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ALCOOLISMO: é um dos transtornos psiquiátricos mais comuns no mundo ocidental e que pode causar ferimentos e mortes. O álcool é uma droga potente que causa alterações neuroquímicas agudas e crônicas, produzindo sintomas psicológicos temporários graves, incluindo depressão, ansiedade e psicoses. Em longo prazo, níveis cada vez maiores podem produzir tolerância e uma adaptação do corpo tão intensa que a interrupção do uso pode precipitar uma síndrome de abstinência caracterizada por insônia, hiperatividade do sistema nervoso autônomo e ansiedade. → Em relação ao grupo de drogas lícitas, o álcool se destaca como a mais utilizada ao longo da vida (98,3%) (GLOBAL DRUG SURVEY, 2019) → De acordo com Global Status Report on Alcohol and Health do ano de 2018, o consumo total de álcool per capita na população mundial, com idade a partir de 15 anos, equivale a cerca de 6,4 L por ano. Esse consumo varia de acordo com as regiões, sendo que o maior nível de consumo foi observado em países da região europeia (10 L ou mais) seguido dos países das Américas e Pacífico Ocidental (7,5 – 9,9 L). Ainda de acordo com o mesmo relatório, estima-se que o consumo de álcool per capita em indivíduos maiores de 15 anos irá crescer até 2025 no continente americano (de 8,0 para 8,4 L), sendo que um aumento nos 3 países mais populosos dessa região – Brasil, México e Estados Unidos da América – deverá refletir no crescimento geral de consumo nesse continente (WHO, 2018). → No Brasil, a prevalência do uso de bebidas alcoólicas ao longo da vida é de 66,4%, correspondendo a aproximadamente 102 milhões de brasileiros (BASTOS et al., 2017) → Em 2016, o consumo estimado de álcool per capita em brasileiros foi de 7,8 L por ano, ultrapassando a média mundial (6,4 L) (WHO, 2018) → Os valores culturais atribuídos ao uso do álcool, bem como o nível socioeconômico em que o indivíduo se encontra, contribuem para o uso inicial da droga. Em 2012, cerca de 22% dos brasileiros declararam ter experimentado bebidas alcóolicas com menos de 15 anos e 14% da população adulta declarou ter iniciado o consumo regular de bebidas alcóolicas aos 15 anos, evidenciando não só o contato precoce com o álcool, bem como o seu uso contínuo de forma prematura (LARANJEIRA et al., 2014). → As pessoas que recebem intervenção terapêutica e estão em recuperação da dependência ao álcool ainda tendem a ter altas taxas de recaída. No Brasil, cerca de 50% dos indivíduos que passaram por tratamento da dependência ao álcool recaem nos 6 meses subsequentes, evidenciando uma alta taxa de recaída em pouco tempo após o tratamento → Início da ingestão → interação de fatores genéticos e ambientais, incluindo fatores sociais, religiosos e psicológicos. → TEORIAS PSICOLÓGICAS: • Busca pela redução de tensão, aumentar os sentimentos de poder e reduzir os efeitos de dor psicológica • ↓ do nervosismo e ajuda a lidar com os estresses diários • Doses baixas → intensificação do bem-estar e uma facilidade de interações em situações tensas. • Doses altas, quando os níveis de álcool no sangue caem, há aumento da tensão muscular, nervosismo e tensão • Os efeitos relaxantes são maiores em usuários de leve a moderados e menores no alcoolismo → TEORIAS PSICODINÂMICAS: → O uso de baixas doses de álcool ajuda a reduzir a ansiedade e desinibe o indivíduo na medida em que o ajuda a lidar com um superego severo e autopunitivo e a reduzir o estresse → A teoria psicanalítica clássica postula que alguns alcoolistas pararam no estágio oral de desenvolvimento e usam o álcool para aliviar suas frustrações ao consumi-lo por via oral. Alguns indivíduos podem ter “personalidade aditiva”, como ocorre nos casos de homens alcoolistas com transtorno de personalidade antissocial que tem riscos elevados de criminalidade, violência e dependência de múltiplas substâncias após abuso de álcool. → TEORIAS COMPORTAMENTAIS: baseiam-se nos efeitos de recompensa do consumo de álcool, como a não responsabilização cognitiva e comportamental das suas atitudes devido ao afeito do álcool, e a continuidade do abuso, mesmo