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Fichamento sobre: Iniciação à Filosofia - Tomás Melendo A FILOSOFIA NO MUNDO DE HOJE 1. Filosofia espontânea a) Aproximação preliminar No momento atual a filosofia passa por um momento debilitado, pois muitas pessoas, entre intelectuais e público comum, ignoram sua importância, consagrando incompreensíveis as elucubrações mentais e carentes de fundamento. No entanto, muitos dos que opinam, sem perceber são filósofos em exercício naquilo que se chama filosofia implícita ou espontânea, dotada, às vezes. A filosofia constitui substancialmente um tipo de saber, com o qual se tenta das respostas às questões mais relevantes da vida. Há as questões mais típicas como “quem sou eu?” ou “de onde venho?”, como também as bastantes iniciantes, como por exemplo, sobre o sentido da dor, do sofrimento do inocente, da distinção entre o bem e o mal, além de muitas outras questões do mesmo estilo. Deste ponto de vista, qualquer pessoa “filosofa” enquanto busca na vida algo mais que o mero e maçante cotidiano. Em quase todos os numerosos assuntos, exercitando um sadio espírito crítico, tentam ir mais além das expectativas que reinam no ambiente. E nessa mesma proporção acabam se comportando como filósofos. A filosofia pretende dar a resposta mais definitiva possível a qualquer questão que se lhe proponha no âmbito natural, e antes ou simultaneamente, estabelecer perguntas de máximo alcance. O pensador italiano, Giuseppe Savagnone, afirma que “A verdade que a filosofia busca não é somente a que deriva da simples constatação dos fatos”. Por sua vez, Reinhard Lauth, aponta que “ A pergunta filosófica não é somente, portanto, a pergunta pela essência e ser do todo da realidade, senão também por seu valor e sentido”. Quanto mais exija uma pergunta e quanto mais explique uma resposta, com maior propriedade elas podem ser qualificadas como filosóficas. b) Naturalmente filósofos A filosofia caminha por vias que permitem descobrir um significado de grande calibre para até a menor de nossas ações. Outros momentos próprios da filosofia espontânea qualificam-se como crises existências. Onde a pessoa se questiona sobre o significado de sua existência. A cada vez que dá voltas à sua resposta vital e se pergunta, ela está recolocando para si mesma, o significado de seu existir. Existe, por outro lado circunstâncias em que a nossa condição de filósofo se mostra de maneira que inevitável. Por exemplo, quando a pessoa sofre algum acidente ou trauma que faça perder a consciência. Ao despertar as primeiras perguntas serão indagações do tipo global sendo penetrantes, de “sentido” “Onde estou?”, O que aconteceu?” ou “Quem sou eu?” Pieper e Zubiri sustentam que a admiração que dá origem à reflexão filosófica sobrevém quando o mais cotidianos, que acreditávamos entender perfeitamente, seja pelo motivo que for, torna-se incompreensível, cheio de mistérios e nos supera. É o que qualificaremos como “admiração” ou “assombro”. Aristóteles e Kant entre outros defenderam que – a saber que “Todo homem é por natureza filósofo”. Qualquer ser humano, em algum momento de sua vida, confecciona um tipo de “filosofia espontânea”, com a qual, às vezes sem uma plena consciência, orienta o conjunto de o seu existir. Savagnone reafirma e matiza: “Não se pode deixar de ser, de certo modo, filósofos: deve-se escolher, então, entre sê-lo deixando-se dominar pelas „filosofias‟ implícitas nas mensagens dos mass- media e nas modas culturais da sociedade em que vivemos, ou elaborando uma pessoal e responsável visão da realidade e da própria filosofia”. 2. Por que a filosofia? a) A rejeição inicial Neste início de século XXI está acontecendo com a filosofia e a metafísica o que seria determinado pela situação da cultura e dos estudos filosóficos que dominam o momento atual. E semelhante panorama poderia ser definido como uma desconfiança pronunciada, no que se refere às possibilidades do entendimento. Na filosofia comumente os temas mais candentes e próprios da metafísica são abandonados, ainda que se dedique uma particular atenção às questões fragmentárias, as quais são dotadas, sem dúvida, de interesse mas não sendo definitivas. Isso explica por que, ante a presença de um legítimo filósofo, o “especialista em filosofias” e o homem comum adotam uma atitude similar à que suscitava Sócrates quando exercia o seu trabalho entre sábios e menos sábios da Atenas de seu tempo. O homem de hoje, atarefado, dinâmico e muito prático, fica desconcertado ante o bombardeio interrogador de um genuíno filósofo, que o põe perante questões que, por acaso, jamais havia considerado. Tratando-se de um “especialista”, demonstra com grande abundância de meios que o proposto pelo filósofo é mero palavreado, ilusões ou imaginações, etc. Sendo o nosso interlocutor o homem comum, resolverá a situação com um certo gosto de condescendência, indicando para si mesmo que os filósofos estão um pouco perturbados, fabricam o mundo à sua medida e não sabem por os pé na realidade que os circunda como os demais humanos se colocam. Contudo, quando se trata de saber o que é na verdade, o homem e o que lhe corresponde fazer ou sofrer, segundo a natureza que tem, deve colocar todos o seu esforço em investiga-lo e examiná-lo com atenção. Quando nosso filósofo tenta descobrir o sentido das coisas e pessoas que encontra em seu entorno, dirige o seu olhar para o alto, para o que denominou-se “Mundo das Ideias”. De modo que, com efeito, para entender a fundo este mundo, importa desocupar-se dele e fixar a atenção