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Nota de Aula 16 -Teoria do Equilíbrio Geral em Concorrência Perfeita

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DEPARTAMENTO DE ECONOMIA / PUC-Rio
Microeconomia II
Prof. Marcos Antonio C. da Silveira
Nota de Aula 16:
Teoria do Equilíbrio Geral em Concorrência Perfeita
(Trocas Puras)
Bibliografia: Varian (nona edição), cap. 31
1 Introdução
• Seja uma economia de trocas com N indivíduos (i=1,2,...N) e M bens (j=1,2,...,M) tq:
— preferência de cada indivíduo i representada pela função utilidade
ui = ui(Xi)
onde Xi =
¡
x1i , x
2
i , ..., x
j
i , ..., x
M
i
¢
denota uma cesta de consumo do indivíduo i
— dotações iniciais dos indivíduos dadas pelo vetor
W = (W1,W2, ...,Wi, ...,WN)
onde Wi =
¡
ω1i , ω
2
i , ..., ω
j
i , ..., ω
M
i
¢
denota a cesta de dotação inicial do indivíduo i
• Qual a alocação final de bens? Depende do mecanismo social de alocação de recursos
• Mais especificamente, qual a alocação final de bens produzida por um mecanismo de
mercados competitivos?
— Indivíduos são livres para trocar num mecanismo de mercados competitivos
— Liberdade de troca =⇒ alocação final não pode piorar qualquer indivíduo em re-
lação à alocação inicial
• Objetivos da nota de aula:
— Qual a alocação final produzida por um mecanismo de mercados competitivos?
— Esta alocação é eficiente de Pareto?
1
2 Demanda Walrasiana numa Economia de Trocas
• Demanda Walrasiana: conceito fundamental no estudo do Equilíbrio Geral
Definição 1 Demanda Walrasiana (Teoria do Consumidor / Micro I)
• Seja uma economia de trocas tq existe um mercado competitivo para todo bem j=1,2,...,M
• Dado um vetor de preços qq P = (p1, p2, ..., pj, ..., pM), a demanda walrasiana Xi(P ) do
indivíduo i é o conjunto de todas as cestas de consumo Xi =
¡
x1i , x
2
i , ..., x
j
i , ..., x
M
i
¢
que
maximizam sua utilidade
ui(x1i , x
2
i , ..., x
j
i , ..., x
M
i ) (1)
sujeito a sua restrição orçamentária
MX
j=1
pjxji = p
1x1i + p
2x2i + ...+ p
MxMi ≤ p1ω1i + p2ω2i + ...+ pMωMi =
MX
j=1
pjωji (2)
• Em outras palavras, se uma cesta X∗i =
¡
x1∗i , x
2∗
i , ..., x
j∗
i , ..., x
M∗
i
¢
∈ Xi(P ), então X∗i maximiza
a utilidade (1) s.a. restrição (2)
2
Proposição 1 Homogeneidade de grau zero da demanda walrasiana numa economia de trocas
• Para todo P = (p1, p2, ..., pj, ..., pM) e para todo λ > 0, segue que
Xi(P ) = Xi(λP )
onde
λP = (λp1, λp2, ..., λpj, ..., λpM)
Prova. Por definição, Xi(λP ) e Xi(P ) são os conjuntos de todas as cestas Xi =
¡
x1i , x
2
i , ..., x
j
i , ..., x
M
i
¢
que maximizam a utilidade
ui(x
1
i , x
2
i , ..., x
j
i , ..., x
M
i )
sujeito, respectivamente, às ROs