as experiências sendo negativas, mas “prazerosas”. Compreender essa teoria é importante para modificar comportamentos de consumo de álcool na população e reabilitação. → TEORIAS SOCIOCULTURAIS: fatores socioculturais influenciam nos índices elevados (irlandeses e índios norte-americanos que consomem até a embriaguez) e baixos (judeus, os quais consomem, mas se abstêm da embriaguez) de alcoolismo. Embora explicam até 40% do risco de alcoolismo, existem algumas exceções. De forma geral, fatores socioculturais contribuem para o início do consumo, problema temporários e o alcoolismo. → HISTÓRIA INFANTIL: crianças com transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH), transtorno da conduta, transtorno da personalidade antissocial aumenta o risco de transtorno relacionado ao álcool. As crianças também possuem risco elevado se um ou ambos os pais eram alcoolistas, sugerindo que uma função cerebral hereditária pode predispor um indivíduo a um transtorno relacionado ao álcool. → TEORIAS GENÉTICAS: há 4 evidência: 1) quanto mais parentes alcoolistas próximas, maior risco de problemas graves com álcool (3 a 4x >); 2) os genes influenciam em 60% nos riscos de alcoolismo, sendo o restante influenciado por fatores ambientais; 3) o risco de alcoolismo é maior em descendentes de pais alcoolistas, mesmo os filhos sendo criados por outros pais não alcoolistas; 4) existe uma variedade de genes que influenciam no uso de álcool e intoxicação. EFEITOS DO ÁLCOOL: → Álcool etílico ou etanol (CH3–CH2–OH) é utilizado para ingestão. Os sabores de bebidas alcoólicas são diferentes devido a sua elaboração que inclui diversos produtos finais (tem baixo efeito psicoativo), como metanol, aldeídos e fenóis • Uma dose única é 12 g de etanol, ou seja, 355 mL de cerveja com teor de 3,6% de etanol, 118 mL de vinho não fortificado, 45 mL de destilado com 40% de etanol (uísque ou gim) • Uma dose de álcool eleva o nível de álcool no sangue de um homem de 68 kg em 15 a 20 mg/dL, concentração de álcool que uma pessoa comum consegue metabolizar em 1 hora • Ao calcular a ingestão de álcool do paciente, deve-se atentar a variação no teor alcoólico, dos copos e conteúdo → ABSORÇÃO: 10% do álcool consumido é absorvido no estômago e o restante no intestino delgado. O pico de concentração ocorre após 30 a 90 minutos, dependendo se o álcool foi ingerido com o estômago vazio (o que intensifica a absorção), de forma rápida (reduz o tempo até o pico de concentração) ou lenta. • Em doses elevadas, o corpo se protege secretando muco e fechando a válvula pilórica (causa náusea e vômito), o que impede a passagem e absorção do álcool para o intestino delgado, permanecendo no estômago durante horas • O álcool é absorvido na circulação e distribuído para todos os tecidos, principalmente aqueles com grande proporção de água → os efeitos intoxicantes são maiores quando a concentração de álcool no sangue aumenta do que quando se reduz (efeitos Mellanby). → METABOLISMO: 90% do álcool absorvido é metabolizado pela oxidação no fígado, 10% são excretados inalterados pelos rins e pulmões • O corpo pode metabolizar cerca de 15 mg/dL por hora, ou seja, oxida 22 mL de 40% de álcool em uma hora. Em indivíduos com história de consumo excessivo, a suprarregulação das enzimas resulta em rápido metabolismo • O álcool é metabolizado por duas enzimas: álcool desidrogenase (ADH) e aldeído desidrogenase. A ADH catalisa a conversão de álcool em acetaldeído, que é um composto tóxico; a aldeído desidrogenase catalisa a conversão de acetaldeído em ácido acético − A aldeído desidrogenase é inibida por dissulfiram, utilizado no tratamento de transtornos relacionados ao álcool → EFEITOS SOBRE O CÉREBRO: • BIOQUÍMICA: o efeito do álcool se dá pelos seus efeitos sobre as membranas dos neurônios, o que aumenta a fluidez das membranascom o uso de curto prazo. Com o uso prolongado, as membranas se tornam rígidas ou endurecidas, prejudicando o funcionamento normal dos receptores, dos canais iônicos e de proteínas funcionais ligadas a membranas. Em estudos recentes, pesquisadores tentaram identificar alvos