. Questionamento do consumo e das práticas abusivas. 3ª Fase: dias atuais. Consciência ética mais clara de ecologia e cidadania. 1985: Res. 39.248/85 da Assembleia Geral da ONU. Normas internacionais para proteção do consumidor. PROTEÇÃO DOS CONSUMIDORES *Msg do Presidente JFK, de 15/3/1962 ao Parlamento : Proteção dos interesses dos consumidores (direitos fundamentais como segurança, informação, escolha, ser ouvido). Traça os princípios básicos do direito do consumidor. A essa msg se segue amplo movimento mundial em favor da defesa do consumidor. Também em razão dessa msg se comemora o Dia do Consumidor em 15 de março. MARCOS IMPORTANTES 1972: Conferência Mundial do Consumidor (ONU). 1973: a CDH (Comissão de Direitos Humanos) da ONU reconhece direitos ao consumidor. O Conselho da Europa lança a Res. 543: “Carta Europeia de Proteção ao Consumidor”. 1975: resolução do Conselho da Comunidade Européia dividiu o direitos dos consumidores em 5 categorias: (1) proteção da saúde/segurança; (2) proteção dos interesses econômicos; (3) reparação dos prejuízos; (4) informação e educação; (5) representação (ser ouvido). 1985: Res. 39.248/85 da Assembleia Geral da ONU. Normas internacionais para proteção do consumidor. MOVIMENTO CONSUMERISTA NO BRASIL No Brasil, a proteção ao consumidor iniciou-se na década de 1970, por meio de alguns movimentos regionais. Na década de 1980, marcada pela redemocratização do país, foi criado o Conselho Nacional de Defesa do Consumidor, por meio do Decreto nº 91.469/85, que teve destacada atuação na elaboração de propostas na Assembleia Constituinte e no CDC. No mesmo período, a ONU, por meio da Resolução nº 39.248/85, estabeleceu as Diretrizes das Nações Unidas para a Proteção do Consumidor, ressaltando a importância da participação dos governos na implantação de políticas de defesa do consumidor. Década de 70: primeiras discussões; Segunda metade da déc. 80: CF/88 prevê a criação do CDC; 1990: CDC (Lei 8.078/90). 1997: o Brasil elabora o Protocolo de Defesa do Consumidor, posteriormente descartado. 2000: os Estados-partes do Mercosul assinaram a “Declaração de Direitos Fundamentais dos Consumidores do Mercosul”. LEGISLAÇÃO A CF/88 atribuiu a competência para legislar sobre a produção e consumo, assim, como a responsabilidade por danos ao consumidor, de modo concorrente, à União, aos Estados e ao Distrito Federal (art. 24, V e VIII). A CF/88 prescreveu, ainda, a exigência de edição de lei para que os consumidores sejam informados acerca dos impostos incidentes sobre mercadorias e serviços (art. 150, §5º), que foi disciplinada e regulamentada pela Lei 12.741/12. LEGISLAÇÃO O Município não tem competência para legislar sobre direito do consumidor. Ex.: lei municipal que proibia taxa mínima de consumo em estabelecimentos, foi declarada inconstitucional. Nota: em caráter excepcionalíssimo, o STF admite a lei municipal, com base no art. 30, I, da CF/88. Ex.: RE 818.880, no qual se admitiu lei municipal destinada a melhorar as condições de atendimento à população local. => Proteção é concorrente. É possível decretos e regulamentos para a fiel execução da lei, inclusive das leis consumeristas. Ex.: Decreto nº 2.181/1997 (Sistema Nacional de Defesa do Consumidor) e 6.523/2008 (Regulamenta o SAC via telefone). CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR A razão da necessidade do CDC é a vulnerabilidade: o consumidor é a parte mais fraca - vulnerável - na relação contratual. A vulnerabilidade é a fragilidade de uma das partes da relação contratual. O vulnerável está exposto a práticas lesivas pela parte mais forte. Justamente por estar exposto a práticas lesivas, necessita da proteção do Estado. SURGIMENTO DA IDEIA DE VULNERABILIDADE A ideia de vulnerabilidade teve início com a revolução industrial e a produção em grandes quantidades, que deram ensejo ao aparecimento da sociedade de massa. Após a 2ª GM ampliou-se a produção em larga escala, aumentando significativamente o número de vulneráveis. VULNERABILIDADES As vulnerabilidades podem ser divididas em: 1. Técnica; 2. Jurídica; 3. Fática; 4. Informacional. ESPÉCIES DE VULNERABILIDADES 1. TÉCNICA: falta de conhecimento sobre o produto ou serviço.O consumidor geralmente não tem expertise; não tem conhecimento técnico. 2. JURÍDICA: falta de conhecimento do ordenamento jurídico, sobre aspectos do direito e contábeis. O consumidor não tem noção plena de seus direitos (ex.: ao consumidor pode ser impingido, imposto, um contrato de adesão). Ademais, o fornecedor é um litigante habitual; o consumidor é um litigante esporádico. Dessa forma, o fornecedor conhece mais e melhor o ordenamento jurídico, no intuito, inclusive, de preservar seus interesses e minorar eventuais perdas. 