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Fernanda Carvalho - Medicina UNIFTC - 5º semestre A sífilis, também denominada lues, é uma doença infectocontagiosa, com manifestações cutâneas e sistêmicas, evolução crônica e transmissão predominantemente sexual. A transmissão congênita ocorre por via transplacentária ou hematogênica e, com menos frequência, através de transfusões sanguíneas ou inoculação acidental. O homem é o único reservatório conhecido. Afeta um número estimado de 36 milhões de pessoas, com estimativas entre 5 a 11 milhões de casos novos no mundo. O agente etiológico é o Treponema pallidum, bactéria que pode simular várias doenças e processos autoimunes, sendo, por esse motivo, conhecida como “a grande imitadora”. A doença é classificada em primária, secundária, latente e tardia, ou terciária. Em geral, adota-se a classificação como recente, quando tem até um ano de evolução, e tardia, após esse período. Na maioria dos casos, a sífilis inicia-se com lesão ulcerosa na genitália ou na região anal. Como todas as doenças de transmissão sexual, essa ulceração é muito importante na transmissão dos vírus da imunodeficiência adquirida (HIV) e das hepatites B e C. De acordo com alguns autores, a sífilis pode acelerar o desenvolvimento da imunodeficiência pelo HIV, levando à progressão mais rápida para neurossífilis e complicações associadas ao acometimento do sistema nervoso central (SNC). A sífilis é mais frequente em adultos sexualmente ativos. A doença não tem predileção racial ou de gênero; associa-se a fatores socioeconômicos, condições higiênicas precárias e, principalmente, comportamento sexual de risco. Estimativas de prevalência e fatores de risco no Brasil: Gestantes 1,5% Cortadores de cana (Paraíba e Goiás) 2,5%. Estudo Brasileiro publicado em 2018 que abordava a epidemiologia da sífilis, HIV e Fernanda Carvalho - Medicina UNIFTC - 5º semestre hepatites B e C entre cortadores de cana nas regiões de Paraíba e Goiás: Nesse estudo, chama a atenção quando se olha o resultado da Sífilis, a partir do teste treponêmico (teste sorológico que tem como objetivo averiguar se em algum momento da vida o indivíduo se infectou com treponema pallidum. Se o indivíduo já teve sífilis ele dá positivo, se ele já teve e curou ele também fica positivo e se ele está tendo ativamente, também dá positivo). A partir dos resultados observa-se: portadores de sífilis como um todo -> 2,5%, já aqueles que tinham o teste treponêmico + o VDRL positivo (sífilis em atividade) -> 1,2%; é como se fosse 1 em cada 100 pessoas com sífilis em atividade que pode transmitir. Logo, quando se trata de população em geral, se comparada com HIV (0,3% -> 3 a cada 1000), nota-se que a sífilis é muito mais prevalente. FAIXA ETÁRIA MAIS ACOMETIDA NO BRASIL: PROGRAMAS DE INTERVENÇÃO: Redução da prevalência; Redução da incidência; Redução do risco de sífilis congênita; Redução do risco de HIV. Nesse gráfico, o tempo 0 é desde o início da intervenção; depois, 5 anos após a intervenção. O eixo y é a taxa de mudança na prevalência (quanto essa prevalência cai). Nas profissionais do sexo, a prevalência de sífilis é muito maior se comparada aos cortadores de cana, por exemplo. Se a prevalência ficar em 0, então quer dizer que a intervenção não adiantou nada, se subir para 20, a intervenção fez crescer o número de infectados, no entanto, se cair para -20, quer dizer que houve uma mudança a partir da linha de base de 20% nas taxas iniciais de prevalência. Se for para -40, quer dizer que caiu -40% da base, ... e se cair 100%, quer dizer que nulificou a taxa. Esse gráfico mostra que, 1 ano após a intervenção nessas mulheres, um impacto em termos de pessoas com sífilis em atividade caiu quase 50%, isso vai para 70% e vai chegar perto de 80% a redução da prevalência após 5 anos. Fernanda Carvalho - Medicina UNIFTC - 5º semestre REDUÇÃO NAS TAXAS DE SÍFILIS COM SCREENING A VARIADOS INTERVALOS E TRATAMENTO IMEDIATO: Nesse gráfico mostra que se fizer esse screening anual, reduz nas meninas 80% de prevalência e reduz nos clientes em torno de 40%. Já se fizer esse screening só a cada 4 anos, a redução é bem menor, pois só vai estar tratando a cada 4 