nas alturas. Para exercer a tarefa filosófica devemos fazer repousar o olhar intelectual sobre nosso entorno até “penetrar” no mais profundo de cada um dos entes que o compõe. O amante da sabedoria considera os mesmo acontecimentos que afetam os seus concidadãos, mas faz isso com maior profundidade, penetra mais em cada um deles e em suas relações com o conjunto. Como consequência, descobrem na realidade dimensões mais profundas, diversas das que os seus contemporâneos estão acostumados a perceber. Certamente, ante o filósofo desenhado por Platão, torpe e sem manha para os assuntos cotidianos, o expert em negócios ou em política acabava por transformar o inicial assombro admirativo em sorriso mais ou menos irônico. E suas relações possíveis com a filosofia ficavam “justificadamente” removidas. b) Di-versão e tédio Para Heráclito, a pessoa que não faz reflexão, na verdade, está dormindo; ademais, estando atarefada e absorta nos vaivéns de seus interesses privados, não quer abandonar os seus sonhos e participar da ordem comum dos poucos que, estando acordados, ao filosofar, conhecem as coisas tal como são. Platão, o filósofo, que descobriu a autêntica realidade e tenta mostra-la aos que vivem na ilusão das meras imagens, é rejeitado por estes, que podem inclusive chegar a tirar-lhe a vida, como aconteceu com Sócrates. Klerkegaard consegue expor as dificuldades que se oferecem ao indivíduo que está imerso no mundo, quando busca passar do superficial estágio estético aos compromissos que levam consigo o ético e o religioso. Heldegger, sublinha a resistência que o homem do “se”, diluído no anonimato, opõe para sair da massa e defrontar-se consigo mesmo. Em concreto como pressagiara Horkheimer, sob as manifestações externas do “agito” topamos com uma das pragas mais devastadoras do nosso século: o tédio conhecido também como vazio existencial e a ausência de projeto vital, sendo a causa imediata e inevitável de infelicidade. A sociedade industrial está preparada para satisfazer todas as nossas necessidades, mas a mais humana de todas as necessidades, de ver o sentido da vida de cada um, permanece insatisfeita. As pessoas podem ter muito com que viver, mas, com uma frequência maior, nada têm pelo que viver. Albert Camus, em A queda, deixa uma mostra do que dá de si uma existência epidérmica quesomente pretende fugir do tédio. O diagnóstico do Camus se concentra na curiosa construção linguística do “eu-eu-eu”. São buscadas distintas compensações, aptas a fazer vibrar de maneira imediata o nosso “eu”: comida, bebida, televisão, viagens, sexo, álcool, drogas... Estamos segundo anunciava, ante umas das categorias fundamentais de Pascal – a “di-versão”. De semelhante perspectiva também a tarefa profissional, a política, os negócios, tudo o que fazemos pode ser vivido como uma “di-versão”. Desolação de Pascal: “isso é tudo o que os homens podiam inventar para serem felizes!”. Um grande e trágico jogo para entreter-se ilusoriamente dia após dia e não olhar para dentro. Um grandioso e complicado passatempo com um preço muito alto – a fuga de si mesmos. Fazendo da diversão um ofício, o homem se desembaraça de seu destino, abdica da própria grandeza e se dilui nas situações e nas realidades exteriores. A disjuntiva entre trabalho e diversão é tremendamente reveladora dos problemas de fundo que afetam a nossa época. Muita gente volta para casa tão esgotada que tem apenas o desejo de descansar. Mas esta alternativa deixa fora o mais importante: a nossa relação com as pessoas, o único que nos poderia levar a transcender o vulgar e o tédio. Além disso, como manifestações que são da única atitude de funda da “Di-versão”, trabalho e descanso tendem a assumir formas cada vez mais semelhantes. c) A existência anônima O principal inspirador desse tipo de exame é, sem dúvidas, Kierkegaard. Ele fez da contraposição entre “singular” e massa a chave de todo o seu pensamento e de sua completa existência e função na vida; sendo arrastada por sua incontida paixão, religiosa. Por que os homens, mais concretamente os da última centúria, têm medo da filosofia? No dizer do filósofo de Frelburg, a maior parte dos homens vive uma vida anônima, ordenada, na qual falta o valor para suportar o risco de ser ele mesmo. É o reino do “-se”, da forma impessoal. Martin Heldegger, escapa das mãos o autêntico problema, o de saber assumir a responsabilidade de nossa condição de seres livres. A incapacidade de escolher é uma nota constante dos homens do “se”. No homem da existência anônima, dominada pelo “se”, esfuma-se sem remédio o pensamento. Consequentemente, a palavra degenera em “charlatanice”, “palavreado” ou “frivolidade”, o interesse pelo mundo que nos rodeia em “curiosidade”, a sossegada compreensão das coisas em “equívoco”. No “palavreado”, a palavra que deveria servir para expressar a realidade converte-se no seu substituto: “as coisas são assim porque assim se diz”. Quanto à “curiosidade”, quase ninguém “toma o cuidado de ver para compreender o que vê, mas somente se preocupa com o ver”. Com efeito, num mundo em que os homens se vêem bombardeados por todo tipo de estímulos sensoriais, a atenção passa freneticamente de um a outro, sem que se saiba deter para tentar penetrar no sentido de algum deles. Deste modo, nasce o “equívoco”: “parece que se compreendeu perfeitamente tudo, que se o agarrou e expressou, mas na realidade não é assim”. “Ás vezes por um detalhe de mínima importância, o que antes era uma existência quase celestial”
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