moleculares específicos para os efeitos do álcool. O álcool intensifica os canais GABA A, 5-HT3, ACth e inibe os canais de glutamato e canais de cálcio. • EFEITOS COMPORTAMENTAIS: possui efeito final depressor, como os barbitúricos e benzodiazepínicos. Varia de acordo com os níveis de álcool no sangue: − 0,05%: pensamento, discernimento e inibição são relaxados e às vezes perturbados. − 0,1%: atos motores voluntários normalmente se tornam desajeitados. É a “intoxicação legal”. − 0,2%: há depressão de toda área motora do cérebro pode ser medida e o controle do comportamento emocional são afetados. − 0,3%: indivíduo fica confuso ou em estupor. − 0,4 a 0,5%: coma. − Em níveis mais elevados, os centros cerebrais de controle da respiração e da FC são afetados, e ocorre morte secundária a depressão respiratória direta ou a aspiração de vômito • EFEITOS NO SONO: há aumento da facilidade em adormecer (redução da latência do sono), porém há diminuição do sono do movimento rápido dos olhos (sono REM ou sono com sonhos) e do sono profundo (estágio 4) e maior fragmentação do sono, com episódios mais frequentes e mais longos de vigília. Portanto, a noção de que ingerir álcool ajuda a dormir é um mito. → OUTROS EFEITOS FISIOLÓGICOS: → FÍGADO: uso de álcool, mesmo que de curta duração, como episódios semanais, pode resultar em acúmulo de gorduras e proteínas, as quais produzem a aparência de um fígado gorduroso, às vezes encontrado em exames físicos como hepatomegalia. Pode desenvolver hepatite alcoólica e cirrose hepática. → SISTEMA GASTRINTESTINAL: a longo prazo, pode causar esofagite, gastrite, acloridria e úlceras gástricas. • Abuso intenso → varizes esofágicas e sua ruptura é uma emergência médica que causa morte por hemorragia. • Também é a causa de pancreatite, insuficiência pancreática e câncer pancreático • Altera a digestão e absorção dos alimentos, inibe a capacidade de absorver nutrientes, o que pode causar deficiências vitamínicas do complexo B. → OUTROS SISTEMAS: há ↑PA, desregulação do metabolismo de lipoproteínas e triglicerídeos e aumento do risco de IAM e de doença cerebrovascular. Pode afetar o sistema hematopoiético e aumentar a incidência de câncer na cabeça, no pescoço, no esôfago, no estômago, no fígado, no colo e no pulmão. Intoxicação aguda - associada a hipoglicemia, responsável por parte das mortes súbitas de indivíduos intoxicados. Fraqueza muscular é outro efeito colateral do alcoolismo. Pode causar o aumento de estradiol em mulheres. → TESTES LABORATORIAIS: os níveis de γ-glutamil (gama gt) transpeptidase são elevados em cerca de 80% dos indivíduos com transtornos relacionados ao álcool, e o volume corpuscular médio (VCM) é elevado em cerca de 60%, mais em mulheres do que em homens. No abuso de álcool pode haver elevação também de ácido úrico, triglicerídeos, aspartato aminotransferase (AST) e alanina aminotransferase (ALT). → INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS: são perigosas e fatais • O álcool e fenobarbital são metabolizadas pelo fígado e seu uso prolongado pode levar à aceleração do metabolismo. Quando o indivíduo com transtorno relacionado ao álcool está sóbrio, esse metabolismo acelerado o deixa excepcionalmente tolerante a vários fármacos (sedativos, hipnóticos, analgésicos, fármacos para alívio de náusea, resfriados e alergias). Porém, durante a intoxicação, esses fármacos competem com o álcool pelos mesmos mecanismos de desintoxicação, e concentrações tóxicas de todas as substâncias podem se acumular no sangue que agem de forma sinérgica causando efeitos depressores do SNC. Narcóticos, sedativo-hipnóticos (BZ) e psicotrópicos potencializam o efeito depressor do álcool. CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS DO DSM-V: A. Uso problemático de álcool, com sofrimento clínico significativo, + 2 dos seguintes critérios durante 12 meses: 1. Álcool é consumido em quantidade e período maior do que o pretendido. 2. Insucesso no controle do álcool; 3. Muito tempo é gasto para a obtenção e utilização de álcool ou na recuperação de seus efeitos. 4. Fissura ou um forte desejo ou necessidade de usar álcool. 