anos. No entanto, se fizer esse screening a cada 6 meses nas meninas, a redução pode chegar a quase 100% de redução, ou seja, praticamente eliminaria a sífilis nessas meninas. SÍTIO DE DESENVOLVIMENTO DO ESTUDO: Província de Nyanza, localizada na parte oeste do Quênia, tem a 2ª maior taxa de mortalidade (39 por 1000 nascidos vivos) e a 5ª maior taxa de mortalidade perinatal (37 por 1000 nascidos vivos e stillbirths); Nyanza tem também a maior prevalência de HIV (14%) e sífilis (2,3%) entre mulheres de idade reprodutiva. IMPLEMENTAÇÃO DO PROGRAMA PRÉ-NATAL: Em 2011-2013, diversas organizações conduziram um programa piloto para testagem rápida para sífilis, integrando treinamento de enfermeiras, melhoria das unidades de saúde, água segura, intervenções nutricionais e prevenção de sífilis congênita; Essa intervenção atingiu um número de aproximadamente 8000 mulheres grávidas de março de 2011 a fevereiro de 2012. Esse gráfico mostra os resultados “Antes da intervenção”, com baixa cobertura de sífilis e “Após a intervenção”, com alta cobertura de sífilis. No gráfico acima, percebe-se que a sífilis no pré-natal tem diagnósticos muito tardios, apenas no 3º trimestre. Geralmente essas mulheres são testadas já na sala de parto; hábito muito comum em maternidades públicas. No gráfico acima observa-se que o maior número de casos de sífilis em gestantes era em casos que já tinham sífilis latente. Fernanda Carvalho - Medicina UNIFTC - 5º semestre EXISTE UMA PONTA DA SÍFILIS PARA O HIV? A sífilis tem grande significado como indicador de exposição ao HIV e sua história natural é alterada na vigência de coinfecção sífilis-HIV. É possível que seja facilitadora ou agravante da ação e da transmissão do HIV. Foi realizado um estudo: Estrutura do estudo: Estudo de coorte retrospectiva de homens não-infectados pelo HIV e diagnosticados com sífilis com pelo menos uma entrevista; Informação coletada por meio de relatórios de morbidade de rotina e atividades de vigilância, que incluem também entrevistas com parceiros para casos de sífilis e entrevistas do STD- Surveillance-Network para uma amostra aleatória de casos de gonorreia; Período do estudo entre janeiro de 2009 e dezembro de 2016. Resultados: Entre janeiro de 2009 e dezembro de 2015, foram 2.443 diagnósticos de sífilis e 17.290 de gonorreia entre 16.006 indivíduos; Entre esses 16.006 indivíduos, 43,1% (n=6906) eram homens HIV negativos, entre os quais 22,2% (n=1531) tiveram uma entrevista e foram incluídos nesta análise; Na entrada da coorte, 45,9% (n=702) foram diagnosticados com sífilis, 52,3% (n=800) com gonorreia e 1,8% (n=29) com ambas; Média de idade = 30 anos. QUADRO CLÍNICO: SÍFILIS PRIMÁRIA: Cancro duro -> pênis, vagina, vulva, ânus; Lesão inicial da sífilis, que surge cerca de 10 a 90 dias após o período de incubação; Pouco diagnosticado, pois é indolor; Confundido com “verruga”; Quando não tratado, o cancro persiste, em média, 1 a 6 semanas, desaparecendo espontaneamente após esse período. Em cerca de um terço dospacientes, o cancro deixa cicatriz levemente atrófica com bordas regulares. O primeiro teste imunológico a se tornar reagente em torno de 10 dias da evolução do cancro duro é o FTA-Abs, seguido pelos outros testes treponêmicos e não treponêmicos (VDRL – indica infecção ativa); SÍFILIS SECUNDÁRIA: As lesões da sífilis secundária podem surgir na vigência do cancro ou, com mais frequência, após a sua regressão. O quadro clínico inicial dessa fase caracteriza-se por erupção macular, de coloração rósea (“roséola sifilítica”), lembrando quadro alérgico ou viral. Gradualmente, essa erupção macular evolui para lesões papulosas, papuloescamosas, placas e, às vezes, lesões papulotuberosas ou nodulares; O diagnóstico presuntivo é baseado na presença de lesões típicas na pele e mucosas que costumam ser exuberantes nessa fase; As lesões de pele são muito comuns nessa fase, pois trata-se de um fenômeno sistêmico de vasculite pelo treponema; São pleomórficas: podem ser eritematosas, descamativas, psoriáticas; Afetam palmas das mãos e planta dos pés; Podem estar associadas com outros sintomas do paciente como febre, linfadenomegalias, mialgias, mal-estar, cefaleia; Na sífilis