λp1x1i + λp
2x2i + ...+ λp
jxji + ...+ λp
MxMi ≤ λp1ω1i + λp2ω2i + ...+ λpjω
j
i + ...+ λp
MωMi (3)
e
p1x1i + p
2x2i + ...+ p
jxji + ...+ p
MxMi ≤ p1ω1i + p2ω2i + ...+ pjω
j
i + ...+ p
MωMi
Cortando λ em ambos os lados da RO (3), segue que as duas ROs acima são idênticas.
Logo, pode-se concluir que Xi(p) = Xi(λp)
Proposição 2 Função Demanda Walrasiana
• Suponha preferência contínua e estritamente convexa para indivíduo i
• Então, é possível definir uma função demanda walrasiana para este indivíduo, ou seja,
para todo P = (p1, p2, ..., pj, ..., pM), existe uma única cesta
X∗i =
¡
x1∗i , x
2∗
i , ..., x
j∗
i , ..., x
M∗
i
¢
∈ Xi(P )
• Neste caso, é tb possível definir uma função demanda walrasiana xji (P ) por cada bem j,
dada por
xji (P ) = x
j∗
i
3
3 Equilíbrio Walrasiano
• O que significa um vetor de preços que equilibram todos os mercados simultaneamente?
3.1 Definição Geral
Definição 2 Equilíbrio Geral Competitivo ou Equilíbrio Walrasiano
• Seja uma economia de trocas com N indivíduos (i=1,2,...N) e M bens (j=1,2,...,M) tq:
— existe um mercado competitivo para todo bem j
— preferência de cada indivíduo i representada pela função utilidade
ui = ui(Xi)
onde Xi =
¡
x1i , x
2
i , ..., x
j
i , ..., x
M
i
¢
denota uma cesta de consumo do indivíduo i
— dotações iniciais dos indivíduos dadas pelo vetor
W = (W1,W2, ...,Wi, ...,WN)
onde Wi =
¡
ω1i , ω
2
i , ..., ω
j
i , ..., ω
M
i
¢
denota a cesta de dotação inicial do indivíduo i
• Um Equilíbrio Walrasiano consiste de:
— um vetor de preços P¯ = (p¯1, p¯2, ..., p¯j, ..., p¯M)
— uma alocação de bens X¯ =
¡
X¯1, X¯2, ..., X¯i, ..., X¯N
¢
onde
X¯1 =
¡
x¯11, x¯
2
1, ..., x¯
j
1, ..., x¯
M
1
¢
; ...; X¯i =
¡
x¯1i , x¯
2
i , ..., x¯
j
i , ..., x¯
M
i
¢
; ...; X¯N =
¡
x¯1N , x¯
2
N , ..., x¯
j
N , ..., x¯
M
N
¢
tais que:
1. a alocação X¯ =
¡
X¯1, X¯2, ..., X¯i, ..., X¯N
¢
é factível, ou seja, para todo bem j=1,2,...M,
NX
i=1
x¯ji = x¯
j
1 + x¯
j
2 + ...+ x¯
j
N ≤ ω
j
1 + ω
j
2 + ...+ ω
j
N =
NX
i=1
ωji
2. X¯i é uma cesta ótima do indivíduo i dado o vetor de preços P¯ = (p¯1, p¯2, ..., p¯j, ..., p¯M), ou
seja,
X¯1 ∈ X1(P¯ ); ...; X¯i ∈ Xi(P¯ ); ...; X¯N ∈ XN(P¯ )
Observação 1 Pode-se pensar no mercado competitivo através da existência de uma terceira
pessoa - o Leiloeiro Walrasiano
4
3.2 Caso particular: função demanda walrasiana bem definida
• Suponha função demanda walrasiana bem definida para todos indivíduos
• Condição de suficiência: estrita convexidade
Definição 3 Seja xj(P ) a demanda de mercado pelo bem j (j=1,2,...,M) como função do vetor
de preços P = (p1, p2, ..., pj, ..., pM), definida como
xj(P ) = xj1(P ) + x