5. Fracasso social (trabalho, na escola ou em casa). 6. Uso continuado de álcool, apesar de problemas sociais ou interpessoais. 7. Redução ou abandono das atividades sociais, profissionais ou recreacionais. 8. Uso em situações de perigo para a integridade física. 9. Uso é mantido apesar da consciência de ter um problema físico ou psicológico causado ou exacerbado pelo álcool. 10. Tolerância, definida por: a. Necessidade de quantidades progressivamente maiores de álcool para alcançar a intoxicação ou o efeito desejado. b. Efeito acentuadamente menor com o uso continuado da mesma quantidade de álcool. 11. Abstinência, manifestada por: a. Síndrome de abstinência característica de álcool. b. Álcool é consumido para aliviar ou evitar os sintomas de abstinência. → Especificar se em remissão inicial (nenhum dos critérios para transtorno por uso de álcool no mínimo em 3 meses, com exceção de que o Critério A4) ou remissão sustentada (nenhum dos critérios para transtorno por uso de álcool foi satisfeito em qualquer momento durante um período igual ou superior a 12 meses, com exceção do Critério A4). → Especificar se em ambiente protegido, ou seja, se o indivíduo se encontra em um ambiente no qual o acesso a álcool é restrito. → Especificar a gravidade atual em Leve (2 ou 3 sintomas), Moderada (4 ou 5 sintomas) e Grave (6 ou mais). → SUBTIPOS: a dependência de álcool pode ser: • tipo A (início tardio, poucos fatores de risco na infância, dependência leve, poucos problemas relacionados ao álcool e pouca psicopatologia) • tipo B (muitos fatores de risco na infância, dependência grave, início precoce de problemas relacionados ao álcool, muita psicopatologia, história familiar de abuso de álcool, abuso frequente de várias substâncias, longa história de tratamento para o uso de álcool e várias situações de vida estressantes graves). → Outra classificação é em três subtipos: • consumidores problemáticos em estágio inicial (sem síndromes completas de dependência de álcool) • consumidores afiliados (bebe diariamente em quantidades moderadas) • consumidores esquizoides isolados (dependência grave). → Há também a dependência de álcool gama (observada nos Alcoólicos Anônimos, são incapazes de interromper o consumo de álcool) e dependência de álcool delta (há dependência de álcool e ingestão todos os dias, sem estar ciente da falta de controle) → Outros quatro subtipos são: 1) antissocial, em homens, início precoce, relacionado com o transtorno da personalidade antissocial; 2) cumulativo de desenvolvimento, expectativas culturais propiciam mais oportunidades para a ingestão de álcool ao longo do tempo; 3) afeto negativo, em mulheres, para regulação do humor e para facilitar relacionamentos sociais; 4) limitado de desenvolvimento, consumo de grandes quantidades de álcool que se tornam menos frequentes com a idade e com o aumento das expectativas da sociedade quanto ao trabalho e à família também conhecido como embriaguez simples. CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS DO DSM-V: A. Ingestão recente de álcool. B. Alterações comportamentais ou psicológicas clinicamente significativas e problemáticas (comportamento sexual ou agressivo inadequado, humor instável, julgamento prejudicado) desenvolvidas durante ou logo após a ingestão de álcool. C. Um (ou mais) dos seguintes sinais ou sintomas, desenvolvidos durante ou logo após o uso de álcool: 1. Fala arrastada ou tontura. 2. Incoordenação. 3. Instabilidade na marcha. 4. Nistagmo ou visão dupla. 5. Comprometimento da atenção ou da memória.6. Estupor ou coma. D. Os sinais ou sintomas não são atribuíveis a outra condição médica nem são mais bem explicados por outro transtorno mental, incluindo intoxicação por outra substância. A definição legal antiga de intoxicação no Brasil exigia uma concentração sanguínea de 200 mg de etanol por decilitro de sangue (mg/dL), o que equivale a 0,20 g/dL. Atualmente, não é tolerada nenhuma quantidade. CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS DO DSM-V: A. Cessação (ou redução) do uso pesado e prolongado de álcool. B. Dois (ou mais) dos seguintes sintomas após algumas horas a dias da cessação (ou redução) do uso de álcool: 1. Hiperatividade autonômica (sudorese ou frequência cardíaca maior que 100 bpm). + Midríase. 