secundária todos os testes que detectam anticorpos são reagentes; Fernanda Carvalho - Medicina UNIFTC - 5º semestre Nesse estágio é esperado encontrar títulos altos nos testes quantitativos não treponêmicos (VDRL); A confirmação ocorre por meio dos testes treponêmicos (ELISA, FTA-ABS, IFI) e não treponêmicos (VDRL). O teste não treponêmico esclarece sobre a atividade da doença. Não é específico do treponema, apenas indica a atividade da doença. ATENÇÃO! A figura acima parece uma alergia, porém, trata-se de sífilis!! Para não se confundir, pedir para o paciente mostrar as palmas das mãos. Se tiver lesão nas palmas das mãos, é sífilis. A imagem acima mostra uma lesão nodular infiltrativa. Pode-se perceber que as mãos desse paciente estão afetadas pela doença. Essas descamações nas mãos são muito características de sífilis. SÍFILIS LATENTE: Nesse estágio não ocorrem manifestações clínicas ou alterações radiológicas; somente a sorologia é positiva – os títulos são variáveis, dependendo do tempo de evolução. SÍFILIS TERCIÁRIA: Cerca de um terço dos pacientes com sífilis latente não tratada desenvolverá sífilis terciária. Os demais enfermos permanecerão latentes por toda a vida. As três principais apresentações clínicas da sífilis tardia são as manifestações cutâneas e cardiovasculares e a neurossífilis; A sífilis terciária atinge pele (gomas) e órgãos internos, como aorta ascendente, o sistema nervoso central e a coluna (tabes dorsais); Gomas são lesões necróticas circundadas por processo inflamatório e fibrose, frequentemente ulceradas, em regiões da genitália, ânus e região; Iniciam como nódulos subcutâneos que evoluem para úlceras com base necrótica brancoamarelada; Podem regredir e reaparecer de forma intermitente ao longo de anos, algumas vezes de forma simultânea a episódios recorrentes de sífilis secundária. Fernanda Carvalho - Medicina UNIFTC - 5º semestre Essa imagem mostra uma goma sifilítica cerebral. Isso é uma recorrência de sífilis secundária: a sífilis secundária não foi tratada, a doença regrediu e entrou na fase de latência (latência até um ano: precoce. Se passa de um ano: tardia) e depois dessa latência o paciente passa a ter episódios recorrentes de sífilis secundária. A imagem acima mostra uma lesão sifilítica na base do pênis: goma terciária. SÍFILIS CONGÊNITA: Na ausência de tratamento adequado, as mulheres grávidas podem transmitir a doença para o feto, por via transplacentária ou durante o parto. Em geral, quanto mais avançado for o estágio da gravidez, menor será a possibilidade de transmissão transplacentária. A infecção pelo T. pallidumdurante a gravidez pode resultar em parto prematuro, morte intrauterina, morte neonatal ou sífilis congênita, a qual, clinicamente, pode ser dividida em precoce e tardia. DIAGNÓSTICO LABORATORIAL: Testes treponêmicos apontam para a produção de anticorpos para Treponema pallidum; Teste rápido: fácil, rápido e mostra positividade se o paciente teve ou tem sífilis em atividade; Outros testes confirmatórios são: quimioluminescência, FTA-ABS, IFI; Testes não treponêmicos -> VDRL: fundamental para definir a atividade da doença e acompanhar o tratamento do paciente. INTERPRETAÇÃO: Teste rápido positivo – teste de anticorpos. Quando dá positivo quer dizer que a pessoa tem anticorpos para sífilis e VDRL não reagente: o paciente teve sífilis e curou, não possui mais atividade da doença; Teste rápido positivo e VDRL positivo: 1. Tem sífilis em atividade -> tratar; 2. Dependendo dos títulos (menor do que 1:8) e do tratamento prévio, pode representar cura. Psiu! Sífilis não dá imunidade. TODA VEZ QUE O PACIENTE TIVER SÍFILIS – INVESTIGAR OUTRAS DOENÇAS: Teste rápido para HIV, HBV, HCV; Avaliar presença de HPV; Avaliar corrimentos (gonococo, chlamydia, ureaplasma). Fernanda Carvalho - Medicina UNIFTC - 5º semestre SÍFILIS PRIMÁRIA: Cancro duro no pênis, vulva ou vagina: Penicilina Benzatina; 2,4 milhões UI (dose única). SÍFILIS SECUNDÁRIA: Manchas no corpo, linfonodos aumentados, cefaleia: Penicilina Benzatina; 2,4 milhões UI (dose única). SÍFILIS LATENTE: Penicilina Benzatina; 7,2 milhões UI; 2,4 milhões UI 1x/semana por 3 meses. NEUROSSÍFILIS: Processo meningoencefálico