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Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 1 SITUAÇÃO PROBLEMA 01 – VÁ DE TAXI... 1. Entender o protocolo XABCDE e o atendimento inicial do paciente politraumatizado; Em todo o mundo o trauma é uma das principais causas de óbitos, independentemente da faixa etária envolvida. Neste quesito temos os acidentes de transito como o líder de causa de trauma. Acredita-se que até 2030 a morte secundária aos acidentes de trânsito ocupe a sétima colocação na causa de morte. Devemos ter ideia que cerca de 49% das vítimas são pedestres, ciclistas e motociclistas. Por conta da sua elevada incidência o trauma ocasiona uma importante oneração do dinheiro público devido aos gastos médicos e a perda de produtividade de algumas vítimas, por isso, medidas preventivas, por exemplo, a lei seca vem como importante estratégia para romper tal ciclo. O médico emergencista ganha papel importante frente a um trauma, pois o mesmo deve exercer um papel de liderança. Mesmo assim, não podemos esquecer que a abordagem inicial deve ser feita em equipe, necessitando de uma boa relação, comunicação e treinamento. A medicina da emergência deve estabelecer ótimos vínculos com a cirurgia geral, neurocirurgia, ortopedia e anestesia a fim de levar o paciente ao centro cirúrgico de forma rápida e segura. O atendimento a um paciente politraumatizado inicia desde a chegada de profissionais ou leigos que possua habilidade de realizar o suporte básico de vida. Não podemos esquecer que aqui no Brasil temos duas instituições nas quais são responsáveis por esses casos: Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), corpo de bombeiros e polícia. O SAMU e o corpo de bombeiros dividem os casos de forma pactuada de acordo com a gravidade. Devemos ter o conhecimento que o próprio SAMU apresenta dois tipos de equipes para o atendimento. Segundo a portaria 2052 que rege o SAMU existe dois tipos de ambulâncias: (1) ambulância básica composta pelo motorista, técnico de enfermagem, maca, tábua rígida – pode ou não ter desfibrilador e não faz procedimento invasivos, enquanto que, (2) ambulância avançada: é composta por médico, enfermeiro, motorista, desfibrilador e drogas, mas não é uma ambulância de salvamento e sim de condução desse paciente para um centro de referência. Desse modo, o treinamento dos profissionais a situações extremas é fundamental para que uma equipe tenha sucesso nas suas abordagens. Sendo assim, o grau de complexidade dos procedimentos realizados por essa equipe durante a cena varia de acordo com a destreza da equipe. Acima dessas duas instituições que realizam esse atendimento inicial temos a central de regulação (sistema nervoso central da emergência) na qual deve ser composta por um médico que fica responsável desde o envio de uma equipe para a cena até a regulação do paciente para o centro de referência. É importante ressaltar que embora o centro de referência esteja lotado, os demais hospitais de emergência trabalham sobre a ótica da vaga zero. Essa vaga nada mais é do que a obrigatoriedade de um serviço de saúde em receber o paciente a fim de encaminhá-lo para a central. Caso neste primeiro momento o hospital de emergência não Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 2 possua recursos suficientes, o mesmo deve acolher o paciente, estabilizar e referencia-lo para a central. Por isso, o papel da central de regulação é importante, pois se deve levar em consideração, a distância, tempo de percurso, o estado de saúde do paciente e o recurso humano dentro dos serviços de emergência naquele momento. Cabe ressaltar que não se faz encaminhamento do paciente para o serviço de referência sem ter atendido o paciente. Durante o atendimento inicial do paciente traumatizado devemos ter em mente os 3 S (segurança, cena e situação). Tal mnemônico permite que o profissional de saúde evite erros e maiores danos ao paciente ou coloque em risco a sua equipe. Desse modo, devemos frisar sempre: em primeiro lugar devemos avaliar se o ambiente é seguro para que possamos tocar no paciente. Essa premissa permite que muitos erros possam ser evitados, pois caso seja inviável chegar ao paciente com parada a melhor conduta é procurar por ajuda, mesmo que você perca algum tempo. A avaliação da segurança do local deve ser constante, pois qualquer erro pode levar o fracasso do atendimento e morte de toda equipe. Desse modo, a experiência da equipe é bastante importante para minimizar tais erros, pois qualquer tomada de decisão equivocada não há como voltar atrás. O atendimento ao paciente ocorre de forma sistematizada, considerando as possíveis situações ameaçadora à vida do paciente através de uma ordem padronizada XABCDE. A letra X nada mais é do que o controle da hemorragia através de técnicas de hemostasia, transporte rápido, uso de cristaloides e prevenção de hipotermia (torniquete e imobilização pélvica). Lembrar da fórmula do choque índex: razão entre frequência cardíaca e PAS. Valores iguais e acima de 0,9 estamos diante de uma situação de sangramento crítico. A letra A (avaliação das vias aéreas com restrição da mobilidade da coluna cervical): traduz o primeiro passo no atendimento em avaliar a perviabilidade das vias aéreas, mesmo tendo a precaução com a mobilidade da coluna. Desse modo, o avaliado deve se identificar a presença de corpos estranhos, fraturas de mandíbula e face as quais impossibilitam a ventilação. Manobras comuns são importantes para evitar a queda da língua (principal causa de obstrução de via