2. Tremor aumentado nas mãos. 3. Insônia. 4. Náusea ou vômitos. 5. Alucinações ou ilusões visuais, táteis ou auditivas transitórias. 6. Agitação psicomotora. 7. Ansiedade. 8. Convulsões tônico-clônicas generalizadas. C. Há sofrimento ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas da vida do indivíduo. D. Os sinais ou sintomas não são atribuíveis a outra condição médica. Especificar se tem perturbações da percepção, como alucinações (geralmente visuais ou táteis) ou ilusões auditivas, visuais ou táteis na ausência de delirium. → CLÍNICA: mesmo sem delirium, pode ser grave • Condições que podem predispor ou agravar incluem fadiga, desnutrição, doença física e depressão. • O sinal clássico é tremor, mas também há sintomas psicóticos e de percepção (delírios e alucinações), convulsões e os sintomas de delirium tremens (DTs). • Tremores ou “tremedeira” ocorrem 6 a 8 horas após a interrupção do consumo, convulsões, em 12 a 24 horas, e DTs, a qualquer momento durante as primeiras 72 horas, embora médicos devam estar atentos para o desenvolvimento de DTs durante a primeira semana de abstinência, não necessariamente nessa ordem. Pacientes que passam por abstinência de álcool estão, de modo geral, alertas, mas podem se sobressaltar facilmente. • As convulsões têm características estereotipadas, generalizadas e são tônico-clônicas. Os pacientes costumam ter mais de uma convulsão 3 a 6 horas após a primeira ocorrência. É difícil diagnosticar a causa na sala de emergência, sempre considerando o abuso prolongado de álcool (hipoglicemia, hiponatremia e hipomagnesemia), lesões nacabeça, infecções do SNC, neoplasias do SNC e outras doenças cerebrovasculares. Nesses casos, indicam-se os benzodiazepínicos para tratar os sintomas de abstinência de álcool, por via oral ou parenteral (exceto Diazepam e clordiazepóxido), começando com uma dosagem elevada, reduzindo-a conforme a recuperação do paciente. → DELIRIUM ou DELIRIUM TREMENS: é a forma mais grave da síndrome de abstinência de álcool, é uma emergência médica. Os pacientes são um perigo devido à imprevisibilidade de seu comportamento, podem ser agressivos ou suicidas, ou podem agir em resposta a alucinações ou pensamentos delirantes como se fossem perigos genuínos. É comum ocorrer uma semana depois da cessação ou redução da ingestão de álcool. Além dos sintomas de delirium, há hiperatividade autonômica (taquicardia, diaforese, febre, ansiedade, insônia e hipertensão), distorções da percepção e níveis flutuantes de atividade psicomotora (de hiperexcitabilidade a letargia). Comum entre os 40 anos, após 5 a 15 anos de consumo intenso, geralmente do tipo compulsivo. Uma doença física (hepatite ou pancreatite) predispõe à síndrome. O melhor tratamento é prevenção com benzodiazepínicos, como 25 a 50 mg de clordiazepóxido a cada 2 a 4 horas até evidências de que esteja fora de perigo. Assim que o delirium surge, no entanto, 50 a 100 mg de clordiazepóxido devem ser ministrados a cada 4 horas VO, ou lorazepam deve ser administrado via intravenosa (IV) caso medicação oral não seja possível. → DEMÊNCIA PERSISTENTE INDUZIDA POR ÁLCOOL: é um problema cognitivo de longo prazo, heterogêneo e pouco estudado. Há reduções globais do funcionamento intelectual, das capacidades cognitivas e da memória, mas dificuldades na memória recente são consistentes com o prejuízo cognitivo global, uma observação que ajuda a distinguir essa condição do transtorno amnéstico persistente induzido por álcool. → TRANSTORNO AMNÉSTICO PERSISTENTE INDUZIDO POR ÁLCOOL: é uma perturbação na memória de curto prazo causada pelo uso intenso de álcool. Raro em menos de 35 anos, devido a necessidade de uso crônico. • SÍNDROME DE WERNICKE-KORSAKOFF: o nome clássico para transtorno amnéstico persistente induzido por álcool é composta por encefalopatia de Wernicke (sintomas agudos) e síndrome de Korsakoff (condição crônica). Enquanto a encefalopatia de Wernicke é