3. FÁTICA: inferioridade econômica, pessoal ou psicológica (ex.: consumidor que precisa contratar). 4. INFORMACIONAL: falta de informações sobre o produto ou serviço. HIPOSSUFICIÊNCIA: DESNECESSIDADE A presença de uma dessas vulnerabilidades já é suficiente para aplicar o CDC; não se exige a hipossuficiência. Vulnerabilidade e hipossuficiência são conceitos diversos! VULNERABILIDADE E HIPOSSUFICIÊNCIA Vulnerabilidade não se confunde com hipossuficiência: a hipossuficiência do consumidor constitui um plus, algo a mais, que traz a ele mais um benefício, qual seja a possibilidade de pleitear, no campo judicial, a inversão do ônus de provar, conforme estatui o art. 6º, VIII, do CDC. Diferencia-se da vulnerabilidade, conceito jurídico indeclinável que justifica toda a proteção constante do Código do Consumidor, em todos os seus aspectos e seus preceitos. Assim, a vulnerabilidade é fenômeno de direito material com presunção absoluta (art. 4º, I, do CDC – o consumidor é reconhecido pela lei como um ente vulnerável), ao passo em quea hipossuficiência é fenômeno de índole processual que deverá ser analisado casuisticamente, de acordo com as regras ordinárias de experiência. Todo consumidor é vulnerável, mas nem todo consumidor, vulnerável, é hipossuficiente. VULNERABILIDADE: PRESUMIDA? Discute-se se a vulnerabilidade é presumida ou se ela deverá ser comprovada... PESSOA FÍSICA No caso de consumidor pessoa física presume-se a vulnerabilidade. Uma 1ª corrente preconiza que essa presunção é absoluta, ou seja, não admite prova em contrário. A 2ª corrente defende que a presunção é relativa, podendo ser comprovada a ausência da vulnerabilidade. PESSOA JURÍDICA A 1ª corrente defende que, sendo o consumidor pessoa jurídica, a vulnerabilidade não é presumida, devendo ser demonstrada no caso concreto. Uma 2ª corrente, minoritária, defende que a vulnerabilidade também seria presumida para a pessoa jurídica, por uma questão de equidade. Obs.: em determinados contratos, presume-se a vulnerabilidade, mesmo sendo o consumidor pessoa jurídica (ex.: contratos bancários e contratos com concessionárias de serviços públicos). A razão de ser um Código TODOS SOMOS CONSUMIDORES O estatuto é uma lei que regula interesses específicos, de uma categoria de pessoas, ao passo que o código destina-se a todas estas. Preferiu-se, pois, a edição de um Código de Proteção e Defesa do Consumidor, ao invés de um Estatuto, por considerar-se que não são consumidores apenas determinadas pessoas, mas todas estas. De fato, todos somos consumidores; quem não consegue atuar como consumidor pode ver-se excluído socialmente, sendo a compra de itens falsificados (como roupas e acessórios, por exemplo), considerada por alguns estudiosos como forma de identificação e pertencimento social. MANDAMENTO CONSTITUCIONAL No Brasil, a CF/88, no art. 48 do ADCT, ordenou que o Congresso Nacional criasse, num prazo de 120 dias, o CDC (mandamento constitucional). Daí decorreu a edição da Lei nº 8.072/90. A CF/88 insculpiu a gênese das regras e princípios de proteção ao consumidor, sendo pioneira em aludir à defesa do consumidor como um direito fundamental e dever do Estado. A lei que criou o CDC é uma lei ordinária, motivo pelo qual foi discutida a sua constitucionalidade, sob o argumento de que deveria ter sido editado o código via lei complementar. Foi considerada constitucional. PROTEÇÃO AMPLA O CDC protege o consumidor nas fases pré-contratual, contratual e pós-contratual. As normas do CDC se referem a direitos fundamentais de terceira dimensão (artigo 5º, XXXII, da Constituição Federal de 1988). As normas de defesa do consumidor caracterizam, ainda, princípio da ordem econômica (artigo 170, V, da Constituição Federal de 1988), devendo orientar e limitar a intervenção do Estado na economia. APLICAÇÃO A CONTRATOS ANTERIORES Quando da edição do CDC, discutiu-se a aplicação de suas normas aos contratos anteriores. Prevaleceu, porém, a corrente segundo a qual o CDC não se aplica aos contratos anteriores, salvo os de trato sucessivo, isto é, aqueles que se prolongam no tempo. NORMAS DE DIREITO DO CONSUMIDOR As normas de defesa do consumidor são de interesse social e, cogentes (não podem ser alteradas pela vontade das partes); cunho coercitivo. São, ainda, normas de ordem pública; o juiz aplica de ofício, sem que seja necessária requisição de sua aplicação. A intervenção do Estado se dá, por exemplo, no conteúdo dos contratos, para manter o equilíbrio entre as partes, de modo a evitar os abusos. O CDC é um notório