j
2(P ) + ...+ x
j
N(P ) =
NX
i=1
xji (P )
Definição 4 Seja zj(P ) o excesso de demanda de mercado pelo bem j (j=1,2,...,M) como
função do vetor de preços P = (p1, p2, ..., pj, ..., pM), definido como
zj (P ) =
demanda agregadaz }| {
NX
i=1
xji (P ) −
oferta agregadaz }| {
NX
i=1
ωji .
Proposição 3 Seja um vetor de preços P¯ = (p¯1, p¯2, ..., p¯j, ..., p¯M) tal que, para todo bem j=1,2,...,M,
zj
¡
P¯
¢
≤ 0⇐⇒
demanda agregadaz }| {
NX
i=1
xji
¡
P¯
¢
≤
oferta agregadaz }| {
NX
i=1
ωji (4)
Então, pode-se afirmar que este vetor de preços
P¯ = (p¯1, p¯2, ..., p¯j, ..., p¯M)
e a alocação de bens
X¯ =
¡
X¯1, X¯2, ..., X¯i, ..., X¯N
¢
tal que, para todo indivíduo i=1,2,...,N,
X¯iz }| {¡
x¯1i , x¯
2
i , ..., x¯
j
i , ..., x
M
i
¢
=
Xi(P¯ )z }| {¡
x1i (P¯ ), x
2
i (P¯ ), ..., x
j
i (P¯ ), ..., x
M
i (P¯ )
¢
(5)
constituem um Equilíbrio Walrasiano
5
4 Propriedades do Equilíbrio Walrasiano
Proposição 4 O que importa no Eq. Walrasiano são preços relativos
• Numa economia de trocas, seja um Equilíbrio Walrasiano dado pelo vetor de preços
P¯ = (p¯1, p¯2, ..., p¯j, ..., p¯M)À 0
e pela alocação
X¯ =
¡
X¯1, X¯2, ..., X¯i, ..., X¯N
¢
ou seja, X¯ é factível e, para todo i=1,2,...,N, X¯i ∈ Xi
¡
P¯
¢
• Então, para todo λ > 0, o vetor de preços
λP¯ = (λp¯1, λp¯2, ..., λp¯j, ..., λp¯M)
e a alocação
X¯ =
¡
X¯1, X¯2, ..., X¯i, ..., X¯N
¢
também constituem um Equilíbrio Walrasiano, ou seja, X¯ é factível e X¯i ∈ Xi
¡
λP¯
¢
para
todo i=1,2,...,N
6
Proposição 5 Lei de Walras
• Seja uma economia com M bens e N indivíduos cujas preferências são monótonas
• Suponha função demanda walrasiana bem definida para todos os bens
• Seja zj (P ) a função excesso de demanda agregada pelo bem j (j=1,2,...,M), definida
como
zj (P ) =
demanda agregadaz }| {
NX
i=1
xji (P ) −
oferta agregadaz }| {
NX
i=1
ωji =
NX
i=1
£
xji (P )− ω
j
i
¤
(6)
• Então, para qualquer vetor de preços P = (p1, p2, ..., pj, ..., pM), segue que
MX
j=1
pjzj (P ) = p1z1 (P ) + p2z2 (P ) + ...+ pM−1zM−1 (P ) + pMzM (P ) = 0 (7)
ou seja, a soma dos valores dos excessos de demanda agregada é identicamente nula
Prova. Demonstração para uma economia 2X2 (indivíduos A, B e bens 1,2)
Preferências monótonas =⇒ p/ todo vetor de preços P = (p1, p2) a demanda walrasiana
xA(P ) =
¡
x1A(P ), x
2
A(P )
¢
xB(P ) =
¡
x1B(P ), x
2
B(P )
¢
de cada indivíduo satisfaz sua RO com igualdade, ou seja,
p1x1A (P ) + p
2x2A (P ) = p
1ω1A + p
2ω2A
p1x1B (P ) + p
2x2B (P ) = p
1ω1B + p
2ω2B
Somando as eqs. acima:
p1
£
x1A (P ) + x
1
B (P )
¤
+ p2
£
x2A (P ) + x
2
B (P )
¤
= p1
£
ω1A + ω
1
B
¤
+ p2
£
ω2A + ω
2
B
¤
Manipulando algebricamente as expressões acima:
p1