reversível com tratamento, apenas 20% dos pacientes com síndrome de Korsakoff se recuperam. • A conexão fisiopatológica entre as duas síndromes é deficiência de tiamina (vitamina B1), causada por maus hábitos nutricionais ou por problemas de absorção. A tiamina é um cofator de várias enzimas importantes e pode estar envolvida na condução do potencial de ação ao longo do axônio e na transmissão sináptica. As lesões neuropatológicas são simétricas e paraventriculares, envolvendo corpos papilares, o tálamo, o hipotálamo, o mesencéfalo, a ponte, a medula, o fórnice e o cerebelo. → APAGÕES: são semelhantes a episódios de amnésia global transitória. Durante um apagão, o indivíduo retém a possui um déficit específico na memória de curto prazo, que o impossibilita de relembrar eventos que ocorreram nos 5 ou 10 minutos anteriores. Como suas outras faculdades intelectuais se mantêm preservadas, ele pode desempenhar tarefas complexas e parecer normal ao observador casual. Os mecanismos neurobiológicos para apagões alcoólicos atualmente são conhecidos em nível molecular; o álcool bloqueia a consolidação de novas memórias em memórias antigas, um processo que, acredita-se, envolva o hipocampo e estruturas relacionadas do lobo temporal → TRATAMENTO E REABILITAÇÃO: → Existem três medidas gerais envolvidas no tratamento do indivíduo alcoolista depois do diagnóstico do transtorno: intervenção, desintoxicação e reabilitação – contemplando as condições psiquiátricas • O paciente com abuso ou dependência de álcool precisa, então, ficar face a face com a realidade do transtorno (intervenção), sofrer desintoxicação, caso necessário, e dar início à reabilitação • Os pontos principais dessas três medidas para uma pessoa alcoolista com síndromes psiquiátricas independentes comórbidas têm grande semelhança com as abordagens utilizadas com o indivíduo alcoolista primário sem síndromes psiquiátricas independentes. No primeiro caso, no entanto, os tratamentos são aplicados depois que o transtorno psiquiátrico foi estabilizado o máximo possível. → INTERVENÇÃO: • O objetivo da intervenção - abrir caminho por meio dos sentimentos de negação e ajudar o paciente a reconhecer as consequências adversas que podem ocorrer se o transtorno não for tratamento • processo destinado a aumentar a motivação para o tratamento e a continuidade da abstinência • Essa medida frequentemente envolve convencer o paciente de que ele é responsável por seus próprios atos e lembrá-lo de como o álcool gerou prejuízos significativos em sua vida (prejuízos para família, trabalho, prejuízos sociais) • Uma única intervenção raramente é suficiente. A maioria dos indivíduos alcoolistas precisa ser lembrada das várias vezes das maneiras como o álcool contribuiu para cada nova crise antes de considerar abstinência como uma opção de longo prazo. • FAMÍLIA: A família pode ser de grande auxílio na intervenção. Familiares precisam aprender a não proteger o paciente dos problemas causados pelo álcool; senão, ele pode não conseguir reunir a energia e a motivação necessárias para interromper o consumo. Além disso, durante o estágio de intervenção, a família pode sugerir que o paciente se encontre com pessoas que estão se recuperando do alcoolismo, talvezpor meio dos AA → DESINTOXICAÇÃO: • A maioria dos indivíduos com dependência de álcool apresenta sintomas relativamente leves quando interrompe o consumo. • Se o paciente possuir de saúde relativamente boa, estiver adequadamente alimentado e tiver um bom sistema de apoio social, a síndrome de abstinência depressora normalmente lembra uma gripe leve • O primeiro passo fundamental na desintoxicação é o exame físico → Na ausência de uma condição médica grave ou abuso combinado de outra substância, é pouco provável que haja abstinência de álcool grave • O segundo passo é proporcionar descanso, alimentação adequada e vitaminas, especialmente as que contêm tiamina. → ABSTINÊNCIA LEVE OU MODERADA: A abstinência ocorre porque o cérebro se adaptou fisicamente à presença de um depressor cerebral e não consegue funcionar de maneira adequada na ausência da substância • Administrar depressores cerebrais suficientes no primeiro dia para reduzir os sintomas e, então, reduzir a dosagem do fármaco até sua interrupção ao longo dos cinco dias seguintes proporciona, à maioria dos pacientes, o máximo de alívio com a menor possibilidade de desenvolver abstinência grave • Qualquer depressor – incluindo álcool, barbitúricos ou qualquer um dos benzodiazepínicos – pode funcionar, mas a maioria dos profissionais prefere um benzodiazepínico, devido a sua relativa segurança • Pode-se administrar um tratamento adequado seja com fármacos de ação breve (p. ex., lorazepam), seja com substâncias de ação prolongada (p. ex., clordiazepóxido e diazepam). Um exemplo de tratamento é a administração de 25 mg de clordiazepóxido via oral 3 ou 4 vezes por dia no primeiro dia, com indicação de pular a dose se o paciente estiver dormindo ou se sentindo sonolento. Podem ser ministradas 1 ou 2 doses adicionais de 25 mg durante as primeiras 24 horas se o paciente estiver com tremores ou mostrar sinais de aumento de tremor ou disfunção autonômica • Ao administrar um agente de ação prolongada, como clordiazepóxido, o clínico deve evitar produzir sonolência excessiva decorrente de sobremedicação; caso o paciente esteja sonolento, a próxima dose agendada deve ser omitida • Ao tomar um fármaco de ação breve, como lorazepam, o paciente não pode perder nenhuma dose, porque alterações rápidas nas concentrações de benzodiazepínicos no sangue podem precipitar abstinência grave. • ABSTINÊNCIA GRAVE • Para aproximadamente 1% dos pacientes alcoolistas com extrema disfunção autonômica, agitação e confusão – ou seja, aqueles com delirium por abstinência alcoólica, ou DTs –, ainda não foi desenvolvido um tratamento ideal • O primeiro passo é questionar o motivo pelo qual uma síndrome de abstinência tão grave e relativamente incomum ocorreu; a resposta costuma estar relacionada a um problema médico concomitante grave que precisa de tratamento imediato • Os sintomas de abstinência podem, então, ser reduzidos ao mínimo por meio do uso de benzodiazepínicos (que, dependendo do caso, às vezes requerem doses elevadas) ou agentes antipsicóticos, como haloperidol. • ABSTINÊNCIA PROLONGADA: Sintomas de ansiedade, insônia e hiper-reatividade autonômica leve provavelmente continuam durante 2 a 6 meses após a cessação da abstinência aguda. Embora não pareça haver tratamentos farmacológicos apropriados para essa síndrome, é possível que alguns medicamentos usados para a fase de reabilitação, especialmente acamprosato, possam funcionar ao reduzir alguns desses sintomas. É importante advertir o paciente de que algum tipo de problema de sono ou sentimentos de nervosismo podem permanecer após a abstinência aguda e discutir abordagens cognitivas e comportamentais adequadas para ajudar o paciente a se sentir mais à vontade. Esses sintomas de abstinência prolongada podem aumentar a probabilidade de recaída. → REABILITAÇÃO: → três componentes principais: (1) esforços contínuos para aumentar e manter níveis elevados de motivação para abstinência; (2) ajudar o paciente a se readaptar a um estilo de vida sem álcool; e (3) prevenção de recaída → Como essas medidas são tomadas no contexto de síndromes de abstinência aguda e prolongada, e crises de vida, o tratamento exige a constante reintrodução de recursos semelhantes que lembrem o paciente o quanto a abstinência é importante e que o ajudem a desenvolver novos sistemas de apoio diários e estilos de enfrentamento. → Não há conhecimento de nenhum evento de vida único, período de vida traumático ou transtorno psiquiátrico identificável que seja uma causa única de alcoolismo. Além disso, os efeitos de quaisquer causas de alcoolismo possivelmente foram diluídos pelos efeitos do álcool sobre o cérebro e pelos anos de um estilo de vida alterado, de forma que o alcoolismo assumiu vida própria. Isso é verdadeiro apesar da crença de muitos indivíduos alcoolistas de que a causa foi depressão, ansiedade, estresse de vida ou síndrome dolorosa. → A mesma abordagem de tratamento geral é usada em contextos ambulatoriais e de internação. A escolha