aérea), realizando a elevação do mento (Chin lift), anteriorização da mandíbula (jaw trust) e tração mandibular na tentativa de sanar a obstrução. Caso o paciente não consiga proteger a sua via aérea devemos lançar mão do suporte avançado com intubação ou uma cricotireoidostomia. Para tanto, a escala de coma de Glasgow é importante para indicar a necessidade de intubar o paciente. UMA ATENÇÃO ESPECIAL SOBRE A INTUBAÇÃO É QUE EM FRENTE A UM CASO DE DISFUNÇÃO HEMODINÂMICA NÃO DEVEMOS INTUBAR SOMENTE POR ISSO. ISSO PORQUE A INTUBAÇÃO LEVA O SUO DE DROGAS QUE CAUSAM HIPOTENSÃO, BEM COMO O USO DA PRESSÃO POSITIVA, AGRAVANDO A DISFUNÇÃO ORGÂNICA DO PACIENTE CHOCADO. POR ISSO, A INTUBAÇÃO, CASO SEJA NECESSÁRIO, DEVE SER POR SEQUÊNCIA RÁPIDA E EM APENAS UMA TENTATIVA. A letra B (ventilação e respiração): assegurar uma boa ventilação do paciente o examinador deve identificar os fatores que interferem na oxigenação do sangue, ou seja, inspecionar os pulmões, caixa torácica e diafragma. Desse modo, turgência de jugular e desvio de traqueia devem ser avaliados. Durante a cena o tórax deve ser exposto possibilitando a visualização, palpação e ausculta. Logo em seguido podemos lançar mão de oxímetro de pulso. Fatores que dificultam a ventilação: pneumotórax Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 3 hipertensivo, lesão na árvore brônquica, pneumotórax aberto, hemotórax maciço e tamponamento cardíaco. A letra C (circulação com controle de hemorragia): a atenção quanto à hemodinâmica do paciente é fundamental através da avaliação da perfusão periférica, pulsos e capacidade do paciente de manter um bom nível de consciência. Devemos saber que um pulso periférico rápido e fino ou ausente é um sinal clássico de choque hipovolêmico. Desse modo, a monitorização eletrocardiográfica e da pressão arterial se faz necessário. Paralelo a isso, devemos instalar dois acessos venosos periféricos de grosso calibre, caso seja impossível, lançamos mão de acesso intraósseo, acesso venoso central e flebotomia nesta ordem de prioridades. Devemos coletar os níveis séricos de hemoglobina e hematócrito, INR, tipagem sanguínea, lactato e gasometria arterial, não esquecendo de solicitar beta-HCG em todas as mulheres com idade fértil. Além disso, administrar 1000 mL de solução isotônicaaquecida faz parte do protocolo. Caso haja hemorragia externa devemos pressionar o local, caso seja impossível, lançamos mão de um torniquete. Fontes de hemorragia interna podemos identificar através do exame físico, exames de imagem, toque retal e vaginal. Em situações de choque hemorrágico o uso de ácido tranexâmico precocemente faz parte do protocolo, sobretudo em paciente com PA sistólica abaixo de 90 e taquicardia acima de 120 bpm. Administrar 1 g IV em 10 min em até 3 horas do trauma. A letra D (avaliação neurológica): o exame neurológico é mais focado em determinar o nível de consciência do paciente, através da avaliação das pupilas e sinais de lateralização. Devemos sempre prevenir lesão cerebral secundária, mantendo boa oxigenação e perfusão cerebrais. A letra E (exposição e controle do ambiente): a exposição consiste em retirar o paciente do ambiente no qual pode acarretar dano ao mesmo, bem como precaver hipotermia. Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 4 O próximo passo do atendimento do trauma consisde na avaliação secundária clinicamente do paciente de forma sistemática, seguindo a ordem craniocaudal. Podemos antes de iniciar o exame físico questionar o paciente ou acompanhante sobre o mnemônico AMPLA. A – alergias; M – medicamentos em uso; P – passado médico/prenhez; L – líquidos e alimentos ingeridos recentemente; A – ambiente e eventos relacionados ao trauma. Cabeça: inspecionar e palpar toda a face em busca de deformidades e lacerações. Identificar alterações na acuidade visual, motricidade ocular, reflexos pupilares e hemorragia de conjuntiva. A inspeção oral e integridade da mucosa devem ser avaliadas. Coluna cervical e pescoço: realizar medidas de preocupação da mobilidade cervical. Faz-se necessário palpar, inspecionar e auscultar o pescoço (busca de sopro carotídeo). Tórax: inspeção do tórax exposto, ausculta cardíaca e pulmonar. A TC de tórax está indicada se o paciente politraumatizado apresentar dor torácica importante, dispneia, sensibilidade esternal ou alteração no US torácico, ou raio X de tórax. Abdômen e pelve: identificar marcas de cinto de seguração, abrasões e escoriações, correlacionando com a localização das vísceras. O abdômen deve ser inspecionado como um todo e palpado em busca de um ponto localizado de dor ou sinal de irritação peritoeneal. A pelve deve ser examinada em busca de sinais que indique instabilidade. Períneo, reto e vagina: a presença de lacerações e sangramentos ureterais, equimoses devemos suspeitar de lesões na pelve e retroperitônio. O toque retal deve ser realizado a fim de identificar integridade da parede retal. O toque vaginal deve ser realizado em um paciente que tenha risco de lesão. Musculoesquelético: a presença de deformidades, contusões escoriações devem ser buscadas. Palpar proeminências óssea à procura de dor e dificuldade de mobilização é fundamental para identificar fratura oculta. Não devemos esquecer do dorso do paciente que deve ser inspecionado e palpado de forma inteira. REAVALIAÇÃO: NÃO PODEMOS ESQUECER QUE O PACIENTE EVOLUI DE FORMA DINÂMICA, DESSE MODO SE FAZ NECESSÁRIO UMA AVALIAÇÃO CONTÍNUA DE TODOS OS SISTEMAS EM BUSCA DE AGIR DE FORMA CORRETA NESSE PRIMEIRO ATENDIMENTO. Ainda nesse atendimento inicial não podemos esquecer do RCP proposto pelo ATLS. O passo a passo: 1. Verifique o pulso carotídeo no lado do pescoço. Tenha em mente para não perder tempo tentando sentir o pulso; sente por não mais de 10 segundos. Se você não tem certeza você se sentir um pulso, iniciar a RCP com um ciclo de 30 compressões torácicas e duas respirações. 