z1(P )z }| {£
x1A (P ) + x
1
B (P )
¤
−
£
ω1A + ω
1
B
¤

+ p2



z2(P )z }| {£
x2A (P ) + x
2
B (P )
¤
−
£
ω2A + ω2
B
¤

= 0
7
Proposição 6 M-1 mercados "limpos" =⇒ M mercados "limpos"
• Seja uma economia de trocas com preferências monótonas
• Seja um vetor de preços P = (p1, p2, ..., pj, ..., pM) tq...
— p/ todo bem j=1,2,...,M
pj > 0 (8)
— M-1 mercados quaisquer estão "limpos", ou seja, p/ todo bem j=1,2,...,M-1
zj (P ) =
demanda agregadaz }| {
NX
i=1
xji (P ) −
oferta agregadaz }| {
NX
i=1
ωji = 0
• Então, este vetor de preços "limpa" todos os M mercados, ou seja,
zM (P ) =
demanda agregadaz }| {
NX
i=1
xMi (P ) −
oferta agregadaz }| {
NX
i=1
ωMi = 0
de forma que constitui um vetor de preços de Equilíbrio Walrasiano
8
5 Existência do Equilíbrio
• Teste da consistência lógica de um modelo
• Continuidade da função excesso de demanda agregada =⇒ existência do equilíbrio
• O que garante a continuidade da função excesso de demanda agregada?
— Preferências convexas =⇒ demandas individuais contínuas
— Grande número de indivíduos na economia (hipótese coerente com a existência de
mercados competitivos)
• Estrita Convexidade importante para garantir unicidade do equilíbrio
9
6 Eficiência do Equilíbrio Competitivo
• Pergunta importante: A alocação de equilíbrio produzida por mercados competitivos
é eficiente de Pareto?
Proposição 7 Primeiro Teorema do Bem-Estar
• Seja uma economia de trocas que satisfaça as seguintes condições:
— existência de um mercado competitivo para todo bem;
— ausência de externalidades.
• Suponha que existe um Equilíbrio Walrasiano dado pelo vetor de preços
P¯ = (p¯1, p¯2, ..., p¯j , ..., p¯M)
e pela alocação
X¯ =
¡
X¯1, X¯2, ..., X¯i, ..., X¯N
¢
• Então, a alocação X¯ é eficiente de Pareto.
Condições para a validade do Primeiro Teorema
• Existência do equilíbrio
• Ausência de externalidades
• Comportamento competitivo
Intuição do Primeiro Teorema
• Indíviduos competitivos tomam como dada a mesma estrutura de preços relativos =⇒ as
cestas de consumo de dois indivíduos i e i0 satisfazem a seguinte condição de otimização:
para um par de bens qualquer j e k, segue que
TMSj,ki


X¯iz }| {
x¯1i , x¯
2
i , ..., x¯
j
i , ..., x¯
k
i , ..., x¯
M
i

 = p¯
j
p¯k
= TMSj,ki0


X¯i0z }| {
x¯1i0 , x¯
2
i0 , ..., x¯
j
i0 , ..., x¯
k
i0 , ..., x¯
M
i0


Implicação do Primeiro Teorema
• Mercados competitivos são um mecanismo social de alocação de recursos eficiente e
sem custo
• Resultado importante numa economia com milhares de consumidores e firmas, onde o
planejamento central é extretamente complexo e custoso
10
Proposição 8 Segundo Teorema do Bem-Estar.
• Suponha que as preferências dos indívíduos são convexas.
• Então, para toda alocação eficiente de Pareto X¯ = ¡X¯1, X¯2, ..., X¯i, ..., X¯N¢, existe um vetor
de preços P¯ = (p¯1, p¯2, ..., p¯j, ..., p¯M) tal que P¯ e X¯ constituem um Equilíbrio Walrasiano
• Em outras palavras, com preferências convexas, é possível sustentar qualquer alocação
eficiente de Parteto X¯ como resultado de um Equilíbrio Walrasiano
Prova. (Argumento gráfico) Pode-se redistribuir as dotações iniciais dos bens de forma que
a nova alocação inicial situe-se na reta orçamentária que tangencia as curvas de indiferença
na alocação eficiente de Pareto X¯. A hipótese de convexidade das preferências é introduzida
para garantir a existência do Equilíbrio Walrasiano
Implicações do Segundo Teorema
• Separação dos problemas de eficiência e distribuição de riqueza
• Mercado neutro do ponto de vista distributivo:
— mercado não gera "desigualdade"
— desigualdade gerada pela distribuição inicial desigual da riqueza
11

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