do modo de internação intensiva, mais oneroso, costuma depender das evidências de outras síndromes psiquiátricas ou médicas graves, da ausência de grupos ambulatoriais próximos adequados e da história do paciente de fracasso em um sistema de cuidados ambulatorial. → A abordagem ambulatorial usa uma combinação de aconselhamento individual e em grupo, evitação criteriosa de medicamentos psicotrópicos, a menos que sejam necessários para transtornos independentes comórbidos e envolvimento em grupos de mútua ajuda, como os AA. → ACONSELHAMENTO. Os esforços de aconselhamento nos primeiros meses devem estar voltados para questões da vida diária com a finalidade de ajudar os pacientes a manter um nível elevado de motivação para abstinência e para melhorar seu funcionamento. • Técnicas de psicoterapia que provocam ansiedade ou que exigem insights profundos não demonstraram nenhum benefício durante os primeiros meses de recuperação e, pelo menos teoricamente, podem, na realidade, prejudicar os esforços para manter a abstinência. Portanto, a abordagem se concentra nos esforços que provavelmente caracterizarão os primeiros 3 a 6 meses de cuidados. • a recuperação é um processo de tentativa e erro; o paciente faz uso dos deslizes que ocorrem para identificar situações de alto risco e para desenvolver técnicas de enfrentamento mais apropriadas • A maioria dos esforços de tratamento identifica os efeitos que o alcoolismo tem sobre as pessoas importantes na vida do paciente, e um aspecto de destaque na recuperação envolve auxiliar familiares e amigos próximos a entender o alcoolismo e perceber que a reabilitação é um processo contínuo que dura de 6 a 12 meses ou mais • Aconselhamento para casais e família e grupos de apoio para parentes e amigos ajudam os indivíduos envolvidos a reconstruir relacionamentos, a aprender como evitar proteger o paciente das consequências de consumo no futuro e a oferecer o máximo de apoio possível no programa de recuperação do paciente alcoolista. → MEDICAMENTOS: → Caso a desintoxicação tenha sido finalizada e o paciente não integre os 10 a 15% de alcoolistas que apresentam um transtorno do humor independente, esquizofrenia ou transtorno de ansiedade, há poucas evidências que indiquem a prescrição de medicamentos psicotrópicos para o tratamento do alcoolismo. → Níveis residuais de ansiedade e insônia como parte de uma reação a estresses de vida e abstinência prolongada devem ser tratados com abordagens de modificação de comportamento e tranquilização. Medicamentos para esses sintomas (incluindo benzodiazepínicos) têm probabilidade de perder sua eficácia muito mais rapidamente do que o desaparecimento da insônia; portanto, o paciente pode aumentar a dose e apresentar problemas subsequentes. Do mesmo modo, tristeza e oscilações de humor podem se manter em níveis mais baixos durante vários meses. → Uma possível exceção à recomendação contrao uso de medicamentos é o agente de sensibilização ao álcool dissulfiram. • administrado em doses diárias de 250 mg antes que o paciente receba alta da primeira fase intensiva de reabilitação ambulatorial ou dos cuidados durante a internação • O objetivo é colocar o paciente em uma condição na qual a ingestão de álcool precipite uma reação física desconfortável, incluindo náusea, vômito e sensação de queimação na face e no estômago • Outras duas intervenções farmacológicas promissoras foram objeto de estudo recentemente: A primeira envolve o antagonista de opioides naltrexona, o qual, ao menos em teoria, se acredita apresentar a possibilidade de reduzir o desejo de consumo de álcool ou embotar os efeitos de recompensa do ato de beber. O segundo medicamento que desperta interesse, acamprosato, foi testado em mais de 5 mil pacientes dependentes de álcool na Europa. − Usado em dosagens de aproximadamente 2.000 mg ao dia, esse medicamento esteve associado a cerca de 10 a 20% de resultados mais positivos do que o placebo quando usado no contexto dos regimes de tratamento comportamentais e psicológicos habituais para lidar com alcoolismo.
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