exemplo de dirigismo contratual. Lei principiológica, com normas de ordem pública e altivo interesse social que inaugurou um verdadeiro microssistema jurídico de defesa do consumidor. NORMAS DE DIREITO DO CONSUMIDOR MICROSSISTEMA JURÍDICO => contém normas de direito material, processual, administrativo e penal. DIÁLOGO DAS FONTES => Trata-se da conciliação das normas oriundas de diplomas legislativos diferentes. Busca uma hermenêutica conciliadora. Expressão criada por Erik Jayme e divulgada no Brasil por Cláudia Lima Marques. DIÁLOGO DAS FONTES As técnicas utilizadas classicamente sempre foram pautadas nos critérios hierárquico, da especialidade e cronológico, mas o mundo contemporâneo exigiu a necessidade de se introduzir um conceito diferente (o de conflito de leis no tempo), um conceito de aplicação simultânea e coerente de muitas leis ou fontes de direito privado, sob a luz (ou com os valores-guia) da Constituição Federal de 1988. Ex.: Súmula 608 do STJ - "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão". TIPOS DE DIÁLOGO DAS FONTES A prof.ª Cláudia Lima Marques identifica três tipos de diálogos possíveis entre o CDC e o CC: a) diálogo sistemático de coerência (aproveita-se a base conceitual de uma lei pela outra); b) diálogo sistemático de complementariedade e subsidiariedade (adotam-se princípios e regras de um sistema, em caráter complementar, para melhor solução do caso concreto); c) diálogo das influências recíprocas sistemáticas (uma norma influencia na interpretação de outra): diálogo de double sens. NORMAS DE DIREITO DO CONSUMIDOR Entretanto, existe uma exceção, no Enunciado 381 da Súmula do STJ, segundo a qual, o juiz não pode conhecer de ofício as cláusulas abusivas, sendo necessário que a parte provoque tal reconhecimento. Crítica: o enunciado da súmula afrontaria o art. 1º do CDC. BUSCA DA IGUALDADE MATERIAL Sobre o assunto, ensina Cláudia Lima Marques que o “favor debilis é, pois, a superação da ideia — comum no direito civil do século XIX — de que basta a igualdade formal para que todos sejam iguais na sociedade, é o reconhecimento (presunção de vulnerabilidade — veja art. 4o, I, do CDC) de que alguns são mais fortes ou detêm posição jurídica mais forte (em alemão, Machtposition), detêm mais informações, são experts ou profissionais, transferem mais facilmente seus riscos e custos profissionais para os outros, reconhecimento de que os ‘outros’ geralmente são leigos, não detêm informações sobre os produtos e serviços oferecidos no mercado, não conhecem as técnicas da contratação de massa ou os materiais que compõem os produtos ou a maneira de usar os serviços, são pois mais vulneráveis e vítimas fáceis de abusos”. EXERCÍCIOS EXERCÍCIO 1 1. (FCC — 2012 — TJ-GO — Juiz) O Código de Defesa do Consumidor: a) estabelece normas de defesa e de proteção dos consumidores e fornecedores de produtos e serviços, de ordem pública e de interesse social b) estabelece normas de defesa e de proteção do consumidor, de ordem pública e de interesse social, regulamentando normas constitucionais a respeito c) prevê normas de interesse geral, dispositivas e de regulamentação constitucional d) prevê normas de defesa e de proteção ao consumidor, dispositivas e de interesse individual, sem vinculação constitucional e) estabelece normas de interesse coletivo geral, de ordem pública e interesse social, sem vinculação com normas constitucionais EXERCÍCIO 2 2. (CESPE — 2011 — IFB — Professor) Acerca dos princípios e direitos do consumidor, julgue os itens seguintes. Doravante, considere que a sigla CDC, sempre que utilizada, refere-se ao Código de Defesa do Consumidor. O CDC é uma lei de ordem pública econômica e de interesse social. ( ) certo ( ) errado EXERCÍCIO 3 3. (CESPE — 2008 — PC-TO — Delegado de Polícia) De acordo com a legislação especial pertinente, julgue os itens de 81 a 91. A defesa do consumidor encontra supedâneo na Constituição Federal ao estabelecer que o Estado, na forma da lei, promoverá a defesa dos direitos do consumidor. Por sua vez, o Código de Defesa do Consumidor preconiza que as normas de proteção e defesa são de ordem pública e interesse social. Sendo assim, as referidas normas têm de ser observadas mesmo que contrariem a vontade das partes. ( ) certo ( ) errado EXERCÍCIO 4 4. (CEPERJ — 2012 — PROCON-RJ —Agente de Proteção e Defesa do Consumidor) A defesa do consumidor tem base constitucional que indica a necessidade de edição do seguinte Código: a) Civil. b) de Defesa do Consumidor. c) Comercial. d) Tributário. e) Desportivo. GABARITO 1. B; 2. certo; 3. certo; 4. B
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