2. Use o salto de um lado na metade inferior do esterno no meio do peito. 3. Coloque a outra mão em cima da primeira mão. 4. Estique os braços e pressionar para baixo. Compressões deve ser de pelo menos dois polegadas no peito da pessoa e a uma taxa de 100 a 120 compressões por minuto. 5. Certifique-se que entre cada compressão que você parar completamente pressionando no peito e permitir que a parede torácica para retornar à sua posição natural. Inclinando-se ou Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 5 descansando no peito entre as compressões pode manter o coração de recarga entre cada compressão e fazer CPR menos eficaz. 6. Depois de 30 compressões, parar compressões e abrir as vias aéreas pela inclinação da cabeça e o levantamento do queixo. Ponha a mão na testa da pessoa e incline a cabeça para trás. b. Levante o queixo da pessoa, colocando o dedo indicador e médio sobre o maxilar inferior; erguer. c. Não realizar a manobra de inclinação da cabeça-elevação do queixo, se você suspeitar que a pessoa pode ter uma lesão no pescoço. Nesse caso, é utilizado o queixo impulso. d. Para a manobra empurrou-maxilar, segure os ângulos do maxilar inferior e levante-o com as duas mãos, uma de cada lado, movendo a mandíbula para a frente. Se seus lábios estão fechados, abra o lábio inferior com o polegar. 7. Dê uma respiração enquanto observa a elevação do tórax. Repita ao dar um segundo fôlego. Respirações que deve ser entregue mais de um segundo. 8. Continuar compressões torácicas. Alternar rapidamente entre compressões e ventilações de resgate para minimizar as interrupções das compressões torácicas. Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 6 2. Conceituar hemorragia em trauma; A hemorragia é a perda de sangue através de ferimentos ou pelas cavidades naturais e pode ser também interna, sem exteriorização do sangue. Podem resultar de um trauma, mas também está presente em diversas condições clínicas. • HEMORRAGIA INTERNA A hemorragia interna ocorre numa cavidade pré-formada no organismo, como peritônio, pleura e pericárdio. O sangue não é observado no exterior, mas o indivíduo pode apresentar- se pálido, taquicárdico, sonolento, com pele fria e úmida. A suspeita pode ser feita através da avaliação do mecanismo do trauma e da avaliação inicial do paciente. As principais áreas de hemorragia interna são o tórax, abdome, retroperitoneo, bacia e ossos longos. Nas vítimas de trauma fechado, os órgãos mais acometidos são o baço (40 a 55%), o fígado (35 a 45%) e o intestino delgado (5 a 10%). Já os ferimentos por arma branca geralmente envolvem o fígado (40%), o intestino delgado (30%), o diafragma (20%) e o cólon (15%). As lesões por arma de fogo acometem mais o intestino delgado (50%), o cólon (40%), fígado (30%) e as estruturas vasculares intra-abdominais (25%). Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 7 • HEMORRAGIA EXTERNA A hemorragia externa no trauma deve ser identificada e controlada durante a avaliação primária. Na abordagem de um sangramento arterial, inicialmente é feita a compressão no local da ferida. Se o sangramento persistir, deve-se aplicar pressão manualmente na artéria proximal à lesão. Se ainda assim, o sangramento persistir, pode ser considerado um torniquete manual ou pneumático. 3. Compreender os mecanismos hemorrágicos (livros de cirurgia - Sabiston) - formação e dissolução de coágulo; A hemostasia nada mais é do que o oposto de hemorragia. Ela nada mais é do que o nome dado a um conjunto de fatores que garantem que o organismo não perca sangue frente a presença de lesão vascular. Compreender a hemostasia envolve o conhecimento dos mecanismos que envolvem a coagulação. Isso porque o organismo não pode simplesmente contrair o vaso lesado e impedir o fluxo sanguíneo. Tal efeito resultaria em hipóxia e isquemia tecidual para os tecidos irrigados pelo vaso lesado. Sendo assim, a formação do tampão de coagulo permite o fechamento dos orifícios pequenos e médios a fim de que o corpo consiga reparar a lesão. Os eventos que compreendem a hemostasia são: constrição vascular, formação de tampão plaquetário,formação do coagulo e crescimento de tecido fibroso. Cabe ressaltar que pouca hemostasia permite sangramento excessivo, enquanto muita permite a formação de trombos, coágulos sanguíneos que se aderem as paredes dos vasos. Uma vez que há um aumento da formação dos trombos, há consequentemente o maior risco para obstrução vascular e possível isquemia de algum tecido. Desse modo, o organismo deve estabelecer um equilíbrio entre os fatores que estimulam e impedem a coagulação. CONSTRIÇÃO VASCULAR O primeiro passo da hemostasia é a constrição vascular a fim de reduzir o fluxo sanguíneo. Nós podemos auxiliar este fenômeno aplicando pressão sobre o ferimento, facilitando a liberação de fatores parácrinos que irão participar da coagulação. A constrição só é possível graças a presença de um espasmo miogênico local e presença de reflexos nervosos oriundos do ferimento. FORMAÇÃO DO TAMPÃO PLAQUETÁRIO O próximo passo é a formação do tampão plaquetário. Antes disso, devemos conhecer a principal célula envolvida neste mecanismo: a plaqueta. As plaquetas são originadas no tecido hematopoiético, tendo