crônico; Casa de demência após anos de infecção; Alterações do comportamento, mudança do status e do humor; Disfunções cognitivas; Paralisias de pares cranianos; Comprometimento ocular ou auditivo; A invasão do Treponema pallidum no SNC pode ocorrer no cérebro, em nervos que dão acesso ao SNC (VIII par) ou nos olhos (Uveíte mista). Psiu! Quando trata a neurossífiis precocemente, tem como reverter esse quadro. Porém, se o paciente for tratado tardiamente, não vai ter mais jeito. DIAGNÓSTICO DA NEUROSSÍFILIS: Através do exame de líquor: o Pleocitose moderada; o Aumento de proteínas; o VDRL no líquor é muito específico, porém menos sensível (50%); Através de alterações auditivas (redução da audição) ou vestibulares (e.g., zumbido); Através de manifestações oculares compatíveis com uveite posterior ou mista; Os exames sorológicos serão sempre POSITIVOS e o VDRL sérico não cai com o tratamento diferencial. TRATAMENTO: 1ª escolha; o Penicilina G cristalina 24.000.000 UI por dia (divididos em 6 vezes) por 10 – 14 dias; 2ª escolha: o Ceftriaxone (2g) diários por 14 dias; o Taxa de falência de 23%. ACOMPANHAR QUEDA NO VDRL: VDRL a cada 3 meses no primeiro ano de tratamento; VDRL a cada 6 meses no segundo ano de tratamento; Queda de 2 a 3 diluições a cada 4 meses em sífilis primária e secundária Queda de 2 diluições a cada 6 meses em sífilis latente e neurosífilis. POR QUE SÍFILIS CONTINUA SENDO UM PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA: Baixa conscientização do risco e do uso de preservativos em populações heterossexuais; Necessidade de monitoração das taxas de sífilis em grupos populacionais variados; Ausência de screening repetidos;Fernanda Carvalho - Medicina UNIFTC - 5º semestre Diagnóstico tardio no pré-natal e puerpério; Tratamento iniciado tardiamente. IDENTIFICAR PESSOAS SOB RISCO: Indivíduos com menor escolaridade; Heterossexuais; Jovens < 25 anos; Parceiros múltiplos (> 6 parceiros últimos 12 meses); Contato sexual com pessoas com sífilis; Trabalhadoras do sexo; Tatuagem. ACÕES: Screening repetidos com teste rápido para sífilis; Melhoria no cuidado pré-natal com screening para sífilis no 1º trimestre; Tratamento imediato naqueles testados positivos com teste rápido, enquanto aguarda o restante do rastreamento; Tratamento imediato da parceria sexual do caso índice. ATIVIDADES: 1. Agente etiológico da Sífilis: a) Treponema pallidum; b) Neisseria gonorrhoeae; c) Chlamydia trachomati; d) Trichomonas vaginalis; e) Haemophilus ducreyi. 2. A sífilis é uma doença infecciosa crônica que pode acometer praticamente todos os órgãos e sistemas do corpo. Além de ser uma doença sexualmente transmissível, ela também é considerada uma: a) Protozoose; b) Bacteriose; c) Virose; d) Micose; e) Verminose. 3. Uma das lesões mais específicas da sífilis surge no local da inoculação. Geralmente ela é única, indolor e com base endurecida. Analise as alternativas abaixo e marque o nome dado a essa lesão. a) Cancro mole; b) Cancro duro; c) Roseóleo sifilítica; d) Sifílides; e) Afta. 4. A sífilis é uma doença infecciosa que se manifesta em três estágios: sífilis primária, secundária e terciária. Sobre os estágios dessa doença, marque a alternativa incorreta: a) A doença é mais contagiosa nos primeiros dois estágios; b) O terceiro estágio pode não apresentar sintomas; c) Na sífilis primária, é possível observar uma ferida indolor que surge no local da inoculação da bactéria; d) Na sífilis secundária, é possível observar o acometimento da pele com o surgimento de manchas; e) Na sífilis terciária, é possível observar uma lesão conhecida como cancro duro. 5. A sífilis é uma doença sexualmente transmissível grave que, se não tratada adequadamente, pode ocasionar a morte do acometido. A respeito dessa doença, marque a alternativa correta: a) A sífilis é transmitida exclusivamente pela via sexual; b) A sífilis pode ficar um período sem manifestações clínicas, dando uma impressão errônea de cura; c) A sífilis é uma doença que atinge apenas a pele e a região genital; d) A sífilis, diferentemente de outras DSTs, não pode ser transmitida para o bebê durante a gestação; e) A sífilis é uma doença viral. Resposta 1a, 2b, 3b, 4e, 5b.