como principal percussor o Megacariócito. Elas nada mais são do que fragmentos dessas células. Mesmo sendo apenas fragmentos, as plaquetas exercem funções: contratilidade pela presença de trobostenina; presença de retículo endoplasmático e complexo de Golgi capaz de sintetizar enzimas e armazenar cálcio e grandes quantidades de fosfolipídeos; presença de mitocôndrias e enzimas que produz ATP e ADP; complexos enzimáticos responsáveis por sintetizar as prostaglandinas; síntese de fator estabilizador de Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 8 fibrina e fator de crescimento. Sua superfície é composta por glicoproteínas responsáveis por impedir a adesão das plaquetas ao endotélio saudável. A formação do tampão começa quando as plaquetas se aderem ao endotélio lesado. Tal mecanismo é catalisado pela presença de colágeno. Uma vez que essa ativação acontece as proteínas contrateis da célula tornam-se ativas permitindo a secreção de grânulos de fatores coagulantes que aderem ao colágeno liberam grandes quantidades serotonina, fator de ativação plaquetária (PAF), ADP e Tromboxano A2. Tais substâncias apresentam a capacidade de permitir a contração vascular, bem como, especificadamente o PAF, possui a capacidade de ativar mais plaquetas, formando um eixo de retroalimentação positiva. FORMAÇÃO DO COAGULO A formação do coagulo envolve fatores que influenciam o mecanismo de forma positiva e negativa. Sendo assim, o equilíbrio entre os mesmos assegura a homeostase sanguínea. Uma vez que temos a presença de lesão vascular há uma maior concentração e secreção de fatores pró-coagulação, culminado na cascata da coagulação. Em síntese, todo esse mecanismo pode ser dividido em três partes: (1) cascata que envolve a presença de fatores e complexos de substâncias que ativam umas às outras tendo como produto a produção do ativador da protrombina;(2) em seguida, o ativador da protrombina catalisa a conversão de protrombina em trombina; (3) a trombina atua como uma enzima que catalisa a conversão em fibrinogênio em fibrina para formação do coagulo. Devemos ter em mente, que o coagulo nada mais é do que uma “fixação” do tampão plaquetário através da produção da rede de fibrina. A coagulação inicia através de duas vias, intrínseca e extrínseca, as quais formam uma cascata complexa de reações que envolve a participação de enzimas e íons. A via intrínseca inicia quando o trauma expõe o colágeno às plaquetas. Desse modo, podemos compreender que a mesma inicia por contato do colágeno ao fator XII. A via extrínseca inicia quando os tecidos danificados expõem o fator tecidual (tromboplastina tecidual ou fator III) o qual ativa fator VII. Por fim, as duas vias se unem em uma via comum produzindo trombina, convertendo Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 9 o fibrinogênio em fibrina. Cabe ressaltar que ambas as vias se comunicam e iniciam simultaneamente. Ambas apresentam sistema de retroalimentação positivo o qual garante a formação do coagulo. Além disso, a participação do cálcio é fundamental no mecanismo, pois ele catalisa a ativação das enzimas proteolíticas (os fatores). Uma diferença entre as vias é a duração, sendo a via extrínseca responsável por uma duração de tempo menor, enquanto a intrínseca por um tempo maior. O passo final da coagulação é a conversão de fibrinogênio em fibrina, uma reação catalisada pela enzima trombina. As fibras de fibrina permeiam o tampão plaquetário e retêm eritrócitos dentro de sua malha. O fator XIII ativo converte a fibrina em um polímero com ligações cruzadas, o qual estabiliza o coágulo. Os coágulos são apenas uma correção temporária. Conforme o vaso danificado lentamente é reparado, o coágulo é desintegrado quando a fibrina é quebrada em fragmentos pela enzima plasmina. Uma forma inativa da plasmina, o plasminogênio, é parte do coágulo. Depois da coagulação, a trombina, um fator na cascata de coagulação, age com um segundo fator, chamado de ativador de plasminogênio tecidual (tPA) para converter o plasminogênio inativo em plasmina. A plasmina, então, quebra a fibrina, em um processo chamado de fibrinólise. Uma vez que a coagulação se inicia, o que a impede de continuar até toda a circulação tenha sido coagulada? Dois mecanismos limitam a extensão da coagulação do sangue dentro de um vaso: (1) inibição da adesão plaquetária e (2) inibição da cascata de coagulação e produção de fibrina. Como mencionado, fatores como a prostaciclina no endotélio do vaso sanguíneo e no plasma asseguram que o tampão plaquetário fique restrito à área lesada. Além disso, as células endoteliais liberam substâncias químicas, chamadas de anticoagulantes, que impedem a coagulação. A maioria age bloqueando uma ou mais reações da cascata da coagulação. O corpo produz dois anticoagulantes, heparina e antitrombina III, as quais trabalham juntas para bloquear os fatores ativos IX, X, XI e XII. A proteína C, outro anticoagulante do corpo, inibe os fatores de coagulação V e VIII. A descoberta dos fatores que controlam a coagulação e a fibrinólise foi um importante passo no desenvolvimento de tratamentos para muitas doenças relacionadas a problemas de coagulação. Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 10 4. Definir choque e seus tipos (breve); Define-se choque como a situação em que há perfusão orgânica e oxigenação tecidual inadequadas. No politraumatizado, a causa mais comum de choque é a hipovolemia decorrente da hemorragia. Logo, toda vítima de trauma que se apresente fria e taquicárdica está em choque hipovolêmico até que se prove o contrário. O choque pode ser dividido didaticamente em 3 fases. A primeira ocorre quando os prejuízos são reversíveis e os mecanismos compensatórios estão intactos; nela, o tratamento é a reposição volêmica, iniciando-se com 1.000 mL de cristaloide e reavaliando-se continuamente. Na segunda fase, há o desarranjo microvascular e a disfunção de 1 ou mais órgãos. Na terceira fase, as alterações são graves e irreversíveis, com lesões teciduais estabelecidas e alterações de repolarização cardíaca e das membranas em geral. A insuficiência respiratória decorrente do choque é um evento tardio e só deve ocorrer na terceira fase. A má perfusão (a perfusão depende do fluxo de sangue total e de sua distribuição homogênea por todo o tecido) causada pelo choque é resultado de uma liberação de oxigênio deficiente para a mitocôndria. Nesse sentindo, há uma queda da produção de energia, devido a diminuição da respiração aeróbica. Em contra partida, observamos o aumento da respiração anaeróbica a qual culmina no aumento do ácido lático (produto dessa via). Como a demanda de energia é grande a respiração anaeróbica não dáconta e observamos morte celular e insuficiência do órgão. Os mecanismos que envolvem os tipos de choque são: (1) hipovolêmico deriva de uma depleção do volume vascular, resultando na perda do conteúdo, por exemplo, situações de hemorragia. Além da hemorragia não podemos esquecer do sequestro de líquidos causado por queimaduras ou perda de líquidos causado por diarreia ou vômitos; (2) restritivo quando há compressão do coração e dos grandes vasos, aumentando a resistência periférica e PA diastólica. O principal causador desse tipo de choque é a tromboembolia pulmonar a qual bloqueia o fluxo sanguíneo normal para os Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 11 pulmões; (3) cardiogênico quando temos defeitos diretamente na bomba, o coração. A falência da bomba propriamente dita pode derivar de alterações diretas no músculo miocárdio, arritmias e infarto; (4) neurogênico paciente que sofreu trauma raquimedular alto não conseguindo mantar o tônus simpático, sendo assim, o mesmo apresenta vasodilatação periférica e queda da PA; (5) o distributivo é originado da redução da resistência vascular sistêmica, associada a um aumento da frequência cardíaca. Desse modo, observamos um desequilíbrio entre oferta e consumo de oxigênio. O choque séptico se encontra dentro desse grupo, ele é um quadro de infecção grave dificilmente encontrado em paciente com trauma, além dele temos o choque anafilático. MARCADORES CLÍNICOS DO ESTADO DO CHOQUE Hipotensão: marcador pouco sensível no choque agudo, mas bastante específico (PAS < 90 mmHg) = choque. A hipotensão postural consiste na queda de 10 mmHg no período de 30 segundo durante a posição supina. Pressão diferencial ou pressão de pulso: diferença entre as pressões sistólica e diastólica, sendo que valores menores que 20 mmHg já classificamos como choque. CAI NA PROVA!! Dentre os choques não hemorrágicos os mais comuns são o neurogênico e o séptico. Choque neurogênico: (única indicação de uso de noradrenalina) Lesão medular = perda do tônus simpático; Perda da resistência periférica (queda da pós carga); Hipotensão sem taquicardia; Séptico: Raramente é encontrado no politraumatizado!! Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 12 A taquicardia é uma manifestação bastante presente, mas pouco específica (pacientes atletas, portadores de marca passo e uso de medicamentos pode não apresentar a taquicardia). A taquipneia é uma manifestação específica do choque no qual o organismo tenta compensar a acidose metabólica criada pelo metabolismo anaeróbico. Hipoperfusão cutânea: é resultado da descarga adrenérgica e vasoconstricção. Alteração de consciência: presente em pacientes chocados. Devemos lembrar que no trauma pacientes que fizeram uso de álcool pode apresentar nível de consciência rebaixado. Oligúria: marcador mais sensível e específico no choque. 5. Elucidar os mecanismos compensatórios do choque hemorrágico, suas manifestações e tratamento (hipotensão permissiva); O choque hemorrágico como seu próprio nome já classifica deriva da perda de sangue, sendo essa perda de forma aberta ou fechada (dentro das cavidades). Frente a um paciente politraumatizado até que se prove o contrário devemos classifica-lo com choque hipovolêmico. Como esse choque envolve propriedades relacionadas à hemodinâmica vamos esclarecer alguns conceitos para que possamos entender as alterações frente a este caso. O sangue flui em um circuito fechado através de vasos sanguíneos. Para que o fluxo se estabeleça há a necessidade de fornecimento de energia através de uma bomba, o coração. Desse modo, todo fluxo sanguíneo que parte do coração é denominado de débito cardíaco o qual sofre influência de duas variantes: a pré-carga (retorno venoso) e pós-carga (resistência vascular periférica). Além dessas duas variantes, temos ainda a contratibilidade miocárdica (ionotropismo) a qual consiste na força da contração e sua efetividade para vencer a pressão de ejeção e a frequência cardíaca (cronotropismo) a qual garante um tempo adequado para que as câmaras cardíacas se encham completamente. Com isso, em situações de taquiarritmias com frequência superior a 200 bpm o tempo de enchimento diastólico é prejudicado, culminando na queda do débito cardíaco. Enquanto que nas bradiarritmias se a frequência estiver abaixo de 40 bpm o débito cardíaco cai drasticamente. Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 13 Os choques são classificados como hipodinâmicos (baixo débito e aumento da resistência vascular periférica – vasoconstricção) e em hiperdinâmicos (alto débito cardíaco e redução da resistência vascular periférica – vasodilatação). Quanto ao choque hemorrágico, ele se caracteriza por ser hipodinâmico com aumento dos níveis de catecolaminas aumentando a constrição vascular, frequência cardíaca e contratilidade. O indivíduo com choque hipovolêmico apresenta pressão de enchimento nos ventrículos baixas, pois o retorno venoso está comprometido. Toda essa alteração hemodinâmica resulta em isquemia tecidual e de órgãos. O organismo consegue preservar alguns órgãos frente a um choque, entretanto quando a hipóxia perdura muito tempo, tal mecanismo é ineficaz. Desse modo, a ordem dos tecidos que sofrem isquemia são: primeiro (pele, subcutâneo, musculoesquelético e vísceras) em segundo lugar (rins) e terceiro lugar (cérebro e coração). Seguindo a lógica do choque, temos um comprometimento no metabolismo celular, pois os estoques de oxigênio são reduzidos. Desse modo, sabemos que a respiração aeróbica se torna prejudicada. Desse modo, o organismo lança mão da respiração anaeróbica com a produção de ácido lático, culminando em uma acidose metabólica. Tal condição é visível aos exames laboratoriais que irão revelar aumento no lactado do sangue periférico. Além do prejuízo direto no metabolismo, temos ainda alterações metabólicas que resulta na liberação do cortisol, adrenalina e glucagon. Eles promovem uma hiperglicemia e lipólise. Temos ainda, a ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona a fim de estabelecer seu efeito constritor e retentor de sal. Frente a todas as alterações hemodinâmicas o resultado final é disfunção de múltiplos órgãos e sistemas. A hipóxia leva ativação de citocinas pró-inflamatórias, cirando assim um estado inflamatório intenso e disseminado. Esse caos inflamatório permite uma descompensação hemodinâmica com vasodilatação, aumento da permeabilidade dos capilares, quimiotaxia e lesão nos órgãos. Além disso, temos alterações nas plaquetas e nos fatores de coagulação, levando a um desequilíbrio e formação de microtrombos de forma disseminada (CIVD). MECANISMOS COMPENSATÓRIOS Se o distúrbio hemodinâmico não for corrigido prontamente, podemos originar as disfunções orgânicas. A disfunção de múltiplos órgãos e sistemas é classificado pela presença de 3 ou mais comprometimentos orgânicos. O cérebro é um órgão nobre que é protegido da isquemia por possuir uma capacidade de autorregulação do seu fluxo sanguíneo. A isquemia cerebral ocorre quando a PAM está entre 50-55 mmHg. Pacientes com choque pode apresentar disfunção cerebral devido a atuação de mediadores inflamatórios que inibem a função neuronal, causando o que se chama de encefalopatia séptica. Tal alterações, culminam em distúrbios eletrolíticos e metabólicos do órgão. O coração de forma semelhante ao cérebro, apresenta uma capacidade de autorregulação do sangue, sendo classificado como um órgão nobre. A resposta cardíaca Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 14 frente a um choque deriva de ativação neuro-hormonal (sistema adrenérgico) o qual culmina no aumento da frequência cardíaca e aumento da contratilidade. O estresse frente ao choque e a presença de fatores depressoresdo miocárdio (mediadores inflamatórios) podem resultar em disfunção desse órgão, sobretudo em pacientes cardiopatas, podendo levar a IAM. Os pulmões reagem frente a um choque com uma taquipineia derivada de ativação dos seus receptores e pela acidose metabólica originada pela hipóxia. Quando falamos do sistema respiratório não podemos esquecer da sua principal disfunção: a Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (acúmulo de neutrófilos, liberação de substâncias oxidantes e proteolíticas, lesão alveolar, formação de membrana hialina, extravasamento de líquido, formação de edema e danos na hematose – formação de atelectasia pelo extravasamento de surfactante). Os rins como são órgãos de prioridade intermediária sofre frente ao choque prolongado. De forma regulatória, temos uma redução da função renal, com baixa da filtração glomerular, provocando oligúria e azotemia (aumento da concentração de ureia e creatinina). Como mecanismo primário, tais modificações são reversíveis frente a correção do choque. Caso o choque permaneça por mais tempo, podemos observar lesão renal (necrose) a qual pode resultar em oligúria e azotemia irreversível. O trato gastrointestinal por ser uma víscera sofre de início frente a um quadro de choque com hipoperfusão e vasoconstricção pela ação direta das catecolaminas. O fígado também sofre de forma semelhante, podendo ser identificado uma hepatite isquêmica com aumento das transaminases, fostase alcalina e bilirrubinas, bem como disfunção hepática. A função sintética do fígado também é prejudicada, podendo ser observado uma hipoalbubinemia e deficiência dos fatores de coagulação. CLASSIFICAÇÃO DO CHOQUE HEMORRÁGICO O choque hemorrágico é classificado em 04 classes segundo a quantidade mensurada de sangue perdida. Tal classificação permite uma abordagem eficiente. Classe 01: apresenta pouca preocupação clínica, pois a perda de sangue não foi suficiente para alterar hemodinamicamente o indivíduo. Sendo assim, podemos compreender que os mecanismos compensatórios foram capazes de restabelcer uma nomovolemia. Classe 02: corresponde a uma perda de 15-30% do sangue total. Aqui já temos o surgimento de manifestações clínicas ao exame físico, tais como: taquicardia, taquipneia e diminuição da pressão de pulso. Classe 03: já temos uma perda de aproximadamente 2000 mL. Neste caso, temos a presença de sinais clássicos do choque hipovolêmico: taquicardia, taquipneia acentuadas, oligúria e alterações do nível de consciência. Nesses pacientes o manejo não só envolve a administração de cristaloides, como também o uso de sangue. Classe 04: o paciente mais grave do choque hipovolêmico, com uma perda superior a 2 L. O paciente se apresenta com coma, diminuição significativa da PA sistólica e diastólica e anúria. Perdas superiores a 50% do total de volume sanguíneo pode resultar ausência de pulso, prejudicado a aferição da pressão. Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 15 TRATAMENTO DO CHOQUE HEMORRÁGICO O tratamento do choque inicialmente consiste em cessar o sangramento. Desse modo, as feridas devem ser comprimidas, caso seja necessário, podemos lançar mão do uso de torniquete (no máximo 1 h até o atendimento hospitalar). Seguindo o atendimento, devemos iniciar precocemente a reposição volêmica através de realizar dois acessos venosos periféricos. No momento da punção, devemos colher amostra de sangue para realizar a tipagem, dosagem de hemoglobina, hematócrito, amilase e beta-HCG. A solução mais indicada é o Ringer lactado a qual apresenta uma composição bioquímica mais semelhante ao plasma sanguíneo. A reposição inicial consiste no uso de 1000 mL até reestabelecer o débito urinário. Caso seja utilizado a SF 0,9%, devemos tomar cuidado para a acidose hiperclorêmica que a mesma pode causar em situação de grande volume. Cabe destacar que a reposição volêmica em grandes quantidades não substitui o controle definitivo da hemorragia. Em alguns casos, retardar a reposição volêmica pode ser benéfico, sobretudo na presença ferimentos penetrantes e com hemorragia. Diante da reposição volêmica temos um conceito importante chamado de hipotensão permissiva. Tal conceito é oriundo da premissa de que o profissional de saúde visa a todo momento reestabelecer a pressão do paciente traumatizado, mesmo sem resolver a hemorragia (encher o taque sem desligar a torneira). Tal situação pode agravar a hemorragia, pois teremos mais pressão, com isso, mais perda de sangue, bem como desaloja os trombos e reverte a constrição. Desse modo, o conceito de pressão permissiva nada mais é do que permitir que o paciente chocado tenha uma pressão “estável” mais baixa até que seja resolvido ou encontrado o foco da hemorragia. Temos como parâmetro dessa hipotensão uma PAS 90-80 Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 16 mmHg. A ÚNICA CONTRAINDICAÇÃO DE HIPOTENSÃO PERMISSIVA É EM SITUAÇÕES DE TCE NO QUAL NECESSITAMOS DE UMA PRESSÃO MAIOR PARA ASSEGURAR A PERFUSÃO DO ENCÉFALO. NA PRESENÇA DE TCE DEVEMOS ALCANÇAR A PAS DE 120 MMHG. Agentes hemostáticos (ácido tranexâmico ou ácido aminocaproico) são medidas auxiliares no controle da hemorragia do paciente traumatizado. O ideal é utilizá-los em nível pré-hospitalar, principalmente entre os chocados, independentemente da etiologia. O sangue deve ser reposto na forma de concentrado de hemácias. O objetivo é aumentar a capacidade de transporte de oxigênio do volume intravascular. Está indicada transfusão a pacientes com perda estimada > 30% do volume sanguíneo total. Idealmente, devem ser feitas provas cruzadas, utilizando sangue com tipo específico ABO e Rh. Na indisponibilidade do tipo específico ou na falta de tempo, deve-se utilizar sangue tipo O e, em mulheres em idade fértil, Rh negativo. Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 17 A principal causa de resposta inadequada ao tratamento do choque é a hemorragia oculta ou não diagnosticada. Os idosos e os portadores de choque de causa não hemorrágica devem ser transferidos para Unidade de Terapia Intensiva para adequada monitorização, inclusive da Pressão Venosa Central (PVC). 6. Estudar a profilaxia intra-hospitalar pós trauma; Os doentes esplenectomizados apresentam um risco aumentado para desenvolver infeções severas pós-esplenectomia sendo esta uma situação rara (menos de 1%) mas potencialmente fatal e cujo risco se prolonga por toda a vida. Foram descritos casos 20 a 40 anos após esplenectomia. O risco de infeção severa nos doentes esplenectomizados é superior a 50 vezes comparando com a população normal e o S. pneumoniae é o agente causador mais comum (50 a 90% dos casos), seguido pelo Haemophilus influenzae tipo b e pelo Neisseria meningitidis. Todos estes indivíduos devem ser imunizados antes (de preferência) ou depois da esplenectomia, com a vacina pneumocócica. 7. Descrever os hemoderivados e seus critérios de utilização. CONCENTRADO DE HEMÁCIAS O concentrado de hemácias é obtido por meio da centrifugação de uma bolsa de sangue total e da remoção da maior parte do plasma. O CH também pode ser obtido por aférese, coletado de doador único. Nesse caso, frequentemente o procedimento permite a obtenção de duas unidades em um único procedimento. Seu volume varia entre 220mL e 280mL. Assim como o ST, o concentrado de hemácias deve ser mantido entre 2°C e 6°C e sua validade varia entre 35 e 42 dias, dependendo da solução conservadora. Os concentrados de hemácias sem solução aditiva devem ter hematócrito entre 65% e 80%. No caso de bolsas com solução aditiva, o hematócrito pode variar de 50% a 70%. Os CH podem ser desleucocitados com a utilização de filtros para leucócitos ou desplamatizados pela técnica de lavagem com solução salina fisiológica preferencialmente em sistema fechado. A transfusão deconcentrado de hemácias (CH) deve ser realizada para tratar, ou prevenir iminente e inadequada liberação de oxigênio (O2) aos tecidos, ou seja, em casos de anemia, PEGADINHA Qual o momento adequado para oferecer sangue? Existe um exame adequado? - A oferta de concentrado de hemácias e plasma congelado é mandatório quando classificamos o choque em Grau 3 ou 4. No grau 3 devemos repor de forma gradativa, realizando a prova de tipagem sanguíneo, enquanto que no grau 4 devemos repor de forma maciça (mais de 04 bolsas de concentrado de hemácias na primeira hora ou 10 bolsas em 24 horas). Há protocolos que defende que para um concentrado de hemácias devemos administrar um plasma congelado. Em homens podemos fazer uso do O+, enquanto que mulheres utilizamos o O- (universal). Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 18 porém nem todo estado de anemia exige a transfusão de concentrado hemácias. Em situações de anemia, o organismo lança mão de mecanismos compensatórios, tais como a elevação do débito cardíaco e a diminuição da afinidade da hemoglobina pelo O2, o que muitas vezes consegue reduzir o nível de hipóxia tecidual. Pacientes com hemorragia classe III e IV podem evoluir para óbito por falência múltipla de órgãos se não forem submetidos a esquemas de ressuscitação na primeira hora. A transfusão de CH está recomendada após perda volêmica superior a 25% a 30% da volemia total. O hematócrito não é bom parâmetro para nortear a decisão de transfundir, uma vez que só começa a diminuir uma a duas horas após o início da hemorragia. Em hemorragias agudas o paciente deve ser imediatamente transfundido quando apresentar sinais e sintomas clínicos: FC acima de 100-120 bpm, hipotensão arterial, queda do débito urinário, FR aumentada, enchimento capilar prejudicado e alteração do nível de consciência. CONCENTRADO DE PLAQUETAS O concentrado de plaquetas (CP) pode ser obtido a partir de unidade individual de sangue total ou por aférese, coletadas de doador único. Cada unidade de CP unitários contém aproximadamente 50-60mL de plasma. Dois métodos diferentes são utilizados para a obtenção de plaquetas pela centrifugação de sangue total. O primeiro consiste na centrifugação do sangue em duas etapas. Na primeira etapa, é feita uma centrifugação leve, em que se obtém o plasma rico em plaquetas (PRP); este plasma é novamente centrifugado, desta vez em alta rotação, para a obtenção do CP. O segundo método baseia-se na extração do buffy coat, ou camada leucoplaquetária, geralmente com a utilização de extratores automati- zados de plasma e com o uso de bolsas top and bottom. O sangue total é submetido à centrifugação, visando à separação da camada leucoplaquetária. O plasma sobrenadante é transferido para uma bolsa-satélite, pela saída superior (top) da bolsa e o concentrado de hemácias é extra-ído pela saída inferior (bottom) da bolsa. A camada leucoplaquetária permanece na bolsa original. Os concentrados de plaquetas (CP) unitários contêm aproximadamen- te 5,5 x 1010 plaquetas em 50-60mL de plasma, já as unidades por afére- se contêm, pelo menos, 3,0 x 1011 plaquetas em 200-300mL de plasma (correspondente a 6-8U de CP unitários). Basicamente, as indicações de transfusão de CP estão associadas às plaquetopenias desencadeadas por falência medular, raramente indicamos a reposição em plaquetopenias por destruição periférica ou alterações congênitas de função plaquetária. PLASMA FRESCO O plasma fresco congelado (PFC) consiste na porção acelular do sangue obtida por centrifugação a partir de uma unidade de sangue total e transferência em circuito fechado para uma bolsa satélite. Pode ser obtido também a partir do processamento em equipamentos automáticos de aférese. É constituído basicamente de água, proteínas (albumi- na, globulinas, fatores de coagulação e outras), carboidratos e lipídios. É completamente congelado até 8 horas após a coleta e mantido, no mínimo, a 18°C negativos, sendo, porém, recomendada a Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Perda de Sangue) 19 temperatura igual ou inferior a 25°C negativos. Sua validade se armazenado entre 25°C negativos e 18°C negativos é de 12 meses. Se mantido congelado a temperaturas inferiores a 25°C negativos sua validade é de 24 meses. O congelamento permite a preservação dos fatores de coagulação, fibrinólise e complemento, além de albumina, imunoglobulinas, outras proteínas e sais minerais, e mantém constantes suas propriedades. As indicações para o uso do plasma fresco congelado (PFC) são res- tritas e correlacionadas a sua propriedade de conter as proteínas da coagulação. O componente deve ser usado, portanto, no tratamento de pacientes com distúrbio da coagulação, particularmente naqueles em que há deficiência de múltiplos fatores e apenas quando não estiverem disponíveis produtos com concentrados estáveis de fatores da coagula- ção e menor risco de contaminação viral. A utilização de PFC com o intuito de prevenir hemorragia nestes pa- cientes pode ser feita, mas corrige incompletamente o distúrbio da he- mostasia e não é consenso, pois as alterações plaquetárias e vasculares parecem ser mais importantes nesta circunstância. Não há evidências que indiquem a eficácia da transfusão de PFC antes da realização de procedimentos invasivos com o objetivo de prevenir complicações he- morrágicas. Nestes casos, a utilização de técnica cirúrgica cuidadosa realizada por profissional experiente na realização do procedimento parece ser o principal fator para prevenir tais complicações.
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